“Proibidão, produção musical e pop funk: cronologia sucinta”

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Proibidão, produção musical e pop funk: cronologia sucinta Carlos Palombini Dos subgêneros de funk carioca, o proibidão é meu preferido. Isso porque, originalmente, é o mais simples: uma voz (um timbre), uma narrativa (uma história), uma narração (uma maneira de contá-la), uma base (um ritmo) e um canto (entoações da voz). Feito para consumo interno em apresentações ao vivo divulgadas em fitas cassete e CDs domésticos, o proibidão inicialmente tem recurso a dispositivos mínimos de produção musical, numa estética que poderia definir-se como a do menos-é-mais. Com tal simplicidade, ele é a escola de formação dos principais MCs da primeira geração. Menos evidente, é também uma escola de produção musical que gera eventualmente o conjunto de produções musicais (arranjos) mais criativos, não apenas do funk carioca, mas de toda a produção gravada desde que a fonografia tornou-se uma arte, isto é, desde que, na segunda metade do século dezenove, inventou-se a gravação. Ele coloca em evidência, pelos meios mais variados e dos modos mais imaginativos, uma voz, uma narrativa, uma narração e um canto para produzir uma outra canção brasileira. O proibidão existe de diferentes modos que se sobrepõem ou se alternam no tempo e no espaço. Há um proibidão “de raiz”, que corresponde ao período da gravação em tempo real (ao vivo) e da circulação em fita cassete, CD doméstico e dispositivos de rede hoje falecidos ou agonizantes: Orkut, fotologs, blogs, 4-Shared, Soulseek etc. Suas bases são as versões instrumentais de singles importados — notadamente o volt-mix — bem como o tamborzão no período de sua ascensão e de seu auge, de 1998 a 2005. Um exemplo tardio é a gravação de Gil do Andaraí, ao vivo na Nova Holanda, de “Veio o toque”, de dezembro de 2004 ou do ano seguinte. Já não se trata simplesmente de uma base em loop, mas de um pedal às vezes cortado ao qual se sobrepõe um scratching, que serve de deixa a tiros, primeiro sampleados e ritmados, depois desordenados e reais. Tiros são companheiros constantes de tamborzão nesse período. Em 2008 o projeto das UPPs começa a desencadear a crise. Neste ano, bom número de proibidões recebe produções elaboradas em tempo diferido (em estúdio): “A Penha é o Poder”, interpretada pelo MC Max, produção do DJ Chorão; e, todas de Thiago dos Santos, o Praga, “Visão de cria”, com o MC Smith, produção do DJ Corvina; “Faz a rodinha em volta da FAP”, com o MC Max, produção do DJ Chorão; e “Camisa da Osklen”, com os MCs Max e Tikão, montagem do DJ Byano. A essa altura, o principal centro de promoção do subgênero é o Baile da Chatuba, no Complexo da Penha; seu meio de circulação, o Youtube. Em 2009, a um ano das invasões e ocupação militar dos Complexos da Penha e do Alemão, o proibidão se volta sobre seu passado: em março, “Na faixa de Gaza é assim”, do MC Orelha, interpretada e produzida pelo autor, utiliza o tempo diferido para simular o tempo real da velha escola; em julho, “Vida bandida”, de Thiago do Santos, interpretada pelo MC Smith em produção do DJ Byano, ilustra um ao vivo com requintes de tempo diferido. Em dezembro de 2010 a prisão dos MCs Frank, Max, Tikão, Dido e Smith torna os rappers receosos. Representadas pelo CD Unidos contra a UPP, naquele mês, começam a proliferar as montagens com fragmentos de vozes proibidas. O inimigo deixa de ser o alemão e passa a ser o Estado. O subgênero torna-se ambíguo em 2011 com

“Rotina de patrão”, interpretado pelo MC Smith, produção dos DJs Rennan e Isaac 22; e, em 2013, com “Herói ou vilão”, do MC Orelha, produção do DJ Diogo do Serrão. Com letras crípticas, o MC Rodson recebe produções do DJ RD da NH em “Papo de bandido”, de 2011, e em “Tá tudo monitorado”, de 2012. Por outro lado, prossegue um proibidão explícito, em tempo real ou diferido, representado pelo MC Vitinho, com “Bala na Dilma sapatão”, de 2011, produção do DJ Rafael de São Gonçalo; e pelo MC Geele, com “Na Copa do Mundo quem vai vencer é o CV”, de 2014. O experimentalismo acaba por conduzir a uma espécie de proibidão pop, de linguagem mais convencionalmente política, ilustrado, em 2015, por “Trem Bala desgovernado”, de Thiago dos Santos, na voz do MC Menor do Chapa, e “Faixa de Gaza 2”, do MC Orelha, na voz do autor, ambas com vídeos de KondZilla e visualizações na casa dos sete ou oito dígitos. As letras agora são autorreflexivas e o experimentalismo das produções cede lugar a um estilo aparentado ao da ostentação paulista, onde os videoclipes substituem a imaginação visual.

Fonografia DJ Battery Brain, 1988, “808 Beatpella Mix”, 8 Volt Mix, Techno Hop Records, THR-20, http://goo.gl/3I7BwR. MC GEELE, 2014, “Na Copa do Mundo quem vai vencer é o CV”, prod. Estúdio Criminoso, http://goo.gl/W1p0fC. MC Gil do Andaraí, 2005, “Veio o toque”, ao vivo na Nova Holanda, http://goo.gl/US1oMH. MC Max, 2008, “Faz a rodinha em volta da FAP”, de Thiago dos Santos (Praga), prod. DJ Chorão, http://goo.gl/cdtiVE. MC Max, 2008, “A Penha é o Poder”, prod. DJ Chorão, http://goo.gl/MXwni3. MC Max e MC Tikão, 2008, “Camisa da Osklen”, de Thiago dos Santos (Praga), montagem do DJ Byano, http://goo.gl/dyfNKf. MC Menor do Chapa, 2015, “Trem-bala desgovernado”, de Thiago dos Santos (Praga), prod. KondZilla, http://goo.gl/hgkgZu. MC Orelha, 2015, “Faixa de Gaza 2” , do MC Orelha, prod. KondZilla, http://goo.gl/3xbRmo. MC Orelha, 2013, “Herói ou vilão”, do MC Orelha, prod. DJ Diogo de Niterói, http://goo.gl/Q8SP8E. MC Orelha, 2009, “Na faixa de Gaza é assim”, do MC Orelha, prod. MC Orelha, http://goo.gl/4Swtk6. MC Rodson, 2012, “Tá tudo monitorado”, prod. DJ RD da NH. MC Rodson, 2011, “Papo de bandido”, prod. DJ RD da NH, http://goo.gl/tmL7vX. MC Smith, 2011, “Rotina de patrão”, prod. DJs Rennan e Isaac 22, http://goo.gl/OF7OCd. MC Smith, 2009, “Vida bandida”, de Thiago dos Santos (Praga), prod. DJ Byano, ao vivo na Chatuba, http://goo.gl/yb1NBm. MC Smith, 2008, “Visão de cria”, de Thiago dos Santos (Praga), prod. DJ Corvina, http://goo.gl/GVRosx. Vários, 2010, Unidos contra a UPP, http://goo.gl/itJ90s. 2

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