Recinto Megalítico do Casal Leitão, Reguengo Grande, Lourinhã

August 12, 2017 | Autor: Simão Mateus | Categoria: Arqueología, Arte Rupestre, Megalitismo, Lourinhã
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ARQUEOLOGTA-~

r e s u m Breve estudo do conjunto megaiitico do Casal do Leitão (Reguengo Grande, Lourinha. Lisboa), que inclui um recinto funerário entretanto destruido pela actividade agricola. um menir com gravura antropornárfica e gravuras rupes-

Recinto Megalítico do Casal Leitão Reguengo Grande (Lourinhã)

tres. O conjunto foi provavelmente construido pelos habitantes do povoado da Columbeira, datado

av Calcolitico inicial,

por Isabel Mateus e Simão Mateus GEAL — Grui» de Etnologia e Arqueologia, Museu da Lourinha (Rua João Luis de Moura, 2530.157 Lourinhã(.

c have

palavras

Idade do Cobre; Megalitismo; Estattra-menir: Arquitectura funerária: Arte rupestre; Povoado.

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1 ntrodução

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Brief study cif the Casal do Leitão Megalithic set (Reguengo, Grande, Lourinhã, Lisboa), including a burial site which was rneanwhile destroyed hy farming, a M enhir hearing an

ano

anthropomorphic engraving rupestral engraviugs.

The set was probably bulit by the inhabitants of the Columbeira

habito:, from the initiai ChalcolithIc period.

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duas dezenas de menires e outros monólitos" (VIw o r d$

Copper age: Megalithism; Menhir Statue; Funerary architecture; Rup-estral are; Habiwt,

r é s u m Breve érude de l'ensemble rnegalithique du Casal do Leitão (Reguengo Grande, Lourinha', Lisbonne), qui inclut une enceinte funeraire entretemps détruite par I'activité agricole, un menhir avec une gracure anthropornorphique ez des gravuras rupestres. L'ensemble a éte probablernent caristruit par les occupants cie l'herbkiN de Columbeira, datant du Chalco ithique Initial. ['P

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Ãge do Cuivre; Mégalithisme: Sta.. tue-Menhir: Architecture funérai. re ;

aparecimento de monumentos funerários como dolmens ou grutas naturais e artificiais, tal como de sepulturas de cúpula (tholoi), fazem da Estremadura portuguesa uma região de grande importância no contexto do Neolítico e Calcolítico. No entanto, é pouco significativo o número de menires normalmente associados a este fenómeno cultural, Encontram-se menires e cromeleques em S. João das Lampas (Sintra), em que, de entre os "mais de

Art rupestre; Habitou_

e MARTINS 1979), apenas um é descrito como sendo decorado, e no complexo megalítico da Barreira e do Funchal, Sintra, com menires sem qualquer pintura ou simbologia esculpida, embora grande número possua cavidades que, nalguns casos, se apresentam aos pares e que MARTINS e MORGADINHO (1989) interpretam como figuração de olhos. Os monumentos funerários são frequentes em toda a Estremadura, tais como os monumentos megalíticos de Trigache e de A-da-Beja, em Odivelas (FERREIRA, LEISNER e FERRE/RA 1961), a anta da Toupeira, em Lousa (GUEDES 2006), as grutas de Cascais (Paço 1941), as grutas artificiais do Tojal de Vila Chã, em Carenque (HELENO 1933), o monumento da Bela Vista (MELLO et ai, 1961), os sepulcros de falsa cúpula e corredor como a i'holo.s. da Praia das Maçãs (LEISNER, ZEWSZEWSKI e FERREIRA 1969), a tholos da Titilaria (CARDOSO et ai. 1996), a Cholos do Barro (TRINDADE e FERREIRA 1963), ou a Motos de Paimogo (GALLAY, SPINDLER e FERREIRA 1973). Os povoados fortificados tem, também, enorme significado na Estremadura. Parede (SERRÃo 1983) e Leceia (CARDoso 1989), ambos no concelho de Oeiras, Oleias (GONÇALVES 1997) e Penha Verde (CARDOSO et ai.1993), no concelho de Sintra, Penedo do Lexim (SousA et al. 2004), em Mafra, Pedra de Outro

(BARnosA 1956), no concelho de Alenquer, Zambujal (SCHUBART 1995) e Fórnea (GONÇALVES 1995), no concelho de Torres Vedras, Vila Nova de S. Pedro (SAVORY 1970), no concelho de Santarém, Pragança (GONÇALVES 1997), no concelho do Cadaval, Outeiro da Assenta (SANTOS 1972), no concelho de Óbidos, o povoado do Paço, nos limites dos concelhos de Peniche e da Lourinhã (SÁ e CI-IÉNEY 2007), S. Mamede (CARDoso e CARREIRA 2003) e Columbeira (ScHLIBART, FF.RRE/RA e MONTELRO 1969), no concelho do Btrnbarral, entre outros.

CENTE

C_

Descoberta Em 1981, Horácio Mateus descobriu uni bloco de arenito que tinha figuras gravadas e servia de suporte a cabana de caniços (Phragmites australis) para abrigo dos agricultores e típica desta região. Durante esse ano e em prospecção de superficie de toda a zona, foi descoberta uma área de enterramento com dentes humanos e centenas de pequenos fragmentos de osso e de cerâmica e, em 1984, encontrou-se um ídolo cilíndrico, de calcário. Em Maio de 1990 e a uns duzentos metros de distância, para Nordeste, identificaram-se gravuras rupestres que, atendendo á localização, se consideram como fazendo parte do mesmo conjunto. Em 1994, fomos alertados para a destruição da cabana a que o men ir dava suporte e, ao mesmo tempo, lhe dava abrigo, Quando o fomos escavar, o menir já estava meio deitado, com apenas parte da base enterrada. Procurámos o antigo rendeiro daqueles terrenos, que nos contou que a área era coberta por vegetação tipo mato, com urze, tojo, giesta e outras plantas. No desbravar do terreno, que decorreu nos anos 40 do

I, I TRO DE APIQUEOLDGIA

al madan -

1 ALMADA

ISSN 0871-066X IF Série (16)I Dezembro 2008

século XX, encontraram uma "ruína em pedra de firma circular e com um corredor, como se fbssem umas ruínas- de moinho", Corno "encontraram ossos no interior destas ruínas'', trataram de destruir tudo o mais rapidamente possível porque, se "de Lisboa soubessem de alguma coisa, já não seria permitido o plantio do pomar", Instado para nos fornecer mais pormenores sobre estas ruínas, acabou por informar que havia também vasos de cerâmica, que ele denominou de "cacos", Em relação ao menir, informou-nos que este foi encontrado a cerca de 50 metros para Sul, e transportado para ser reutilizado como suporte da cabana.

Enquadramento geográfico, geológico e arqueológico

O Casal Leitão situa-se no planalto das Cesaredas, entre a margem esquerda do Rio Real e o Vale de S. Bartolomeu, a 1500 metros a Leste do Reguengo Grande, freguesia do concelho da Lourinhã, perto da estrada que liga o Reguengo Grande à Columbeira, em terreno ocupado por pomar, vinha e culturas sazonais. Separa-o do povoado da Columbcira e da localidade de Azambujeira dos Carros o vale da ribeira do Roto, subafluente da ribeira da Zanibujcira, um dos afluentes do Rio Real. As coordenadas geográficas UTM são 29SMD825487. Encontra-se à cota de l 72 metros, em terreno de argilas aráveis, possuindo pe-

quenos afloramentos de marga rnicácea e arenitos, esporadicamente fossiliferos, com oxidação amarelo-acastanhada, pertencentes às camadas da Abadia e ao Lusitaniano Superior (ZsyszEwsKi et ai, 1966). O recinto megalítico localiza-se na bordadura calcária meridional do vale tifónico de ()Mos, no topo da encosta, sobre a curva que marca o começo do desnivelamento para o Vale do Roto e a zona cai-sica onde se encontram as Grutas da Colurnbeira. A paisagem é ampla, abrangendo o vale de übidos e a dobra antielinal da serra de Montejunto, a Nascente. Podem observar-se Azambujeira dos Carros, o Sobral da Lagoa e, em dias límpidos, o Sítio da Nazaré. Está inserido numa região de grande riqueza arqueológica que, num circulo com raio medindo cerca de 20 km, inclui, a Norte, a Casa da Moura (CARRELRA e CARDOSO 2002), no concelho de Óbidos, a Noroeste, a gruta da Fuminha, em Peniche (DFIGAno 1880), ambas com carácter funerário, abrangendo largo período que, passando pelo Calcolítico atinge a Idade do Bronze. Num raio de dez quilómetros encontram-se a Lapa do Suão (CORTES et ai. 1977) e a Lapa Furada (CARREIRA e CARDoso 1992), que apresentaram colec95es do Calcolítico, e, a Sul, a gruta da Feteira, que foi local de enterramento do Neolítico (ZILHAID 1984), A construção de thoioi e de povoados fortificados coincidindo com o inicio do Calcolitico, manteve-se com as práticas de inumação em grutas. Assim, a camada 1 c a camada 3 da necrópole neolítica da gruta da Feteira estão datadas, respectivamente, de 2889 a 2494 a.C. e 3510 a 3042 a.C., enquanto o povoado do Lambujai, com espólio do Calcolitico, foi datado de 3010 a 2470 a.C. (ZiLuko 1995).

Figuras 1 e 2

1AEll

esquerda, fotografia do rnemr a sentir de suporte ao abrigo de caniços, quando foi descoberto por I-Iofácio Mateus, em 1981 Em cima. Corta Geohigng de Portugal, Notícia Explicativa da Folha 30-B. Bombarral, onde se encontra situado o Casal Leitão

ARQUEOLOGIA 111~

IlleiFigura 3 ■110. O megalitisrno na região da Estremadura portuguesa. Menires, thola .e povoados fortificados da Estremadura portuguesa existentes num raio de dez e 20 quilómetros, tendo como [entro o Casal leitão,

Os povoados do Paço, do Outeiro de S. Mamede e da Colurnbeira estão distribuídos num raio de dez quilómetros, e os povoados do Outeiro da Assenta, Pragança e Vila Nova de S. Pedro estão incluídos no circulo de acção com 20 quilómetros de raio, O conjunto arqueológico em estudo é composto por um espaço funerário, um menir e rochas gravadas.

Men ir Um menir é um monumento constituído por um único monólito, cravado verticalmente no solo e com dimensões muito variáveis. Apresenta-se isolado na paisagem ou em conjunto com outros menires, podendo formar alinhamentos e cromeleques, E, também, vulgar a utilização de espaços em que "a coexistência de ~ires — pedras levantadas, com menires naturais afeiçoados surge esporadicamente" (SOUSA 1998: 150). É possível que estes conjuntos de menires e pseudo-menires tivessem um significado especial, como a escultura de temas sagrados, a organização de espaços, pontos de reunião ou manifestações ritualizantes. Farinha dos SANTOS (1972: 55 e 57) designa o menir como "um bloco desbastado que apresenta configuração aproximada à de um obelisco' dizendo, logo de seguida, que "há menires que reproduzem o símbolo fálico da fecundidade". A falta de artefactos que acompanhem, a maior parte das vezes, estes monumentos, não permite uma datação correcta ou a compreensão dos factos que levaram à sua construção. Segundo a listagem feita por VICENTE e MARTINS (1979), os menires portugueses foram feitos com o material local. A matéria-prima utilizada foi o granito, o calcário, o basalto e, no menir da Cumeada (S. Bartolomeu de Messines), o grés. No Algarve, a maioria dos menires é em calcário branco. No entanto, no concelho de Vila do Bispo e no concelho de Silves conhecem-se menires afeiçoados sobre arenito vermelho, o "grés de Silves", sendo o de Abrutiais um monólito com 3,10 metros de altura (Golvms 1997). Na Cantábria, os menires são quase todos em arenito proveniente do local onde foram inseridos (CALADO 2006). Também o menir do Casal Leitão foi afeiçoado sobre um bloco de arenito, quartzítico, proveniente de pequeno afloramento local não cartografado.

O menir do Casal Leitão é um monólito cilindro-cónico que, aquando da descoberta, se encontrava em posição vertical, medindo 144 cm acima do solo, com o anverso (a parte mais trabalhada) virado para Nascente. O comprimento total é de 213 cm e o perímetro máximo tem 170 cm, medidos na base. Segundo a tipologia definida por Prescott Vil:ENTE e Silveira MARTINS (1979), classificamos este menir, quanto à forma, no grupo VI — cilindro-cónico. Quanto á decoração, não se enquadra em nenhum dos tipos propostos por estes autores, Está afeiçoado como falo, com o topo em ponta, que interpretamos como um corpo e glande, separados por sulco profundo e bem demarcado. O corpo do alegado falo foi decorado com uma representação antropomórfica e covinhas. O anverso apresenta, na parte superior, quatro traços horizontais, quase paralelos entre si, formando dois pares distintos, e dois traços subverticais que se vão unir sobre a parte central do que é interpretado coma a prega da glande. O corpo fálico está gravado com um circulo em traço inciso, representando cara com duas covinhas, os olhos, e uma covinha maior desenhando a boca. O nariz é representado com traços incisos verticais e uma pequena cova que faz de narina. Logo a seguir à face, partem duas linhas, levemente encurvadas, de 70 em de comprimento, que desenham o resto do corpo. Não apresenta pescoço nem membros superiores e inferiores. Não oferece escudo, armas ou colar. O reverso está insculpido com diversas covinhas e, na glande, apresenta dois traços incisos, quase horizontais, que se curvam suavemente nas pontas e, logo acima, dois traços oblíquos conjugados.

CENTRO DE ARQUEOLOGIA

DE

ALHADA

SSN 087 1 -066X Ì IP Série ( 16) j Dezembro 2008

Figura 471.111 Fotografia do menir e ilustração do reverso e anverso do mesmo.

As gravuras têm patina semelhante à da superfície do menir. Durante a escavação a que se procedeu em 1994, não se encontrou qualquer artefacto que nos pudesse auxiliar, nem a camada inicial em que deveria estar implantado o menir com a respectiva estrutura de sustentação, como, por exemplo, no Menir das Cegonhas, de [lanha-a-Nova (Canoso ei ai. 1995), confirmando-se não se encontrar in O terreno foi prospectado e localizado, a cerca de 50 rn para Sul, o recinto de onde era proveniente, segundo o agricultor que amanhava aqueles terrenos. Neste local existem outros blocos dispostos verticalmente, aparentemente sem qualquer afeiçoamento, O menir está, actualmente, em exposição no Museu da Lourinhá.

Recinto funerário

O recinto funerário está totalmente destruido. Para o podermos definir temos, apenas, a descrição feita pelo agricultor que cultivou a terra na década de 40, como "um recinto circular, como se fisse uma eira OU um moinho, com um muro . felto de pedras e um corredor..."

Não restando estruturas visíveis, os elementos de que dispomos não são suficientes para definirmos este monumento. Poderemos estar perante uma 'halos à semelhança cia medos de Pai mago, mas a destruição da estrutura não permite qualquer estudo. No recinto funerário lbram encontrados uma ponta de seta, esquírolas ósseas, pequenos fragmentos de cerâmica e dentes humanos. Numa das últimas prospecções, feita em 1996, foram recolhidos: —Dentes humanos: três dentes incisivos decíduos, um incisivo, um pré-molar c um molar de adulto jovem; • Uma falange e cerca de unia centena de esquirolas ósseas; —Unia lasca de sílex. No caderno de campo de 1990, foram registados os seguintes dados sobre a ponta de seta: -ponta em sílex-, sobre lâmina, de base crincava não peclunca'tida, de bordos rectilíneos e talhe bilácial". Na altu-

ra, não foi fotografada nem desenhada.

Segundo fomos informados pela direcção do Museu da Lourinhk os ossos, esquírolas, dentes, cerâmica e a referida ponta de seta depositados naquela instituição, foram perdidos durante as cheias de Dezembro de 2006. Gravu ras rupestres

A 200 metros para Nordeste do recinto funerário, encontrou-se um grupo de rochas margosas, algumas delas gravadas. À volta foram amontoadas outras pedras resultantes da limpeza do terreno, Num dos blocos observa-se composição, com uma mão e antebraço, uni círculo excêntrico cortado por dois traços verdeais, e um triângulo. A mão, de dedos abertos, tem desenhada a unha do polegar. Por baixo do polegar encontra-se uma covinha. O antebraço é terminado por um traço oblíquo. Alguns centímetros abaixo, encontra-se um círculo e, saindo do seu interior, dois traços subverticais. Esta gravura pode ter duas interpretações: a representação de uma cabeça, ou de um templo ou recinto funerário. No interior não há figuração de olhos, boca ou nariz. Em vez disso, esboçam-se dois triângulos e algumas linhas. Ao lado da cabeça ou recinto foram gravados dois triângulos concêntricos com um lado em comum, que interpretamos como triângulo púbico, dando identidade sexual ao conjunto, Num outro bloco está gravado um círculo incompleto, com dois traços que partem da sua base. No interior, foram insculpidas sete covinhas, uma central e as outras seis mais ou menos equidistantes. Num dos lados do semicírculo há três linhas curvas que terminam numa excrescência. Os outros blocos apresentam covinhas, não nos sendo possível correlaciona-Ias umas com as outras. Foi utilizada a incisão obtida através de objecto duro na execução das gravuras.

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Gravuras rupestres. Em cirna, mão e circulo quase completo. com duas rectas sectantes e triângulos. Em baixo, semicírculo e sete covinhas no interior.

ARQUEOLOGIA

Ídolo calcário

Figura 7 4 :~111011~1~11 ¡dolo do Casal Leitão em calcária liso esquerda) e comparação com trás dos ídolos de 5. Mamede atireita),

Na prospecção de superfície de 1984, foi encontrado um cilindro de calcário branco, macio, não proveniente da região. É um cilindro imperfeito, com os topos ligeiramente arredondados, e mede 8 cm de altura e 7,5 cm de diâmetro máximo. O topo apresenta levantamentos que fazem com que termine em ponta pouco acentuada. Mostra diversas fracturas acidentais que, pela oxidação da rocha, se percebe terem ocorrido em tempos diferentes. Este cilindro é totalmente liso, semelhante aos que foram encontrados na Gruta da Casa da Moura (CARREIRA e CARIDOSO 2002), ou em Leceia. Mais pequeno e robusto que os da tholos de Paimogo (GALLAY et ai. 1973) e das grutas do Poço Velho ou de Cascais (Paço 1941). É bastante semelhante, em tamanho, aos cilindros lisos encontrados no povoado de 5. Mamede, embora nenhum deles apresente o levantamento em bico do topo. Pelo contrário, um destes cilindros apresenta uma concavidade no topo com várias covinhas. Em S. Mamede, apesar das tipologias do espólio mais determinante serem do Calcolitico pleno, há, no entanto, cerâmica que aponta para ocupação no Calcolitico inicial e até um vaso de bordo denteado, característico do Neolítico final (CARDOSO e CAIBA 2003). No povoado da Columbeira não foram encontrados, até agora, quaisquer ídolos,

5 Lir, 1i~

Considerações finais O conjunto megalítico do Casal Leitão apresenta semelhanças com outros monumentos do mesmo tipo, designadamente, na relação entre recintos megalíticos e a paisagem envolvente: - Implantação junto ao topo de uma encosta virada a Nascente, como no monumento do Tojal e analogamente aos menires da Bretanha; — Situação no local de melhor panorâmica do planalto e de onde se avistam outros sítios arqueológicos, como se referencia em Lousa (GUEDES 2006). O menir, grosseiramente desbastado, parece reproduzir um símbolo fálico, usando um arenito pro-

veniente de afloramento local. As gravuras foram feitas em linhas incisivas simples, com motivos antropomórficos. Não estava ire situ e não foram encontradas cerâmicas nem outro mobiliário, além do Moto, que nos ajudem a datar esta peça. As gravuras muito simples, sem grandes cuidados estéticos, e a técnica utilizada não nos permitem colocá-lo em nenhumas das fases do megalitisino. No afloramento a 200 m, as gravuras rupestres com o triângulo, braço e mão, poderão ser componentes da simbólica do princípio feminino da deusa-mãe, como é referido por Victor GONÇALVES (1989) em relação às placas de xisto. A tipologia das gravuras é semelhante às do menir, o que faz supor que foram feitos com a mesma técnica e que seriam da mesma idade. O ídolo foi produzido em calcário não existente na região, à semelhança dos ídolos de Leceia, o que nos pode remeter para a integração do recinto no Calcolitico (Coso l989). A semelhança é grande, no tamanho, material utilizado e estética, com dois dos ídolos calcários do povoado de S. Mamede, situado a poucos quilómetros deste recinto. As armaduras de flecha surgem no Mesolitico e desenvolvem-se com o aparecimento de grupos sociais construtores de povoados fortificados. São armas com maior poder de penetração, utilizadas na caça de grandes peças ou para combater outros homens. São patentes nos povoados e locais funerárias de enterramento colectivo, com grande variedade de formas. As pontas de seta de base côncava, como a que foi encontrada no recinto funerário, surgem no Neolítico e têm uma grande incidência no Calcolitico. A proximidade do menir, do recinto funerário e das figuras rupestres adquire, aqui, um significado especial. Evidencia-se a relação do sagrado 5 mi transmitido através do símbolo fálico do menir, a simbologia do feminino das gravuras rupestres e o local de enterramento: o culto, a fecundidade, a vida além da morte. A relação do recinto megalítico com a paisagem é realçada com a implantação no topo da encosta virada a Nascente, sobre o vale da ribeira do Roto e em frente ao povoado da Columbeira, que oferece material do Calcolitico inicial. Os habitantes eram construtores de tholoi. A sequência de ocupação das tholoi era, frequentemente, feita num primeiro contexto do Calcolitico inicial / médio. A proximidade do recinto megalítico com o povoado da Columbeini aponta para uma grande probabilidade de serem os habitantes daquele os seus construtores. Tanto a tipologia da ponta de seta como do ídolo aponta para uma coincidên-

CENTRO DE ARQUEOLOGIA DE ALmADA

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cia com o nível cultural da Columbeira, Por isso, e apesar de um espólio tão pobre, somos levados a crer que estamos perante um conjunto integrado na cultura do Calcolitico inicial a que pertence aquele povoado (GoNçALvEs 1994). "4 convivência de rochas talhadas com outras naturais parece constituir uma especificidade da área..." (SOUSA 1998: 150), Podendo haver a asso-

ciação de rochas talhadas com outras naturais seria, talvez, enriquecedor se, integradas em futuros estudos do povoado da Columbeira, se efectuassem escavações do local onde se encontrava inicialmente o menir e onde se observam, ainda, diversas rochas, algumas dispostas ve rt icalmente. Seria também interessante integrar esses trabalhos com o estudo da linha de costa e a estratigrafia do Holocénico no vale

do rio Real e da ribeira da Zarnbujeira, à semelhança

do que foi feito no rio Sizandro para o povoado do e Sei l uz 1995). k,

Zarnbtljai (HOFFMANN

Agradecimentos Agradeço a Harácia Mateus pelo companheirismo e aventura na descoberta e estudo do recinto megalítico do Casal Leitão, a Otiávio Mateus pela revisão do trabalho e incentivo, a Marta Mateus que nos acompanhou em tantas andanças, a Mário Varela Gomes, João Ludgero Gonçalves, Cláudia Manso e Cláudia Silva, sempre disponíveis quando lhes solicitamos apoio ou discutimos alguns pontos de vista relacionados com o trabalho, a Otília Correia e Alexandra Ferreira pela simpatia e disponibilidade com que nos receberam no Museu do Bombarral, ao Museu da Lourinhá pela autorização de estudo do menir e do ídolo, ao Museu Municipal do Bombarral pela disponibilidade e apoio na cedência dc bibliografia e material de estudo.

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