Programas Especiais de Formação de Docentes e a interpretação do Ministério da Educação e dos Tribunais

June 30, 2017 | Autor: Isabel Placido | Categoria: Educação, Formação De Professores, Responsabilidade Civil, Legislação
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Publicado em 03/06/11

Programas especiais de formação de docentes e a interpretação do ministério da educação e dos tribunais Isabel Anacleto Placido - Advogada - OAB/SC n. 20.798 O professor é, em essência, um eterno aluno. É verdade que também o são os melhores profissionais em todas as áreas; sempre se atualizando, refletindo, aprendendo. Mas pelo fato do magistério ter em seu cerne a educação – por que não dizer em sua alma – faz com que o professor seja “o profissional” por excelência. Logo, não é surpresa que os professores estejam sempre preocupados em se aperfeiçoar. Ganham eles, ganha a sociedade. Infelizmente, as oportunidades e o acesso a cursos de graduação não são iguais para todos. Talvez por isto tantos são atraídos pelos cursos de Formação Especial de Docentes, modalidade criada pela Resolução n. 02 de 1997 do Conselho Nacional de Educação. Diz a Resolução, em seus artigos 1º e 2º: “Art. 1º A formação de docentes no nível superior para as disciplinas que integram as quatro séries finais do ensino fundamental, o ensino médio e a educação profissional em nível médio, será feita em cursos regulares de licenciatura, em cursos regulares para portadores de diplomas de educação superior e, bem assim, em programas especiais de formação pedagógica estabelecidos por esta Resolução. Parágrafo único Estes programas destinam-se a suprir a falta nas escolas de professores habilitados, em determinadas disciplinas e localidades, em caráter especial. Art. 2º O programa especial a que se refere o art. 1º é destinado a portadores de diploma de nível superior, em cursos relacionados à habilitação pretendida, que ofereçam sólida base de conhecimentos na área de estudos ligada a essa habilitação”. Em algumas regiões do país, até mesmo pelo longo histórico de desvalorização da carreira, as instituições de ensino encontravam dificuldades em achar profissionais para ministrar determinadas disciplinas. Por isto, facilitou-se a qualificação daqueles que, detendo título de graduação em área com sólido conhecimento daquela disciplina, pudessem obter titulação para também dar aula aos ensinos fundamental, médio e profissionalizante. Muitos professores viram nisto a oportunidade de obter outra licenciatura, em área diferente da qual já ministravam. Ocorre que o Ministério da Educação e o próprio Conselho Nacional de Educação não reconhecem a nova titulação porque “A Resolução CNE/CP 02/97 tinha objetivo expresso de suprir a falta de professores habilitados em determinadas disciplinas e localidades, em caráter especial, procurando seguir a orientação presente na Lei n. 9.394/96, qual seja, a de proporcionar via de acesso ao magistério aos portadores de diploma de cursos superiores distintos de licenciaturas (Art. 63, II). Assim, esperava-se que nas localidades onde existisse falta de professores habilitados em química e

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matemática, por exemplo, e houvesse engenheiros químicos e mecânicos pretendendo ingressar na carreira do magistério, seria possível proporcionar-lhes a via de acesso, habilitando estes profissionais para a atuação em sala de aula”. (Doc. 010-017). (Trecho do Parecer n. 26/2001, do Conselho Pleno do Conselho Nacional de Educação). Assim, em interpretação conjunta da Resolução n. 02/97 e da própria Lei de Diretrizes e Bases (Lei n. 9.394/96), tais cursos não podem ser frequentados por quem já possui uma licenciatura, mas tão somente por bacharéis e tecnólogos. E mais: a área de formação (o curso superior em que é graduado) deve ter sólida base na área de licenciatura pretendida. A racionalidade deste posicionamento resta evidenciada por outro parecer do CNE/CP, o de número 20/2003: “Embora não haja uma norma explícita para determinar quais cursos superiores de bacharelado (ou denominação específica) conferem sólida formação teórica a quais cursos de licenciatura, é razoável pensar que a comparação de históricos escolares seja feita e possa identificar conteúdos básicos comuns. (...) Esta também será a justificativa de invalidar a participação de alunos já detentores do título de licenciatura, dado que obrigatoriamente já deveriam ter tido formação pedagógica, que seria redundante caso a repetissem no aludido programa especial”. (Itálico nosso) Ou seja: para estes programas, o profissional já deve ter uma sólida formação na área pretendida e o que lhe deve ser ministrada é justamente a parte pedagógica. Portanto, para o já licenciado, esta formação lhe seria inútil. E, se diferente for, não está autorizado pela legislação. Caso licenciados forem admitidos, a responsabilidade é da instituição que oferece o curso, conforme deixa claro o parágrafo único do artigo 2º da Resolução n. 02/97: “Art. 2º O programa especial a que se refere o art. 1º é destinado a portadores de diploma de nível superior, em cursos relacionados à habilitação pretendida, que ofereçam sólida base de conhecimentos na área de estudos ligada a essa habilitação. Parágrafo único A instituição que oferecer o programa especial se encarregará de verificar a compatibilidade entre a formação do candidato e a disciplina para a qual pretende habilitar-se”. A responsabilidade da instituição de ensino que oferece o programa especial é reafirmada pelo Parecer CNE/CP n. 20/2003: “Preliminarmente, deve-se ponderar que, se é verdade que à instituição cabia verificar a compatibilidade da formação anterior do candidato em relação à habilitação pretendida, isso não significa que a ela teria sido outorgado direito discricionário e absoluto para fazê-lo sem qualquer observância à norma expressa. É entendimento meridiano de que os programas aos quais se refere a Resolução CNE/CP 02/97 não se aplicam a alunos que já detenham diploma de licenciatura – de qualquer espécie – e que devem ser da área própria da habilitação específica pretendida”. Os danos causados pelo estudante que despendeu tempo, dinheiro e sonhos são extensos. Material e moralmente. O certificado que recebeu ao fim do curso é nulo de pleno direito, como aponta o mesmo Parecer CNE/CP n. 20/2003 e também pelo Parecer CNE/CP n. 25/2002: “Assim, os alunos com diplomas de licenciatura, curta ou plena, quer ingressaram em programas de complementação pedagógica não satisfazem os requisitos do quadro legal de referência. Portanto, o ato jurídico sob cujo manto foram realizados não é perfeito, decorrendo daí que seu certificado não gerou direito. Este entendimento está alinhado não apenas com a norma expressa no Parecer CNE/CP 04/97, mas também com a jurisprudência que se firmou a partir do Parecer CNE/CES 741/99 e se fez presente em diversos pareceres, entre eles os Pareceres CNE/CP 26/2001 e CNE/CP 25/2002”. (Itálico nosso). “No caso do CEFET-PR Curitiba, o exemplo da estudante citada carece de provisão legal face às finalidades e objetivos da formação pedagógica especial. O certificado emitido não preenche as

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condições formais e materiais da plenificação de curso. Dessa maneira, o ato jurídico que expediu o certificado de plenificação apresenta defeito de origem e torna o ato sem valor, pois quod nullum est, nullum producit et effectum”. Há ainda um ponto ao qual os que pretendem cursar um programa especial devem ficar atentos. Ainda que o problema não seja que o aluno já possua licenciatura, é necessário que saibam que o certificado pode não ser aceito pela instituição de ensino em que pretendem trabalhar. Isto se deve ao fato de que o objetivo da criação de tais cursos foi socorrer as regiões que careciam de professores. Assim, as escolas podem simplesmente optar por contratar somente aqueles que passaram por cursos regulares, por entender que estes estão melhores preparados. E, se não houver escassez de profissionais, é altamente provável que assim procedam. Concursos públicos para preenchimento de vagas de professores deverão ter seus editais previamente questionados, caso não incluam os certificados de programas especiais entre os documentos que comprovam a titulação. E, ainda assim, fica a critério da Administração dizer se eles serão aceitos ou não, podendo inclusive dar pesos diferentes para os diplomados e os portadores de certificados, desde que devidamente avocados no edital (Parecer CNE/CP n. 26/2001). Portanto, quem for vítima de propaganda enganosa, tendo sido levado a acreditar que era habilitado a frequentar tais cursos; ou ainda que o certificado obtido ao final teria igualdade com os diplomas de cursos regulares; ou que simplesmente foi levado a erro pela falta da prestação de informação fundamental, pode acionar judicialmente quem ofereceu o curso para pleitear indenização. “Neste caso, o prejuízo dos estudantes, face às finalidades do Parecer e da Resolução, é total. Mas como usuários de boa fé de uma prestação pública que lhes foi oferecida, sem que quem tinha a responsabilidade de prestar informação clara e respaldada na normatização adequada, o tivesse feito, cabe ao CEFET-PR-Curitiba, com o apoio técnico e financeiro da SEMTEC, o dever de preencher um direito dos estudantes”. (Parecer CNE/CP n. 025/2002). Nunca é demais lembrar que prestação de serviços educacionais é relação de consumo, sendo a matéria decidida pelo Supremo Tribunal Federal (Recurso Especial n. 275318 do Distrito Federal. Relator Ministro Maurício Corrêa. 12-09-00). Escassa nos demais tribunais pátrios, a jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo é rica no tocante ao tema. E é indubitável que se fixou o entendimento em consonância ao que dispõe o Conselho Nacional de Educação e do próprio Ministério da Educação, acima descrito. Também, que a instituição que ministrou o curso é responsável pelos danos materiais e morais. Já quanto a pedido de lucro cessante, no entanto, pelo que se observou dos acórdãos, entende o TJSP não ser cabível. Ainda assim, ressalte-se que os casos analisados aventavam questões de perdas de oportunidades hipotéticas, sendo que em nenhum havia a incidência de uma perda concreta, já possível de ser contabilizada. Em caso patrocinado por nós, ainda em tramitação no Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, uma pedagoga licenciada e concluinte de curso de formação especial participou de concurso público municipal para o preenchimento de vagas para professores do ensino fundamental e médio. Foi aprovada, classificada e chamada a assumir a vaga, e tão somente foi impedida de tomar posse em virtude de seu certificado, que era equivalente, mas não igual a diploma – titulação esta exigida pelo edital. Em primeira instância, o magistrado reconheceu os danos matérias e morais, bem como os lucros cessantes. No entanto, contabilizou apenas o ano decorrido entre a data do chamamento e a sentença. Atualmente a lide está em grau de recurso e, ao que tudo indica, sua decisão abrirá precedente na jurisprudência catarinense. (Autos n. 020.09.009380-1, 1ª. Vara Cível da Comarca de Criciúma; e Apelação Cível n. 2010.070389-1, Segunda Câmara de Direito Público).

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