Qualidade na Educação: um estudo em desenvolvimento

August 6, 2017 | Autor: A. Batel Anjo | Categoria: Education, Politics
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Qualidade na Educação: um estudo em desenvolvimento António Batel Anjo e Zeferino Martins Ministério da Educação Moçambique

Introduçã o Realizadas várias pesquisas e uma aturada reflexão leva-nos a concluir que existe, no mundo em geral, uma grande preocupação com um ensino de qualidade, mais do que com a educação de qualidade. Ensino e educação são conceitos diferentes. No ensino organizam-se um conjunto de atividades didáticas no sentido de ajudar os alunos a compreenderem assuntos de áreas específicas do conhecimento – são aspetos extremamente importantes mas de caracter processual. Já na educação o foco é muito mais abrangente. Além de ensinar, é necessário conjugar o ensino com vida, o conhecimento com a ética, a reflexão com ação e ter uma visão global do mundo e um reconhecimento claro e inequívoco do local e do tempo onde se está. Pelo mundo fora encontramos muitas escolas e universidades que são tidas como modelos de um ensino de qualidade sendo que, na verdade, tal não acontece. Temos isso sim, meritoriamente e em alguns cursos, escolas e universidades com áreas de excelência. Mas o conjunto das instituições de ensino está muito distante do conceito de educação de qualidade. Ter um ensino de qualidade envolve muitas variáveis:      

Organização inovadora, aberta, dinâmica com um projeto pedagógico participativo. Docentes bem preparados, intelectualmente e emocionalmente, bons comunicadores e detentores de ética profissional. Relação entre professores e alunos que permita conhecê-los, acompanhá-los, orientálos. Infraestrutura adequada, atualizada e confortável. Tecnologias acessíveis, rápidas e renovadas. Alunos motivados, preparados intelectualmente e emocionalmente, com uma forte componente social e cultural e com capacidade de tomar decisões.

Como facilmente se observa um ensino assim estabelecido é utópico para os dias de hoje. No entanto têm que ser estas as metas que norteiam as políticas nacionais de educação. Um ensino com estas características de qualidade é muito caro e por isso só pode ser pago por poucos ou então tem que ser amplamente subsidiado e patrocinado.

As instituiço es Poderemos pensar e criar algumas instituições de excelência mas a grande maioria demorará décadas para evoluir até um padrão aceitável de excelência, sendo que estes acabam por ser diferentes no tempo e evoluem com as conjunturas políticas e geoestratégicas. Temos, no geral, um ensino muito mais complexo. As melhores universidades são bastante desiguais nos seus cursos, metodologias, forma de avaliar, projetos pedagógicos, infraestrutura. Quando há uma área mais avançada esta é colocada como modelo, divulgada externamente como se fosse o padrão de excelência de toda a universidade. De repente olhamos uma instituição e sentimos que se toma “o todo pela parte”, que o trabalho apresentado é apenas fruto de pequenos grupos, lideranças de projetos e de nichos de investigação e que são generalizados como se todos os setores da escola fossem desta forma. As instituições vendem bem os seus sucessos e escondem os insucessos, os problemas e as dificuldades. Apesar dos esforços dos governos e das próprias famílias temos bastantes alunos que ainda valorizam mais o diploma do que o aprender, que estudam o mínimo para ser aprovados, que esperam ser conduzidos passivamente e não exploram todas as possibilidades que existem dentro e fora da instituição escolar. Existem instituições que se aproveitam desta situação e então encontramos um ensino voltado, em boa parte, para o lucro fácil, aproveitando a grande demanda existente, com um discurso muito teórico (com base em documentos) e sem um investimento na prática (laboratórios e oficinas). O desafio de todas as instituições a nível mundial é procurar ter um ensino de qualidade, mas conscientes de que é um processo longo e ainda mais exigente em dois aspetos – económico e social.

Desãfios pãrã umã educãçã o de quãlidãde Neste contexto pede-se aos governos e diferentes instituições que o maior desafio é o de caminhar para uma educação de qualidade, integrante de todas as dimensões do ser humano. Precisamos de encontrar pessoas que façam essa integração em si mesmas do sensorial ao intelectual, emocional, ético e tecnológico, que transitem de forma fácil entre o pessoal e o coletivo. Aquando da transição do novo milênio, acompanhado a vontade de mudança sugerida pelo calendário e posteriormente com os movimentos nacionais e transnacionais que sugeriram que a sociedade pretende uma mudança efetiva e que muitas das ideias instaladas estão ultrapassadas impõe-se uma pergunta: qual o impacto de todas estas mudanças sobre os sistemas educação? Temos cinco desafios fundamentais para o futuro que podemos adaptar do relatório “European Report on the quality of school education – sixteen quality indicators”1, que embora produzido para servir os propósitos da educação na Europa pode com facilidade ser extrapolado para outros continentes.

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ISBN 92-894-0536-8 © European Communities, 2001

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Os referidos desafios são: 1. 2. 3. 4. 5.

o conhecimento; a descentralização; os recursos; a inclusão social; os dados e a sua comparabilidade.

Estes desafios são no fundo aquilo que está espelhado na maioria dos programas governamentais como sendo um conjunto de metas a alcançar. O desafio da sociedade do conhecimento faz-nos refletir nos propósitos essenciais da educação escolar, em relação ao mundo do trabalho e à aprendizagem ao longo da vida. A grande capacidade de gerar e gerir a informação leva-nos a equacionar as conceções tradicionais de conhecimento, a sua transmissão, o papel do professor e do aluno. A consciência que só um processo de descentralização pode aproximar as pessoas das decisões políticas e que estas podem ser absorvidas e participadas por toda a comunidade. A inclusão passa pelo estabelecimento de políticas de equidade e racionalidade no uso dos recursos disponíveis. Uma questão fulcral no processo de julgamento de uma política para a educação a nível internacional tem que ver com a comparabilidade dos dados obtidos. As políticas de educação são enraizadas numa cultura existente e que não pode ser objeto de comparação. Daí que todas as conclusões necessitem de uma análise sociológica muito séria.

Indicãdores Se encontramos um conjunto de metas e temos consciência que caminhamos num sentido de uma educação para todos e inclusiva, levanta-se uma questão: como medir os progressos? Surgem então indicadores internacionais que permitem aferir os progressos das políticas e das necessárias correções que vão sendo introduzidas. Definiram-se quatro áreas (realização pessoal, sucesso, monitorização e recursos) e mais um conjunto de indicadores que tornam o processo de verificação mais fácil. Área Realização

Sucesso e transição

Monotorização

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Indicador 1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11.

Matemática Leitura Ciência Tecnologias de Comunicação e Informação Aprender Línguas estrangeiras Aprender a aprender Educação Cívica Abandono escolar Conclusão do Ensino Secundário Ingresso no Ensino Superior Avaliação e orientação do Ensino Básico e Secundário 12. Participação dos Encarregados de Educação Página 3

Recursos e Estruturas

13. 14. 15. 16.

Formação de Professores Educação pré-primária Número de alunos por computador Orçamento dedicado à educação por aluno

Associados à área de realização pessoal, desenvolvem-se sete indicadores de rendimento que são vistos como críticas para todos os países no presente e no futuro. Em alguns campos como a Matemática, a Leitura e a Ciência é relativamente fácil obter dados que comprovem o desempenho destas áreas curriculares. Já no que diz respeito a “aprender a aprender” é um indicador que não é facilmente mensurável. Num sistema social e económico imprevisível e com os dados atualmente disponíveis é muito difícil mensurar o “civismo”, as “línguas estrangeiras”, que ainda carece de um modelo a seguir. A tecnologia da informação e comunicação (TIC) não sendo fácil de medir o grau de desenvolvimento será um indicadorchave nos próximos anos. Todas essas áreas de realização continuam a ser importantes metas para o futuro. A área do sucesso e transição abrange três indicadores de grande importância relevância política. Eles estão intimamente relacionados – conclusão do Ensino Secundário, participação no Ensino Superior e o abandono escolar – cujos valores podem ser facilmente obtidos se existirem dados obtidos de um sistema de registo fiável e credível. O acompanhamento da Educação Escolar tem que ver com dois indicadores específicos: a avaliação e orientação da educação escolar e a participação parental. Estes indicadores têm que ver com o projeto da escola, onde os diretores, professores, alunos e pais são os principais interessados no sucesso da educação e no seu melhoramento constante. Por último a área dos recursos e estruturas com quatro indicadores que têm que ver com as políticas definidas para o sector da educação e que inclui a verificação de aspetos-chave para o desenvolvimento de uma educação de qualidade. As despesas com a Educação estão ligadas à qualidade da formação dos professores e ao sucesso dos alunos, são por isso inquestionáveis embora a sua aplicação careça de uma auditoria permanente por parte da sociedade.

Os desãfios pãrã Moçãmbique Passados os anos de ocupação colonial e da guerra de libertação e civil o enfoque do sector foi a implementação do Plano Estratégico de Educação e Cultura (PEEC 2006-2010/11), orientado para três grandes objetivos: 1. Aumentar o acesso, reduzindo as disparidades geográficas e de género; 2. Melhorar a qualidade do ensino; 3. Fortalecer a gestão do sistema administrativo da Educação em todos os níveis.

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Para aumentar o acesso, as ações principais centraram-se na expansão da rede escolar em todos os níveis de ensino, através da construção de infraestruturas educacionais e, em simultâneo, na implementação de medidas específicas para evitar a exclusão de alunos do Sistema Educativo, por razões financeiras, culturais, de género ou por necessidades educativas especiais. Para o aumento da qualidade de ensino, fizeram-se intervenções nas reformas curriculares, à provisão de livros escolares e de outros materiais didáticos fornecidos em quantidades suficientes e em tempo útil, ao desenvolvimento de um sistema integrado para a formação e capacitação de professores e ao aumento do recrutamento anual de novos professores formados. Na área do ensino pós-primário foram introduzidas reformas para melhorar os seus níveis de qualidade e a sua relevância para o desenvolvimento do país. O aumento da capacidade institucional, foi no sentido de tornar o Sistema Educativo, desde o nível central até à escola, menos burocrático, mais criativo, mais dinâmico, mais próximo dos agentes educativos e da comunidade, sublinhando a necessidade e a obrigatoriedade de o sistema prestar contas sobre a sua atuação. Na perspetiva de oferecer serviços educativos de qualidade, com equidade, as principais intervenções do sector integram ações específicas e assuntos transversais de modo a assegurar que todos tenham a oportunidade de beneficiar dos serviços educativos, independentemente do sexo, religião, condição económica e social ou de outras particularidades. Como resultados destas medidas obtivemos a expansão do sistema educativo, em todos os níveis com particular realce para o nível pós-primário, quer em termos de expansão da rede escolar, quer em termos de crescimento dos efetivos escolares. Um sistema mais equilibrado com a evolução dos alunos através dos diferentes graus de ensino, com grande enfâse com a grande participação das mulheres na educação. Um ensino superior renovado e em fase preparação para novas políticas de crescimento em qualidade com a formação cada vez maiores de graduados e pós-graduados. Um orçamento do sector da Educação, e a sua execução, cresceu de forma significativa ao longo dos últimos anos. O peso da despesa para a Educação no Orçamento do Estado (OE) variou entre 20% e 23,4%, o que reflete o grande compromisso do Governo e dos vários parceiros que apoiam este sector. Como corolário de tudo isto temos uma população mais educada que pode ser observado através do aumento do número de graduados em todos os níveis de ensino. Os progressos, quer ao nível do acesso, quer ao nível do aproveitamento, foram maiores para as mulheres. A proporção da população com acesso à escola aumentou de 30,8% em 2002-03 para 37,3%, em 2008-092.

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PARP 2011-2014, pág. 7.

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Conclusã o em jeito de novos desãfios No entanto e apesar de todos os esforços a redução do aproveitamento escolar, verificada desde 2008, em todos os níveis é preocupante. Qual a causa? Teremos que trabalhar no sentido de avaliar e rever os nossos indicadores para melhorar as políticas vigentes. Mas como podemos observar os indicadores e os desafios de uma nova educação são os mesmos quer se trate da velho mundo ou do mundo em desenvolvimento. O lançamento de um estudo durante este ano e o próximo é o nosso desafio para que a educação em Moçambique possa ser comparada em termos internacionais afinando por padrões mundialmente aceites. Não somos parentes pobres de um sistema que cresce longe dos nossos olhos, somos sobretudo atores num cenário de mudança a nível mundial. A nossa cultura, os nossos anos como nação podem ser um fator que teremos que ter em conta quando analisamos os nossos dados. Mas uma coisa é certa – afinamos pelo padrão mundial.

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