Quem vigia o vigia

July 28, 2017 | Autor: Karina Mattos | Categoria: Supremo Tribunal Federal, Poder Judiciário
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Jornal de opinião

Presidente Prudente - Ano 1 - número 3 - Outubro 2012

Cultura prudentina

Distribuição gratuita

Humor

Henrique Chagas destaca importância das câmaras setoriais

Circo Teatro Pio Pardo MSN do Inocêncio Renato Machado Casca bico

Meio ambiente Castilho explica porquê degradação ambiental continua

E mais Sérgio Roxo, Marília Libório, Arlette Piai, Raimundo Oliveira, Karina Mattos e muito mais...

EXCLUSIVO

“NÃO SOU BANDIDO” ENTREVISTAMOS O POLÊMICO JOSÉ RAINHA

2 Painel

Jornal de opinião

Outubro 2012

facebook.com/pio.pardo.7

Presidente Prudente - Ano 1 - número 3 - Outubro/2012 Pio Pardo é uma publicação independente. Avenida Washington Luiz, 2486 - Jd. Paulista Presidente Prudente - CEP 19023-450 Telefone: (18) 3223-5315 Direção: Zelmo Denari [email protected] Conselho Editorial: Arlete Piai, Maria Ângela D’Incao, José Roberto Fernandes Castilho. [email protected] Edição: Cristiano Oliveira [email protected] Diretor de Criação: Richard de Almeida [email protected] Os artigos assinados não correspondem necessariamente a opinião do jornal, sendo de inteira responsabilidade de seus autores.

Capa: Richard de Almeida

Editorial O dia seguinte Os candidatos prudentinos amanheceram com gosto de tabuleta na boca, como quem está de porre. Foram três meses de muita gastança, falatório político e “converseiro” sobre quem sairia vitorioso nas urnas. A julgar pelos resultados parciais, elas revelaram aquilo que tudo mundo já desconfiava e que o Ibope acabou por confirmar. A chapa do ex-prefeito Agripino e do seu filho, Paulo Lima, postulantes da prefeitura – cujo registro de candidatura fora indeferido, mas estava sub judice, na expectativa de julgamento definitivo pelo Tribunal Superior Eleitoral – conseguiu prosseguir na campanha até a data das eleições. Tinha tudo para dar errado. E deu, como demonstra a consagradora vitória do atual prefeito, Tupã. Presidente Prudente vai poder contar com o trabalho de um moço que – a exemplo de Agripino em passado recente – tem tudo para turbinar o crescimento vertiginoso da nossa cidade. Quanto aos demais postulantes ao

cargo de prefeito fica assinalada a brilhante performance do novato Fabio Sato, uma promessa de renovação dos quadros políticos prudentinos. A campanha eleitoral dos vereadores foi uma caixinha de surpresas, a julgar pelos primeiros resultados que nos dão conta de substancial renovação da Câmara Municipal, o que é muito saudável, pois a alternância no poder é um dos postulados do ideário democrático. De resto, fica o registro de que três dos vereadores mais votados em Prudente ( Isaque Silva, Natanael Gonzaga e Alba Lucena) se posicionaram contra o aumento do número de vereadores. Por outro lado, a vitoriosa votação do candidato folclórico Zé do Gato é, sob todos os títulos, lastimável e recomenda maior rigor no combate ao voto “qualunquista” (sem compromisso ideológico), bem como, o fortalecimento da luta pelo voto consciente nas próximas eleições municipais. Finalizando este tópico, só nos resta desejar boa gestão ao prefeito

Pio do leitor [email protected]

eleito e profícua atuação legislativa aos novos integrantes da Câmara Municipal de Presidente Prudente. E para despertar os prudentinos desta letargia pós-campanha em que se encontram imersos, nada melhor que a entrevista de Zé Rainha ao nosso tablóide. Temos a certeza de que o depoimento bastante elucidativo desta polêmica figura do nosso cenário ruralista, por sua atuação de vanguarda no campo, encerra um ciclo e irá contribuir, positivamente, para a maturação dos debates acerca do movimento sem-terra em nossa região. Por último, era nossa intenção fazer uma reportagem sobre o preocupante problema da destinação do lixo em nossa cidade. Convidamos o atual Secretário do Meio Ambiente, Fernando Luizari, que, por justificáveis razões de saúde, declinou do convite indicando o atual presidente da Prudenco, Mateus Godoi. Este, no entanto, alegando compromissos assumidos, não atendeu à nossa solicitação, nem respondeu ao nosso telefonema.

Eles disseram “Por que as pessoas escovam os dentes quatro vezes por dia e fazem sexo duas vezes por semana? Por que não o contrário?” Woody Allen, cineasta “A opinião que nosso inimigo tem de nós está mais perto da verdade do que a nossa própria”. Insight de François de La Rochefoucauld (1613-1680), moralista francês “Num país de Silvas e Santos, os Ministros do Supremo Tribunal Federal chamam-se Fux, Weber, Lewandowsky e, agora, Zavascki. É fácil entender porque o Judiciário anda afastado do povo...” José Roberto Castilho, professor “Que jornalismo noticioso é este que se faz em Presidente Prudente que, às vésperas das eleições municipais, não divulgou as pesquisas eleitorais feitas pelo IBOPE no dia 4 de outubro e que confirmavam a vitória de Tupã sobre os demais candidatos?” Zelmo Denari, jurista

Envie sua mensagem por e-mail: [email protected]

Falou bonito Os manuais de pedagogia poderiam, de maneira simples, se resumir a duas finalidades: iniciativa e prática. Tanto educadores nacionais – entre eles, Paulo Freire – quanto estrangeiros – destaque a Edgar Morin – são unânimes: discurso e prática devem andar lado a lado. Educação pressupõe prática. Homens e mulheres inteligentes são os que aplicam leituras e teorias acumuladas.Os primeiros gestos, incentivos e estímulos são dados pelo “Pio-pardo”, periódico que entra na vanguarda por, entre outros motivos, buscar a movimentação da cultura por meio do incentivo à reflexão política, ao pensamento social, ao raciocínio aplicado aos empecilhos cotidianos. Reunindo pitadas de irreverência, de crítica aos problemas da população, de acontecimentos que exigem análise mais detida sem, no entanto, afundar-se em linguagens técnicas, de bom-humor, de rico acervo de imagens e charges, de entrevistas e de valorização de artistas locais, “Pio-pardo” simboliza a iniciativa e a prática. Constata-se a prática pelo trabalho materializado em páginas bem diagramadas, excelente distribuição interna, interessantes abordagens – iconográfica e jornalística. O tablóide não se limitou ao discurso, mas, sem medo, deslocou-se ao foco dos problemas. Iniciativas como esta, ativada por um grupo de intelectuais, que se dispõe arregaçar as mangas e colocar as mãos na massa, nos fazem acreditar na possibilidade de nossa região entrar na liderança cultural do Estado nas próximas décadas. Boas vindas ao Pio-pardo. Vicentônio Regis do Nascimento Silva, escritor

Outubro 2012

Caos Urbano 3

Meio ambiente segue degradado Atuação de órgãos públicos é equivocada em matéria ambiental, faltam medidas concretas e competentes Foto: André Felício

José Roberto Fernandes Castilho [email protected]

Em matéria ambiental, é imperioso reconhecer a notória insuficiência da atuação dos órgãos de proteção em Prudente. Na verdade, talvez o termo “insuficiência” seja leve demais porque se trata mesmo de deficiência: trata-se de atuação que, pela falta de medidas concretas competentes, deixa muito a desejar. Tais órgãos têm denominações diversas: são secretarias, conselhos, departamentos, Ministério Público, etc, integrados por agentes regiamente pagos, assistentes técnicos à larga, muitos oficiais disponíveis, mas cabe perguntar: qual o efeito duradouro de sua atividade? Qual a eficácia dela? Qual a agilidade dessa estrutura de controle, que se mostra paquidérmica? Como a doutrina costuma apresentar três aspectos do ambiente, vou apontar, em cada um deles, exemplos da grande deficiência de atuação desses órgãos. Em primeiro lugar, o ambiente é o ambiente natural resultado da interação do solo, água, ar, fauna e flora. Neste aspecto, o problema do lixão de Prudente parece insolúvel. Em pleno século XXI - e apesar da lei que o proíbe -, Prudente tem um lixão a céu aberto que é uma vergonha ou, se se quiser, uma tragédia que deveria enrubescer nossas autoridades. Não há meios de a Prefeitura aprovar o aterro sanitário. Houve um projeto em 2007 que foi rejeitado pela Cetesb e outro, do ano passado, que foi questionado pela autoridade aeronáutica. Assim, continuamos no pior dos mundos, com os catadores, em condições subumanas, invadindo o alambrado para continuar exercendo sua atividade. De outra parte, o solo no local não foi impermeabilizado e, assim, o chorume tóxico continua penetrando nele. A situação, portanto, é a pior possível. Quanto à reciclagem do lixo, ela não chega a atingir 5%.



Em segundo o “silêncio sorlugar, o ambiente é ridente” tradiartificial, ou seja, o cional, enquanto meio urbano. Aqui as condições da a situação não é vida urbana se diferente. Em PruSÓ NO VAREJO degradam. dente consente-se Em terNão se pode com a construção ceiro lugar, o de qualquer projeimaginar que a ambiente é culto, esteja em acortural, composto proteção do ou não com a pelo patrimôlei de uso e ocunio histórico e ambiental se pação do solo. É artístico. Bem, materialize na quanto a este asque, concomitante a essa lei, há uma pecto, a destruidefesa do lei de 2001 que ção é permanen‘matinho’; autoriza a regularite. O caso mais zação de qualquer emblemático é Isto é infantil, obra mediante o o do Hotel Mupagamento de penicipal – que foi embora quena multa. Portambém hospirenda alguma tanto, a inserção tal -, edificação dos edifícios na bastante caracmídia” cidade pode ser – e terística que foi normalmente é – parcialmente desarmônica, aberrante, atendendo demolida e cujos escombros permaapenas os interesses dos proprietánecem lá na esquina da Gurgel com rios. O caos do trânsito constitui o a Joaquim Nabuco. Como já disse resultado muito claro disso. O Miuma vez, aquilo é uma chaga aberta nistério Público deveria postular a no centro da cidade, demonstrando clara inconstitucionalidade dessa lei a total deficiência de atuação dos órque tornou regra a exceção – mas gãos de proteção ambiental. O caso não o faz. Fica silente, sempre com do hotel é um paradigma no sentido

bíblico: “pelos seus frutos os conhecereis” (Mateus, 7). A atuação dos órgãos ambientais pode ser medida pela destruição do Hotel Municipal. Ou então, dentre outros múltiplos exemplos, pela retirada, em 2010, de todos os ornamentos do prédio do antigo Armazém Sírio Casa Porta de Ferro, construção que data de 1921. Portanto, penso ser necessária uma completa reformulação na estratégia de ação dos órgãos de proteção ambiental em Prudente. Sua atuação é equivocada e não está atingindo os resultados desejados. Não está produzindo efeitos consistentes para a comunidade. Não se pode imaginar que a proteção ambiental se materialize na defesa do “matinho” ou da “plantinha”, aqui e ali, num varejo fácil e barato. Isto é infantil, embora renda alguma mídia. A atuação daqueles órgãos precisa se dar no “atacado”, combatendo os grandes problemas. Mas para isso é necessário enfrentar demandas, entrar com ações coletivas, partir para a luta contra “lobbies” poderosos que atuam na cidade - como aquele que mantém a indústria dos condomínios fechados que privatizam a cidade.

4 Opinião

Outubro 2012

Uma emenda mais que aguardada Proposta é de que o acusado que for condenado por órgão de segunda instância só poderá recorrer se for recolhido à prisão

Zelmo Denari

[email protected]

O ministro Marco Aurélio Mello, da Suprema Corte, julgando um recente habeas-corpus, concedeu uma decisão liminar favorável à soltura de Reginaldo Pereira Galvão, conhecido como Taradão, que foi condenado, em maio de 2010, a 30 anos de prisão, acusado de ser um dos mandantes do assassinato da missionária norte-americana, Dorothy Stang, morta em fevereiro de 2005, na região de Anapu, a 766 km de Belém do Pará, epicentro de uma disputa de sem terras com fazendeiros. Dos cinco condenados pela morte da missionária, Galvão foi o segundo a ser colocado em liberdade. Anteriormente, o Poder Judiciário já libertara Clodoaldo Batista, acusado de co-autoria no crime e foragido desde fevereiro do ano passado. Estão presos ainda outro mandante (Vitalmino Bastos de Moura), um intermediário (Amair Feijoli da Cunha) e o autor do crime, Rayfran das Neves Sales. Este crime, ocorrido no ano de 2005 e julgado em 2010, teve um desfecho rápido para os padrões da justiça brasileira e isto se deve à sua repercussão internacional, pois a vítima era cidadã norte-americana. O que salta aos olhos é que, por estarem envolvidos no crime, fazendeiros abastados, um já fugiu da prisão e outro acaba de ter sido agraciado com a comentada decisão liminar. Pelo trote do jumento, dentro em breve outras



CASO DOROTHY Que seriedade possui um país cujo Judiciário subverteu o princípio da liberdade para livrar assassinos

“liminares” serão concedidas pelos “luminares” do Direito, permitindo, assim, que os fazendeiros sejam colocados em liberdade. São essas as decisões que enfeiam o Brasil lá fora. Que seriedade possui um país cujo Poder Judiciário

subverteu o princípio da “liberdade, ainda que tardia” (libertas, quanvis sera), para além das conquistas políticas do seu povo, ou seja, para livrar da prisão assassinos do seu povo? Por essa e por outras – à luz de um parecer de Ada Pelegrini Grinover – o ministro da Suprema Corte, Cesar Peluso, vem de elaborar um projeto de emenda constitucional, assegurando a execução imediata dos processos julgados em segunda instância por órgão colegiado, em nome da celeridade processual. Trocando em miúdos, a idéia prevalente, na área penal, é a seguinte: o acusado que for condenado por um órgão colegiado de segunda instância, somente poderá recorrer às instâncias superiores se for recolhido à prisão. Trata-se de uma emenda constitucional de elevado alcance, tendo presente que, neste país, o acesso às instâncias supe-

riores do Poder Judiciário não está no cardápio dos pobres. O crime que envolveu o jornalista Pimenta Neves, um dos maiores casos de impunidade e morosidade judicial da Justiça brasileira, é o exemplo mais flagrante dessa afirmativa. No ano de 2000 Pimenta Neves matou, por ciúmes, sua colega de trabalho, Sandra Gomide – 20 anos mais nova – e foi condenado pelo júri-popular no ano de 2006. No entanto, por força de recursos ofertados nas instâncias superiores, somente foi recolhido à prisão no dia 26 de maio de 2011, ou seja, 10 anos depois da prática do crime. Isto tem uma explicação filosófica. Segundo alguns analistas do Direito, as pessoas ricas são cercadas por uma áurea de proteção, denominada metanorma, decorrente do prestígio social que desfrutam na sociedade e que é levada em consideração no momento da aplicação da pena. Nossos magistrados, notadamente das instâncias mais altas, sentem uma compulsão e invocam toda sorte de princípios – v.g. contraditório, ampla defesa, presunção da inocência e quejandos – para colocar em liberdade os criminosos mais abastados. Por todo exposto, o projeto de emenda constitucional da lavra do ex -presidente Cesar Peluso, supra referido, que se encontra nas mãos do relator, deputado Aloísio Nunes Ferreira, no Congresso Nacional, precisa ser prestigiado, pois concorre para restaurar o prestígio do Poder Judiciário.

O majestoso Caiuazinho Raymundo Farias de Oliveira [email protected]

Quando cheguei a Montevidéu, contemplei, extasiado, a imensa orla banhada pela imensidão das águas do estuário do Prata, e mergulhei, inexplicavelmente, na crista das ondas mansas do tempo. Viajei à Caiuá e Presidente Prudente na busca nostálgica das aulas de geografia e dos mapas que enfeitavam as paredes escolares daquela época longínqua e desafiavam meu “conhecimento” infanto-juvenil, quase em estado de inocência. Professores e professoras mostrando-nos, pacientemente, com uma régua ou uma varinha parecida com uma batuta, os rios, suas nascentes, afluentes, a foz, saltos e cachoeiras, os municípios, estados e países percorridos, os riozinhos e riachos, o rio do Peixe, o Santo Anastácio e... o Caiuazinho, todos afluentes do Paranazão que nos fazia tirar o chapéu, lá em Presidente Epitácio, com tanta água e tantas ilhas. Ora, o Caiuazinho foi o rio onde aprendi a nadar o pouco que sei. Foi minha inesquecível acade-

mia aquática frequentada, também, por cobras verdes! E aprendi na marra, no sufoco, no susto “ os amigos mais velhos nos dando caldo dentro d´água, era aquela tortura, sobretudo nos tempos de enchentes. Engasgos, vômitos, tosses, espasmos, impiedoso terrorismo aquático sob o olhar silencioso dos aguapés verdejantes. Até hoje, guardo, no corpo, “tatuagens” de arame farpado que ficaram de minhas desesperadas fugas, perseguido pelos “amigos” maiores que só queriam que eu perdesse o medo de mergulhar nas águas cristalinas do Caiuazinho. E agora, tanto tempo depois, tantos carnavais, tantos natais, tantos réveillons e eis-me aqui, meio cansado de guerra, em Montevidéu, capital do Uruguai, nosso terrível adversário futebolístico (quem não se recorda do Maracanã de 1950? ). Eis-me aqui, como dizia, caminhando por suas largas avenidas com seus

prédios baixos, o Uruguai onde se refugiou João Goulart e, logo depois, o velho e impetuoso Leonel Brisola, naquele trágico 1964... Aqui, de um ponto mais alto, admiro a arquitetura da cativante capital com suas linhas coloniais, seus monumentos dedicados a seus heróis e à sua história, mas me impressiona mesmo a imensidão azul,

às vezes verde, no tom claro ou escuro, dependendo das nuvens e do sol, das águas dançantes do estuário do Prata, para onde convergem as águas do rio Uruguai, do rio Paraná que recebe águas dos rios Paraguai e Tietê. Dentre elas, por que não dizer, aquelas do meu querido Caiuazinho, onde aprendi a nadar. Eta, mundão pequeno!

Opinião 5

Outubro 2012

Fé e fidelidade Cardeal Carlo Maria Martini, um dos mais notáveis pensadores dos nossos tempos, se notabilizou por dialogar publicamente com católicos e não católicos

Sérgio Roxo da Fonseca [email protected]

Faleceu recentemente com 85 anos o cardeal Carlo Maria Martini, com certeza, um dos mais notáveis pensadores dos nossos tempos. Foi arcebispo de Milão até 2002 quando então se aposentou. Notabilizou-se por dialogar publicamente com católicos e não católicos. Nas eleições dos Papas João Paulo II e Bento XVI, os especialistas apontavam como o futuro pontífice. Era jesuíta. Antes de ser atingido por uma doença incurável, dedicou o seu tempo à educação. Não se afastava das questões polêmicas, tanto q u e che-

gou a se manifestar publicamente contra abusos sexuais cometidos por sacerdotes, numa época em que o silêncio correspondia ao exercício da prudência, ainda que hipócrita. A imprensa publicava constantemente seus artigos sobre os temas mais perturbadores dos nossos dias. Era comprometido com a verdade. Publicou um dos livros mais surpreendentes do século XX, juntamente com o Professor Umberto Eco: “No que creem os que não creem”. O livro transmitia as visões daqueles dotados de fé em diálogo com os que não creem. No que creem os que não creem? Em nada? Ou têm eles uma fé? Qual f é ? N o ho-

Carlo Maria Martini morreu no dia 31 de agosto deste ano

mem? Na humanidade? Nas guerras? Aqueles que não creem em Deus devem acreditar em alguma outra coisa. Mesmo que seja na assombração. Ou seja, os infiéis têm alguma fé. A aparente contradição foi timbrada com as insuperáveis inteligências do cardeal Carlo Martini e do professor Umberto Eco. O livro é de leitura obrigatória por

Ilustração: Roberto Bertoncine

várias r a zões. É possível registrar algumas. A primeira delas refere-se à espantosa possibilidade de um príncipe da Igreja dialogar publicamente com um intelectual desprovido de fé. O diálogo era semanalmente publicado pela imprensa italiana. Os que creem podem ensinar algo aos que não creem? E o contrário: os que não creem podem revelar alguma verdade aos que creem. Aqueles pensadores demonstraram que há um domínio comum ligando todos os homens, fieis e infiéis, o que enseja a possibilidade de ser trilhado, lado a lado,

o caminho da paz. Tenho comigo bem guardado a edição da revista L´Espresso. A capa exibe a imagem do cardeal Carlo de Martini. Nela foi publicada a entrevista, melhor dizendo, o diálogo travado entre o cardeal Carlo e o professor Ignácio Marino, cientista e bioeticista. Seria impossível aqui transcrever a reportagem, mas eis os temas principais: fecundação assistida, aborto, célula tronco, AIDS, doações de órgãos e eutanásia. Tem sentido o registro. Há dez anos um príncipe da Igreja sente-se à vontade para debater publicamente com um cientista as ainda atuais questões da humanidade. A sua coragem e a coragem dos seus interlocutores espantam os observadores até hoje. No dia 31 de agosto deste ano, a humanidade perdeu um filho de difícil substituição, Carlo Maria, arcebispo de Milão.

6 Opinião

Outubro 2012

Valorização da cultura prudentina Participação popular é fundamental para definir o que é cultura, seja produção simbólica, cidadania ou produto econômico

Henrique Chagas

cultural. E o Conselho Municipal de Cultura é a expressão máxima desta Vários segmentos culturais de política cultural, onde o aprofundaPresidente Prudente, liderados pelo mento da participação popular e a Conselho Municipal de Cultura, se institucionalização da cultura como mobilizam para formular o Plano direito do cidadão devem ser práticas Municipal de Cultura, objetivando fundamentais. Motivos pelos quais, a priori atender exigência do Sistema será necessário que o Comuc agregue Nacional de Cultura – SNS. Em artià sua natureza também o caráter norculação com a Secult – Secretaria de mativo, fiscalizador e deliberativo. É Cultura Municipal, os debates aconno Conselho que se constroem coletecem através de câmativamente as poras setoriais – reunidos líticas públicas em eixos temáticos-, para a cultura, com a participação das pois nele estão diferentes linguagens representados o culturais, como cinema poder público e CLASSE e artes visuais, artes a sociedade ciARTÍSTICA plásticas, dança, acesvil. sos culturais e patrimôEm parValorização nio, literatura, cultura ceria com a Sepopular, cultura afro cult, o Comuc, da cultura -brasileira, música e tetem o exato atro, para a formulação da política cultural do tamanho da Município. participação Estas ações tiveram início no mês de popular nas agosto e continuam aos câmaras sábados no Centro Cultural Matarazzo com a setoriais finalidade de construir uma política cultural. Com diretrizes, propostas e estratégias articuladas, a inna Conferência tenção é que o Plano esteja concluído Municipal de até novembro e apresentado na ConCultura, criará ferencia Municipal de Cultura. a definição do Verdade que o Comuc, desplano de cultura de a sua instalação, se mobiliza para para os próximos a consecução do Plano Municipal de dez anos, preceCultura, contudo encontrou enormes dido – como já dificuldades para deslanchar o seu dito, pelos semiintento, talvez decorrentes de sua nários das câmaprópria natureza jurídica meramente ras setoriais. O consultiva. Agora com a adesão do Plano Municipal Município ao SNC – Sistema Naciodefinirá os connal de Cultura, o plano deixa de ser ceitos de política intenção e passa ser necessidade. cultural, apreA adesão ao SNC trouxe alsentará o diaggumas obrigações, sendo a principal nóstico da realidelas a formulação de uma política dade municipal e [email protected]



apontará os desafios a ser enfrentados em cada eixo temático cultural. O plano estruturará a intervenção do poder público através de programas estratégicos a curto, médio e longo prazo. Assim, a participação popular é fundamental, especialmente para definir o que é cultura, seja enquanto produção simbólica, direito de cidadania ou produto econômico. Quem dirá o que é produção cultural são os cidadãos, através da valorização da diversidade das expressões artísticas e dos valores culturais locais. Quem definirá o alcance do direito de cidadania a ser privilegiado, seja pelo livre acesso ou pelas ações de inclusão através da cultura, é a sociedade. A sociedade civil, consumidora de cultura, é quem fortalece as cadeias produtivas culturais e quem reconhece a cultura como

fenômeno plural, gerando emprego e renda. Essa participação é a métrica da importância da cultura para o Município. E a sociedade civil está representada no Comuc pelos conselheiros, que devem ser sistematicamente cobrados por sua efetiva participação. Enfim, o reconhecimento e a valorização da cultura, enquanto direito de cidadania, produção simbólica e econômica em Presidente Prudente tem o exato tamanho da participação popular e dos grupos produtores e consumidores de cultura nas câmaras setoriais, na Conferência Municipal e nas suas representações no Conselho Municipal. Richard de Almeida, conferindo as últimas do pio, enquanto passeia pelo Museu do Louvre em Paris. Vitória de Samotrácia, ao fundo.

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Outubro 2012

Opinião 7

Nossa cidadania: uma frágil criança Nestes tempos de eleições municipais, constatamos quanto há para se aprender em termos de democracia Marília Libório

[email protected]

Ailton do Porto, Ana do Mel, Ilson do IML, Dicão e assim por diante... O que esperavam estes candidatos? Será que conseguiriam obter a confiança de mais eleitores com seus apelidos? Ou pretendiam re -editar o sucesso do Tiririca? Será que alcançariam mais de 100 votos? Ou se candidataram apenas para obter licença eleitoral? Como se apresentaram na mídia e quais propostas pretendiam cumprir? Quase todos garantiam mais educação,

Motivada pelo que pude observar nos diversos cenários urbanos por onde passei nestes últimos meses, poluídos pelo excesso de estímulos visuais e auditivos, duas questões comparecem, de imediato, às nossas considerações: quem eram os candidatos que buscavam o poder político e as estranhas, para dizer o mínimo, coligações partidárias. No primeiro caso, os candidatos usaram, à exaustão, os meios que acreditaram mais eficazes para a fixação de seus nomes ou apelidos. Eram panfletos, banners, “santinhos“, outdoors, bicicletas perambulando pelas ruas com cartazes, desempregados portando bandeiras que perturbavam o trânsito e a visibilidade nos cruzamentos, veículos com auto-falantes apreCONSCIÊNCIA sentando as qualidades de Nossa cidadania determinado postulante em só se fortalecerá, decibéis acima quando os dos permitidos pelas normas eleitores legais e pelo mais perceberem as bom senso. saúde, mais Quem segurança, demanobras por eram estas pesfesa do meio amdetrás soas? A título biente, mais transde ilustração porte público, dedo sorriso e reforçando senvolvimento... a coleção que interesseiro etc... etc... Sempre se amplia a o mesmo cinismo, de candidato cada ano que a mesma ignorânpassa, inúmeamigo cia das eleições ros candidatos anteriores e o optaram pelos mesmo desconheapelidos com os quais se identificacimento das competências e atribuivam. Nestas andanças, pude relacioções do Município. Quanta falta tem nar alguns exemplos: Robson Kero feito o CEPAM (Centro de Estudos e Kero, Alemão, Gislaine do Gabinete, Pesquisas de Administração Municianu_29x9,5cm.ai 1 10/10/12 15:09 Neguinha (que é do sexo masculino), pal) ligado ao Governo do Estado de



São Paulo, que tinha como objetivo preparar os nossos políticos eleitos para o exercício de funções tanto no executivo

quanto no legislativo, e que atualmente está esvaziado de seus recursos iniciais. A segunda questão, também provocada pela observação da publicidade eleitoral no período que antecedeu o 7 de outubro, trata das coligações espúrias entre partidos a título de arregimentar, de forma questionável, os parcos minutos da propaganda eleitoral. Na maior parte dos casos, são coligações que envenenam as plataformas partidárias, tornando

falsas quaisquer propostas que sejam veiculadas em palanques políticos. Isso sem se falar na imoralidade da composição para uma pretensa governabilidade. Por falar em plataformas partidárias, devemos lembrar que para ocupar os cargos que dependem de eleição dos mais de cinco mil municípios brasileiros concorreram cerca de 420 mil candidatos, vinculados a um dos trinta partidos (por que tantos partidos? Quais seus programas?) registrados no TSE (Tribunal Superior Eleitoral), sendo que é exigida a participação de pelo menos 30% de mulheres nas campanhas eleitorais de cada partido. Dispositivos legais para concretizar a democracia existem, como, por exemplo, eleições livres, pluralidade partidária, publicidade político -partidária, controle do processo eleitoral, com respectiva supervisão dos partidos interessados. Faltam, no entanto, as condições plenas para que a nossa democracia seja transparentemente praticada. Dentre estas condições, ocupa o primeiro lugar a efetividade da educação, sem a qual continuaremos a compor os numerosos currais eleitorais que vêm alimentando o saldo bancário da grande maioria dos nossos representantes. A nossa cidadania só se fortalecerá, atingindo uma maturidade crítica e também participativa, quando todos os eleitores perceberem, com clareza e objetividade, as manobras que são elaboradas por detrás do sorriso interesseiro ou de cada vantagem que será auferida com a escolha de um candidato amigo.

8 Entrevista

Outubro 2012

SEM PAPAS NA LÍNG Ficar atrás de grades não é uma novidade para José Rainha Júnior. Mas sob a acusação de desvio de recursos do governo federal, o líder sem-terra ficou o maior período encarcerado, inclusive com chefes de facções criminosas como o PCC. Após sair da cadeia, Rainha retoma a vida e as ações no Pontal do Paranapanema. Aos 52 anos e com uma história repleta de polêmicas, ele aceitou falar sobre os mais diversos assuntos, inclusive os mais ardilosos, com este periódico.

PIO-PARDO - José Rainha, primeiro eu gostaria que você contasse um pouco de sua trajetória até chegar ao Pontal do Paranapanema. JOSÉ RAINHA - Minha militância data dos anos 70. Comecei bem jovem, na década de setenta. Em 75 foi fundada a Comissão Pastoral da Terra do Brasil, para saldar a dívida da Igreja com os camponeses do Brasil. A repressão era muito grande. Tive a felicidade de conhecer o Frei Beto em Vitória, quando saiu da cadeia de Presidente Venceslau e foi morar em Santa Maria. Ali, nos anos 76/77, foram fundadas as Comunidades Eclesiais de Base. Foi quando nos encontramos e comecei a participar das CEBs. PIO-PARDO – Explica melhor esta passagem... JOSÉ RAINHA - Eu estava com 15 para 16 anos, quando aprendi a ler e escrever. Meu pai era um trabalhador rural. Tinha uma dívida

rural de empréstimo com o Banco do Brasil. Acabou perdendo o sítio, como costumava acontecer. Passei a trabalhar para outros proprietários agrícolas no Espírito Santo. Aí conheci o Frei Beto, que abriu meus olhos para as questões sociais e principalmente para o tema da reforma agrária. Meu pai não gostou... Era muito reacionário. Defendia a Arena e os governos militares...

por isso que saí de casa, com 17 anos ou 18 anos. Ele costumava dizer que eu tinha idéias comunistas. Nunca neguei. Em 1979, já participava do movimento pela anistia dos presos políticos, ao lado de Lula. As comunidades eclesiais criaram um movimento designado Anampe - Articulação Nacional dos Movimentos Populares. ParticiINVASÕES pando desse moviO Estado só mento tive a oportuage mediante nidade de conhecer todos os líderes popressão; líticos de esquerda daquela época.



na história da humanidade nunca houve mudança a não ser através da luta

PIO-PARDO – Então, enquanto garoto, você discordava do seu pai? JOSÉ RAINHA – Sim e foi

PIO-PARDO - O Lula era deputado?

JOSÉ RAINHA - Lula era presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo. Na ocasião conheci Lula, o velho Leonel Brizola e Miguel Arraes. Em 79 ou 80 foi fundado o PT. Nesse período, com a fundação do PT, participei da oposição sindical em Linhares. Fui secretário e depois presidente do Sindicato

dos Trabalhadores Rurais. Logo em seguida fundamos o PT. Em 81, fazíamos o primeiro Congresso designado Primeiro CONCLATE - Conferencia Nacional da Classe Trabalhadora em Praia Grande. Os companheiros comunistas não queriam criar uma Central Única dos Trabalhadores e sim uma Central Geral dos Trabalhadores. Houve um grande racha e o Jairzão aproveitou para criar a CGT - Central Geral dos Trabalhadores. PIO-PARDO – Que estava ligada a Dilma?

JOSÉ RAINHA – Não, nesse período a Dilma tinha uma atuação bastante discreta, como técnica. Depois que foi presa foi funcionária do Rio Grande do Sul, no setor hidrelétrico, pois era uma grande profissional. Militou no PDT, no MDB, depois participou da militância. Ela não tinha ligação com o PT. PIO-PARDO - Onde e quando foi fundado o MST? JOSÉ RAINHA - Em julho de 1984, na cidade de Cascavel no Paraná. Mas só foi oficializado em janeiro de 85, no Teatro Guaíba em Curitiba. Foi um grande acontecimento. Participei da fundação do movimento em Curitiba e depois no Nordeste, Espírito Santo, Sul da Bahia, Sergipe, Alagoas, fechando minha caminhada no Estado do Maranhão. PIO-PARDO - E a sua vinda aqui para o Pontal? José Rainha – Deu-se no início dos anos 90. Estava participando do movimento no Maranhão e sofri um atentado, decorrente de repressão fortíssima, no sul do Pará. Voltei a São Paulo para ficar uns dias, e o pessoal recomendou-me atuar no Pontal do Paranapanema. No ano de 1991, no dia 23 de março aconteceu uma grande ocupação na fazenda São Bento, uma grande ocupação em Mirante. Fui convidado a conhecer o movimento dos trabalhadores rurais e resolvi ficar. PIO-PARDO – O fato de ter encontrado no Pontal um questionamento sobre o caráter público das terras devolutas contribuiu para a tua decisão? JOSÉ RAINHA – Foi fundamental. Quem poderia imaginar que São Paulo estava litigando sobre a natureza pública das terras do Pontal? Comparando com as disputas no Estado do Maranhão, que versavam sobre terras de 100 a 300 hectares, aqui, no Estado mais desenvolvido da nação, falava-se em um milhão de hectares de terras! Na cidade de Mirante do Paranapanema descobrimos um julgado de 1958 declarando devolutas, ou seja, públicas, as terras ali existentes e a decisão já não comportava

Entrevista 9

Outubro 2012

GUA

Após nove meses de prisão, José Rainha Júnior conta detalhes de como foi o período de encarceramento, sua relação com Lula, com o MST, sobre as acusações que responde e da retomada das ações no Pontal

mais recursos. Foi quando o governador Mario Covas, sabendo que as referidas terras estavam ocupadas por diversos fazendeiros, permitiu que fossem feitos acordos para terminar a disputa possessória. Foi então que, através de convênios com o INCRA foram desapropriadas amigavelmente diversas glebas de terra no Pontal do Paranapanema. Os fazendeiros receberam do Estado o valor atualizado das glebas devolutas por que as terras, apesar de públicas, foram benfeitorizadas pelos respectivos ocupantes, ou seja, pelos fazendeiros e isto explica a indenização paga pelo Estado. PIO-PARDO – Explique melhor esse mecanismo de distribuição de terras devolutas. JOSÉ RAINHA – O Estado só age mediante pressão. Padecemos 25 anos de ditadura nesse país. A ditadura só cedeu com a mobilização popular. Aliás, na história da humanidade nunca houve mudança a não ser através da luta. A independência da América Latina foi conquistada através de lutas. Veja, por exemplo, nossa luta contra a escravatura. Estamos falando de 1889. Os intelectuais, tipo Carlos Gomes, Chiquinha Gonzaga, Joaquim Nabuco, Rui Barbosa, precisaram sair às ruas para que acontecesse a abolição da escravatura. Hoje se você ocupa um pedaço de chão para transformar a terra produtiva; se você luta pela reforma agrária, te chamam de doido, irresponsável. Ouvi o discurso da Kátia Abreu recentemente, ouvi o discurso do deputado Álvaro Dias. Afirmavam, sem ficar envergonhados, que não adianta dar terra para os que não sabem trabalhar. Nós estamos falando em reforma agrária, em democratização do país, nós estamos falando em crescimento para a geração de empregos, nós estamos falando em fazer justiça para negros e pobres. Essa é a questão quando falamos de terras improdutivas. Em nenhum momento vocês vão nos ver defendendo a invasão de terras produtivas. Nós estamos falando de grandes

latifúndios improdutivos. E para voltar no mesmo problema, nós estamos falando em terras públicas. A questão da terra no Brasil é uma questão de 500 anos. É preciso sacudir a estrutura latifundiária do Brasil. PIO-PARDO – Existem terras devolutas produtivas e terras devolutas improdutivas?

mércio da massa. Pois bem, a maior produção de macaúba nativa pode ser encontrada aqui no Pontal. Nas beiras dos rios do Pontal floresce muita macaúba nativa, essa mesma que estão plantando em Minas. O que é o pinhão manso? É outra cultura tão vantajosa, barata e produtiva. Mas aí vem os “estudiosos” dizer que o projeto não pode ser implantado porque “não tem história”. Que merda de “história” é esta? Estão é querendo criar empecilhos para não se desenvolver a cultura do pinhão manso aqui.

ram para cá e para poucas gotas de biodiesel, ou melhor, para zero gota? JOSÉ RAINHA – Não foi desenvolvido o projeto. O projeto que foi discutido está na Petrobrás, então os caras nos prenderam acusando disso, de um projeto que não existiu, quer dizer, existiu o projeto, mas não teve recurso.

JOSÉ RAINHA – No Pontal têm as duas coisas. Tem terra devoluta produtiva, que são as que produzem grãos, cana, e as terras improdutivas que produzem nada. Os fazendeiros PIO-PARDO - Você em que costumam dizer que todas as fazenpé ficou o tal projeto de biodiesel das são produtivas. Dá licença, exisdo Pontal? tem fazendas nesse Pontal que, para achar boi, tem J O S É que andar de biRAINHA – nóculos... A verPlantamos madade é que essa mona e participaatividade deixou mos de um projede ser produtiva to de instalação NA PRISÃO no Pontal, não é do biodiesel que mais lucrativa. parado na Me jogaram na está Tanto que as árePetrobrás. Esta as de pastagem cova dos leões e iniciativa resulestão virando tou na minha prieu me dei bem; um imenso canasão, sob a alegavial. ção que fizemos Ali não havia um projeto com magnatas P I O o objetivo de pe-PARDO – Você gar dinheiro do da corrupção participou do governo federal projeto do pie muito menos e invadir terras. nhão manso, inlatifundiários centivado pelo P I O ex-presidente -PARDO - Isto Lula. Que aconmotivou o coteceu com o pinhão manso e com o municado do MST dizendo que programa de bio-combustível no você não pertencia mais ao moviPontal? mento?

PIO-PARDO – Mas e os recursos que vieram para cá para a associação da qual o senhor coordenava?

José Rainha – Participei. Era a saída naquele momento. A grande questão foi a resistência contra o programa do biodiesel. Trata-se de uma energia renovável, que deveria ser produzida pelo pequeno agricultor. Recentemente assisti pela televisão uma matéria que falava da produção da macaúba na região de Minas. Lá estão produzindo macaúba para fazer o biodiesel, o coco, e ainda o co-

JOSÉ RAINHA - Que nunca teve, nunca se comprovou, fui absolvido total, mais onde está a tese defendida?



JOSÉ RAINHA – Não. Fui acusado de estar introduzindo a cultura do agronegócio, participando da cooperativa. Agora eu pergunto, quem é que está plantando macaúba nos assentamentos? É esse grupo que era contrário ao meu projeto. Prá você ver eu estava correto. Minha tese estava correta. PIO-PARDO – Mas você não acha que são muitos milhões que vie-

JOSÉ RAINHA – Não, são outros recursos. Uma parte de recursos foi para plantar mamona e foi plantado. Outros vieram normalmente pelo Pronaf. Não existiu isso. PIO-PARDO – Mas a deputada Kátia Abreu faz ataques muito incisivos aos sem-terra quanto à aplicação correta desses recursos que vieram do governo federal. JOSÉ RAINHA – Todos os recursos foram aplicados corretamente. O diabo é que tratando-se do Zé Rainha fazem alusão à aplicação incorreta dos recursos. Querem bater no Zé Rainha... PIO-PARDO - Quem quer? JOSÉ RAINHA – Trata-se de uma ofensiva da oligarquia rural. Qual foi a razão das minhas prisões no Pontal? É formação de bando e quadrilha, não é isso? Quais foram as outras acusações? PIO-PARDO arma?



Porte

de

PIO-PARDO - Você pode contestar a afirmação da deputada Kátia Abreu, quando afirma que os sem-terra nada produzem? JOSÉ RAINHA – Esta afirmação não é verdadeira. Os semFotos: Richard de Almeida

LULA “Quando estive preso, ele fez por mim algo que nem meu pai faria, mandou dois ex-ministros me visitarem.”

BANDIDO? “Todas às vezes que ousam me prender como bandido, a bandidagem tem por mim o maior reconhecimento”

FRATERNIDADE “Não existe um lugar mais fraterno para se viver do que na cadeia; nunca recebi tanta solidariedade na minha vida”

10 Entrevista -terra produzem, o problema é que essa produção não é divulgada. Vá ao Instituto de Terra e levante qual é a produção de leite dos assentados. Na região, a maior produção de leite é originária dos pequenos agricultores, dos assentamentos. Da mesma forma, a produção de hortaliças vem dos assentamentos. Sem falar da produção de mandioca e milho, Desafio qualquer um a levantar os dados do Instituto de Terras. O problema é que não divulgam isso. PIO-PARDO – Você se arrepende de alguma ação aqui no Pontal? JOSÉ RAINHA – Não. Não me arrependo de todas as ações feitas no Pontal, mas tenho o reconhecimento de ter errado. A gente cometeu muitos erros que poderiam ser evitados. Mas fico feliz porque o movimento mais conflituoso do Brasil ainda é o Pontal e nós nunca perdemos uma vítima, nunca perdemos uma pessoa. Nunca tivemos movimentos violentos, de ferir pessoas, como aconteceu recentemente em Pernambuco, Pará, Rondônia, muita gente perdeu a vida. Aqui nunca perdemos vidas. Em 2000, sofri um atentado, uma emboscada. Você acha no que deu esse processo? PIO-PARDO - Eu que te pergunto... JOSÉ RAINHA - Falta de provas. Até hoje ninguém falou mais nada. Eu continuei ralando depois em várias prisões. PIO-PARDO - Você culpa a oligarquia rural e tudo mais. Mas a gente percebe de uns tempos para cá que o próprio MST discrimina José Rainha Júnior, inclusive não te aceitando como membro do movimento, mesmo você sendo um dos fundadores. Como é que está essa relação? JOSÉ RAINHA - Os movimentos sociais têm divergências. Isso é natural. Imagina a dimensão desse movimento no Brasil. Eu tenho muitas divergências, mas nunca sai do MST. PIO-PARDO - Mais eles são bem taxativos em dizer José Rainha Júnior não pertence ao MST. JOSÉ RAINHA - Veja bem, ninguém pode se autodeclarar líder. Eu não posso dizer que sou líder. Sou um homem que luta pelo povo. Ninguém pode desconhecer o meu trabalho aqui no Brasil. Já fui premiado no exterior. Há discussões internas, divergências de política interna. Tenho o maior respeito por toda liderança do MST aqui no Pontal e tenho a felicidade de conhecer todos os líderes a nível estadual e nacional. PIO-PARDO - A Deolinda

Outubro 2012 tentou algumas eleições e não deu certo. O que aconteceu? Por que ela foi candidata?

tratamento de preso, mas com muita dignidade, sem regalia nenhuma. Convivi com pobres, miseráveis. Até fiz uma paródia de que era como Daniel: me jogaram na cova dos leões, eu me dei bem com os leões, sabe porque? Ali não havia magnatas da

J O S É RAINHA – Deolinda sofreu muito na prisão. Desma-

causa, então não vai a lugar nenhum. Mas não existe um lugar mais fraterno para se viver do que na cadeia. Nunca recebi tanta solidariedade na minha vida e aprendi muito lá. Em Piracicaba, numa prisão que fui para depor, cheguei de noitinha sem trazer nada comigo. Meu companheiro de cela deu-me a toalha para tomar banho, a metade de um sabonete e uma pasta de dente enrolada num papel higiênico. A comida que havia sobrado, embora fria, foi dividida comigo. Uma lição de vida para mim. A gente é muito egoísta aqui fora, não consegue ver o outro lado. Mas reconheço que as facções criminosas não têm causa. Causas são as lutas, a reforma agrária, empregos justos para todo mundo, salário digno e justo. PIO-PARDO - Como está a relação de José Rainha com os veículos de comunicação hoje?

mou dois filhos na cadeia, em corrupção 1995 e em 2003. Ali ficou convencida e muito menos latifundiários... Eu de que deveria partiencontrei a “pocipar da luta partidábraiada”, os miria. Filiou-se ao PT e seráveis, o lixo depois ao o PCdoB. da sociedade ta lá Fez isto mais para dentro. fortalecer o partido e LATIFUNDIO articular as bases. Eu PIO-PARa apoiei, pois achei DO – Foi realExistem fundamental partimente o maior fazendas cipar da luta partiperíodo em dária. Agora, meu cana? nesse filho João Paulo fez J O S É 18 anos e se lançou Pontal que, RAINHA – Pascandidato a vereador para sei nove meses no pelo PCdoB, em Tepresídio entre os odoro Sampaio. Fiachar boi, daqui da região e quei feliz e torci por o de Pinheiros III. tem que ele... (João Paulo Na cela cabiam 12 Rainha teve 183 voandar de pessoas. Éramos tos e não conseguiu 31. Às vezes penbinóculos... se eleger). De minha so, como é que um parte, nunca me fiser humano pode liei a partido, ajudei viver naquelas condições. Todos me a fundar o PT, mas nunca me filiei. conheciam. As famílias, as pessoas, PIO-PARDO - Qual sua relareconheciam meu trabalho. Costumação com o Lula hoje? vam dizer que eu tinha uma causa. É impressionante dizer isso, todas as JOSÉ RAINHA – Ótima. vezes que eles ousam me prender Quando estive preso, ele fez por mim como bandido, a bandidagem do crialgo que nem meu pai faria. Eu esme tem por mim o maior reconhecitava doente na prisão e Lula mandou mento. Fiquei com presos lideranças dois ex-ministros, o Paulo Vannuchi e de facções e todos me tratavam com o Luiz Dulce, me visitar. Trouxeram dignidade. Alguns juízes, alguns prouma carta de reconhecimento, pelo motores e delegados não sabem difemeu trabalho em defesa dos trabalharenciar um criminoso comum de um dores rurais. Prometeu visitar-me asprisioneiro político, como me consisim que ele se recuperasse da doença. dero.



PIO-PARDO – Em sua última prisão, você ficou maior tempo. Como você foi tratado?

PIO-PARDO – Como você vê essas organizações dentro dos presídios?

JOSÉ RAINHA – Recebi um

JOSÉ RAINHA – Não tem

JOSÉ RAINHA – Eu continuo tendo o mesmo pensamento. A grande mídia nunca esteve a nosso favor. Sempre nos colocou na ilegalidade, sempre criminalizou nosso movimento, nos colocando fora da lei, como se vivêssemos à margem do Estado Democrático de Direito. Nós temos o direito de ter um pedaço de terra para trabalhar. Esse direito está previsto no texto constitucional. É vergonhoso nos deparar no Pontal com sentenças judiciais transitadas em julgado declarando que uma terra é devoluta e essa terra não nos ser destinada. PIO-PARDO - Vocês vêem no Estado um inimigo? JOSÉ RAINHA – O Estado sempre foi inimigo dos pobres. O Estado foi feito para proteger a classe dominante. Para ser verdadeiramente democrático o Estado deveria, em primeiro lugar, respeitar os direitos humanos e assegurar o princípio da igualdade de todos. Não se pode falar de um Estado Democrático Direito, na amplitude desta palavra, quando milhares de pessoas passam fome ou estão desempregadas; quando milhares de pessoas estão nas ruas, morando debaixo das pontes, sem direito à habitação. PIO-PARDO - Qual é a programação para outubro? Tem alguma marcha preparada para Prudente? Você se arriscaria fazer novamente? José Rainha – Se necessário, será feita. A marcha tem sido uma forma importante de atrair a sociedade em favor de nossa causa. PIO-PARDO – José Rainha é bandido? José Rainha – Não sou um bandido. José Rainha é um cidadão, que tem dignidade e muito respeito à vida dos trabalhadores.

Outubro 2012

Uso comum dos banheiros Costume, surgido na Europa, da utilização de um só banheiro para ambos os sexos em locais públicos tem ficado em evidência pediu licença, entrou na sala privativa da [email protected] empresa aérea após alguns A imprensa minutos volescrita – nossa fontou para te de informações pedir desmais confiável – culpas tem dado ênfase e comao costume, surpletar o gido na Europa check-in. (tinha de ser), Logo da utilizaem seguida, “a pasção de um sageira” dirigiu-se ao só banheiro portão onde iria aguarpara ambos dar seu vôo, por coincios sexos, em dência, vizinho ao meu. locais públiA certa altura, levantoucos. -se para se servir da toalete. OcorreuPensei com os meus botões: -me, certa feita, é a hora da onça beber água! em São Paulo, Fiquei observando qual seria precisar com ura toalete de sua escolha e não gência de um badeu outra: a jovem entrou, nheiro para satisfazer tranquilamente, no banheiro minhas necessidades fisiológicas e feminino. somente encontrar disponível, no saDesde então, passei a entender guão do hotel, o banheiro feminino. melhor a diferença entre o travesti Não tive dúvidas, abri a porta e servie o homossexual. O primeiro é um -me do vaso sanitário, sem o menor transexual, ou seja, uma pessoa que constrangimento. Quando saí, tive a não aceita seu sexo aparente e está felicidade de não me deparar com neconvencido de que pertence ao sexo nhuma usuária na fila de espera. oposto e, por isso, em casos extreNão foi o que sucedeu com um mos, se submete a intervenção cirúramigo prudentigica para mudança no que – premide sexo. O segundo, do pelas mesmas pelo contrário, não necessidades se rebela contra seu – não trepidou corpo e segue sua em se utilizar do NA TOALETE vida, com a conforbanheiro femimação sexual que “Passei a nino em um suDeus lhe deu. permercado da entender Em termos de cidade. Quando hábitos prevalentes a diferença saiu, topou com em locais públicos, é duas senhoras bom ter presente que entre o travesti e na fila de espeprimeiro, ou seja, o homossexual: oo transexual, ra, que ficaram por resurpresas e critijeitar suas caracteo 1º não aceita caram duramenrísticas fisiológicas, te sua conduta. seu sexo costuma se utilizar Retrucou, meu das toaletes reservaaparente e o amigo: das ao sexo oposto, - As se2º não se rebela ou seja, femininas. nhoras não diO segundo, por sua contra seu riam que não tevez, conformado nho vergonha, se corpo” com suas caractepassassem pelo rísticas fisiológicas, mesmo apuro. costuma se servir Em outra ocasião, fazia o meu das toaletes masculinas. check-in no balcão de Congonhas No entanto, devo advertir que precedido por uma bela jovem de vesestas condutas valem si et in quantido rodado, muito elegante. A atentum, inseridas que estão no estágio dente solicitou-lhe os documentos, atual das nossas relações de sociais, mas surpresa, advertiu-a que havia pois nunca se sabe, em termos culalgum engano, pois o bilhete aéreo e turais, para onde caminha a humarespectiva identidade faziam menção nidade. De resto, estou convencido a pessoa do sexo masculino. A moça, de que há mais segredos nesta conentão, respondeu que não havia nefraria, do que possa sonhar a vã finhum equívoco, pois era a pessoa losofia... retratada no documento. A atendente

Zelmo Denari



Comportamento 11

MSN do Inocêncio Inocêncio Prudente é prudentino nato, morou alguns anos fora, mas está de volta para “morrer na terrinha natal”. Atualmente, virou internauta, e ainda se espanta com a política local.

12 Judiciário

Outubro 2012

Quem vigia o vigia? Questiona-se se a opinião de 11 magistrados prevaleça quando se trata da formulação de políticas públicas

Karina Denari Mattos [email protected]

Já se tornou rotina a transmissão televisiva dos julgamentos de nossa Suprema Corte, notadamente quando se trata de questões de fundo ético-religioso, político ou técnico, como aborto de anencéfalos, mensalão ou demarcação de terras indígenas. Forjam-se, naquele Corte, super-heróis e até vilões, em questões antes alheias à compreensão popular, mas que hoje fazem parte do papo de rotina nas mesas de bar. Toda a repercussão dos julgamentos tem um ponto em comum: seguem a tendência mundial, norte -americana, de que a Suprema Corte detém a última palavra nos assuntos de interpretação da Constituição. Esta tendência é positiva, pois já chancelou a união homoafetiva e as pesquisas com células-tronco, recentes diretrizes do STF. E se não fosse o caso? Entre os casos paradigmáticos e bastante sugestivos lá fora, por sua complexi-

filhos, o qual, tendo vivido por mais de vinte anos em regime de escravidão, a serviço de um cirurgião do exército, pleiteou judicialmente sua liberdade. À época, plena véspera de Guerra civil (1861-1865) o tema era palpitante na sociedade norte-americana, pois o Norte clamava pelo abolicionismo, mas o Sul escravagista, invocando a pretensa necessidade de mão de obra escrava nas lavouras de açúcar, se opunha, invocando os tratados firmados entre os estados federativos. A decisão, considerada uma das mais desastradas da história da Suprema Corte – ao lado da polêmica eleição de Bush em 2000 contra A l

dade, podemos citar o Dred Scott case. Este precedente norte-americano de 1857, com raros estudos no Brasil, versa sobre a postulação de um escravo nascido nos EUA, casado, com

Gore - além de negar a libertação não é o locus de deliberação por exdo escravo, proclamou que nenhum celência, mas instituição responsável negro jamais seria pela seguconsiderado cidadão rança dos norte-americano. direitos e A partir desse julgarantias gamento, a opinião fundamendominante é que as DESEQUILÍBRIO tais, para cortes constitucioevitar a diHá relativo nais, sedentas pela tadura da aprovação popular maioria. consenso de e fortalecimento de Por isso, que tanto poder seu poder, costuquestionamam decidir -se se a nas mãos de um pelo “poliopinião de só órgão, não ticamente 11 magiscorreto”. trados “de é saudável Insnotável satitutos de ber jurídisuposta leco e ilibada gitimação reputação” democrática utilizados pelo – como quer a Constituição – deva Supremo Tribunal Federal – tipo prevalecer quando se trata da formuaudiências públicas e Amici Curiae lação de políticas públicas, com efeito – pouco auxiliam na fundamenvinculante e erga omnes ( para usartação das decisões, já que mos um jargão jurídico). Há relativo o Judiciário consenso no sentido de que tanto poder, concentrado nas mãos de um só órgão, não é saudável pela ruptura do equilíbrio desejável em todas as instituições democráticas.



Um livro no lixo Eustásio de Oliveira Ferraz

[email protected]

Andava pela rua Donato Armelim quando, de repente, numa caçamba de lixo, deparei-me com um livro: “O Homem esse Desconhecido”, de Alex Carrel. Estava todo amarrotado, com sinal de umidade. Que tipo de leitor teria sido o seu proprietário? Um intelectual frustrado? Um curioso? Um leitor que pula páginas? Pensei com Gabriel Perissé: podemos viver sem ler? Quem não lê não entra no rio da história e quem lê é como o mar onde deságuam muitos rios. Sempre acreditei que a aquisição de um livro sempre tem o sabor de um encontro afetivo. Por isso, fiquei meditando e lembrei-me de uma conversa que tive, certa feita, com Charles Borg, um amigo de Araçatuba, que esteve recentemente na Irlanda. Dizia ele que Dublin é a cidade do livro. A ca-

pital irlandesa se destaca pela quantidade de livrarias. Não é sem motivo que Dublin é também a cidade com maior número de agraciados com o Prêmio Nobel de literatura e são três os dublinenses condecorados: William Yeats, Ezra Pound e Samuel Beckett. Estranho como o mais ilustre dos clássicos irlandeses, James Joyce, não ter sido agraciado pela distinta honraria. Talvez pelo fato de ter sido rejeitado, inclusive pelos seus compatriotas, em decorrência da linguagem vulgar utilizada no seu famoso “Ulysses”. Sinceramente de Ulisses só li resenhas esparsas e o livro “O gozo de Ulisses”, de Noga

Lubicz, cuja leitura foi infrutífera. Dublin é a capital das livrarias. E Presidente Prudente? Quantas as temos? Frequentei a livraria do saudoso professor Chamé, no Prudenshopping. Depois, a livraria Nobel, onde sempre folheava livros com uma sensação de pura felicidade. Felicidade diante da beleza dos livros, que nos alimentava e nos confortava. Ambas as livrarias desapareceram pela falta de leitores. Livraria não precisa de fregueses, mas de leitores. Estou convencido que nossa cidade abriga uma multidão de peregrinos que atra-

vessam os desertos e as florestas, mas são surpreendidos pelas trevas, não pela luz. A livraria Universitária também fechou. A justificativa foi a dificuldade da empresa em se ajustar diante das novas tecnologias. Alegou-se depois o fator “crise”, bem como o advento da leitura digital. Mas, que é a crise? Já se disse que “não faz sentido alimentarmos uma visão puramente negativa da crise”. A bem da verdade, a “crise aparece como um apelo, uma mensagem que é preciso decifrar.” Muito embora não possamos fugir das crises, não nos esqueçamos que a “leitura é microscópio para captar o minúsculo, telescópio para intuir o longínquo, periscópio para ver ao redor e estetoscópio, para investigar o profundamente humano.” Acho bonitas estas palavras, no entanto, a julgar pela lembrança do livro despejado na caçamba de entulho, nem todos pensam assim...

Política13

Outubro 2012

Na vida da cidade

O povo tendo conquistado o direito ao voto, elegeu no estado mais rico do reino um palhaço analfabeto

Arlette Piai [email protected]

Era uma vez um rei. Ele reinava num país tão grande, quão grande era a sua tirania. O povo se calava amedrontado, sem poder reagir aos mandos e desmandos do déspota. Passaram-se décadas e o rei percebeu que no mundo globalizado poderia perder a coroa, decidiu, então, ouvir seus súditos. “Façam que venha ao reino a opinião pública, disse o rei”. Mas a opinião pública perdera o uso do pensamento e da palavra. A qualquer pergunta do rei, a resposta era sempre o silêncio. O tirano esbravejando declarara que a patologia da mudez coletiva era culpa da elite e da imprensa. O tempo passa e aparece um aqui, outro ali, a balbuciar algumas palavras até que começam a falar, e o primeiro pedido feito fora a volta da democracia. Perplexo com o desejo do povo, dirigiu-se o rei aos serviçais e perguntou como conseguiria ter poderes absolutos e ao mesmo tempo governar democraticamente. “Impossível, disseram alguns; não dá, responderam outros; pedido absurdo gritaram raivosos ainda outros. Até que surgiu uma ideia: “Majestade, dê a todos o direito ao voto; mas censure a imprensa, feche as escolas e ofereça ao povo o “bolsa pão”. O rei gostou. Não conseguiu censurar a imprensa, entretanto teve grande sucesso com as escolas; deixou as portas abertas e as almas fechadas; a estratégia foi impedir às crianças e aos jovens a capacidade de pensar. E assim, o povo tendo conquistado o direito ao voto, elegeu no estado mais rico do reino um palhaço analfabeto para deputado federal. Hoje ele faz parte da Comissão da Educação e Cultura e possivelmente até oriente as diretrizes da Educação do reino. Pa-

Mau Governo nos afrescos do pintor Ambrogio Lorenzetti (c.1290-1348)

rece filme de ficção, mas é verdade. Numa cidade do interior, na calada noite, os vereadores votaram o aumento de seus próprios salários enquanto muitos vivem com o mínimo e tantos desempregados... Parece filme de ficção, mas é verdade. O direito ao voto perdura e o circo também. O trágico virou cômico e às vésperas das eleições surgiram dezenas de palhaços vorazes pelo poder e mais: até candidato cassado desejando ser classificado.



ALIENAÇÃO “Se os homens neutralizam o direito de pensar, a cidade pode ser tomada e dominada pela ferocidade de um tirano”

O espírito da tirania do rei está sempre à espreita, não morre; como o sono da Branca de Neve, aguarda o “beijo do príncipe” para renascer. Mas os súditos que fizeram algumas conquistas estão também à espreita... Para evitar “o perigoso retorno” valorizam o Legislativo que representa a vigilância do rei e o cerne da democracia. Parti-

cipam do diálogo com os vereadores e deputados, presentes ou on-line, cobrando-os ferrenhamente. Hoje se arrepiam só ao pensar que se não assumirem seus deveres de cidadania, mais cedo ou mais tarde, contrairão novamente a patologia da mudez. E o rei despótico continua de prontidão para o bote. E os cidadãos do reino, vigilantes da democracia, fazem questão de lembrar o discurso do filósofo grego Teócrito de Corinto, século VI a. C., que encerra assim: “Na vida da cidade, se os homens neutralizam dentro de si o direito de pensar, a cidade pode ser tomada e dominada pela ferocidade de um tirano, cujo despotismo levará o povo à morte pela fome, pela crueldade, pela injustiça, pela prepotência (...) O povo, certamente, será arrastado à opressão, à tortura, ao cárcere ou a qualquer outra forma de crueldade e perdição”.

14 Curtas

Outubro 2012

Pinga-fogo

Zelmo Denari [email protected]

O celibato sacerdotal

Eleições em São Paulo 1

O celibato sacerdotal, bem como, o dogma da infalibilidade papal, duas das cláusulas pétreas da Igreja Católica, estariam com os dias contados? O recém-nomeado arcebispo de Teresina (PI), dom Jacinto Furtado de Brito Sobrinho, 65, declarou que “o fato de que, para ser padre, precisa ser também celibatário é uma disciplina da Igreja que pode mudar”. Essa opinião se choca com recentes declarações do papa que consideram o celibato “imprescindível”, rotulando de desobediente a ala reformista que preconiza o casamento, bem como a ordenação de mulheres. Fica difícil entender como um bispo que não comunga o ideário do Vaticano, que já negou a infalibilidade papal e, pior ainda, filiado à Teologia da Libertação – doutrina religiosa que vitimou o frei Leonardo Boff – possa ser nomeado arcebispo. Algo se move, no seio do catolicismo?

Em São Paulo, um disputado primeiro turno eleitoral chegou ao fim, vencido pelo candidato do PSDB, José Serra e por seu opositor do PT, Fernando Haddad. O candidato Russomano, que até então vinha liderando a disputa, sucumbiu na undécima hora o que, de si, pode ser considerado uma vitória de Lula. O segundo turno promete ser ainda mais eletrizante, pela desesperada captação de apoio dos candidatos vencidos (Russomano e Chalita).

Eleições em São Paulo 2 Dentro deste contexto, as igrejas – queira ou não o arcebispo de São Paulo, dom Odilo Scherer – se converteram em currais eleitorais. No primeiro turno, sagraram-se vencedoras a Igreja Católica e a Assembléia de Deus (leia-se Serra e Haddad). Por sua vez, a Igreja Universal naufragou com Russomano. No segundo turno – tendo presente que vivemos num país cada vez mais confessional e mais distante do ideário secular – os dois candidatos deverão rezar um ano e três sextas-feiras pelos votos dos católicos, que serão decisivos. Na visão de Lula, o segundo turno paulista será uma luta armada entre o PT e o PSDB pela Prefeitura de São Paulo.

A derrota de Sato Em Presidente Prudente, o acidente de percurso mais comentado foi a derrota do candidato à reeleição pelo Partido Verde, Douglas Kato. Sem embargo de ter sido o terceiro vereador mais votado da cidade, com mais de 3.000 votos, não foi eleito em razão da pífia votação do candidato a prefeito e puxador de votos, Dr. Talmir. No terreno político, o que mais importa é saber qual é a “hora e a vez”. Para muitos candidatos prudentinos, pode até ter sido a hora, mas não foi a vez...

Para conhecimento dos professores Esta manhã, acordei muito feliz. Soube que, no ensino fundamental, os professores já ensinam nossas crianças que o Brasil não foi descoberto, mas “conquistado pelos portugueses”. Fica restabelecida, assim, uma verdade his-

tórica. De resto, os professores deveriam ensinar, ainda, que os conquistadores, como de resto todos os europeus, cheiravam mal e foi com nossos índios que aprenderam o saudável hábito de tomar banho diariamente.

Para conhecimento de todos A Veja – uma leitura não-recomendável, por ser de direita e tendenciosa – publica, no último número, uma preciosa entrevista do poeta Ferreira Gullar, marxista de primeira hora, onde faz severas e irrespondíveis críticas à esquerda como experiência histórica. Dela se extraem as seguintes pérolas: “no sec. XIX o capitalismo era destrutivo e inaceitável, mas descobriu-se depois que a empresa não pode ser repudiada, porque não há outra forma comprovada de gerar riquezas”; “o capitalilismo é forte porque é instintivo”; “o empresário é um intelectual que, em vez de escrever poesias monta empresas”. Numa das passagens indaga: “quantos defensores de Cuba estariam dispostos a viver lá?” Vale a pena ler a entrevista em sua integralidade.

Dá-lhes Dilma Nossa presidente começou bem o mês, desferindo pontapés em três setores que têm tudo a ver com o bem-estar da população brasileira. O processo de intervenção promovido pela Agência Nacional de Saúde atingiu 37 operadoras de planos de saúde. Em seguida, a Anatel suspendeu os planos de venda de três das quatro maiores concessionárias de telefonia celular. Finalmente, a Agência Nacional de Energia Elétrica promoveu intervenção em oito distribuidoras que vendem eletricidade em seis Estados. Dilma parte do suposto de que, quando as concessionárias de serviços públicos prestam maus serviços quem sofre é a população. As ações das empresas punidas caíram na Bolsa, o que prova que concessionária mal administrada não vale nada.

Guerra dos sexos Os cientistas chineses descobriram que os eunucos de determinada dinastia viveram 20 anos além do previsto para pessoas daquela idade. Sugerem que essa longevidade temporal se deva ao fato de terem sido castrados e atribuem à ausência de hormônios

masculinos a responsabilidade por essa performance. As mulheres não gostaram desta notícia, pois temem que os poucos héteros que ainda sobram na praça, resolvam se emascular para conseguir uma sobrevida de 20 anos...

Assim não dá O Pio-pardo está convencido que o PSDB não quer resolver o problema fundiário do Pontal. Governando o Estado há cerca de 20 anos, o governo estadual não toma medida alguma capaz de solucionar o problema das terras devolutas, áreas de interesse ambiental ou regularizar as posses. Para piorar, comete vexames, como os da Lei 11.600/03. Esta lei foi cantada em prosa e verso pelo governo estadual como redentora do Pontal. Passados quase 10 anos, nenhum título de domínio foi expedido com base nela, tamanhos os seus equívocos. Não contente, o atual governo modifica

esta lei em 2011, mas ela continua e continuará ineficaz. Na verdade, o PSDB não sabe o que fazer com o Pontal do Paranapanema. Por isso, os futuros projetos políticos para o Pontal correm o risco de serem atingidos pelo cocô do Piopardinho, este simpático mas endiabrado passarinho do nosso tablóide.

A batalha do mensalão As divergências na Suprema Corte entre o relator Joaquim Barbosa e o revisor Lewandowski, no julgamento histórico do mensalão, começam a sinalizar que a mídia de esquerda – entre elas, Carta Maior, revista de cabeceira deste escriba – começa a apoiar as opiniões de Lewandowski pelo fato de divergir do relator do processo. Como é intuitivo, estão querendo demonizar o relator Joaquim Barbosa, com sucessivas alusões ao seu “desequilíbrio emocional”, à sua “postura constrangedora” e até ao “papel híbrido que tem desempenhado como relator, revisor e acusador”. Nada mais equivocado. O relator Joaquim Barbosa tem se conduzido d e

maneira exemplar e imparcial como relator do processo. Bastante apropriada a crítica que fez ao revisor, por não ter descrito adequadamente um fato constante dos autos. Para Joaquim Barbosa a divergência levantada por Lewandowiski era inadmissível, pois estava em causa “matéria factual”. Não à toa, o revisor votou pela absolvição de José Dirceu.

Humor 15

Outubro 2012

Circo Teatro Pio-Pardo APRESENTA:

A bolinha perdida

Farsas burlescas O prato de lentilhas Estava Diógenes se deliciando com um prato de lentilhas quando o filósofo Aristipo o advertiu: - Se soubesses ser submisso ao rei não estarias comendo esse prato de lentilhas. Diógenes, sem perder a fleugma, respondeu: - Se soubesses como é bom comer lentilhas, não ficarias “com o cu aos pulos” na presença do rei.

A exposição das genitálias Dois próceres políticos, de paletó e gravata, conversam sobre o recente problema da exposição das genitálias perante a mídia. - Tenho comigo que a genitália humana não deva ser exposta ao público. - Também penso assim... - Partes pudendas devem ser trancadas na escuridão de nossos próprios corpos. - É o lugar exato. - Mas temos que ser vigilantes. Não podemos deixar nenhuma fresta senão... - Entra mosca! ( fonte: Angeli )

Farsa da adoção

Personagens: um árabe, sua mulher, uma vizinha e o respectivo marido, todos genitores de uma ninhada de filhos biológicos, batem um papo descontraído sobre a adoção de filhos, num final de tarde em Presidente Prudente. Quando chegou a vez do árabe emitir sua opinião ele disparou: - Querem mesmo saber minha opinião? - Pode dizer Turcão – brincou o maridão. - Eu não aceito esta coisa de criar um filho que não é meu. Se minha mulher, que está aqui presente, não

me tivesse dado tantos filhos, eu arrumaria lá fora, com outras mulheres e traria depois para criar em casa... - Você quer dizer ... – provocou o maridão; - Quero dizer que o Turcão aqui não vai criar filhos de nenhuma vagabunda, sem saber a origem... A mulher, desconcertada, intervém: - Acho uma falta de vergonha dizer uma coisa desta, diante de nossos amigos? - E quer saber do mais: não dê palpite mulher, porque você já me deu 4 filhos e, portanto, está bem equipadinha! Pintura de Hélder Santana dos Reis

O coletivo estava cheio. Passageiros em pé e sentados. Acompanhado da mãe um menino começa a chorar continuamente. A mãe pergunta a razão e ele diz que havia perdido sua bolinha. A mãe, que nem sabia que ele tinha nas mãos uma bolinha, procura no assento e não acha. O menino continua a chorar com muita insistência. Os demais passageiros, condoídos com a perda da bolinha e se põem também a procurar a bolinha por todo o ônibus. Depois de alguns minutos o menino para de chorar e a mãe pergunta ao moleque: - Sossegou o facho? - Pode deixar e não se preocupe, eu faço outra... Ato contínuo enfia o indicador no nariz e reinicia a produção de bolinhas.

MULTIMÍDIA Palavras de Galeano Eduardo Galeano, o filósofo mais acreditado da América Latina e que esteve hospitalizado no final de agosto, recebeu alta em Montevidéu, para felicidade de seus leitores. No Brasil, acaba de lançar pela L&PM, seu “Os filhos dos dias”, uma espécie de almanaque anual, contendo 366 verbetes, onde discorre sobre discriminação contra mulheres e homossexuais, ambientalismo, ataques contra pobres e indefesos e, notadamente, política. Dentre suas revelações, a de que a soma dos sem-teto (não estamos falando aqui dos magistrados sem-teto, mas daqueles que não possuem habitação ) em todo mundo chega a um bilhão em pleno século 21; que até 16 de maio de 1990 a homossexualidade fazia parte da lista de doenças mentais da OMS; que no dia 13 de fevereiro de 2.008 o menino Miguel Lopez Rocha, 8, brincava nos arredores de Guadalajara quando caiu no rio Santiago, mas não morreu afogado e sim envenenado, pois o rio continha arsênico, ácido sulfúrico, mercúrio, cromo e “otras

A Igreja do Diabo

Bovino Cultura Rubens Shirassu Júnior

Enquanto o cenário bucólico agoniza, o boi mastiga sua longa solidão caminhando inocente para a morte. É a cultura bovina, que cumpre sem pergunta pela sina de desinteressado ruminante de nunca chegar a ser.   Com aquele ar da noite soturna: sussurrante de silêncios, engenho de dentro cheio da verdura do verde dólar, você é assim – qualquer coisa, serena, isenta e fiel soldado, igual a pedra, seu regrado destino.   Como o resto dos homens, prende a ideia cega, teu vago retrato

da agricultura devastada, paisagem morta: Boi, a sonoterapia te carrega por um campo fechado, cercado, pelo tradicionalismo que adormece a raiz de sua breve e rude palavra: Boi. Por mais que te celebrem, não escutas, embora em forma te assemelhe à ostra.   Como a máquina de aragem que percorre a cerração e o deserto lavra o exílio onde mora, Tudo é igual a nada, pois anda em rodeios, prisioneiro autista, sem realização, sem chão nem estrelas, nisto perdido.

Dentro da programação do XIX Festival Nacional de Teatro de Presidente Prudente, a Cia. Teatral Boccaccione, de Ribeirão Preto, encenou a peça A Igreja do Diabo, no dia 27 de setembro último. A peça relata a frustrada tentativa de fundação de uma igreja que somente aceitasse seguidores que seguissem a cartilha do diabo. A cartilha do diabo, como não poderia deixar de ser, é diabólica, pois bastante permissiva quanto às condutas dos respectivos fiéis. O público lotou o Teatro Municipal, provavelmente curioso para tomar conhecimento de uma proposta teatral, capaz de revelar quais seriam os desígnios perversos do gênio do Mal. A peça, montada sem pompa, permite que a ação se desenvolva com extrema desenvoltura, a começar pela música cadenciada, com vozes e contracantos bem ensaiados. No momento em que os seguidores da nova seita foram borrifados com as águas do inferno, despejadas de um cantil de barro, houve uma tentativa mal sucedida de levar ao palco alguns assistentes que deveriam passar pela mesma iniciação e esta tática teatral, como sói acontecer, quebrou por alguns minutos o ritmo do espetáculo.

cositas más”, que foram despejadas pelas multinacionais, dentre elas, a Nestlé, IBM e Xerox, para citarmos as mais conhecidas. Revela o escritor uruguaio que as multinacionais escolheram Guadalajara, porque seus países de origem não aceitam este tipo de doação. Por último, que logo após o lançamento das bombas atômicas contra o Japão, na última guerra mundial, o “New York Times” publicou artigo de Willian Laurence, redator especializado em ciências, afirmando que não havia radiação em Hiroshima e Nagasaki e que a radioatividade era uma “mentira da propaganda japonesa”. Após a conversão dos fiéis, o sacro converte-se em profano e os beatos, em sacripantas. Como esperado, os anjos, travestidos de sátiros e faunos de sôfregas narinas, são despidos até o nu frontal e se lançam às beatas travestidas de ninfas seminuas. O espetáculo tinha tudo para dar errado, mas não deu. O público vibrava a cada aparição do diabo e das diabetes. No final, não por acaso, os seguidores da seita diabólica são acometidos por súbitas recaídas e surpreendidos praticando “bondades” não toleradas no inferno. Do mesmo modo, as pessoas tementes a Deus, com freqüência eram surpreendidas praticando “maldades” inconfessáveis. A apoteose nos mostra o Diabo conciliando com a suprema divindade e admitindo o fracasso de sua frustra tentativa de criar sua igreja. Tudo muito bonitinho, adequado e conveniente. Bem de ver que o autor da peça poderia ter ido além e libertado seus personagens de compromissos com quaisquer das facções em jogo, quando mais não fora, para denunciar a intolerância religiosa, bem como o mundo de trevas dos que acreditam no diabo ou em suas diabruras. Mas aí também seria querer demais e o desfecho infiel ao relato de Machado de Assis, no conto homônimo que inspirou a peça.

16 Humor

Casca bico

Outubro 2012

Deus Lhe Pague - Chico Buarque

Richard de Almeida [email protected]

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