Recensão crítica: Protecção Internacional Direitos Humanos

May 22, 2017 | Autor: Pedro Passerini | Categoria: Direito Internacional dos Direitos Humanos
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1.

Parte Introdutória

O trabalho que se segue analisa a obra Human Rights as Politics, Human Rights as Idolatry do autor canadense Michael Ignatieff sobre os direitos humanos, o valor e natureza humana. Ignatieff defende que a aceitação dos direitos humanos é compatível com o reconhecimento de um estatuto especial, procura o ênfase situado entre o relativismo e a própria índole universal aplicada aos Direitos Humanos. O autor propõe o desenvolvimento de políticas ativistas, para garantir a integração destes direitos, assim como o fomento de políticas de construção; a relação dialéctica entre as instituições e o ser humano — sendo, o federalismo dos direitos humanos o mecanismo mais adequado para reconhecer os direitos de autogoverno. A filosofia grega foi importante, por ter aberto novos horizontes: a curiosidade pelo indivíduo humano. Contudo este ramo jurídico constitui um dado típico da cultura moderna: onde será apresentado uma louvável critica quanto ao reconhecimento do primado Ocidental na sua emancipação e difusão. Adicionalmente não se pretende, com isso, negar as tentativas e os esforços do jusnaturalismo desde os socráticos, os platónicos, em particular o contributo dos estóicos de fundá-los universalmente. Apenas queremos dizer que o uso comum da expressão direitos humanos define certos problemas num contexto estrutural peculiar. É precisamente, dessa perspectiva histórica, é que se faz sentido falar de um legado da Revolução Francesa com respeito aos direitos humanos e o contributo da escola americana. Enfrentando esse desafio intelectual procurei de uma melhor forma debruçar-me sobre os direitos fundamentais do ser humano, que desde os meados do séc. XV, tem dominado a nossa tradição filosófica. Não se pretende esgotar a riqueza argumentativa do autor presente, nem de nenhum outro que se dedicou a este tema. Acima de tudo, desejo compreendê-los, assinalar os aspectos de cada um, alternando e comparando sempre que possível.

2.

A Pessoa é Digna, Porque é Pessoa… Quando se trata do Homem, o caso é diferente. Não só o antropólogo ou sociólogo profis-

sional, mas também todo o ser humano, se considera qualificado, pelo simples facto da sua humanidade. Será uma ousadia esboçar tal quadro? Creio ser este um dos principais objectivos ao longo desta análise. “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade.”

2.1)

O Legado Ocidental

Depois do período tempestuoso e demoníaco que fora a Revolução Francesa, e a consequente queda das estruturas sócio-políticas tradicionais que ainda a caracterizavam a Europa, principalmente Estados como a França, Portugal, a Bélgica e a Rússia, fundamentadas pelo absolutismo, o direito natural assumiu uma nova forma, porém não associada à subjugação do Homem, quer pela defesa cristã quer pelos Monarcas detentores de soberanias singulares. A noção do direito natural pressupõe o conceito fundamental de natureza humana. Procurando simplificar e abreviar, diremos que a lei natural, como regra suprema do agir humano, implica que o Homem se comporte segundo a sua própria natureza. Até meados dos séculos XVIII, o valor Ocidental ainda constituía uma competência europeia. A condenação de Sócrates em 399 a.C, é um facto, que pelo menos, a maioria dos teóricos liberais possuem uma certa dificuldade em conceber — a democracia condenou à morte o maior de todos os seus filhos. Creio perceber, que além dos ocidentais inaugurarem palavras como, “genocídio”, “escravatura”, “absolutismo” e “feudalismo”, sentiram a necessidade de igual modo, talvez por sentimento de culpa, a criação de uma Declaração onde pudessem citar, elaborar um corpus contendo regras que protegessem os Direitos Humanos. Abusos, sofrimento, opressão e crueldade, foram alguma das fases ultrapassadas, posso assim afirmar, para que os seres humanos pudessem viver em prol de liberdades fundamentais. Quando os estados europeus começaram a se solidificar nos séculos XV e XVI, eles entraram em um mundo social que já estava densamente povoado de organizações e instituições. Por um lado porque os Estados como sistemas organizacionais eram constitutivamente hostis uns aos outros, facto que foi bem visível na história europeia até meados do século XX; por outro lado, competiam por recursos, autoridade e poder, isto devido à maior dis-

persão dentro da própria comunidade de estados, resultados da ordem de Vestfália, ao consolidar a soberania e invocar o princípio da auto-determinação dos povos, que seria posteriormente, um objecto preferido por Woodrow Wilson, Franklin D. Roosevelt, ou por aqueles, cujo respeito pela integridade física territorial, bem-estar social, eram objetos da sua preocupação. Por esta razão que no pós Segunda Guerra Mundial, o período sangrento e destruição que toda a espécie humana foi exposta, procurou-se institucionalizar o sentimento de culpa e responsabilidade na Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH). A história da filosofa é concludente nesta questão. John Locke, este gentleman movido por um racionalismo critico, torna-se num grande divulgador das teses da tolerância, democracia liberal, quer política quer económica, e da propriedade privada — são conciliações, cimentadas com bom senso, de ideais da sua época, de aspirações de uma classe média cada vez mais central, cujas influências, foram, portanto, fáceis e notáveis no Reino Unido, França e nos Estados Unidos, aliás não é por acaso, que todas as revoluções registradas pela história, pressupõem sempre o sufoco daqueles que foram acorrentados. Atraído pelas marcas filosóficas deixadas por Locke, Jean-Jacques Rousseau, este pré-romântico, trouxe a democracia directa como forma de expressão da soberania popular. Na tese de Rousseau, os indivíduos encontram-se, assim, unidos a todos os outros, mas só obedecem a si próprios e permanecem livres. Geralmente, comete-se um erro, ao afirmar que a difusão dos direitos humanos, deve-se à insígnia ocidental — contudo, tal premissa é de igual modo viciada, uma vez que, o entusiasmo do pensamento liberal ocidental, praticamente lhe serviu de amparo durante toda a sua evolução histórica. Decerto, se por um lado, o século vinte ainda encontrava contrariedades em libertar-se da guerra, por outro lado, o tempo calculado para que dado intuito fosse concretizado, realizar-se-ia o mais breve possível. Um espirito kantiano, movia lentamente, intencionalmente o presidente norte-americano, Woodrow Wilson, figura importante na resolução pós Primeira Guerra, ao ler para o mundo inteiro os seus Catorze Pontos, cujo último previa a criação de um grupo, de cariz internacional, apto em traduzir hostilidades por sentimentos compatíveis, agressividade pela paz; — pois, morreu um soldado, morreram milhões de judeus, dentro dos campos de concentração, edificados em nome do holocausto — erguidos em prol destes acontecimentos no pós Segunda Guerra Mundial, a Carta das Nações Unidas (1945), reprovava a agressão entre Estados, como cita o art. 2.º, n.º 2, “Os membros da Organização deverão resolver as suas controvérsias internacionais por meios pacíficos, de modo a que a paz e a segurança internacionais, bem como a justiça, não sejam ameaçadas;” em curto tempo, a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovava a Convenção para a Prevenção e Re-

pressão do Crime de Genocídio em 1948, e por conseguinte, uma segunda atendendo a protecção dos refugiados em 1951. Portanto, pela primeira vez, historicamente falando, o indivíduo, independentemente da sua raça, género, crenças religiosas, orientação sexual, teria aparentemente os seus direitos garantidos e protegidos quer pela ordem interna, assim como pelo ordenamento jurídico internacional. Mas qual o lugar de relevo dos Estados Unidos da América na comunidade das nações? Uma pergunta, que pressupõe inúmeras repostas à partida. As Nações Unidas, desde a sua fixação, continha sinais do principado norte-americano, exemplifico as Quatro Liberdades de Franklin D. Roosevelt proclamadas no Congresso Americano em 1941, onde encontram-se as condições indispensáveis à existência dos seres humanos. Essa observação feita resulta, relativamente à própria Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, que invoca um só nome: Eleanor Roosevelt.

3.

Os Direitos Humanos uma Utopia Institucionalizada? Documentando, acerca de todo o trabalho executado em nome do existencialismo humano,

questiona-se se os escritos filosóficos, sociológicos não são, demasiadas vezes, meramente técnicos ou então simplesmente utópicos, se é o caso de salientar, a ineficácia das organizações governamentais e não governamentais. Por exemplo, enquanto os europeus ocidentais se divertiam em Maastricht em 1992 ao decidirem facilitar a integração económica com vista a possibilidade da adoção de uma única moeda, Sarajevo ardia-se; situação não muito peculiar dos catástrofes em Ruanda, na Bósnia ou no chão sangrento da Kosovo. “Só quero viver num país normal. Quero levantar-me de manhã, ir a uma loja normal, ler os meus livros, ter um Estado democrático. E viajar. Não sou um filho da internet, mas gostava de ser.” “Mas como se pode viver com quem enforca pessoas em fios elétricos?” Palavras citadas por ex-estudantes ativistas em Belgrado, onde podemos perceber inerentemente, o problema da identidade cultural que na divisão dos povos que não conseguem viver juntos, usa todo o tipo de ferramenta, mesmo quando esta é obrigada a centrifugar Direitos Humanos dos povos subjugados. Mas as instituições não existem para satisfazer o Homem, como pensava John S. Mill? A ideia inicial do projecto era este. À medida que a penetração liberal se concretizava, uma nova Conferência preparava-se, a ter lugar em Roma em 1998, cuja finalidade dos Estados Partes presente no Estatuto, proclamaram: “Conscientes de que todos os povos estão unidos por laços comuns e de que as suas culturas foram construídas sobre uma herança que partilham, e preocupados com o facto de este delicado mosaico

poder vir a quebrar-se a qualquer instante”, o qual previa a criação do Tribunal Penal Internacional. Uma nota adicional, acerca deste preambulo, a meu ver, é acerca do delicado mosaico a qual os seres humanos estão interligados — mas este, quantas vezes já quebrou-se? As instituições contemporâneas não são tão perfeitas quanto parecem, a sua fragilidade parte desde, das assimetrias que presenciamos constantemente, talvez em detrimento da globalização, derrubou o muro de Berlim, para criar um novo muro, este ainda pior, não é por acaso que Timothy Garton afirma que existem várias “Europas”. Na Tunisia, um vendedor de frutas, auto-imolou-se como forma de protesto para com a administração local. O objectivo, não resulta em apresentar e julgar a degradação dos direitos humanos, contudo a cortina de ferro Norte-Sul, parece não ter fim. “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade”; assim cita o art. 1.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Qual é o problema residente neste artigo inaugural da presente Declaração? Aristoteles, título de grande pensador que lhe é atribuído, mas não era, estritamente um democrata. “Dois seres humanos diferem um do outro na matéria; alguns nascem para serem senhores e outros escravos.” É óbvio, que essa posição, relaciona-se, num lato senso, com “governador e governados.” Enquanto as hierarquias feudais e eclesiásticas serviram aos seus fins durante todo o período medieval, em que a cristandade interpretou o direito natural dos seres humanos à sua maneira, a ponto de criar instituições que executasse a pena de morte, não só, como o colonialismo inventado pelos Ocidentais, com a crença de que a evolução dos outros povos era da sua competência, ao mesmo tempo, que os torturava e oprimia; em meados dos séculos XVII-XIX, quando o movimento iluminista-racionalista, juntamente com os Direitos Humanos internacionalmente reconhecidos, (obra da Revolução Francesa e Americana) assumia um novo rumo: o nacionalismo que reivindicava um principio da Paz Perpétua de Kant: a auto-determinação dos povos.

3.1.

O Papel do Estado Importa ainda frisar, à luz dos argumentos de Michael Ignatieff, o facto que, os Direitos

Humanos estão intimamente ligados com o Estado, a que o indivíduo integra, daí que, antes da ordem internacional manifestar-se contra a violação de um direito, cabe à própria jurisdição interna institucionalizar a protecção dos seus cidadãos. É precisamente esse falhanço nacional, ou seja, a impraticabilidade do Estado face ao racismo, à xenofobia, da afirmação dos direitos da mulher, da criança e do idoso, da previsão diferenciada dos direitos da pessoa com deficiência, dos doentes,

entre outros, que implica, de tal forma, a intervenção da comunidade internacional, de modo a proteger os direitos dos indivíduos sob ameaça. Isto me faz lembrar algumas premissas bíblicas. “Cristo pregou para todos os homens, independentemente da sua condição social, dizendo que o bom pastor era aquele que se preocupava com a ovelha desgarrada.” É verdade que o mundo encontra-se cheio de “ovelhas desgarradas”, todavia, creio que, pouco se tem feito, para que pelo menos, amorteça o alto relevo das dessemelhanças. Os homens vêem, ouvem, sentem, saboreiam e cheiram de uma forma bastante idêntica, são de igual modo alimentados pela mesma comida, feridos com as mesmas armas, sujeitos às mesmas doenças e curados pelos mesmos meios. Assim, questiono, quais as circunstancias que explicam as diferenças no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH)? Os jogadores inventam as regras do jogo, modificam-nas à sua vontade e não estão sujeitos senão pela sua própria moral. Assim são os Estados, pelo menos se adoptarmos uma visão utilitarista da coisa. O facto é que, a jurisdição doméstica é insuficiente na protecção e garantia dos direitos humanos. À mercê deste instante, um outro problema é afirmado: a relação entre a ordem interna e a ordem internacional, ou melhor dizendo, qual o equilíbrio a estabelecer entre as normas internacionais, suis generis face ao ser humano e a conjectura da soberania? Quando é que o intervencionismo se legitima como mecanismo para reverter o abuso dos direitos humanos numa esfera jurídica? Por um lado, o bem-estar sócio-económico, nos termos do Estado-providência (Welfare State), depende directa ou exclusivamente da satisfação e insatisfação dos indivíduos e obedece a pressuposições internas. Por outro lado, a comunidade internacional é resultado de um corpus, instrumentos e mecanismos (inúmeras convenções, ONGs, activistas etc.;), elementares na promoção e seguimento apropriado, em temas de protecção dos direitos humanos. É verdade que, nos tempos precedentes desde o seu firmamento na doutrina de Jean Bodin, soberania possuía um caracter sacro, dito de outro modo, absoluto. No entanto, as metamorfoses das relações internacionais, testemunhadas sobretudo, na segunda metade do séc. XX, desempenharam um papel importante não só na internacionalização dos direitos humanos, assim como na própria noção de soberania, baseada na ideia de transferencia de poderes, reconhecimento, solidariedade transnacional, fundamentais na disseminação de interesses comuns globais. Isto faz relembrar, quando os conservadores alemães comemoraram a unificação, os liberais apresentaram-se a dizer, que não era uma soberania no sentido clássico, afinal, partilham uma soberania na Comunidade Europeia. Por isso são designadas algumas expressões, como o caso, da intervenção humanitária (responsabilidade de proteger), um dos ramos mainstream da política externa norte-americana, em prol do Regime-Change, isto é, “exportação de democracias”.

É claro que, devo salientar que as irregularidades, respeitante às intervenções são cada vez maiores, em que a situação torna-se ainda alarmante quando se registam dados de abusos ulteriores, por parte das forças no terreno, é o que se passa com a exploração sexual, em vez de proteger os direitos dos civis ameaçados.

4.

Os Direitos Humanos são Universais, mas as Culturas Relativas 4.1) Universalismo e o Relativismo

Segundo aspirações latas, o universalismo proclama que a ênfase da universalidade encontra-se na formulação dos direitos humanos e no seu carácter moral universal, mais do que na sua implementação, ou melhor os sujeitos dos direitos assim conhecidos seriam os “seres humanos enquanto humanos”, melhor dizendo, todos os indivíduos portadores da humanidade comum. Além disso, faz um paralelo entre os direitos humanos e os direitos fundamentais das Constituições dos Estados. A critica que recebe, provém do relativismo, que mostra que os direitos humanos não são universais, mas antes, dependentes da sociedade na qual os indivíduos vivem, sendo assim, há diferenças nos padrões morais e éticos em diferentes ambientes culturais. É o caso presente no relativismo cultural, quando questiona a possibilidade de que as diferenças étnicas, culturais, costumeiras, linguisticas etc.; possam ser reduzidas a um mínimo denominador comum. O problema relevante para os relativistas é que os sistemas culturais se articulam de maneiras diferentes, são conjuntos diferentes, que compreendem diferentes elementos e relações entre eles.

4.1.1) Relativismo: o comunitarismo hegeliano

Um caso de fazer referência quanto aos muros criados pela globalização, é o da China. Os abusos e as injustiças do capitalismo contribuíram para que uma das maiores economias do mundo, quando medida através de dólares PPC (poder de paridade de compra), fosse criticada quando comparada com outros países, usando agora um outro critério, o indicador do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), que por sua vez, relega para a categoria de IDH Médio. Quanto aos restantes países asiáticos convém ainda acrescentar, que os seus principais desafios resumem-se, em grande parte na emancipação de um assombroso crescimento económico. A Malásia e a Singapura por exemplo, combinam a querela entre o autoritarismo e o capitalismo, como resposta, ao individua-

lismo americano e europeu. A perspectiva asiática procura colocar os direitos da comunidade e da família acima dos direitos e ordens individuais, isto é, nada mais nada menos que um comunitarismo hegeliano, quase uma noção platónica da política, ao enfatizar pelo bem comum. Em seguida, estou em crer que, o advento islâmico, funda-se mais ou menos, na ideia de que, um conjunto de crenças, ritos, valores morais e regras, constituem o pilar do islamismo, assim dizer, a última versão de uma mensagem Divina (Maomé). A construção dos Direitos Humanos no espaço islâmico, é em si controverso.Primeiro, esse conjunto de justificativas, inicialmente, deveria assistir à felicidade humana, neste caso, os seus fiéis. Segundo, a má aplicação, devido à interpretação a contrario sensu deste mesmo conjunto. Como afirmar, que o fim último, consiste na felicidade humana, quando a maioria dos Órgãos ou entidades competentes, o caso da Arábia Saudita, avalia as disposições na forma de incompatibilidade, que regulam a liberdade em contrair casamentos, observado o disposto no art. 16.º, e as considerações relativamente à liberdade religiosa, nas condições previstas no art. 18.º da DUDH. Em decorrência aos artigos outorgados, consideram-se, que tais, vinculam apenas valores ocidentais, assegurando escassa importância às civilizações antigas. A ratificação de uma convenção é um atributo de soberania, a que se refere o art. 2.º n.º 1 c), contudo, ao se sujeitar a direitos e criar obrigações, qualquer convenção é uma fonte de limitação de competências. Pelos parâmetros, verificados, os Órgãos do Estado da Arábia Saudita, prevêem a sua submissão ao exercício arbitrário das entidades ocidentais. Portanto, a perspectiva universal, não é senão uma exceção.

4.1.2. Universalismo e a Posição Liberal

Até 1789, o Ancient Régime definira rigorosamente, uma sociedade de classes, sustentada em pressupostos, que repeliam a separação entre o ordenamento jurídico e as demais instituições católicas. Actualmente, pelos menos, a maioria das Constituições adoptaram que, a liberdade de consciência, de religião e de culto é inviolável e garantida a todos, e que os conflitos destes verificados entre uma ou mais partes resolver-se-ão com tolerância, de modo a respeitar a liberdade de cada uma. A questão de que a vontade de Deus deve ser obedecida não decorre de qualquer pessoa ou instituição, e muito menos têm a autoridade de interferir na interpretação que o outro faz de suas obrigações religiosas. Com efeito, o Estado não tem qualquer dever de protecção para com o Divino, porém tem para com o cidadão. Não busca a religião, mas abriga o religioso; não busca o ateísmo, mas protege o ateu. Desta forma, deve cuidar dos seu cidadão, procurando conhecer as suas crenças, convicções e desejos. “Toda a pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião; este direito inclui a liberdade de ter ou de adoptar a religião ou as crenças de sua

escolha…”, observado o disposto no art. 18.º do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, de 1966 (PIDCP). É verdade que, desde as décadas de 1970, da então Revolução Iraniana, os Direitos Humanos nos Estados fundamentalistas, têm-se tornado cada vez mais, um tema de plausível prioridade na praxis internacional, como ilustra a Comissão de Liberdade Religiosa Internacional dos EUA (USCIRF). A neutralidade dos Estados Ocidentais em matéria de exercício da liberdade religiosa, é um facto, peculiar, incomum na jurisprudência islâmica. A centrifugação da globalização é vista como uma ameaça aos pilares dos países do Médio Oriente. Consequência, esta que muitas vezes justifica a vulnerabilidade exposta nas suas mulheres.

“Certo, atire em mim, mas primeiro me escute. O que você está fazendo é errado. Pessoalmente, nada tenho contra você. Só quero ir à escola.” Estas foram as últimas palavras ditas por Malala Yousafzai, antes de ser baleada por um Taliban no Vale do Swat, noroeste do Paquistão.

Nos termos do art. 28.º da Convenção sobre os Direitos das Crianças, de 1989 (CDC), adoptada unanimemente pelas Nações Unidas, que tem como membro signatário o Paquistão, ementa o seguinte texto “Os Estados Partes reconhecem o direito da criança à educação e tendo, nomeadamente, em vista assegurar progressivamente o exercício desse direito na base de igualdade e oportunidades.” Vê-se, de forma clara, que a institucionalização dos direitos nos sistemas jurídicos islâmicos, ainda carece de uma grande precariedade, apesar do carácter universal dos tratados internacionais, protocolos ratificados, atendendo o valor da pessoa humana. Não só, mas também, que triunfos estas convenções podem ter, se ainda a mutilação genital feminina (MGF), continua sendo objecto de instrumentos internacionais, como da Organização Mundial da Saúde (OMS), e do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF)? De facto, os Direitos só são significativos se gozarem de imunidade individual. Isto aplica-se, igualmente, quando se trata de direitos colectivos, daí dizer que existe intimamente, uma relação entre os direitos individuais e os direitos do grupo, na medida que, sendo o grupo composto por indivíduos, torna-se prioritário a protecção dos direitos dos indivíduos. Por essa razão o Estado, as comunidades locais, a igreja, e a família, por aí fora devem comportar de forma neutra nas decisões pessoais do indivíduo. É precisamente este, individualismo de índole “Tocqueviliano ou Lockeano” assim dizer, que processa e condena os países nãoocidentais. Uma paquistanesa não recusa abdicar-se das suas tradições, apenas “grita” pelo direito em usar um hijab azul, vermelho, ou de uma outra cor qualquer, isto é, usá-la não por uma obrigatoriedade institucional.

Como argumenta Jack Donnelly, as pessoas gozam o direito em escolher o melhor para si mesmas. Aquilo que a Declaração apela, é em particular, a possibilidade de escolha, uma vez que, não são rigorosamente livres nas suas opções, aliás, a alienação ao capital foi amplamente criticado por Karl Marx. Por exemplo, embora o neoliberalismo, encoraja os indivíduos, quanto ao crescimento económico, estes indivíduos, apenas querem direitos que os protejam da vileza dos mercados, apelando por uma justiça social, uma vez que, o homem não é um simples composto de matéria. Nessa questão a observação feita por António Avelãs, suscita interesse: “os povos colonizados foram as grandes vítimas da mundialização. Eles estão a ser vítimas da actual onda da globalização e do neo-imperialismo que a orienta e condimenta. Eles pagam, com a sua dependência e com o seu desenvolvimento impedido — a ditadura do pensamento único.” Como esta dependência materializa-se? Segundo um artigo publicado pela United Nations University (UNU): Safe Water as the Key to Global Health, aludiu que em Bangladesh cerca de 20 milhões de cidadãos bebem água contaminada por arsénico. Se a fome existe, não é porque existe escassez de recursos e meios de produção, o problema é outro, como escreveu Amartya Sen: “o facto de muitos que morrem de fome apesar da crescente produtividade, só pode-se explicar pela falta de direitos e não pela escassez de bens.” A dignidade humana vem de outro lado, de uma alma espiritual e imortal, que a eleva a um nível superior. Uma outra consideração a ter presente, resulta na ideia que o ser humano apreendese primeiramente como sujeito, fonte autónoma de pensamentos, de sentimentos e de vontades. De igual modo, estou de acordo com Thomas Hobbes, ao definir o ser humano, a partir, de caracteres, a saber: a sensação, a imaginação, a linguagem, acções, poder, vícios, a razão e a ciência etc.; são precisamente estes caracteres na base da violação dos direitos humanos. Não concordaremos com ele, pelo menos acerca da natureza humana? Muitas vezes o poder, qualquer que seja a sua essência, não é nada mais, que uma limitação à liberdade. Nós vemos constantemente, homens e mulheres, especialmente as mulheres que tornam escravas de si mesmas por preceitos — preceitos domésticos, transmitidos de geração em geração, na ideia de regra “que devem ser cuidados e continuados.” Todavia além de peacemakers domésticas anseiam com “trilhas proibidas”; isto pressupõe a defesa de Montesquieu citada na usa obra Do Espirito das Leis, que é contra a natureza que as mulheres sejam sejam senhoras de casa…; Em síntese, o género feminino, nas suas posições sociais muitas vezes oscilam para a submissão. É o caso, das ativistas feministas em Itália ao repudiarem-se, dos pressupostos do direito da família romanística, quanto à atribuição automática do sobrenome paterno aos filhos, uma discriminação, evidente, baseada no género, e a ingerência da autoridade pública na vida privada e familiar, previstos nos art. 8.º e 14.º da Convenção Europeia sobre os Direitos Humanos, de 1953. Daí que advoga, muitos autores, que não há razão nenhuma em conceber a li-

berdade como um valor unicamente ocidental, pois é em si paradoxal. Por esta razão Ignatieff, propõe, em analisar os Direitos Humanos tendo em conta a heterogeneidade (as assimetrias) que caracteriza o mundo “leopardo”. O sustento da sociabilidade, como menciona John Rawls, funda-se na premissa que cada membro da sociedade é visto como possuidor de uma inviolabilidade liberdade fundada na justiça, ou, como alguns preferem no direito natural. Os direitos não existem num vácuo, existem porque existe uma sociedade — um legado de Homens carregados de um conjunto de direitos inalienáveis atribuídos pelo Criador, observado na sabedoria de Thomas Jefferson: “conscientes da sua condição aristotélica, em desenvolver laços de fraternidade e irmandade com os seus semelhantes”. Em suma, cada direito traz consigo uma obrigação, e penso que, a obrigação em respeitar um direito inato alheio, não é faculdade somente das instituições locais, pelo contrário, pressupõe a própria moralidade dos indivíduos, em saber distinguir os axiomas do certo e o errado e o justo do não justo. Vimos que todos estes “direitos de primeira geração”, são protegidos e garantidos por inúmeras declarações, protocolos e as respectivas constituições que dedicam as primeiras disposições a seu favor, simplesmente por serem frágeis à inobservância. Contudo, o ideal resultaria, se não existissem esforços para garanti-los, ou melhor, se a pessoa humana fosse inteiramente dotado de um espírito passivo, apto em aplicar da melhor forma possível as normas deontológicas do dever ser, em não prejudicar, discriminar e nem subjugar o seu próximo, mas como é hoje aceite, a sua natureza é, vingativa, cruel, e egoísta; foi neste sentido, que a teórica Judith Shklar, alcunhou o termo “liberalismo do medo”, que vive o mundo deste as décadas de 1940, ou seja, aqui temos um outro problema, aquele de que, não é a moral, o ingrediente dos direitos humanos mas sim o horror, ainda mais grave, a Declaração só existiu porque a tirania tinha invadido a Europa, da mesma forma que, a Declaração da Independência dos EUA, teve como causa o dilema entre colonizadores e colonizados, ou entre opressores e oprimidos, que justificou a Revolução Francesa. Embora a tendência natural é cuidar daqueles que nos estão próximos, a nossa família, a nossa comunidade, podemos ser muitas vezes indiferentes a todos os outros excluídos deste círculo, um exemplo claro disso, foi a escravatura, desde a Grécia antiga, em que aqueles que não possuíam dotes de sabedoria atribuída pelos Deuses, resumiriam a funções domésticas, para não dizer dos europeus quando comercializaram os homens negros, talvez por serem pretos de cabeça aos pés e terem nariz achatado que era quase impossível ter pena deles.

5.

A Visão Espiritualista Como já observei, não restam dúvidas, que antes de todas as leis estão as leis da natureza,

assim denominadas porque derivam unicamente da constituição do nosso ser, logo, as liberdades básicas assegurados não estão sujeitos à negociação política, nem tampouco ao cálculo realista dos interesses nacionais. Actualmente, costuma-se falar de uma doutrina, a que entende-se por doutrina espiritualista, para além da ética e a virtude na base dos direitos humanos. Esta nova, enfatiza que são leis transcendentais, quase de uma seita estóica, assim posso afirmar, de uma figura Divina que concede a pureza aos Homens e a lei máxima de que a felicidade começa desde o respeito e o reconhecimento pelo outro, como salienta os humanistas. Então põe-se o dilema de como conciliar a visão humanista com a religiosa? A religião desempenha um papel importante, quando é vista como uma fonte de coragem e ao mesmo tempo, a ideia ordenado de Deus ao pedir para que os Homens se amem, talvez não temos o direito em adorar a nossa espécie, mas protege-la sim, a partir de alguma Fé estabelecida. Mas não foi a Fé cristã que durante um milénio injuriou os seus fiéis? Então como, a religião pode ser considerada substancial na definição dos Direitos Humanos? A questão por si só é discutível, antes demais, porque a lógica de que são direitos sagrados, antecede a existência de qualquer doutrina religiosa, isto fora perceptível desde os escritos de Platão, e aqueles que rejeitaram a vida terrena por uma contemplação eterna, na filosofia platónica o dualismo entre o mundo sensível e o mundo inteligível, o primeiro corresponde ao mundo dos objectos, o segundo do bem e do belo, reservado somente àqueles virtuosos e seguidores de uma moral crucial, não é por acaso que mais tarde viera ser incorporado no pensamento cristão. Em oposição, afirmo que o próprio direito sagrado, para além do seu lado positivo visto acima, é de igual modo, peculiar, muitos dos atos de tortura, ou perseguições tiveram por base ideias sacras. Por seu turno, o humanismo da renascença veio conceder lugar de primazia no próprio ser humano, devolvendo-lhe a credibilidade que a religião lhe roubara durante anos.

6.

A Visão Humanista

A racionalidade, na forma de raison d’état do séc. XV, veio fundamentar que são direitos que não precisam ter por base, o sagrado, simplesmente por sermos seres pensantes, isto é, a nossa capacidade lógica em perceber a dor, o sofrimento, a crueldade de um outro como se fosse em nós, é esta a razão da ideia de justiça ao fim ao cabo. A nossa consciência, é a única que desempenha

esse papel, e não é por haver seres humanos “maus”, indiferentes à dor dos outros e que todos os outros, inevitavelmente comportam dessa forma. Penso que, Locke, e todos os seus companheiros liberais, tiveram uma certa razão ao concederem a liberdade às democracias, a igualdade aos indivíduos, e de fazerem tudo o aquilo que a lei permite, a escolha de abster ou não do mal é, objecto de cada um, e se um cidadão pudesse fazer o que a lei proíbe já não haveria liberdade porque os outros também teriam esse mesmo poder. Aqui reside o erro da Comunidade Internacional perante a Alemanha no final da Grande Guerra, por não terem criado leis que restringissem o nacionalismo da raça ariana, voltada ao extermínio dos judeus. Avaliei, e estou de acordo que, a origem dos Direitos Humanos não frui, e nem pode ser pensado em prol de uma superioridade ocidental, e não há motivo nenhum para que haja conflito na sua recepção nas diversas ordens internas. O caso americano, apesar de modelo por excelência aos olhos de Tocqueville, pela fama de liberdade alcançada, inumerável, são, os tratados e convenções por este não ratificados; não só, assim como, a adoção da pena capital pelo sistema judicial americano, léxico jurídico ilidido pela Amnistia Internacional, tendo em vista a privação da vida e a dignidade inerente à pessoa humana, manifestadas, em particular nas observações citados nos art. 3.º da DUDH e o art. 6.º da PIDCP. Daí dizer, que não podemos abordar este sector do Direito num sentido lato, na medida que, diferente dos outros sectores jurídicos, que lidam com objectos, digamos mais concretos, este, é suis generis em seu caso, ao lidar com o valor da pessoa humana enquanto conquista histórica que encontra a sua expressão no “Direito de ter direitos”. A Bíblia diz que Deus criou o seu reflexo para representar-lhe na Terra, não diferente temos a elaboração judaica, na voz de Hannah Arendt, que sustenta adicionalmente, que a vida é sagrada, mais sagrada que tudo no mundo; no entanto vimos que a proclamação da religião, não é na melhor dos casos a solução, uma vez que, o próprio catolicismo, ao par do islamismo, entre outros ensinamentos de culto são sujeitos responsáveis, pela fraqueza dos direitos humanos. Embora a laicização, fenómeno do Seiscentismo fecundado no individualismo-humanista, que poderia ser uma alternativa às lacunas por parte da religião, não fora também suficientemente eficaz na afirmação dos Direitos Humanos, como se pode ver, pelas profundas falhas, não só do nacionalismo emergente no século passado, assim como a vasta gama de diferenças que caracterizam o nosso mundo contemporâneo da interdependência crescente, onde as situações sociais, políticas e económicas contribuem constantemente para tornar os Homens supérfluos, sem um lugar no mundo: a raça, a língua, o grau de ensino, e o acesso a outros bens e serviços, são critérios que determinam por conseguinte o lugar, que um indivíduo pode ocupar.

7.

Conclusão Creio que, finalizando, cabe uma derradeira observação sobre a obra Human Rights as Po-

litics and Idolatry, a importância que concedeu ao meu entendimento acerca do tema, compreendendo assim os fracassos e sucessos do ramo jurídico humanitário; a parte de mérito, reside no facto mencionado pelo autor, apelando a não-aceitação da idolatria deste, provavelmente pela ideia de que aquilo que possui carga excessiva de contemplação, pode ser argumento da própria destruição. A meu ver a espontaneidade é importante nos Direitos Humanos, como salienta Will Kymlicka, “todo o direito visa, em última análise o Homem. Sendo os direitos de um vernáculo moral universalmente institucionalizados, devem então ser criadas as condições que permitem para que sejam validados.

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