Quando Dona Maria Desce para Cuidar de Nos
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quando dona maria " desce " para cuidar de nós: caboclos e iNTErterconexões afetivas no tambor de mina do maranhão
No contexto de um ritual os caboclos em Tambor de Mina (religião de matriz negro-africana praticada no Maranhão) previsivelmente brincam e cumprimentam os visitantes, além de manterem relações afetivas recorrentes com seus ‘filhos’. Porém, suas manifestações fora do contexto de ritual ou longe do terreiro frequentemente são involuntários e por vezes impetuosos. Tal acontecimento é visto pelos praticantes como uma explosão imprevisível e perigosa. Este texto trata desta assimetria pela dimensão afetiva. Se na cosmovisão “Mina” entidades espirituais intervêm voluntariamente nas práticas mundanas, e se tal intervenção se manifesta igualmente durante contextos ritualizados e mundanos na forma de uma possessão, qual seria a eficácia afetiva da ‘possessão’ no entorno do ritual e qual seria a eficácia afetiva do ‘ritual’ a respeito de uma
Matan Shapiro
alteração afetiva involuntária?
A fenomenalidade de possessão
Interconexão Afetiva
por Caboclo na Mina Para meus interlocutores no entorno do
de possessão súbita, desvinculada de ritual e
Carlos, como a maioria dos praticantes
ele pediu benção do caboclo Seu Manezinho e
terreiro de Pai de Santo Carlos - aonde
longe do terreiro. Além dos estados afetivos
religiosos no seu terreiro, descreve o seu
subitamente ’caiu’.
aprendi sobre Tambor de Mina durante meu
associados com corpos abertos ou fechados,
envolvimento na Mina em termos escatológicos.
Evidencialmente, então, quadros de relações
trabalho de campo - a súbita imanência da
o ponto aqui é a sismografía contagiosa
Além do fato que a gravidez da sua mãe
intimas no entorno do terreiro sempre
possessão não é somente uma manipulação
dessas formas de transferência. A relação
foi ‘velada’ pelo vodum Adjunsom (povo de
apontam adiante outras relações. Toma
humana ou provocação consciente. Tal fluxo
medium-caboclo faz parte dum escopo maior
obaluaê), outras entidades já rodeavam
por exemplo o guia da casa de Carlos,
pode ‘pegar’ ou ‘agarrar’ praticantes religiosos
de relações entre o medium e seus parentes
Carlos na sua infáncia. ‘Na realidade’, ele me
seu Manezinho. Quando ele vem, ele
involuntariamente dentro e fora do terreiro.
e entre caboclos no mundo da encantaria.
disse, ‘eu já estava recebendo entidades com
frequentemente também trás o farrista da
Por exemplo, numa das passagems que eu
Quando caboclos estão estimulados ao
1 e 2 anos de idade, eu já fui afetado pela
casa, seu Zé de Légua. Às vezes, quando
presenciei, uma das visitantes se aproximou à
movimento, eles fluem através de contextos
questão da espiritualidade. A minha energia
nenhum deles quer descer, a Dona Maria
porta do terreiro do lado de fora. Por chegar
mundanos e divinos livremente, e assim
vital era fraca porque era apenas um bebê,
Légua desce no seu lugar.
lá, ela de repente saiu voando de costa para
estabelecem um canal de concetividade entre
e eles tinham uma energia vital bem mais
Na sua especificação no entorno da casa de
trás, caindo em cima de pessoas que estavam
estes mundos. Segundo e consequentemente,
equivalente a minha. Isso afetava o meu corpo,
Carlos, esta proliferação de relações afetivas
sentadas em frente. As suas mãos foram
relações entre medium e seus caboclos
o funcionamento do meu organismo’. As suas
se baseia na historia acumulada de todas
cerradas fortemente e ela ficou tremendo
não somente replicam ou representam ou
doenças de infância foram assim atribuídas
as incorporações involuntárias que Carlos
no chão por um tempo. Depois me disseram
‘funcionam em maneiras aparecidas’ aos
àquelas entidades. Quando ele comemorou
experimentou desde a infância.
que foi ‘só’ uma sereia que ‘tomou conta dela’.
relações afetivas entre o medium e seus
7 anos, Carlos experimentou a sua primeira
Igualmente, documentei vários casos
parentes.
possessão registrada, quando
Dramas Sociais e Proliferação de Relações Intimas O escopo deste processo de proliferação
ciclo de vida religioso no terreiro. Porém,
caboclos, ou entre Carlos e seus caboclos,
encantado-encantado, e medium-parente.
de relações intimas na casa de Carlos
durante as passagens Claudiane contribuiu
automaticamente também ativa relações
Portanto é possível singularizar quadros
também engloba humanos. O fato é que
trabalho, dinheiro, comida e assistência,
sociais mais amplas no seu alcance, tanto no
específicos de relações íntimas como unidade
todos os rodantes da casa estão engajados
inclusive de trocar ocasionais palavras com
mundo da encantaria quanto no mundo dos
básica de reprodução de sentidos no entorno
numa forma ou outra nas redes de quadros
os entidades possuindo Carlos e Irací. Mais
humanos. Essa dinâmica continua a desafiar
deste fluxo energético. A proliferação desses
de relações intimas que se compõem a
marcante ainda, Claudiane está regularmente
as próprias moralidades e interditos marcando
quadros, e o fato que um sempre está
personagem de Carlos como uma pessoa
encontrando dona Maria Padilha – a pomba-
o fluxo afetivo cotidiano. Possessão assim se
agregado aos outros quadros, desempenha
social dentro e fora da Mina. Toma por exemplo
gira responsável dos trabalhos de Carlos! Ela
torna uma situação distinta que representa o
um território empírico de intercâmbio afetivo -
a Janaina, filha da Claudiane, que era a
desabafa e compartilha as suas dificuldades
fluxo duma força transformadora. Esta força
dentro do contexto religioso e fora.
segunda mulher de Carlos.
com a entidade, e assim indiretamente
faz com que o conjunto dado de relações
O elo deste processo só se torna significativo
Quadros complexos de outorgas, memórias
também com Carlos. A totalidade das demais
sociais e sua violenta rebentação se tornam
na sua acumulação histórica como uma
contestadas, envolvimento amoroso e
concessões aqui descritas – entre o medium e
mutualmente-inclusivas.
mutliplicidade de graus e níveis de intimidade
reciprocidade com divindades se misturam e
seus caboclos por um lado, entre os caboclos
A Possessão como evento distinto realça uma
culturalmente organizadas.
sobrepõem durante e atravéz a temporalidade
e os outros caboclos por outro, e ainda entre o
interconexão afetiva entre agentes humanos e
Usei o conceito de ‘afeto’ como uma
da possessão de Janaina. Claudiane não
medium e seus parentes e vizinhos – somente
divinos, assim reorganizando as suas alianças
metodologia para entender este processo
falava com Irací durante meu trabalho de
se torna visível durante a temporada de
entrelaçadas em novas formas. Tal evento
porque ele permite combinar quadros
campo, e ela diminuiu os seus contatos com
possessão. A própria relação afetiva cultivada
consegue remodelar pelo menos 3 formas
taxonômicos com a sismografia visceral e
Carlos para o mínimo requerido pelo
ao longo dos anos entre Janaina e seus
de relações intimas: medium-encantado,
emotiva imbricada nos demais encontros
cotidianos. ‘Afeto’ relata comparativamente e
mudança-cultural e fixação-estrutural como
analiticamente aquelas passagens intensas
um processo unificado.
cujos meus interlocutores normalmente
Isto propõe teoricamente a desvantagem
consideravam como altamente transitáveis e
de pensar analiticamente sobre emoções
palpáveis traços de sociabilidade. Afeto assim
e afetos como sensações privadas e
permite tratar essas formas de transferência
totalmente individualizadas. A possessão
e contingência fora do alcance do empirismo
ainda é considerada um ritual predicado
positivista, para incluir tais zonas sombrias de
no entrelaçamento de quadros de relações
interação social como ‘intuição’, premonição,
íntimas e sua função é mitigar, abrandar ou
ameaça, possessão, sonho e ‘sensação’. Como
defletir as intensidades de interconexões
explicitei acima, isto abre a possibilidade
afetivas que já estão circulando no mundo;
de falar sobre inter-conexão e proliferação,
em vez de as gerar ex-nihilo do éter da
captando no mesmo tempo o sentido de
colectividade social (viz. Durkheim 2001).
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