Recursos Extraordinário e Especial Repetitivos no CPC/2015: uso e interpretação de acordo com o modelo constitucional de processo

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2016 - 09 - 19

Revista de Processo 2016

REPRO VOL. 258 (AGOSTO 2016) MEIOS DE IMPUGNAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS 1. RECURSOS EXTRAORDINÁRIO E ESPECIAL REPETITIVOS NO CPC/2015: USO E INTERPRETAÇÃO DE ACORDO COM O MODELO CONSTITUCIONAL DE PROCESSO

Meios de Impugnação das Decisões Judiciais 1. Recursos extraordinário e especial repetitivos no CPC/2015: uso e interpretação de acordo com o modelo constitucional de processo Extraordinary and special repetitive appeals in brazilian Civil Procedure Code: use and interpretation according the constitutional process model (Autores) ALEXANDRE MELO FRANCO DE MORAES BAHIA Mestre e Doutor em Direito – UFMG. Professor Adjunto na UFOP e IBMEC-BH. Advogado. [email protected] PAULA VALÉRIO HENRIQUES Advogada. [email protected] Sumário: 1 Introdução 2 A crise no sistema judiciário e o aumento da litigiosidade 2.1 O problema da litigiosidade em massa 3 O não suprimento das demandas, o abarrotamento do sistema judiciário reformas do recurso extraordinário e especial repetitivos 3.1 A técnica de “pinçamento” no julgamento dos recursos extraordinário e especial repetitivos 3.2 O julgamento por amostragem no Código de Processo Civil de 1973 e seus problemas 3.3 O julgamento dos recursos extraordinário e especial repetitivos no Novo Código de Processo Civil em comparação com o CPC de 1973: busca pelo aperfeiçoamento do sistema 3.3.1 Maior influência e autonomia por parte dos tribunais superiores na escolha dos processos representativos da controvérsia e no seu julgamento 3.3.2 A seleção de recursos com argumentação abrangente e a melhor fundamentação das decisões 3.3.3 A decisão de afetação 3.3.4 Ampliação do debate e a produção de decisões fundamentadas – art. 1.038 3.3.5 Maior poder de intervenção dos litigantes 3.3.6 Decisão dos recursos afetados e publicação do acórdão paradigma 4 Conclusão 5 Referências Bibliográficas Área do Direito: Constitucional Resumo: O presente artigo tem por objetivo analisar os recursos extraordinários e especiais repetitivos e sua aplicação de acordo o modelo constitucional de processo. Através da EC 45/2004 e das Leis 11.418/2006 e 11.672/2008 foi inserido dispositivo no CPC/1973 o método de julgamento por amostragem dos recursos extraordinário e especial repetitivos. A Lei 13.105/2015, que institui o novo Código de Processo Civil e entrou em vigor em março de 2016, altera a sistemática de julgamento, melhorando o sistema, em acordo com uma renovada concepção de contraditório e de fundamentação das decisões. Com o presente trabalho, examinaremos como se dá tal método de “pinçamento” e sua utilização de acordo com o modelo constitucional de processo, bem como comparar a forma que era feito no CPC/1973 e como será no CPC/2015.

Abstract: This article aims to analyze the extraordinary and special repetitive appeals and its use according to the constitutional process model. Through Constitutional Amendment 45/2004 and Statutes 11.418/2006 and 11.672/2008 was inserted in the 1973 Brazilian Civil Procedure Code a new form of judgment by sampling of repetitive extraordinary and special appeals. The 13.105/2015 Statute, that approves the new Brazilian Civil Procedure Code, from March 2016, changes the form of judgment, improving the system, in accordance with a new conception of contradictory and reasoning of court decisions. With this study, we will examine the method of “random selection” and its use in accordance with the constitutional process model and compare differences between 1973 Brazilian Civil Procedure Code and 2015 Brazilian Civil Procedure Code. Palavra Chave: Código de Processo Civil - Modelo constitucional de processo - Recursos extraordinários e especiais repetitivos - Método de “pinçamento” - Litigiosidade em massa. Keywords: Civil Procedure Code - Constitutional process model - Extraordinary and special repetitive appeals - “Random selection” technique - Mass litigation. 1. Introdução O presente trabalho visa debater a aplicação do processo civil de acordo com o modelo constitucional de processo, de forma mais específica no que tange aos recursos extraordinários e especiais repetitivos. Para tanto, analisaremos as reformas pelas quais passou o direito processual civil brasileiro, no que refere a este assunto, com o advento da Emenda Constitucional – EC 45/04, bem como com a análise comparativa entre o Código de Processo Civil de 1973 e o Código de Processo Civil de 2015, que entrou em vigor em março deste ano. A Constituição Federal de 1988 trouxe consigo garantias fundamentais ao cidadão. Dentre elas destacamos os princípios do acesso à justiça, do devido processo legal, do contraditório, da ampla defesa e da razoável duração do processo. E o direito processual brasileiro passou, com o advento da CF/1988, a ser regido pelas regras e princípios constitucionais. A mudança operada pela Constituição forma o que é chamado de “modelo constitucional do processo”, isto é, o processo é formado por direitos e garantias de fundamento constitucional que são de observância obrigatória em todos os procedimentos. Entre tais principios, destaque para o contraditório substancial – como dever não apenas de “dizer e contradizer” ou de produzir provas, mas, também, das garantias de influência e de não surpresa –, de devido processo legal e de fundamentação substancial das decisões. Tais fundamentos, além de previsão constitucional, se encontram agora previstos no CPC/2015, tanto no núcleo principiológico que abre a lei (arts. 1.º a 12), como também espalhados por todo o Código, com destaque especial para o art. 489, §§ o e 2.º acima (THEODORO JÚNIOR; NUNES; BAHIA; PEDRON, 2015). Toda a sistemática dos precedentes, bem como do julgamento e definição de teses em recursos extraordinário e especial repetitivos, devem, portanto, ser lidos a partir desse modelo constitucional de processo. No presente artigo tratará a respeito das reformas pelas quais passou a legislação processual civil brasileira a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988. O legislador vem tentando amenizar o abarrotamento do sistema judiciário e, mais específicamente em relação aos tribunais superiores foi criado um mecanismo para lidar com as demandas repetitivas. Este método refere-se ao julgamento por amostragem dos recursos extraordinário e especial repetitivos, também conhecido como técnica de “pinçamento”. Discorreremos sobre como esse método foi inserido no sistema processual civil, com a EC 45/2004 e com as Leis 11.418/2006 e 11.672/2008, que inseriram esse dispositivo na Lei 5869/1973, bem como, de que maneira virá disposto na Lei 13.105/2015, já com as alterações feitas pela Lei 13.256/2016. Explicaremos em que consiste o julgamento por amostragem dos recursos extraordinário e especial repetitivos. Também será apresentado como era feito este procedimento no Código de Processo Civil de 1973 –

CPC/1973 e as omissões presentes no

ordenamento. E, por fim, passa-se para como será aplicado o método de “pinçamento” no Código de Processo Civil de 2015 – CPC/2015, que entrou em vigor este ano. 2. A crise no sistema judiciário e o aumento da litigiosidade O sistema judiciário brasileiro enfrenta uma crise de proporções enormes em relação à demora em se conseguir uma resposta jurisdicional referente ao que foi requisitado pelas partes litigantes. O que percebemos é que com o amplo acesso à justiça trazido pela Constituição da República de 1988, sem a devida renovação e evolução por parte do sistema judiciário, houve uma sobrecarga deste complexo com o grande aumento de litígios. Sendo assim, o sistema judiciário passou a preferir se mover apenas em função da rapidez, muitas vezes deixando à margem a eficiência qualitativa em seus atos. Com isto, o que passamos a ver é uma instituição frágil, abarrotada e com decisões mal fundamentadas. Por fim, é imperioso salientar que a assistência adequada por parte do judiciário não deve dar primazia apenas à celeridade. É preciso que sejam respeitados outros princípios além do da razoável duração do processo, como o do devido processo legal, abarcando ainda, o contraditório, a ampla defesa e a fundamentação das decisões. Apesar de ser de suma importância a promoção de respostas mais rápidas ao grande número de processos e recursos presentes nos tribunais, como um todo, não podemos nos esquecer do conteúdo “respostas” apresentadas. 2.1. O problema da litigiosidade em massa

A litigiosidade em massa é um problema mundial, tornando-se necessária a criação de dogmática e leis que lidem com as demandas repetitivas. Na tentativa de amenizar este impasse, o legislador brasileiro elaborou reformas na Constituição com a EC 45/2004 e no

Código de Processo Civil de 1973, que já se prolongam por quase vinte anos. Ao se tratar de tal tema, é necessário esclarecer que a litigiosidade em massa, ou demanda repetitiva, é aquela em que são propostas ações individuais/coletivas que se repetem às centenas/milhares através de lesões, ou ameaça de lesões, a direitos individuais/coletivos semelhantes e que apresentam questões similares em suas teses e resoluções. Indispensável expor, também, que em nosso ordenamento jurídico existem três tipos de litigiosidade: a individual, que se caracteriza por litígios que envolvem direitos individuais isolados; a coletiva, que se descreve por procedimentos coletivos por se tratarem de causas que envolvem direito coletivo, em sua maioria ações impetradas por associações ou pelo próprio Ministério Público; e a em massa, apresentada acima (THEODORO JÚNIOR; NUNES; BAHIA; PEDRON, 2015). Fato é que o legislador brasileiro preocupou-se ao longo dos anos apenas com as causas que envolviam litígios individuais isolados, com isso o Código de Processo Civil foi se tornando ineficiente na resolução de litígios em massa ou repetitivos que estão cada vez mais presentes no sistema judiciário contemporâneo. O direito processual (de cariz constitucional) realmente necessita fornecer resultados rápidos e práticos para os litígios como um todo, porém esta tutela deve ser prestada sem ferir os demais princípios garantidos pela Magna Carta de forma que assim possa haver uma resposta efetiva que contribua para a resolução dos litígios sem desprestigiar um princípio ao outro. 3. O não suprimento das demandas, o abarrotamento do sistema judiciário reformas do recurso extraordinário e especial repetitivos A busca por desafogar o sistema judiciário levou a uma série de mudanças da legislação processual brasileira como um todo. Em relação aos tribunais superiores, que se encontram cada vez mais inundados de recursos, principalmente no que tange às demandas repetitivas ou em massa, o Código de Processo Civil brasileiro de 2015 almeja solucionar tal problema, proporcionando um alívio para a instituição judiciária. Foram criados, desde há muito, mecanismos para filtragem dos recursos que chegam aos tribunais superiores, bem como para agilizar o julgamento dos mesmos, como o procedimento de “pinçamento”. Dentre as várias transformações, destacamos a EC 45, de 30 de dezembro de 2004; a Lei 11.418, de 19 de dezembro de 2006; a Lei 11.672, de 08 de maio de 2008; o Novo Código de Processo Civil, inserido pela Lei 13.105, de 16 de março de 2015; e por fim, a Lei 13.256, de 04 de fevereiro de 2016. A Emenda Constitucional – EC 45/2004, introduziu o art. 102, § 3.º na Constituição da República de 1988. Este restringe o cabimento do recurso extraordinário apenas para os casos em que seja demonstrada a repercussão geral das questões constitucionais. Para regulamentar o parágrafo 3.º do art.

102 da

CF/1988, foi aprovada a Lei 11.418/2006, que inseriu

os arts. 543-A e 543-B no CPC/1973. Estes artigos tratam, especificamente, da repercussão geral no recurso extraordinário e dos recursos extraordinários repetitivos, impetrados perante o Supremo Tribunal Federal – STF. Em maio de 2008 foi aprovada a Lei 11.672 que acrescentou o art. 543-C ao CPC/1973. Este artigo aborda, exclusivamente, dos recursos especiais repetitivos impetrados perante o Superior Tribunal de Justiça – STJ. Finalmente, a Lei 13.105/2015 promulgou o Novo Código de Processo Civil, que entrou em vigor em 2016, alterado pela Lei 13.256/2016. Referente ao julgamento dos recursos extraordinário e especial repetitivo o novo ordenamento trouxe consigo os arts. 1.035 a 1.041, e esta revogou o II do § 3.º do art. 1.035, reformulou o § 7.º do art. 1.035, revogou o § 10 do art. 1.035, reformulou o § 3.º do art. 1.036, revogou o § 5.º do art. 1.037, reformulou o § 3.º do art. 1.038 e § 2.º do art. 1.041. Após a apresentação das reformas que ocorreram em relação ao julgamento das demandas repetitivas nos recursos extraordinário e especial, movemo-nos para a análise do método trazido por essas mudanças. 3.1. A técnica de “pinçamento” no julgamento dos recursos extraordinário e especial repetitivos

Frisamos que os arts. 543-B e 543-C do CPC/1973 e os arts. 1.035 a 1041 do CPC/2015 expostos, apresentam em seu conteúdo a técnica de julgamento dos recursos extraordinário e especial repetitivos, conhecida como “pinçamento”, ou julgamento por amostragem. Esta é também chamada de “causas piloto” ou “processo teste” (THEODORO JÚNIOR; BAHIA; NUNES, 2009, p. 22-36). Este método consiste, havendo múltiplas causas idênticas, na escolha de um ou mais recursos como representativos da controvérsia para serem julgados, procedendo com o sobrestamento do restante. Assim, o que for determinado no julgamento destas causas “pinçadas” será aplicado às demais, bem como às causas futuras sobre a mesma matéria. Um exemplo foi o julgamento do REsp 1.388.030/MG: “RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. SEGURODPVAT. TERMO INICIAL DA PRESCRIÇÃO. CIÊNCIA INEQUÍVOCA DO CARÁTER PERMANENTE DA INVALIDEZ NECESSIDADE DE LAUDO MÉDICO. 1. Para fins do art.

543-C do

CPC:

1.1. O termo inicial do prazo prescricional, na ação de indenização, é a data em que o segurado teve ciência inequívoca do caráter permanente da invalidez. 1.2. Exceto nos casos de invalidez permanente notória, a ciência inequívoca do caráter permanente da invalidez depende de laudo médico, sendo relativa a presunção de ciência. 2. Caso concreto: Inocorrência de prescrição, não obstante a apresentação de laudo elaborado quatro anos após o acidente.

3. RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO (STJ, 2ª Seção, Rel. Min. Paulo de Tarso Senseverino, DJe. 01.08.2014).” O caso acima trata do julgamento de uma demanda representativa da controvérsia, em que é discutido o termo inicial do prazo de prescrição na ação de indenização, nos casos de invalidez permanente da vítima. Assim, após análise do caso, o STJ consolidou o entendimento de que o termo inicial do prazo prescricional em tais ações será a data em que o segurado teve ciência inequívoca do caráter permanente da invalidez, dependendo de laudo médico, caso não seja notória a mesma. A decisão proferida pelo STJ coincidiu com o acórdão recorrido, sendo, portanto, adotado o que dispunha o artigo 543-C § 7.º, I do CPC/1973. Dessa forma, aplicou-se a todos os demais recursos sobrestados na origem o entendimento firmado pelo tribunal superior, que tiveram seguimento denegado neste caso. Apesar do método de “pinçamento” ser muito defendido, em razão do aumento da celeridade da prestação jurisdicional (e.g. REIS; SERAU JÚNIOR, 2009), é preciso que tal procedimento seja visto de forma crítica. 3.2. O julgamento por amostragem no Código de Processo Civil de 1973 e seus problemas

No Código de Processo Civil de 1973, a técnica de “pinçamento” de recursos extraordinário e especial se encontrava em artigos separados (art.543-B e 543-C), sendo que o primeiro regulava a apreciação da repercussão geral nos recursos extraordinários e o segundo disciplinava exclusivamente o recurso especial repetitivo. O procedimento de ambos se dava basicamente da seguinte forma: o tribunal de origem, na ocorrência de diversos recursos abordando a mesma temática, selecionava um ou mais destes requerimentos como representativos da controvérsia. A partir de então, estes recursos “pinçados” eram enviados ao tribunal superior. Os demais recursos, “não escolhidos”, eram sobrestados na origem até o julgamento por parte do tribunal a quem. Além disso, o julgamento dos recursos selecionados seria aplicado a todos os que foram sobrestados, bem como aos futuros sobre a mesma matéria. Pois bem, o procedimento de “processo teste” se tornou uma forma de criar certo obstáculo de acesso à justiça ampla, já que limitava o número de recursos que iria ser apreciados pelos tribunais superiores. Ressaltamos também que houve uma ampliação dos poderes por parte do tribunal de origem que passou a delimitar quais recursos, e sendo assim, quais temas seriam apreciados pelo tribunal superior – no fim das contas era o tribunal de origem quem delimitava para o tribunal superior quais temas ele iria tratar. Esse método, no

CPC/1973 gerava certas dúvidas no que refere ao respeito ao modelo constitucional de processo.

Primeiramente, devemos questionar como era feita a escolha destes “processos teste”. A partir do momento em que o julgamento do recurso representativo da controvérsia afeta todos os demais sobrestados, a seleção precisa ser minuciosa, para que seja “pinçado” um processo bem estruturado e com uma argumentação vasta que abarque a questão requerida de forma eficiente. No entanto por não exercer uma técnica de escolha clara e específica, sempre há o risco de que se selecione um processo mal arrazoado, afetando todos os demais litigantes (THEODORO JÚNIOR; NUNES; BAHIA, 2009). Destacamos, também, que muitas vezes os recorrentes que tiveram seus recursos sobrestados tentavam retirá-los de tal situação para que fossem julgados, se valendo, inicialmente, de Agravo de Instrumento perante o tribunal superior. Porém, o entendimento do STF se firmou no sentido de que seria cabível, na verdade, Agravo Regimental na origem, o qual, na maioria das vezes era negado (THEODORO JÚNIOR; NUNES; BAHIA; PEDRON, 2015). Percebemos que havia um explícito descumprimento do contraditório e da ampla defesa. Afinal, nos recursos que sofreram o sobrestamento as partes litigantes não tinham o direito de participar ativamente na formação da decisão dos tribunais superiores e muito menos a possibilidade de retirar seu recurso do sobrestamento – exceto pela remota possibilidade de provimento de agravo regimental no próprio tribunal que determinava o sobrestamento. Assim, os recorrentes que não tiveram suas teses escolhidas acabam por ser tolhidos em seus direitos fundamentais, não tendo a chance de atuarem em um processo cujo resultado é de total interesse dos mesmos e nem de se oporem ao sobrestamento dos seus recursos. Ademais, o sistema judiciário não pode se pautar apenas no fato de que com a obstrução de acesso aos recursos ocorreria uma diminuição no número de processos a serem julgados. Principalmente porque o fato de ter menos processos não garante que o julgamento se torne qualitativamente melhor e mais adequado ao modelo constitucional de processo. 3.3. O julgamento dos recursos extraordinário e especial repetitivos no Novo Código de Processo Civil em comparação com o CPC de 1973: busca pelo aperfeiçoamento do sistema

O Novo Código de Processo Civil, através da Lei 13.105/2015 trata da escolha e do julgamento dos recursos repetitivos nos arts. 1.036 a 1.041 (além disso, mecanismo similar de “pinçamento” também está presente no art. 1.035, sobre a repercussão geral). Abrangendo-os em uma mesma disposição o ordenamento vigente traz algumas mudanças importantes, visando uma evolução no sistema processual brasileiro. O novo CPC tem como meta uma utilização mais ativa e eficiente dos direitos fundamentais do cidadão. Para isto, o atual ordenamento nos oferece um sistema “comparticipativo/cooperativo” (THEODORO JÚNIOR; NUNES; BAHIA; PEDRON, 2015), no qual todas as partes do processo atuam na formação da decisão, detendo ampla supervisão e comprometimento com o procedimento, bem como com seu resultado – arts. 7.º a 10 e 489, 1.º. No que concerne a este trabalho, ocorreram algumas mudanças significativas em relação aos recursos extraordinário e especial repetitivos, que se aplicadas de forma perspicaz pelos órgãos julgadores poderão resultar em um retorno positivo, tanto para as partes quanto para desafogar os tribunais superiores. O método de pinçamento dos recursos extraordinários e especiais continua no

regulamento vigente. Porém devemos nos atentar para alguns adicionais e alterações importantes advindas. 3.3.1. Maior influência e autonomia por parte dos tribunais superiores na escolha dos processos representativos da controvérsia e no seu julgamento

Apesar de no CPC/2015 a escolha dos recursos representativos da controvérsia, a princípio, ainda ser tarefa dos tribunais de origem, esta apuração não é definitiva. Agora, o relator do tribunal ad quem não precisa acatar os recursos que lhe são entregues, podendo refutá-los e escolher outros que mais lhe aprouver (ou somá-los àqueles). Além disso, o relator do tribunal superior precisa confirmar a escolha feita pelo tribunal a quo por meio de “decisão de afetação”, presente no artigo 1.037 do CPC/2015 (THEODORO JÚNIOR; NUNES; BAHIA; PEDRON, 2015, p. 372). Assim, o relator não é obrigado a proceder com a decisão de afetação dos recursos selecionados pelo tribunal a quo, porém deve comunicar ao presidente ou vice-presidente do tribunal de justiça ou do tribunal regional federal para que revogue a decisão de sobrestamento dos demais recursos, feita anteriormente. Os tribunais superiores terão maior liberdade para julgarem os recursos que lhes pareçam mais oportunos à decisão sobre o tema. Igualmente importante, no regime do (art. 1.036, §§ 1.o e 5.º –

CPC/2015, deverão ser selecionados dois ou mais recursos representativos da controvérsia

CPC/2015).

Por fim, notamos uma maior autonomia e participação por parte dos tribunais superiores no que se refere à requisição de informações, que não percebíamos no ordenamento antecedente. Apesar de, anteriormente, poderem solicitar informações aos tribunais de origem, tanto nos recursos extraordinários (art. 328 – RISTF), quanto nos recursos especiais (art. 543-C, § 3.º – CPC/1973), ocorre que para os recursos extraordinários repetitivos havia o prazo de cinco dias para que o tribunal de origem apresentasse informações e no caso dos recursos especiais repetitivos esse prazo era maior, quinze dias. O art. 1.038 do CPC/2015 concede poderes ao relator do tribunal superior de requisitar informações para os tribunais de origem, uniformizando os prazos, para ambos os recursos, em quinze dias. Após a apresentação das informações, o Ministério Público deverá ser intimado para se manifestar. 3.3.2. A seleção de recursos com argumentação abrangente e a melhor fundamentação das decisões

Outro ponto importante trazido pela Lei 13.105/2015 é que somente podem ser selecionados recursos que abarquem uma argumentação vasta e uma discussão eficiente a respeito da questão que será julgada. A escolha e suas razões agora deverão ser feitas de forma clara e não mais de maneira obscura como era no CPC de 1973, podendo levar a julgamentos com baixa qualidade – inclusive quanto à qualidade na formação do precedente –, prejudicando todos os demais litigantes que possuíssem seus recursos sobrestados. Recursos melhor estruturados e fundamentados são mais suscetíveis de obterem decisões também mais adequadamente desenvolvidas e embasadas. Somando-se a escolha de no mínimo dois recursos para representarem a controvérsia, ocorre uma abertura maior para o amplo contraditório das partes e o respeito do devido processo legal, garantias constitucionais (THEODORO JÚNIOR; NUNES; BAHIA; PEDRON; 2015). Ademais, o

CPC/1973 previa que deveriam ser escolhidos “um ou mais recursos”. Sendo assim, havia a possibilidade de se

estabelecer uma decisão que afetaria muitos processos a partir da seleção de uma única lide, de uma única argumentação. A partir do CPC/2015 o mínimo de recursos representativos da controvérsia escolhidos passa a ser dois, proporcionando uma maior margem para a construção da decisão por parte dos tribunais superiores. Assim, aumenta-se a garantia dos processos que serão sobrestados, já que terão a mesma “sorte” do julgamento dos recursos “pinçados”, pelo menos que estes recursos selecionados sejam bem fundamentados e estruturados. Ressaltamos que para que esta “evolução” por parte da seleção dos recursos ocorra, os tribunais precisam levar a sério as mudanças operadas em todo o sistema, não apenas quanto a esse procedimento, mas também quanto ao contraditório, ao julgamento integral da lide e a fundamentação das decisões – respectivamente, arts. 7.o a 10, 4.o e 489, § 1.o. 3.3.3. A decisão de afetação

O art. 1.037 estabelece de forma detalhada como se dará o procedimento de afetação dos recursos (AMARAL, 2015, p. 1.060). Com a deliberação de afetação, executada pelo relator do tribunal superior, este deverá se assinalar o tema que será submetido apreciado no julgamento; designar a suspenção, em território nacional, de todos os processos que versem sobre questões similares, seja eles individuais ou coletivos; e, por fim, terá a possibilidade de requisitar aos presidentes ou aos vice-presidentes dos tribunais de origem a remessa de um recurso representativo da controvérsia (art. 1.037, I, II e III –

CPC/2015).

Com a delimitação do tema a ser discutido, percebemos que o ordenamento visa que o procedimento de julgamento dos recursos extraordinário e especial repetitivos aprecie apenas a questão repetitiva. Além disso, é importante, também, para que sejam determinados quais processos deverão ficar suspensos e quais deverão ser retirados da suspensão (MEDINA, 2015, p.1454). Devemos destacar, no entanto, que com a revogação do § 2.º do artigo 1.037, pela Lei 13.256/2016, esta “restrição” para que o tribunal superior não julgue questões fora da delimitação da decisão de afetação não é mais uma “regra” a ser seguida, passando a ser facultado ao tribunal ad quem, se ater à questão delimitada ou não – o limite, no entanto, permanece, se considerarmos o que dispõe, sem alteração, o § 1.o do art. 489.

O relator poderá requisitar ao tribunal de origem remessa de recurso representativo da controvérsia. Ainda de acordo com o § 7.º do art. 1.037, no caso de haver outras questões além da que é objeto da afetação, caberá ao tribunal superior decidir esta primeiramente, para depois ocorrer decisão das demais, em acórdãos específicos, possibilitando melhor fundamentação das decisões. O

CPC/2015 em seu art. 1.037, II, traz a novidade de que a decisão de afetação deverá determinar a suspensão, em todo o território

nacional, do processamento dos processos pendentes que versem sobre a questão. No CPC/1973 esta suspensão ocorria apenas em relação aos recursos interpostos perante os tribunais de segunda instância. A mudança trazida pelo novo ordenamento amplia os efeitos da decisão que submete os processos ao rito dos recursos repetitivos. Por fim, o § 3.º do art. 1.037 torna prevento o relator que tiver identificado, primeiro, a questão a ser submetida a julgamento, nos casos em que houver mais de uma afetação. Tal dispositivo visa evitar que ocorra mais de uma afetação sobre o mesmo tema jurídico, podendo gerar decisões diferentes sobre a mesma questão. Concluímos, portanto, que a decisão de afetação dos recursos extraordinário e especial repetitivos trazia pelo novo Código de Processo Civil é um avanço no que tange a uma melhor delimitação do tema a ser decido, além de se evitar que sejam proferidas várias decisões sobre temas “idênticos”, respeitando, portanto, o princípio do devido processo legal e da isonomia, garantidos constitucionalmente. Outro ponto importante trazido pelo Novo CPC dizia respeito aos prazos para o julgamento dos recursos representativos da controvérsia. Estes deveriam ser decididos no prazo de um ano a contar da publicação da decisão de afetação que delimita o tema que será submetido a julgamento. Ademais terão primazia sobre as demais lides, exceto os que envolvam réu preso e habeas corpus – HC. Não sendo julgados dentro do prazo, findaria a suspensão e a afetação dos recursos, retomando estes seu trâmite. Apesar do CPC anterior, pelo menos em relação aos recursos especiais repetitivos, colocar os recursos representativos da controvérsia em ordem de preferência aos demais (exceto réu preso e HC), não impunha um prazo para julgamento. Tal fato abria espaço para que as decisões demorassem a ser proferidas e processos suspensos por anos aguardando uma resposta. Desrespeito explícito ao que preceitua o modelo constitucional de processo. Ocorre que com a Lei 13.256/2016 o estabelecimento deste prazo para o julgamento das demandas representativas da controvérsia, que tanto promoveria uma garantia a mais para o devido processo legal, foi revogado. Com a revogação do § 5.º do art. 1.037 da Lei 13.105/2015, o sistema judiciário sofreu um enorme retrocesso no que se refere ao julgamento dos recursos extraordinário e especial repetitivos. Vale notar que não houve alteração do § 4.o, que continua afirmando que os recursos afetados deverão ser julgados em um ano; o que significa nada, tendo em mira que qualquer consequência pelo transcurso do prazo não mais existe. Assim, a novidade que seria trazida pelo CPC/2015 seria de suma importância para o que fosse respeitado tanto o devido processo legal como o amplo acesso à justiça. O que é prejudicial para os litigantes, que não terão garantia alguma de quando seus recursos serão julgados, podendo aguardar “indefinidamente” por uma decisão. 3.3.4. Ampliação do debate e a produção de decisões fundamentadas – art. 1.038

O art. 1.038, I, dá abertura para que o relator solicite ou admita manifestação de pessoas, órgãos ou entidades com interesse na controvérsia, considerando a relevância da matéria e o que estiver disposto no regimento interno de cada tribunal. A partir desta premissa podemos perceber a incorporação da atuação do amicus curiae nos julgamentos dos recursos extraordinários e especiais repetitivos. A participação de interessados poderá contribuir para a apreensão de informações e fundamentos para a resolução da questão e a firme fixação da tese jurídica (MEDINA, 2015, p.1456). No

CPC/1973 esta previsão somente se dava em relação aos recursos

especiais repetitivos (artigo 543-C, § 4.º – CPC/1973), não sendo mencionada expressamente para os recursos extraordinários repetitivos, apesar de muitas vezes ser admitida no julgamento dos mesmos. Esse procedimento, presente agora tanto para os recursos extraordinários quanto para os especiais repetitivos, é de suma importância para que as decisões sejam bem fundamentadas, com a discussão ampla da questão controversa, de forma a refletir positivamente em toda a sociedade. Após o relator “requisitar ou admitir a presença de pessoas, órgãos ou entidades com interesse na matéria”, deverá fixar data para ouvir os depoimentos destas, em audiência pública, passando a ter, portanto, “melhores condições para decidir” (WAMBIER; CONCEIÇÃO; RIBEIRO; MELLO, 2015, p. 1518). Com isso, ocorrerá uma maior transparência das decisões que serão tomadas pelos tribunais superiores, além de abrir um amplo debate e participação das partes envolvidas no litígio. Findo os procedimentos apresentados acima, o relator do tribunal superior enviará cópia de seu relatório aos demais ministros, incluindo em pauta o julgamento, que terá preferência sobre os demais, ressalvados os que tenham envolvimento de réu preso e pedidos de habeas corpus. Ao se colocar os recursos extraordinário e especial repetitivos em ordem de preferência de julgamento ocorre uma maior agilidade do processo, e, com isso, as partes que tiveram tanto seus julgamentos “pinçados” como sobrestados poderão ter uma resposta mais célere, corroborando para uma melhora na prestação jurisdicional, além do respeito ao devido processo legal e a razoável duração do processo. Em suma, o novo CPC/2015 traria uma novidade importante para ser fixada no ordenamento a contemplação da fundamentação das decisões. Segundo o § 3.º do art. 1.038, o conteúdo do acordão proferido no julgamento dos recursos extraordinário e especial

repetitivos precisaria abranger a análise de todos os fundamentos da tese jurídica discutida, os favoráveis e inclusive os contrários. Essa premissa seria valorosa para o aumento da transparência das decisões e uma maior aplicação do princípio do contraditório. Ocorre que a Lei 13.256/2016 alterou parte deste parágrafo 3.º, sendo que agora o conteúdo do acórdão precisará abranger somente os fundamentos relevantes da tese jurídica em questão. Ora, não se discute que ainda é primordial que a decisão seja bem fundamentada e discutida, mas não podemos deixar de notar que tal mudança diminuiu muito o papel do contraditório amplo que tanto se objetiva em um processo com viés constitucional, bem como à aquisição, pelas partes e demais afetados, de um acórdão melhor fundamentado. 3.3.5. Maior poder de intervenção dos litigantes

O novo

CPC oferece maior autonomia para as partes, que passam a influenciar de forma atuante na formação das decisões,

ocorrendo um trabalho cooperativo entre todos os sujeitos processuais – art. 6.o. E, em relação aos recursos extraordinário e especial repetitivos esse papel não foi deferido. De acordo com o art. 1036, § 2.º, o interessado poderá fazer um requerimento ao tribunal de origem para que inadmita recurso intempestivo, seja ele extraordinário ou especial, excluindo-o do sobrestamento efetuado. Este parágrafo é de substancial importância para que os recursos que não seriam admitidos não sejam julgados juntamente com os que estão com os demais, admissíveis. No CPC/1973, muitas vezes, eram selecionados ou sobrestados recursos inadmissíveis visto que o juízo de admissibilidade dos recursos extraordinário e especial repetitivos era feito posteriormente ao julgamento destes. Além disso, caso o recurso inadmissível fosse selecionado, ao não ser conhecido posteriormente, esta decisão afetaria todos os demais recursos sobrestados, mesmo que fossem admissíveis. O CPC novo, além de já destacar em seu art. 1.036 § 6.º que somente serão selecionados os recursos que forem admissíveis, ainda proporciona condição para que interessado requeira que exclusão de algum recurso da decisão de sobrestamento por ser intempestivo. Feito o pedido, o recorrente afetado terá um prazo de cinco dias para manifestação. Percebemos, assim, uma maior participação por parte dos litigantes na escolha dos recursos que não estava presente no CPC/1973. E o notório o aumento do respeito ao princípio do contraditório e da ampla defesa, ao se permitir a intervenção do litigante. Ainda no que concerne à intervenção do recorrente interessado, com a Lei 13.256/2016, este pode interpor agravo interno contra a decisão que não acatar o requerimento ao tribunal de origem para que inadmita o recurso sobrestado, retirando o mesmo da decisão de sobrestamento, quando o recurso houver sido interposto intempestivamente. O agravo interno consiste em um recurso cabível contra decisão monocrática final do tribunal. Assim, basicamente, ao se utilizar do agravo interno, a parte objetiva que a decisão monocrática seja reavaliada por um colegiado. A sistemática deste recurso está presente no regimento interno de cada tribunal. Devemos ressaltar, no entanto, que “o novo Código não prevê, o agravo para a hipótese de deferimento do requerimento e a inadmissão do recurso extraordinário por intempestividade” (AMARAL, 2015, p. 1.059). Também deverão as partes ser intimadas da decisão que suspender seu processo, o que proporciona uma maior transparência ao procedimento. A parte poderá, ainda, requerer o prosseguimento do seu processo, caso demonstre a distinção entra a questão presente no processo e a que será julgada no recurso especial ou extraordinário afetado (art. 1.037 § 9.º – possível à outra parte se manifestar sobre o requerimento interposto, no prazo de cinco dias (art. 1.037 § 11 –

CPC/2015). Ainda é CPC/2015).

No Código de Processo Civil de 1973 em situações nas quais a parte não concordava com a decisão local de sobrestamento do seu recurso, inicialmente não tinha nada o que fazer, a não ser aguardar o julgamento do recurso “pinçado” como representativo da controvérsia. Segundo construção jurisprudencial, no máximo lhe foi dada a possibilidade do uso de agravo regimental, tanto nos casos de recurso extraordinário repetitivo quanto nos casos de recurso especial repetitivo, quando a parte não concordasse que a questão presente em seu recurso era “idêntica” ao recurso selecionado, não devendo, portanto, ter o mesmo julgamento deste. Apesar dos tribunais superiores terem passado a admitir o tal recurso, a atuação dos litigantes na formação da decisão, no ainda era limitada e, na maioria das vezes, os recursos eram negados.

CPC/1973,

O CPC/2015 traz uma possibilidade mais palpável da parte ver seu recurso livre da decisão que o sobrestou e com o prosseguimento, quando tratar de questão diversa do que “pinçado”. Isto é importante visto que no ordenamento anterior era frequente o sobrestamento equivocado de recursos que tratavam de assunto totalmente diverso, prejudicando as partes interessadas na solução do litígio (CUNHA, 2013). Com o reconhecimento da distinção alegada pelo litigante, o próprio juiz ou relator do caso dará prosseguimento ao processo, ou se o processo sobrestado na origem for um recurso extraordinário ou especial o relator comunicará a decisão ao presidente ou ao vicepresidente que houver determinado o sobrestamento, para que o recurso seja encaminhado ao respectivo tribunal superior, na forma do artigo 1.030, parágrafo único (art. 1037, § 12 – CPC/2015). Além disso, a partir da decisão sobre o requerimento para retirada do processo da decisão de sobrestamento, a parte terá meios recursais para impugnação da mesma, quais sejam: o agravo de instrumento, se o processo estiver em primeiro grau; e o agravo interno, caso a decisão houver sido proferida pelo relator. Constamos que no CPC de 2015 conduzirá a maior aplicação do modelo constitucional de processo, principalmente no momento em que propicia um contraditório amplo que não observávamos no CPC/1973, no que tange aos recursos extraordinário e especial repetitivos. Assim, os litigantes, maiores interessados em uma resposta jurisdicional plena, terão a oportunidade de participar

ativamente da formação da decisão. 3.3.6. Decisão dos recursos afetados e publicação do acórdão paradigma

Os arts. 1.039, 1.040 e 1.041 tratam da aplicação da decisão proferida no recurso representativo da controvérsia aos demais processos suspensos. Com a decisão dos recursos “pinçados” proferida, os órgãos dos tribunais superiores declararão prejudicados os recursos sobrestados que versem sobre idêntica controvérsia ou os decidirão aplicando a tese firmada. “O artigo 1.039 cuida das consequências no âmbito dos próprios tribunais superiores para aqueles recursos que foram sobrestados em razão da decisão de afetação proferida pelo relator” (TUCCI; FERREIRA FILHO; APRIGLIANO; DOTTI; MARTINS, 2015 p. 1.042). O caput do art. 1.039 do CPC/2015 também dispõe sobre uma questão muito interessante para a aplicação do processo civil de acordo com o modelo constitucional: a decisão de aplicação da tese firmada ou a declaração dos demais recursos como prejudicados deverá ser feita por órgão colegiado. Este fato veda o julgamento monocrático, proporcionando decisões com discussões mais aprofundadas e decisões melhor estruturadas. No que concerne à repercussão geral no STF, o paragrafo único do art.

1.039 do

CPC/2015 corresponde ao § 2.º do art.

543-B

do CPC/1973. Assim, negada a existência de repercussão geral no recurso extraordinário selecionado, automaticamente são inadmitidos os demais recursos extraordinários sobrestados. Tal fato deve ser visto de forma crítica: Se há decisão de afetação que reconheceu a existência de multiplicidade de recursos extraordinários com fundamento em idêntica questão de direito, não pode haver dúvida de que está preenchido o requisito da repercussão geral. Isto é, se existem ações em massa que proporcionaram a existência de recursos extraordinários em série, inegável a existência de “questões relevantes do ponto de vista econômico, político, social ou jurídico que ultrapassem os interesses subjetivos do processo” (TUCCI; FERREIRA FILHO; APRIGLIANO; DOTTI; MARTINS, 2015, p. 1.642). O art. 1.040 do CPC/2015 trata, também, sobre as consequências da publicação acórdão paradigma perante os recursos sobrestados, porém referente a tribunais de segunda instância e juízes de primeiro grau. Com a publicação do acórdão, caso se trate de recursos extraordinário e especial que estavam sobrestados nos tribunais de origem, percebemos duas hipóteses: se o acórdão recorrido for condizente com o acórdão do tribunal superior, os recursos suspensos serão negados; já, no caso do acórdão recorrido ser contrário ao que decidiu o tribunal superior, o tribunal de origem deverá reexaminar sua decisão, adequando-a a tese proferida pelo tribunal ad quem. Estas duas hipóteses já estavam previstas no CPC/1973, art. 543-C, § 7.º, I e II, porém apenas para os recursos especiais repetitivos. Além disso, os processos que estiverem sobrestados tanto em primeiro, quanto em segundo grau deverão retomar seu seguimento, devendo o julgador, ao final, aplicar a tese emitida pelo tribunal superior. Por fim, caso os recursos tratarem de prestação de serviço público objeto de concessão, permissão ou autorização, a decisão será relatada ao órgão, agencia reguladora ou ente competente para que fiscalizem a aplicação da tese adotada pelo tribunal superior (art. 1.040, I, II, III e IV – CPC/2015). Nos casos do acordão paradigma ser contrário ao acordão recorrido, o tribunal de origem ao fazer o reexame da decisão moldando-a a tese estabelecida pelo tribunal superior, poderá constatar o surgimento de outras questões a serem decididas em virtude da alteração. Caberá, então, ao tribunal a quo decidi-las, podendo ser interpostos recurso especial ou extraordinário contrários a esta decisão. Ressaltamos que caso ocorram tais recursos, serão analisadas apenas as questões que surgiram e não a questão da qual teve a afetação para julgamento no regime dos recursos repetitivos (WAMBIER; CONCEIÇÃO; RIBEIRO; MELLO, 2015, p. 1.521). O que dispõe o inciso III do art. 1.040 deve ser observado de forma crítica em relação aos processos que, no momento da publicação do acórdão paradigma, estiverem sobrestados em primeiro grau de jurisdição, visto que a aplicação da decisão firmada pelo tribunal superior não pode se dar de forma mecânica. O art. 1.041, caput, ainda tratando das consequências da publicação da decisão paradigma, aborda os casos em que o tribunal de origem mantém o acórdão divergente. Assim, é facultado ao tribunal a quo a não aplicação da tese firmada pelo tribunal ad quem. Porém, deve proceder com o envio do recurso, extraordinário ou especial, para o tribunal superior, na forma do art. 1.036, § 1.º, fundamentando a “distinção” pretendida (THEODORO JÚNIOR; NUNES; BAHIA; PEDRON; 2015, p. 377). Percebemos que não foi atribuído ao acordão paradigma eficácia vinculante, apesar de que, com a tese firmada pelos tribunais superiores espera-se que os órgãos competentes julguem os processos e os recursos de acordo com essa orientação (TUCCI; FERREIRA FILHO; APRIGLIANO; DOTTI; MARTINS, 2015, p. 1.643-1.645). Por fim, os parágrafos 1.º, 2.º e 3.º do art. 1.040 oferecem ao autor da ação que ainda esteja em primeiro grau de jurisdição, a possibilidade de desistir da mesma, caso a questão nela discutida for idêntica à resolvida pelo recurso representativo da controvérsia. Apesar de tais dispositivos não limitarem o amplo acesso à justiça da parte que desistir da ação, visto que é facultativo, devemos ficar atentos à outra parte (réu) que é afetada pela desistência. O que percebemos é que é negado a ela o contraditório pleno, visto que parte poderá desistir da ação sem ser dado direito de resposta ao réu (§ 2.º) e sem o consentimento deste (§ 3.º). Aparentemente, o CPC/2015 que visa um aumento do contraditório, bem como a formação de decisões comparticipativas não observou tais premissas nestes parágrafos. Não é correto inserir maior celeridade ao sistema judiciário, desrespeitando o devido processo legal. 4. Conclusão

A litigiosidade em massa é, de fato, um problema que tomou proporções mundiais, sendo de suma importância que se busquem alternativas para diminuir o abarrotamento do sistema judiciário. Porém, é necessário que se respeitem as garantias fundamentais estabelecidas pela Constituição Federal de 1988. Em relação aos recursos extraordinário e especial repetitivos, o legislador vem, ao longo dos anos, tentando inserir mudanças no ordenamento para diminuir a quantidade de recursos que chegam aos tribunais superiores. E foi com a EC 45/2004 que tais modificações começaram a ocorrer. As Leis 11.418/2006 e 11.672/2008 trouxeram para o CPC/1973 os artigos que tratavam do julgamento dos recursos extraordinário e especial repetitivos, que passaram a ser decididos através do método de “pinçamento”. Acontece que tais dispositivos foram integrados ao ordenamento com o objetivo de se obter resultados rápidos para o problema da litigiosidade em massa. O legislador não pode primar apenas pelo princípio da razoável duração do processo ou da celeridade da prestação jurisdicional em detrimento de princípios de suma importância como o devido processo legal, o contraditório, a ampla defesa, a solução integral da lide e a fundamentação das decisões. Assim, o que percebemos com a técnica de “pinçamento” dos recursos extraordinário e especial presente no CPC/1973 é a existência de omissões no que concerne ao disposto em um modelo constitucional de processo. Verificamos isto devido ao fato de que as partes não tinham participação no julgamento dos seus recursos por amostragem, ficando totalmente restritas no exercício do seu direito ao contraditório amplo. Além disso, o procedimento era obscuro, tanto na escolha dos recursos representativos da controvérsia, como nos parâmetros para dizer se a questão de direito a ser decidida era idêntica à outra, ou não. Com isto, vários recursos eram, muitas vezes, sobrestados de forma errônea, não sendo oportunizado às partes recorrerem de tal decisão. Desta forma, aos litigantes que viam seus processos sobrestados, restava a espera, muitas vezes extensa, da decisão referente aos recursos “pinçados”, adquirindo a sorte dos mesmos. Ao inserir, no CPC/1973, os artigos referentes ao julgamento por amostragem dos recursos extraordinário e especial, o legislador não se preocupou com o interesse dos litigantes, bem como com o seu direito ao contraditório. Ora, ao ingressar com um recurso a parte quer ver solucionado seu problema e, o legislador ao se preocupar apenas com a celeridade processual, deixou à margem o interesse das partes na solução da controvérsia. Assim, o método de “pinçamento” presente no ordenamento de 1973 distanciou-se do que prevê o modelo constitucional de processo. Noutra senda está a Lei 13.105/2015 que institui o novo Código de Processo Civil, ao tratar do julgamento dos recursos extraordinário e especial repetitivos, trazendo consigo várias mudanças positivas para o sistema judiciário brasileiro. Apesar de ainda conter o método de “pinçamento” dos recursos, presente no código anterior, a partir do observância dos princípios constitucionais do processo.

CPC/2015 percebe-se melhorias significativas em direção à

O procedimento de escolha e julgamento dos recursos representativos da controvérsia se torna mais transparente. Deverão ser selecionados apenas recursos admissíveis e com fundamentação ampla, além de ser feita a identificação precisa da questão que será submetida a julgamento. Outro ponto positivo trazido pelo CPC/2015 é que aos interessados, com a demonstração de que seu recurso possui questão diversa da submetida a julgamento, poderão requerer a retirada do recurso da decisão de sobrestamento, dando seguimento a este, diminuindo, assim, a possibilidade de serem sobrestados recursos de forma errônea. A despeito da Lei 13.256/2016, no que tange ao julgamento dos recursos extraordinário e especial repetitivos, ter correspondido a certo retrocesso, principalmente em relação à retirada do prazo para julgamento dos recursos representativos da controvérsia, o CPC/2015 ainda promoverá muitas mudanças significativas para o sistema judiciário, bem como o respeito ao modelo constitucional de processo que estava sendo negligenciado no ordenamento anterior. O CPC/2015 poderá viabilizar, caso seja aplicado de forma adequada, condições importantes para que possamos vivenciar um sistema técnico coerente de processo, embasado em um aspecto comparticipativo/cooperativo, e com uma aplicação eficiente do modelo constitucional de processo. 5. Referências Bibliográficas AMARAL G. R. Comentários às alterações do Novo CPC. São Paulo: Ed. RT, 2015. CUNHA L. C. Recursos Repetitivos. Leonardo Carneiro da Cunha, [www.leonardocarneirodacunha.com.br/artigos/recursos-repetitivos]. Acesso em: 05.01.2016.

28.11.2013.

MEDINA, J. M. G. Novo Código de Processo Civil comentado – com remissões e notas comparativas ao RT, 2015.

Disponível

em:

CPC/1973. 3. ed. São Paulo: Ed.

REIS, Silas Mendes dos; SERAU Jr., Marco Aurélio. Recursos Especiais Repetitivos no STJ. São Paulo: Método, 2009. THEODORO JÚNIOR, H.; NUNES, D.; BAHIA, A. Litigiosidade em massa e Repercussão Geral. Revista de Processo, v. 177, Novembro 2009. ______;_______; ______. Politização e Convergência entre Civil e Common Law. Revista de Processo, v. 189, novembro 2010. ______; ______; ______; PEDRON F. Q. Novo CPC: fundamentos e sistematização. 2. ed. Rio de Janeiro: GEN/FORENSE, 2015.

TUCCI J. R. C.; FERREIRA FILHO M. C.; APRIGLIANO R. C.; DOTTI R. F.; MARTINS S. G. Código de Processo Civil Anotado. São Paulo/Curitiba: AASP/OAB-PR. WAMBIER T. A. A.; CONCEIÇÃO M. L. L.; RIBEIRO L. F. S.; MELLO R. L. T. Primeiros comentários ao Novo Código de Processo Civil artigo por artigo. São Paulo: Ed. RT, 2015. Pesquisas do Editorial

O NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL CONSTITUCIONALIZADO (PARTE GERAL - LIVRO I) , de Isabel Cristina Arriel de Queiroz - RDCI 93/2015/37 CÓDIGO DE PROCESSO CONSTITUCIONAL: AS BASES DOUTRINÁRIAS DO ANTEPROJETO DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, de Paulo Bonavides - RPC 3/2016/279 RECURSOS PARA OS TRIBUNAIS SUPERIORES E A LEI 13.256/2016, de Georges Abboud - RePro 257/2016/217

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