RECURSOS METODOLÓGICOS PARA O ESTUDO DO ESPAÇO ACÚSTICO E DAS PAISAGENS SONORAS

June 2, 2017 | Autor: L. Mayer Malanski | Categoria: Geography, Soundscape Studies, Geografia, Paisagem Sonora
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RECURSOS METODOLÓGICOS PARA O ESTUDO DO ESPAÇO ACÚSTICO E DAS PAISAGENS SONORAS Methodological resources to acoustic space and soundscape Lawrence Mayer Malanski97 Mariana Mantovani de Quadros Rapacci98 Maria Fernanda Gabriel Santos99 Tiago Silva Keneipp100 Eixo Temático: Multiterritorialidade, Territórios Transfronteiriços, Cultura e Turismo Resumo A geografia humanista possibilita o estudo do espaço acústico e das paisagens sonoras, a partir do qual pode-se explorar e compreender, dentre outros aspectos, os ritmos dos lugares. Neste contexto, este artigo tem por objetivo apresentar e descrever alguns recursos metodológicos para o estudo do espaço acústico e das paisagens sonoras. Para tanto, ele foi elaborado a partir do processo de revisão narrativa de literatura, o qual não esgotou as fontes de informações e a seleção e interpretação das mesmas estiveram sujeitas à subjetividade dos autores. Dentre os diferentes recursos metodológicos existentes, destacam-se neste artigo os passeios sonoros, as gravações de campo, os mapas sonoros, os catálogos de sons, os mapas sonoros pessoais e os catálogos de preferências sonoras. O estudo do espaço acústico e das paisagens sonoras e o uso desses recursos valoriza um sentido da percepção desfavorecido em meio à “cultura do olho” que, por sua vez, demonstra um real desperdício da capacidade humana de experienciar o mundo. Palavras-chave: Paisagem; Paisagem sonora; Recursos metodológicos.

Abstract 97

Professor de Geografia do Ensino Básico, Técnico e Tecnológico do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Paraná, campus Londrina. Pesquisador do Centro de Ensino, Pesquisa e Extensão em Ciências Humanas (CEPECH-IFPR, Londrina) e do Laboratório Território Cultura e Representações (UFPR, Curitiba). Coordenador do projeto de pesquisa “Calçadão de Londrina: exploração sonora do espaço cotidiano” vinculado ao Programa de Bolsas de Iniciação Científica Júnior, (PIBIC-Jr) IFPR/CNPq. E-mail: [email protected]. 98 Estudante do curso de Ensino Médio Integrado ao Curso Técnico em Biotecnologia do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Paraná, campus Londrina. Bolsista do Programa de Bolsas de Iniciação Científica Júnior, (PIBIC-Jr) IFPR/CNPq vinculada ao projeto de pesquisa “Calçadão de Londrina: exploração sonora do espaço cotidiano”. E-mail: [email protected]. 99 Estudante do curso de Ensino Médio Integrado ao Curso Técnico em Biotecnologia do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Paraná, campus Londrina. E-mail: [email protected]. 100 Estudante do curso de Ensino Médio Integrado ao Curso Técnico em Biotecnologia do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Paraná, campus Londrina. E-mail: [email protected].

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Humanistic geography allows the study of acoustic space and soundscapes, from which you can explore and understand, among other things, the rhythms of the places. In this context, this article intend to present and describe some methodological resources for the study of acoustic space and soundscapes. Therefore, it was drawn from the narrative review process of literature, which hasn’t exhausted the sources of information and the selection and interpretation of them were subject to the subjectivity of the authors. Among the different existing methodological resources, are highlighted in this article sound walk, field recordings, sound maps, catalogs sounds, personal sound maps and catalogs of sound preferences. The study of acoustic space and soundscapes and use of these resources enhances a sense of disadvantaged perception through the "culture of the eye" which, in turn, shows a real waste of human capacity to experience the world. Keywords: Landscape; Soundscape; Methodological resources.

Introdução Numa perspectiva fenomenológica, a experiência do mundo ocorre a partir da percepção individual dos objetos e corpos no tempo e no espaço. Dentre estes objetos percebidos encontram-se os sons, que recebem significados e valores que representam tanto aspectos individuais quanto intersubjetivos. Assim, eles conformam paisagens sonoras e contribuem para a identidade dos lugares. A geografia humanista, desenvolvida sobretudo a partir da década de 1970 e caracterizada pelo aporte fenomenológico e existencialista, permite o estudo das paisagens sonoras através de seus aspectos antropocêntricos, entendendo-as como construções mentais elaboradas a partir da experiência dos espaços acústicos (SALGUEIRO, 2001; DARDEL, 2011). No entanto, na atualidade e, sobretudo, nos espaços urbanos, os indivíduos vivem imersos em uma “cultura do olho” que pouco valoriza os demais sentidos da percepção, como a audição (SCHAFER, 2011). Esta predileção pelo sentido da visão revela um real desperdício da capacidade humana de experienciar o mundo. Consequentemente, nesses espaços, os indivíduos tendem a desenvolver baixo nível de consciência dos sons e a sofrer um grau elevado de privação sensorial (PORTEOUS; MASTIN, 1985). Como consequência disso, são comuns os estudos multidisciplinares que se preocupam com questões relacionadas à poluição sonora; isto é, preocupam-se com sons considerados indesejados e seus efeitos sobre a saúde e o comportamento humano e sobre ambientes naturais. De outro modo, análises qualitativas do espaço acústico e das paisagens sonoras podem ser realizadas por diferentes ciências, tais como geografia, história, sociologia, antropologia, urbanismo e música. Na geografia humanista, por

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exemplo, a tendência é que a percepção dos sons de um determinado espaço acústico seja valorizada no sentido de que ela pode contribuir para a identificação de espaços, lugares e culturas num dado contexto histórico. Além disso, os estudos geográficos dos sons envolvem a exploração e compreensão dos ritmos dos lugares, procurando dar-lhes um sentido. Para os estudos do espaço acústico e das paisagens sonoras numa perspectiva humanista da geografia, o pesquisador tem a possibilidade de usar diferentes recursos, tais como passeios sonoros, gravações de campo, mapas sonoros, catálogos de sons, mapas sonoros pessoais e catálogos de preferências sonoras. Estes recursos favorecem os estudos tanto das dimensões físicas/materiais dos espaços, quanto as representações das experiências e do imaginário individual e coletivo. Nesse contexto, este artigo tem por objetivo apresentar e descrever esses recursos. Para tanto, ele foi elaborado a partir de revisão narrativa de literatura e, portanto, as fontes de informações não foram esgotadas e a seleção e interpretação das mesmas estiveram sujeitas à subjetividade dos autores.

Recursos metodológicos para os estudos do espaço acústico e das paisagens sonoras A seguir, tem-se uma breve revisão teórica a respeito do espaço acústico e das paisagens sonoras para, em seguida, serem apresentados e descritos alguns recursos úteis para os estudos desses aspectos espaciais. Espaço acústico e paisagens sonoras O mundo, enquanto o espaço da existência e da experiência humana é acessado pelo indivíduo no tempo presente através de todos os sentidos simultaneamente, o que apresentam à consciência objetos sensíveis e outros indivíduos (DARDEL, 2011; MERLEAU-PONTY, 2011; SOKOLOWSKI, 2014). Deste modo, a percepção conforma um mundo vivido que depende de indivíduos que o percebem intencionalmente e que nele se relacionam de modo intersubjetivo (MERLEAUPONTY, 2011). Assim, os sons, enquanto objetos sensíveis que compõem o espaço acústico, são registrados pelos tímpanos e interpretados pela mente a partir da percepção (MERLEAU-PONTY, 2011). Esses sons podem ser emitidos por fontes biofônicas,

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como aves e outros animais, geofônicas, como o vento e a chuva e antropofônicas, como pessoas, seus equipamentos e técnicas (KRAUSE, 2013). Da percepção resulta a paisagem sonora, entendida como uma formação mental intencional construída a partir da relação corporal do indivíduo com o espaço acústico e com outros indivíduos (FORTUNA, 1998). Ao perceber os sons dos espaços, a mente converte naturalmente os objetos sonoros em eventos dependentes de qualidades simbólicas, semânticas e estruturais que se relacionam com um contexto maior, como signos, sinais, símbolos, ruídos e sons de fundo (SCHAFER, 2011). Em analogia à teoria da Gestalt, sobre estes sons de fundo se sobrepõem os sons de figura, como signos, sinais e símbolos, sendo que estes últimos podem se configurar como marcos sonoros, que identificam os espaços e transmitem mensagens àqueles indivíduos capazes de compreendê-las (ibid.). Logo, esses eventos são capazes de despertar nos ouvintes emoções e pensamentos e conferir a cada espaço sentimentos de lugar, como afeição, intimidade, convite e monumentabilidade (características topofonofílicas), de rejeição e hostilidade (características topofonofóbicas) (SCHAFER, 2011; DREVER, 2015). Ainda, esses eventos podem ser considerados indiferentes ou mesmo insignificantes, como os utilizados para gerar ambiências em espaços considerados deslugares (RELPH, 2014). Além disso, é nos lugares onde se desenvolve o “balé” rotineiro dos corpos, itinerários, passos e gestos relacionados diretamente às rotinas cotidianas dos indivíduos no tempo e no espaço (SEAMON, 1979). Nesse contexto, os sons que formam os espaços acústicos contribuem para que o indivíduo perceptor tenha sensações dos ritmos de cada lugar, isto é, percepções da dinâmica espacial, da passagem do tempo e de imersão. Por tratar da percepção do espaço acústico, considera-se a escala de análise no nível da experiência dos fenômenos, isto é, a mesoescala (GASPAR, 2001; CASTRO, 2000). Esta escala valoriza práticas de investigação de campo através das quais são observadas tanto as dimensões físicas do espaço acústico, quanto as representações das paisagens sonoras (ALAMI; DESJEUX; GARABUAU-MOUSSAOURI, 2010). No âmbito da geografia humanista, os estudos do espaço acústico e das paisagens sonoras podem ser feito a partir de diferentes recursos, tais como os passeios sonoros, as gravações de campo, os mapas sonoros virtuais, os catálogos de sons e os mapas sonoros pessoais, que serão apresentados e detalhados a seguir.

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Recursos metodológicos para o estudo do espaço acústico e das paisagens sonoras Os passeios sonoros são caminhadas exploratórias realizadas com a finalidade de ouvir com atenção detalhes do espaço acústico não valorizados cotidianamente pelos indivíduos, incluindo o próprio pesquisador (SCHAFER, 2011; MCCARTNEY; PAQUETTE, 2012; BERNAT, 2014). Nesses passeios, o ouvinte se desloca por espaços onde a vida diária se desenvolve e tem suas experiências perceptuais valorizadas (DREVER, 2009; SCHAFER, 2011). Para tanto, ele precisa estar atento aos sons afim de alcançar os objetivos esperados com a exploração (SCHAFER, 2011). Dentre as diferentes questões, os passeios sonoros podem ser motivados por temas ecológicos, sociais, políticos, estéticos, históricos e musicais, entre outros (DREVER, 2009; MCCARTNEY; PAQUETTE, 2012). Ainda, eles podem acontecer individualmente ou em grupo; em silêncio ou com diálogo entre os participantes; com roteiros, formas de registro e durações pré-determinados ou não; com ou sem a mediação de equipamentos eletrônicos como gravadores de áudio, GPS e câmeras fotográficas e filmadoras digitais (DREVER, 2009; MCCARTNEY; PAQUETTE, 2012). Ainda, caso o objetivo da exploração sonora seja o registro e a análise do ritmo dos lugares, é aconselhável que o pesquisador faça passeios sonoros em diferentes períodos do dia, dias da semana e, mesmo, em épocas do ano distintas, pois assim ele encontrará diversidades de situações e contextos e acontecimentos específicos. Caso seja feito o registro do espaço acústico através de gravações, elas tornamse objetos de estudos para o pesquisador e importantes registros da composição de um determinado espaço em um dado contexto histórico, cultural e social (DREVER, 2009; HOLMES, 2015). Essas gravações de campo podem ser realizadas de modo móvel ou estacionário (FELD, 2014). No primeiro caso, o pesquisador se movimenta com o equipamento por um trajeto definido (FELD, 2014). Do outro modo, o pesquisador deve permanecer parado com o equipamento em um local escolhido, obtendo-se, assim, panoramas sonoros (FELD, 2014). Cada panorama corresponde a um recorte temporal e espacial de um campo sonoro com cerca de um a três minutos de duração (FELD, 2014). A posterior audição dessas gravações fora do contexto espaço-temporal original e sem a ajuda de outros sentidos perceptivos conforma novas paisagens sonoras influenciadas por memórias, imagens e pela imaginação (SCHAEFFER, 2003). Assim, 566

é importante que também sejam obtidos fotografias, vídeos, descrições e comentários feitos em campo, pois eles favorecem o registro e a compreensão do contexto nas quais as gravações foram realizadas e auxiliam numa futura leitura e análise material adquirido. As gravações podem ser feitas

com equipamentos profissionais ou

semiprofissionais de áudio, ou mesmo através de aplicativos de smartphones, em um formato de áudio digital como o WAV e o MP3 (HOLMES, 2015). Nestes formatos é viável a rápida edição dos arquivos em softwares como o Audacity, no qual é possível retirar ruídos indesejados, equalizar e inserir efeitos nas faixas selecionadas. Estes formatos facilitam, também, a divulgação das gravações de forma gratuita em mídias digitais como bancos de dados sonoros virtuais (assim como o Freesound 101), plataformas on-line de publicação de áudio (como o SoundCloud) e websites de compartilhamento de vídeos (como o YouTube) (HOLMES, 2015). Tanto os passeios sonoros quanto as gravações podem ser organizadas a partir do preenchimento de um registro que contenha um número de identificação, data, localização, condições do tempo, período do dia, hora do início e término do passeio/gravação, duração do passeio/gravação, equipamento utilizado para a gravação, formato e qualidade da gravação e se foram obtidas (e quantas foram) imagens e feitos vídeos (HOLMES, 2015) (Figura 1). Também, é possível a utilização de um croqui, mapa ou imagem de satélite impressa no qual se pode anotar e localizar informações obtidas em campo (HOLMES, 2015).

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Disponível em: . Acesso em: 15 abr. 2016.

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Figura 1 – Registro de passeio sonoro/gravação de campo

Fonte: Adaptado de Holmes (2015)

Também, é viável a composição de mapas sonoros virtuais a partir da inserção das gravações em bases digitais on-line como Google Maps, Bing Maps e Map Maker. Isto permite ouvir as gravações e situar com precisão cartográfica os locais onde elas

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foram feitas. Existem diferentes mapas sonoros virtuais, como: Soundcities102, Favourite Sounds103 e Radio Aporee104 com sons de diversas localidades do mundo e SP SoundMap105 e Mapa Sonoro CWB106, com sons de diferentes localidades da cidade de São Paulo e Curitiba respectivamente. Ainda, as gravações podem ser ouvidas pelo pesquisador de forma que os sons nelas presentes possam ser classificados, formando um tipo de catálogo de sons (SCHAFER, 2011). Para a elaboração deste catálogo consideram-se, sobretudo, os aspectos físicos dos sons, tais como datas, horas e formas de ocorrências (isoladas ou repetitivas); as durações (em segundos ou minutos); as origens (biofonia, geofonia ou antropofonia) e as localizações de suas fontes emissoras em um croqui (SCHAFER, 2011; HOLMES, 2015). Dependendo da motivação da pesquisa, pode importar, também a intensidade dos sons (em decibéis) (HOLMES, 2015). Esses catálogos podem ser úteis para o registro e a comparação da composição de um espaço acústico determinado ao longo do tempo e permitem, igualmente, a comparação entre a composição do espaço acústico de locais distintos (DREVER, 2009; HOLMES, 2015) (Figura 2).

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Disponível em: . Acesso em: 15 abr. 2016. Disponível em: . Acesso em: 15 abr. 2016. 104 Disponível em: . Acesso em: 15 abr. 2016. 105 Disponível em: . Acesso em: 15 abr. 2016. 106 Disponível em: . Acesso em: 18 abr. 2016. 103

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Figura 2 – Catálogo de sons de caminhada sonora

Fonte: Adaptado de Holmes (2015).

No que se refere aos registros e análises dos aspectos simbólicos relacionados à percepção dos espaços acústicos, o pesquisador tem a possibilidade de elaborar ou pedir para que outras pessoas que estejam frequentando o espaço estudado elaborem mapas sonoros pessoais (BERNAT, 2014; HOLMES, 2015). Esses mapas podem ser

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compreendidos como variações dos mapas mentais, destacando-se como representações simbólicas das experiências, ideias e imagens que os indivíduos possuem do espaço vivido ou imaginado (SEEMANN, 2010). Após a elaboração dos mapas, é necessário fazer a leitura e interpretação dos produtos pelo pesquisador afim de “decifrá-los”, o que deve envolver, também, os acontecimentos ocorridos durante o processo de mapeamento (SEEMANN, 2010). Sugere-se que estes mapas sejam elaborados em uma folha de papel com o traçado de um círculo (representando o espaço acústico percebido) que tenha em seu centro um “X” (simbolizando a posição relativa do observador no espaço) (HOLMES, 2015). Assim, o mapeador terá a possibilidade de ordenar os signos no mapa de acordo com as distâncias das fontes emissoras dos sons em relação a sua posição (HOLMES, 2015) (Figura 3).

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Figura 3 – Ficha para mapeamento da paisagem sonora

Fonte: Adaptado de Holmes (2015)

Para a realização do mapeamento é importante que o mapeador ouça atentamente os sons por alguns minutos (entre uma a três minutos, por exemplo) e então busque representa-los em formas de signos (HOLMES, 2015). Caso o mapeador não seja o próprio pesquisador, é importante anotar alguns dados que contribuam para a

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caracterização do indivíduo participante, tais como gênero, relação com o espaço (se é morador ou visitante), idade e interesse em relação ao espaço (se está a trabalho, passeio, de passagem etc.) (HOLMES, 2015). A elaboração do mapa sonoro pessoal pode ocorrer em conjunto com a realização de entrevista com o mapeador (TORRES; KOZEL, 2011). Essa entrevista pode ser escrita ou gravada e envolver questões referentes às lembranças do entrevistado em relação ao espaço explorado, sua trajetória de vida, suas preferências alusivas aos sons agradáveis, desagradáveis e marcantes do espaço percebido (ibid). As informações obtidas por meio das entrevistas podem auxiliar e complementar o processo de interpretação e análise dos mapas sonoros pessoais. Por fim, o pesquisador tem a possibilidade de aplicar testes de preferências sonoras com os entrevistados (BERNAT, 2014). Para tanto, o indivíduo precisa ouvir com atenção durante alguns minutos e citar os sons que considera agradáveis, desagradáveis e, ao menos, um som que identifique o espaço a partir de sua perspectiva. A partir deles é possível identificar os sons considerados agradáveis e desagradáveis, sentimentos de topofonofilia e topofonofobia e outros aspectos simbólicos que conferem identidade aos espaços e lugares (SCHAFER, 2011). Os testes podem ser tratados a partir de perspectivas quantitativas, nas quais os sons citados são agrupados em categorias (como antropofonia, geofonia e biofonia) que, então, serão organizadas em tabelas, gráficos, esquemas e mapas. Além disso, há possibilidade de realização de análises qualitativas que consideram os detalhes, as especificidades e as subjetividades relatadas nos testes (Figura 4).

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Figura 4 – Ficha de preferências sonoras

Fonte: Os autores

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Considerações Finais O espaço acústico e as paisagens sonoras ainda são pouco estudadas por geógrafos, mas, podem oferecer perspectivas interessantes para a identificação de espaços, lugares e culturas, além de para a exploração e compreensão dos ritmos dos lugares. Assim, o interesse por esse tema advém, sobretudo, de geógrafos humanistas, que podem desenvolvê-lo a partir de diferentes recursos metodológicos, tais como os passeios sonoros, as gravações de campo, os mapas sonoros virtuais, os catálogos de sons e os mapas sonoros pessoais. É neste sentido que este artigo buscou apresentar e detalhar alguns desses recursos que os geógrafos interessados pelo assunto podem fazer uso em seus trabalhos de campo. No entanto, mais do que oferecer soluções acabadas, procurou-se, também, instigar a criatividade e a experiência do pesquisador no sentido de adaptar e aprimorar esses recursos, além de desenvolver outros novos.

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