Propaganda, marketing, ideologia e alienação. Fetichismo da marca?
Descrição do Produto
Terceirização da produção: saem às fábricas, surgem às marcas um novo nível de alienação das massas, o fetichismo da marca. Marx em sua obra retrata a alienação do homem, isso acontece para ele a partir de quando o homem perde o domínio dos meios de produção e não se enxerga como o real produtor de valores. Com o desenvolvimento do capitalismo, suas mutações e transmutações, esse modo de produção passou a promulgar um novo estágio de alienação, o fetichismo da mercadoria aliado à venda de abstrações trouxe à tona o mundo das marcas, da subjetividade imposta, o espírito que pode ter uma mercadoria e a significação que ela passou a ter quando consumida por uma pessoa. O presente trabalho visa expor esse movimento tendo em vista principalmente à “terceirização da produção”, termo aqui utilizado para designar o modo como que as marcas “produzem” pagando para outras empresas produzirem seus produtos e com a simples adição de uma logo multiplica o valor da mercadoria, pois tem se aqui, o que alavancou esse movimento foi à descentralização da produção e a precarização do trabalho nos países periféricos como consequências da mundialização de capitais. 1
Marx diz no capítulo 23 do capital que o homem é refém do que ele produz no capitalismo, fazendo uma ligação com a teoria e a prática podemos então dizer que na configuração do capitalismo atual, a mercadoria não é somente material, é também transcendental, social e espiritual. Elas ganharam uma mistificidade especial, a capacidade de mudar a autoestima de uma pessoa, dar status e uma identidade apenas com a simbolização atribuída. “Até o início dos anos 70, os logotipos em roupas geralmente ficavam escondidos, discretamente colocados na face interna dos colarinhos. Os pequenos emblemas de grife apareceram no lado de fora das camisas na primeira metade do século, mas esses trajes esportivos se restringiam aos campos de golfe e quadras de tênis dos ricos. No final dos anos 70, quando o mundo da moda se rebelou contra o brilho aquariano, a roupa countryclub dos anos 50 tornouse estilo de massa para os novos pais 1
MARX, Karl. “A Lei geral da acumulação capitalista” (cap. 23) In: O Capital: crítica
da economia política . Livro I. Volume II. São Paulo: Nova Cultural, 1985.
conservadores e seus filhos mauricinhos. O cavaleiro da Polo de Ralph Lauren e o crocodilo da Izod Lacoste saíram do campo de golfe e dispararam pelas ruas, arrastando o logotipo definitivamente para o lado de fora da camiseta. Esses logos tinham a mesma função social da etiqueta de preços das roupas: todo mundo sabia exatamente quanto o dono da roupa se dispôs a pagar 2 pela distinção.”
Uma representação clássica desse movimento de inserção de um conceito de vida em um produto foi a recorrente procura por pessoas a tatuadores para fazerem tatuagens com os dizeres “Just Do It” (Apenas faça em português) durante a campanha homônima da Nike que era uma propaganda de inspiração para enfrentar os problemas e desafios do dia a dia promovida pela empresa. Os comerciais e as propagandas eram sempre demonstrando que a pessoa que usava Nike era ousada, persistente, inteligente e que sempre levava vantagem em relação as outras por ter esse espírito, o espírito do “Apenas faça”. Já não é novidade a existência fábricas da Nike e da Adidas na Ásia, talvez essas marcas sejam a simbolização desse processo. A precarização do trabalho, a abertura dos Estados e a mão de obra mais barata nesses países foi o que atraiu os investidores das empresas que se instalam em determinadas áreas. Esse fenômeno não é estranho aos brasileiros, a Zona Franca de Manaus se assemelha muito as chamados Zonas de Processamento e Exportação ou as zonas de livre comércio nome dado por economistas, segundo Naomi Klein os lugares onde ficam as fábricas que produzem as mercadorias das grandes marcas, muitas ainda sem obrigações fiscais e que fazem os trabalhadores trabalhem em jornadas extensas. Ela afirma que os trabalhadores chegavam a trabalhar até 16 horas (Sem Empregos cap. Citar) na época que ela estava levantando dados de pesquisa para escrever Sem Logo. Esses trabalhadores acabam ficando sem lazer, sem uma condicionada “vida social” onde as pessoas vivem para trabalhar e suas existências se remetem a produzirem como
2
KLEIN, Naomi . Sem Logo : A tirania das marcas em um planeta vendido . Tradução
de Ryta Vinagre. – 7º edição. – Rio de Janeiro: Record, 2009. p. 52.
3
máquinas. Paul Lafargue milita contra essa vida de exploração quando escreve O Direito à Preguiça e expõe esses aspectos desse condicionamento do capital voltado para a produção de mais maisvalia. Essas jornadas de trabalho exercidas pelos trabalhadores são tão extensas quanto às analisadas por Marx quando ele se refere a mais valia absoluta e as condições de trabalho dessas pessoas são tão degradantes quanto, pois assim como os trabalhadores analisados em toda obra de Marx estes não possuem direitos e são apenas ferramentas descartáveis do capital pela eterna ameaça dos “sobrantes”, ou melhor, do chamado exército industrial de reserva de Marx. A Nike abandonou fábricas nos Estados Unidos e a Adidas fez o mesmo na Alemanha e elas são só exemplo de uma infinidade de outras que fizeram o mesmo por perceberem que os custos do trabalho que para o capital eram “impraticáveis” nas 4
sociedades salariais de Robert Castel e que a “terceirização da produção” era o melhor caminho a ser percorrido. Em um movimento, o chamado neoliberalismo foi tornando os capitais mundiais, não só centralizados em um país ou área. As marcas, empresas que o maior valor não está nas máquinas de produção e sim na logo que as representam, não investem em força de trabalho tão quanto investem em uma ferramenta moderna de agregação de valor, o marketing. Os únicos ditos trabalhadores dessas empresas são os executivos, os chamados CEOs, que são famosos, dão entrevistas e até palestras pelo mundo, mas que com os altíssimos salários que recebem em pequenos espaços de tempo acabam comprando ações das empresas onde eles trabalham e acabam tornandose capitalistas também, mesmo que alguns ainda continuem exercendo a carreira executiva. Uma questão dialética dentro dessa configuração, pois há uma problemática grande que envolve o
3
LAFARGUE, Paul . O direito à preguiça .
4
CASTEL, R. “As transformações da questão social”. In: CASTEL, R. (et allii)
Desigualdade e a Questão Social . São Paulo: EDUC, 2000.
fato deles serem ou não serem trabalhadores, da mistificação do trabalhador ser pobre e explorado, um estigma que é quebrado com esses exemplos. Mas que não ofusca a realidade. A mundialização de capitais trouxe à tona uma nova dinâmica de produção na acumulação de capital, o marketing de certa forma passou a ser componente direto nos custos de produção, no orçamento, pois agrega valor e a produção clássica com maquinário, matéria prima e trabalhadores foi repassada a outras empresas que só fabricam as mercadorias alienando ainda mais os trabalhadores que sabem que só tem que produzir, mas não sabem pra onde e pra quem só sabem pra quando devem produzir até porque eles trabalham por contratos de tempo determinados e repassa as marcas para que elas possam agregar valores astronômicos com uma simples logo ou etiqueta. Esses trabalhadores dessas fábricas são geralmente jovens que saem do interior para procurarem empregos nas fábricas e que enfrentam essa realidade pela falta de oportunidade de emprego em seus países segundo KLEIN (2009). Por isso que são tão mal pagos e de certa forma tem que aceitar o que é pago, pelo fato de ser a única oportunidade de renda que eles possam vir à ter nos seus países por infinidades de questões econômicas, políticas e sociais. Esse cenário acontece também no Brasil quando os chamados “bóias frias” saem do nordeste para irem trabalhar na safra da cana de açúcar nos Estados de sudeste. Não está fora da realidade brasileira essa questão social, a forma de gerir a pobreza no Brasil é com a assistência social guiada pelo Bolsa Família, mas já nesses países é justamente essa abertura de zonas livre comércios que geram rendas as pessoas, mesmo que muito abaixo do nível mundial. Pode se reparar duas formas de gestão da miséria, ou melhor, gestão da barbárie, formas como o governo dinamizam com essas relações como incita 5
Menegat .
5
MENEGAT, Marildo. “Sem lenço nem aceno de adeus. Formação de massas em
tempo de barbárie: como a esquerda social pode enfrentar esta questão? ” em: Revista Praia Vermelha. v.18 n.1 2008.
Mas o intrigante é que a taxa de lucro que teoricamente deveria aumentar bruscamente com esse movimento de “terceirização da produção”, mas não aumenta em escala compatível devido aos altos custos de divulgação, promoção da marca e da mercadoria e aos salários exorbitantes dos CEOs. Muitos deles chegam a terem ganhos 6
até maiores do que os donos das empresas . Uma pessoa simplesmente substitui centenas ou até milhares em capital variável. É interessante fazer um adendo na questão do valor e da valorização destas marcas. Estas que com a publicidade e a propaganda se tornam ainda mais incompreensíveis devido ao enorme risco que correm de se desvalorizam ou valorizarem de um dia para o outro, pois se, por exemplo, o Barcelona que é patrocinado pela Nike vence em uma partida de futebol o Real Madrid que é patrocinado pela Adidas em um dia, no dia seguinte mais camisas do Barcelona vão ser vendidas e haverá uma exposição mundial da Nike e se ocorre o inverso, se o Real Madrid vence a camisa da Adidas aparece em todas as capas de jornais e revistas esportivas e há de certa forma uma simbolização de superioridade de marca subjetiva dentro de toda uma história de rivalidade e cultura apropriada por estas. Dentro dessa conjuntura é plausível lembrar o investimento que as marcas têm sobre as celebridades, atletas, artistas e outros. Elas pagam essas pessoas para usarem seus produtos e consequentemente divulgarem a marca, fazendo que ainda mais as pessoas que compram as mercadorias às enxerguem como uma ponte para elas serem, ou melhor, se sentirem o Cristiano Ronaldo (Nike), o Messi (Adidas), a Anitta (Olla), o Slash (Gibson). Não são vendidos produtos e sim conceitos e estilos de vida. Uma nova configuração de mercadoria que impregna literalmente no imaginário e na vida das pessoas. O âmbito cultural da sociedade também não está protegido desses avanços do capital sobre a vida humana. Esse conceito de uma mercadoria definir status e, por conseguinte estigmatizar a pessoa que a consome traz à tona toda uma questão social.
6
KLEIN, Naomi . Sem Logo : A tirania das marcas em um planeta vendido . Tradução
de Ryta Vinagre. – 7º edição. – Rio de Janeiro: Record, 2009. p. 52. p. 284.
Pode se ilustrar esse movimento através do funk paulista contemporâneo, o chamado 7
funk ostentação . Os MC’s cantam músicas que retificam o fetichismo da mercadoria e também o poder que uma mercadoria tem na atualidade de definir uma classe social. Mas no funk ostentação em especial ela mascara, isso para demonstrar poder sobre os que estão no mesmo habitat social que eles, uma forma de se sentir vem se iludindo e se enganando com mercadorias que eles não têm uma forma de se sentirem em uma parcela de alto consumo e significação social que eles não estão inclusos, mas que de certa forma, mentalmente estão. Todos manipulados pelo capitalismo. É tirada 8
desse contexto erroneamente a ideia de Maquiavel em “O Príncipe” que o homem é um ser que tem prazer em se comparar. Eles fazem isso porque são condicionados socialmente a fazer, bombardeados por abstrações que os alienam cada vez mais e dominam suas vidas. Esses MC’s geralmente são oriundos da classe média baixa e pobre do Brasil que em uma virtuação da conjuntura política de ascensão de parcelas da sociedade brasileira ao mundo do consumismo, ou seja, a “nova classe média” do PT passou a vislumbrar consumir mercadorias que outrora eram inimagináveis e essas pessoas são as principais consumidoras desse tipo de música, dessa movimentação cultural que condiciona os homens a pensarem que são o que eles têm e consomem. Embaixo está uma ilustração dessa realidade de “ostentação”, o ápice do fetichismo da mercadoria e da alienação humana, a música “Na Pista eu Arrazo” do Mc Guimé (2013). “De Ranger Rover, Evoke Na pista, eu arraso Pro Instagram, um close Ela comenta 'eu caso' E aqui são vários casos Pra gente desenrolar
7
Dentre os cantores do gênero procurar por MC Gui, MC Lon, MC Nego Blue e MC
Rodolfinho. 8
MAQUIAVEL, Nicolau. Da
crueldade e da piedade; se é melhor ser amado que
temido, ou antes temido do que amado. In: MAQUIAVEL, Nicolau. O Príncipe . Versão para ebook, Ebooksbrasil.com.
Camarote fechado E champagne pra estourar”
Os executivos são responsáveis por planejar as ações que promoverão o produto, ou melhor, a marca. A produção já não é o mais importante, a divulgação e a promoção desses produtos se tornou protagonista no processo comercial. Os executivos são responsáveis pelos bombardeios ideológicos e de subjetivação que irão circular nas mídias. Esse processo é tão peculiar a essa nova configuração do capitalismo que na atualidade, antes de ser fabricada, a mercadoria já é divulgada com propagandas em outdoors, comerciais, revistas e jornais e tem até valor já estipulado antes mesmo de ser inserida ao mercado. Esse processo “fantasmiza” ainda mais o valor que é fantasmagórico para Christian Honner e para Marx por resultar de relações entre os homens que não são totalmente conscientes. Pois esses valores estipulados surgem de uma série de determinações variáveis oriundos de premissas estipuladas no planejamento de cada produto intensificando ainda mais essa relação contraditória em si. Isso pode ser visto principalmente com os produtos de computação, principalmente em softwares e patentes de equipamentos eletrônicos que passam a ser exclusivos e geram verdadeiros debates antes de serem lançados, mas também com os iPhones já com preços definidos antes do lançamento. Estes, aliás, são perfeitas representações dessa conjuntura, pois a configuração do iPhone é exclusivo dele, e não pode ser reproduzido sem a autorização da Apple, além das peças que são fabricadas para só funcionarem com toda a estrutura dos aparelhos exclusivos da empresa. Fetichismo da marca Analisando a configuração do capitalismo contemporâneo, a sua inserção aprofundada no imaginário das pessoas, a transformação da cultura e da idealização em mercadorias, pode se afirmar que, na conjuntura atual, não existe somente o fetichismo da mercadoria, mas também o “fetichismo da marca”. As pessoas não se importam com o que elas compram e sim a simbolização que quilo trará a sua vida, o status, o poder
sobre outros, o “orgulho de si”, a intimidação, várias outras relações determinadas pelo desenvolvimento das relações dos homens que influenciam suas vidas e as mantem nesse estágio de alienação, pois o capitalismo necessita e vive de ilusões. Por fim, cabe aqui inserir uma problemática à ser discutida, o fetichismo da mercadoria na atualidade. A concepção tirada interagindo com tudo que foi discutido é que existe uma espécie de “fetichismo da marca” que engloba o fetichismo da mercadoria mais a alienação e outros fatores do âmbito cultural e social. Mas em contrapartida temse a ideia de que a marca é uma mercadoria e que a mercadoria geralmente tem uma marca. É uma relação confusa. A marca agrega valor a uma mercadoria e de certa forma é uma ferramenta de valorização, mas colocação que se afirma é que a marca é uma mercadoria por poder ser vendida e comprada além de gerar alienação em um estágio superior.
Bibliografia: CASTEL, R. “As transformações da questão social”. In: CASTEL, R. (et allii) Desigualdade e a Questão Social . São Paulo: EDUC, 2000. HÖNER, Christian. “ O que é o valor? Da essência do capitalismo – uma introdução” KLEIN, Naomi . Sem Logo : A tirania das marcas em um planeta vendido . Tradução de Ryta Vinagre. – 7º edição. – Rio de Janeiro: Record, 2009. LAFARGUE, Paul . O direito à preguiça . MARX, Karl. “A Lei geral da acumulação capitalista” (cap. 23) In: O Capital: crítica da economia política . Livro I. Volume II. São Paulo: Nova Cultural, 1985. MENEGAT, Marildo. “Sem lenço nem aceno de adeus. Formação de massas em tempo de barbárie: como a esquerda social pode enfrentar esta questão? ” em: Revista Praia Vermelha. v.18 n.1 2008.
MAQUIAVEL, Nicolau. Da crueldade e da piedade; se é melhor ser amado que temido, ou antes temido do que amado. In: MAQUIAVEL, Nicolau. O Príncipe . Versão para ebook, Ebooksbrasil.com.
Lihat lebih banyak...
Comentários