Redes De Cooperação De Pequenos Produtores Do Meio- Oeste Catarinense: Uma Questão De Decisão(Ação)?

June 5, 2017 | Autor: Silvio Junior | Categoria: Santa Catarina, Exploratory Study
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REDES DE COOPERAÇÃO DE PEQUENOS PRODUTORES DO MEIO-OESTE CATARINENSE: UMA QUESTÃO DE DECISÃO(AÇÃO)? [email protected] Apresentação Oral-Desenvolvimento Rural, Territorial e regional SILVIO SANTOS JUNIOR1; DENISE BARROS AZEVEDO2; DEBORA LARYSSA THIBES SANTOS3; DANIEL POLETTO TESSER4. 1,3.CEPAN/UFRGS, PORTO ALEGRE - RS - BRASIL; 2,4.UNOESC, JOAÇABA - SC - BRASIL. REDES DE COOPERAÇÃO DE PEQUENOS PRODUTORES DO MEIO-OESTE CATARINENSE: UMA QUESTÃO DE DECISÃO(AÇÃO)? COOPERATION’S NETWORKS OF SMALL PRODUCERS OF THE MIDDLEWEST OF SANTA CATARINA STATE (BRAZIL): A QUESTION OF DECISION OR ACTION? Grupo de Pesquisa: Desenvolvimento Rural, Territorial e Regional Resumo O presente artigo avalia a potencialidade para formação de redes entre os produtores rurais do “Meio-Oeste Catarinense”, através das quais as atividades daquelas pequenas propriedades poderiam ser desenvolvidas de forma competitiva e sustentável. Este artigo busca-se ilustrar as possibilidades de um trabalho integrado e cooperativo das associações da região. Trata-se de um estudo exploratório desenvolvido em duas etapas, a primeira na Feira Livre de Joaçaba-SC, e a segunda com as associações rurais da região. As conclusões mostram que existe interesse e potencialidade para formação de redes de cooperação entre os produtores, entretanto fatores precisam ser desenvolvidos, como aspectos da cultura e o papel das instituições de apoio da região. Palavras-chaves: Redes; Estratégia; Decisão; Políticas de Desenvolvimento. Abstract The present article evaluates the potentiality for formation of nets between the agricultural farmers of the Middle-West of Santa Catarina State (Brazil) through which the activities of those small properties could be developed of competitive and sustainable. This article searches to illustrate the possibilities of integrated and cooperative work of the associations of the region. This article is an exploratory study in two stages, the first parts of Free Fair of Joaçaba city (SC-BR), and second with the agricultural associations of the region. The conclusions show that there are interest and potentiality for formation of nets of cooperation between the farmers, however factors need to be developed, as aspects of the culture and the paper of the institutions of support of the region. Key Words: Nets; Strategy; Decision; Development Politics 1. INTRODUÇÃO 1

Porto Alegre, 26 a 30 de julho de 2009, Sociedade Brasileira de Economia, Administração e Sociologia Rural

Os pequenos produtores, sejam eles de setores tradicionalmente urbanos ou rurais, encontram dificuldades frente à competição com os grandes empreendimentos. Aos pequenos cabia apenas a alternativa de focar-se em um mercado específico e diferenciar seus produtos de acordo com as necessidades dos clientes e, em alguns casos, a customizar sua produção de acordo com as preferências cada um dos clientes. Essa situação, retratada por Porter (2001) como estratégia de especialização, tornou-se ainda mais evidente no final do século passado. Entretanto, para a grande maioria dos agricultores, com pouca capacidade de diferenciação da produção, ela acaba não sendo válida, pois dificilmente os mesmos conseguem implementá-la completamente devido às estruturas mercadológicas onde atuam, colocando-os, portanto, em desvantagem competitiva. No estado de Santa Catarina, a gravidade da situação é evidenciada pelo número de produtores rurais em situação de exclusão da atividade. Segundo o trabalho realizado por Testa et al (1996) apenas 36% dos estabelecimentos rurais podiam ser considerados viáveis. Outros 36% encontravam-se em franca descapitalização e necessitavam de medidas específicas urgentes de apoio para adequar os sistemas de produção e aumentarem a capacidade de geração de renda de forma a evitar o processo de exclusão. Os 28% restantes encontravam-se em situação de subsistência ou exclusão do setor, enquanto unidades produtivas, devido à incapacidade de gerar renda suficiente para manutenção das pessoas envolvidas. Corroborando com esta perspectiva, Tesser (1997) mostra que, devido às propriedades típicas da região desenvolverem atividades mais tradicionais (suinocultura, bovinocultura leiteira e plantio de milho, soja e feijão) e estarem sujeitas aos riscos climáticos e mercadológicos, os lucros dos anos favoráveis acabam sendo absorvidos pelos anos desfavoráveis, resultando em uma rentabilidade média insuficiente para manter a atividade no longo prazo. Adicionalmente, é fato notório que os produtores rurais se encontram, por um lado, frente a oligopólios de fornecedores de insumos e bens de capital necessário ao processo produtivo e, por outro, frente a oligopsônios no momento de negociar a venda de sua produção. Ou seja, encontram-se, individualmente, sem o menor poder de barganha, quer com os fornecedores, quer com seus clientes. Assim, a competitividade dos pequenos produtores acaba ficando restrita a sua eficiência produtiva, onde a baixa escala de produção apresenta-se como outra dificuldade. O Estado de Santa Catarina tem como principal característica, no que tange à produção agropecuária, o fato de estar ancorada, na sua grande maioria, em um modelo fundiário de pequenas propriedades. A região Meio Oeste não é diferente. Segundo dados do IBGE (1996), as propriedades rurais de Joaçaba, município pólo dessa região, possuem área média inferior a 30 hectares e, em sua grande maioria (cerca de 90%) tem menos de 50 hectares de área total. Além disso, ao se observar às atividades agropecuárias desenvolvidas na região confirmasse que o valor bruto da produção (VBP) está concentrado em poucas atividades. São aquelas relacionadas à “vocação regional”: milho, soja, suínos e aves, que no início da década de 1990 concentravam aproximadamente 75% do VBP. Dessa forma mesmo esboçando alguma reação no sentido de agregar valor à produção e profissionalizá-la, os produtores da região acabam enfrentando problemas com a falta de diversidade de produtos e de demanda dentro do mercado local. Em sua proposta de Plano de Governo, a atual gestão do Estado de Santa Catarina propõe a descentralização como uma moderna ferramenta de gestão. Numa tentativa de 2

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concretizar essa intencionalidade, o governo estadual vem orientando suas políticas públicas privilegiando a formação de pequenas associações/cooperativas de produtores rurais em atividades que agreguem valor à produção primária, incentivando-os a formar redes agroindustriais. Segundo dados obtidos com a Gerência Regional da Empresa Catarinense de Pesquisas Agropecuárias e Extensão Rural (EPAGRI), da 8ª Secretaria de Desenvolvimento Regional (SDR), as políticas públicas investiram, no período compreendido entre 2004 e 2006, R$ 1.746.000,00 a “fundo perdido”, no estímulo para formação de agroindústrias, conforme detalhamento exposto na Tabela 1. Tabela 1 - Investimentos Públicos repassados pela EPAGRI, na AMPLASC, de 2004 a 2006 Nome do projeto Abatedouro de Frango Caipira Implantação de pomares de uva Cantina Entreposto de mel Processamento de cêra Industria de processamento de leite Casa do Produtor Vinicampos Coopagro K-19 Embutidos Pancera Panificadora Bela Vista Projeto Produzir - piscicultura Total

Valor Aplicado R$ 190.000,00 R$ 150.000,00 R$ 210.000,00 R$ 130.000,00 R$ 115.000,00 R$ 210.000,00 R$ 130.000,00 R$ 420.000,00 R$ 25.000,00 R$ 23.000,00 R$ 5.000,00 R$ 18.000,00 R$ 120.000,00 R$ 1.746.000,00

Origem do Recurso MDA MDA MDA MDA MDA MDA MDA MI-Mesoregião MI-Mesoregião MI-Mesoregião MI-Mesoregião MI-Mesoregião MI e ONU/FAO ----------

Fonte: EPAGRI - Regional Campos Novos

Além destas fontes de financiamento, o PRONAF (investimento), Projeto Microbacias 2, parcerias com as prefeituras e empresas construtoras de hidrelétricas na região e outras fontes do governo estadual, têm destinado recursos à formação de redes de cooperação. Investimentos, em projetos similares vêm sendo orientados pela Epagri, em outras SDRs, mostrando a aposta da política pública neste modelo de desenvolvimento. Estes são alguns indicativos que ilustram a decisão governamental de orientar esforços, no sentido de aumentar a competitividade das pequenas propriedades rurais por meio da formação de redes de cooperação. Entretanto, esta alternativa estratégica requer o engajamento de um conjunto de agentes (como se demonstrará na seção 1.3); e isto significa lidar com processos decisionais. Neste sentido há que considerar que, conforme ensina Simon (1978), “o contexto decisional está definido por informação incompleta, recursos limitados, multiplicidade de objetivos, conflitos de interesse”. Isto significa que implementar ações conjuntas é complexo e exige conhecimentos dos processos decisionais dos agentes envolvidos O trabalho objetiva-se mostrar o estado da arte da Feira Livre da cidade de Joaçaba (SC) e relatar possibilidades de um trabalho integrado e associativo com as demais associações congêneres da região, como forma de auferir competitividade, através da decisão de formar de uma rede de cooperação entre estas associações, com o apoio dos demais agentes (stakeholders). 3

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Na seqüência apresenta-se o referencial teórico, com os três pilares que sustentam o raciocínio analítico do presente estudo. Na seção 3 é apresentada a metodologia utilizada, e, na seção 4 apresenta-se os resultados. Finalmente, na seção 5, as considerações finais e conclusões do estudo. 2. REFERENCIAL TEÓRICO 2.1 Os aspectos subjacentes da orientação para o trabalho que influenciam no processo decisório Estudos seminais, realizados na segunda metade do século passado, mostram que a finalidade do trabalho vai além da busca do resultado econômico. As pessoas, ao desenvolverem suas atividades laborais, consideram, entre outras coisas, o “prazer de realizar suas tarefas, o auto-respeito e o prestígio” (FRIEDMANN e HAVIGHURST, 1954, apud GASSON, 1973ª). Gasson (1973), em pesquisas realizadas no Reino Unido, identificou quatro categorias básicas que motivariam o “status sócio-econômico e a orientação para o trabalho” dos agricultores. Essas categorias, levando em conta os valores associados à motivação para o trabalho, influenciariam a “inclinação” do produtor rural na hora de tomar decisões. São elas: (a) instrumental; (b) social; (c) expressiva; e (d) intrínseca. Os produtores com orientação instrumental, orientariam suas decisões pelos seguintes valores: (i) maximizar o benefício; (ii) obter um benefício mínimo; (iii) expandir o negócio; (iv) ter condições agradáveis de trabalho. Os produtores com orientação social, orientariam suas decisões pelos seguintes valores: (i) o prestígio social; (ii) a relação com a comunidade agrária; (iii) continuar a tradição familiar; (iv) trabalhar com outros membros da família; (v) manter boas relações com os trabalhadores. Os produtores com orientação expressiva, orientariam suas decisões pelos seguintes valores: (i) satisfação em sentir-se proprietário; (ii) trabalhar ele mesmo na exploração; (iii) exercer habilidades e aptidões especiais; (iv) oportunidade de ser criativo no trabalho; (v) fixar um calendário e alcançar os objetivos traçados. Os produtores com orientação intrinseca, orientariam suas decisões pelos seguintes valores: (i) desfrutar com o trabalho agrícola; (ii) desfrutar com o trabalho ao ar livre; (iii) valorizar o trabalho duro; (iv) a independência nas decisões; (v) aceitar e controlar situações de risco. Em termos gerais, o trabalho de Gasson (1973ª, p. 128), aponta, entre os agricultores, uma predominância das orientações extrínsecas ou expressivas, em contraste com as orientações instrumentais, ou (...) sociais atribuídas a membros de outras ocupações”. A preponderância desses tipos de ‘orientação para trabalho’, tende, pois, dificultar a formação de uma estrutura em rede, na qual o trabalho deve ser coletivamente organizado. 2.2 A estratégia de redes

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Algumas experiências associativas apontam para possibilidades de reverter esse cenário. Estas experiências, conhecidas como redes de cooperação tem apresentado, segundo Cândido e Abreu (2000), Amato Neto (1998), Locke (1995) e Putnan (1993), sucesso em diversos locais e setores, enquanto alternativa capaz de aumentar a competitividade, a geração de renda e o desenvolvimento. “Esses estudos dão especial atenção a aglomerações setoriais de empresas que, pela cooperação ou configuração econômica desenvolvida, criam diferenciais competitivos para as firmas aí localizadas” (BNDES, 2004, p. 11). Dependendo de sua configuração, essas aglomerações são chamadas de Arranjos Produtivos Locais (APLs), Sistemas Locais de Inovação, Sistemas Produtivos Locais, Clusters, Consórcios, Redes de Cooperação, entre outros. Tradicionalmente, os estudos sobre competitividade das empresas eram focados em questões tecnológicas, de demanda, de escala, financeiras e de políticas setoriais. Ultimamente a questão local tem recebido atenção crescente, devido a experiências bem sucedidas ocorridas na região de Emilia-Romagna (Itália) e no Vale do Silício (Estados Unidos), entre outros. “Essas regiões cresceram a taxas muito mais elevadas nos últimos 25 anos, se comparadas à média de seus continentes” (IBID, p.11). A formação de associações, dos mais diferentes tipos, para enfrentar as dificuldades impostas é prática bastante antiga. Em sua tese de doutoramento Cândido comenta sobre a existência, ainda no século XIX, de formas de organizações entre pequenas empresas para utilizarem novas tecnologias produtivas. Em tempos mais recentes, no Japão do pós-guerra, Amato Neto (1998) salienta a importância de um novo padrão de relações inter-empresariais, onde o Keiretsu organization e o sistema de subcontratação contribuíram, sobremaneira, junto com inovações de caráter tecnológico e gerencial, para o intenso processo de desenvolvimento econômico daquele país. A partir da década de 70 o modelo de entrelaçamento entre as empresas difundido no Japão ganha a atenção da Europa, em especial na Itália, na região da Emilia-Romagna. Ali essa proposta de entrelaçamento organizacional é implementada através do governo e de organismos de apoio ao desenvolvimento de pequenas e microempresas (universidades, institutos de pesquisa, instituições financeiras, entre outros), que passam a criar condições para o desenvolvimento regional. Estas redes ou associações passam a ser decisivas para a criação de cadeias produtivas e empresas competitivas em uma região antes deprimida economicamente. A cooperação e a competição podem ser partes de um mesmo relacionamento, conforme Bengtsson e Kock (1999), que usam o termo “coopetição” para descrever tal situação. Entretanto, segundo estes autores, as empresas tendem a cooperar mais freqüentemente quando a atividade [de cooperação] realizada é mais distante dos compradores e tendem a competir nas atividades mais próximas destes. No que se refere ao ambiente rural, Lourenzani et al (2006), sugerem a adoção de ações coletivas por parte dos pequenos proprietários, para a entrada nos canais de comercialização, não só como estratégia de aquisição de escala e poder de negociação, mas como fator de adaptação do produtor aos novos padrões competitivos. Estes autores mostram que a integração gera custos para os envolvidos, mas evidenciam que esta prática diminui os níveis de incerteza nas transações (especificidade de ativos e possibilidade de oportunismo). Deste modo, mesmo tendo custos, os agentes incorrem neste tipo de relação porque acreditam estes custos são menores do que a incerteza na transação. 5

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Há que se considerar que a proposta de redes de empresas é uma iniciativa que vai além dos padrões tradicionais de associativismo. Além mesmo daquele modelo cooperativista, que caracteriza boa parte das associações de produtores rurais, com a finalidade de comercializar a produção, prover assistência técnica e fornecimento de insumos a preços menores aos seus associados. A diferença está na forma do entrelaçamento entre as empresas, que passam a contar com um fluxo de informações entre si; maior que o tradicional. Isso, associado a ferramentas modernas de gestão, possibilitam um rearranjo das atividades de forma a aproveitar as potencialidades de cada componente e as oportunidades dos mercados. Schermerhorn Jr (2001) argumenta que as organizações seriam motivadas a cooperar quando: a) em situações de escassez de recursos ou problemas de performance; b) a cooperação em si é aceita como um valor positivo; c) uma poderosa força extraorganizacional obriga a demanda dessas atividades. A utilização de redes, como ferramenta estratégica para ganhar competitividade e impulsiona o desenvolvimento, se por um lado pode se apresenta como promissora, por outro requer cuidado para a implantação da proposta. Os autores Casarotto Filho e Pires (2001) sugerem que as atividades das redes e/ou consórcios devem envolver principalmente as atividades complementares ao processo de produção tanto a jusante como a montante de forma a valorizar e potencializar a competitividade do produto, conforme Figura 1. Infraestrutura

Tecnologia de Gestão: RH,Qualidade, Planejamento, Gestão Financeira P e D:

Logística de Aquisição:

Produção:

Marketing Logística de Distribuição:

- Atualização setorial

-Compras

- Produção Interna

- Desenvolvimento de produtos

-Estoque de Materiais

- Flexibilidade

-Tecnologia de processos

-Transporte de materiais

- Logística de produção

- Estocagem de produção

- Marca

- Custos Operação

- Transporte de produção

- Redes de distribuição

+

- Vendas - Atendimento personalizado - Assistência

- Produção e terra -

- Atualização setorial

-

+

Tendências para consórcio

Figura 1: Tendência da ação de consórcios de empresas. Fonte: Casarotto Filho e Pires (2001)

Essa maneira de proceder, conforme Casaroto e Pires (2001), acaba por constituir uma via alternativa às estratégias genéricas de Porter (2001); o que pode ser interessante para os produtores de pequenas propriedades agrícolas com poli-cultivo, uma vez que existe dificuldade de especialização e ganhos de escala. O exposto até aqui demonstra que as redes de cooperação vão além de uma alternativa teórica, cabendo aos agentes a decisão de utilizá-las. Na seqüência, faz-se alguns comentários a respeito do processo decisório. 2.3 A questão da decisão

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A adoção de redes de cooperação, como instrumento de competitividade, requer a tomada de decisão para tal. Algumas das teorias mais conhecidas que tratam do processo decisório vêm da Economia. São teorias prescritivas, que buscam indicar uma decisão ‘ótima’ sob a ótica de decisores racionais, representado pelo modelo do ‘homem econômico’. Para isso, lançam mão de cálculos que procuram chegar à alternativa ‘perfeita’ dadas as devidas condições e restrições. “Na decisão racional, há três condições básicas para que ocorra a escolha: (1) que todas as alternativas de escolha sejam dadas; (2) que todas as conseqüências associadas a cada uma das alternativas sejam conhecidas; (3) que o homem racional possua uma completa classificação por ordem de utilidade de todos os possíveis conjuntos de conseqüências” (ZANELA, 1999). Nesse modelo de decisão, segundo Anastassopoulos et al. (1991), a mudança é subordinada inteiramente à vontade do decisor; o método repousa principalmente sobre o julgamento e senso político do mesmo. O autor descreve como passos desse modelo de processo decisório as seguintes etapas lógicas sucessivas: • Diagnóstico do problema; • Percepção e explicitação de todas as ações possíveis; • Avaliação de cada eventualidade pelos critérios derivados dos objetivos ou preferências do decisor; • Escolha da decisão que maximize o resultado – refinamentos, probabilidades, avaliação de risco, custo da informação, etc. Entretanto, a decisão racional possui limites; e fatores cognitivos, situacionais, e informacionais (MARCH e SIMON, 1963), bem como de valores que a influenciam. Diante destas limitações, o indivíduo, impossibilitado de encontrar a decisão ótima, busca a mais adequada tendo em conta as condições disponíveis. Assim, segundo os autores ele se contenta com o satisfatório em detrimento do ótimo. Esse processo de tomada de decisão apresenta fases que, de acordo com Simon (1947), são: (1) A fase de inteligência ou investigação, onde ocorre a exploração do ambiente e os dados são processados em busca de indícios que possam identificar os problemas e oportunidades; as variáveis relativas à situação são coletadas e evidenciadas; (2) a fase de desenho ou concepção, onde ocorre a criação, o desenvolvimento e a análise dos possíveis cursos de ação; o tomador de decisão formula o problema, constrói e analisa as alternativas disponíveis; (3) a fase de escolha, onde ocorre a seleção de uma alternativa ou curso de ação; (4) a fase da revisão, onde ocorre a avaliação de decisões passadas. Nesse processo, para atingir uma situação almejada, segundo Elster (1990), a crença é alimentada pelo desejo do decisor, que parte em busca de evidências para dar suporte a suas crenças. A escolha racional da alternativa é aquela que, de melhor maneira, satisfaz os desejos do decisor, dada suas crenças. Entretanto, o mesmo autor pondera que a quantidade ótima de evidências é parcialmente determinada pelos desejos prévios sobre o custo, qualidade e relevância de vários tipos de evidências (Elster, 1990). Acrescenta, ainda, que a teoria da escolha racional pode falhar através de duas formas de indeterminação: pode haver diversas 7

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alternativas que sejam iguais e equivalentemente boas, ou pode não haver nenhuma alternativa que seja considerada boa. Julga-se que a estratégia de redes pode auxiliar a alavancar a competitividade das pequenas propriedades rurais mais por meio da do processo decisional que deixaria de ser individual/isolado. 3. METODOLOGIA O presente artigo é resultado de um estudo exploratório, buscando informações sobre as iniciativas de associativismo entre pequenos produtores rurais na região Meio Oeste Catarinense, a fim de evidenciar alternativas de melhorias capazes de alavancar o desenvolvimento regional. Estudos exploratórios tratam de aprofundar conceitos preliminares, permitindo também, levantar características inéditas e novas dimensões a respeito da população-alvo (HOPPEN et al, 1996). A pesquisa foi desenvolvida em duas etapas. Na primeira etapa o Universo da pesquisa, era constituído pelos produtores que participam da Feira Livre de Joaçaba. Para esta unidade de análise, se realizou um censo. A coleta dos dados ocorreu na Feira-Livre. A segunda etapa teve como objetivo conhecer as iniciativas de associativismo. Esta etapa teve como unidade de análise “as Iniciativas de associativismo rural”, e o Universo da pesquisa foi constituído por todas as associações existentes no polígono regional compreendido pelas cidades de Joaçaba, Campos Novos, Videira, e Caçador. Nesta etapa a amostra foi determinada por exaustão, na tentativa de realizar um censo regional. A coleta dos dados ocorreu via telefone. Em ambas as etapas utilizaram-se, como instrumento de coleta de dados, a entrevista estruturada. Para a confecção dos instrumentos procederam-se uma investigação prévia sobre as atividades desenvolvidas pelos feirantes de Joaçaba, e revisão da literatura, em busca de conceitos preliminares sobre as potencialidades de organização em rede. “A geração de enunciados inicia com uma revisão da literatura ao qual pertence o construto”. Para a revisão dos enunciados contou-se com a participação da EPAGRI – Joaçaba e de professores da UNOESC. Hoppen et al (1996), observam que, a validação de conteúdo dá-se em duas etapas: a geração de enunciados e o refinamento do instrumento. Ao longo do processo de confecção dos instrumentos, foram realizados pré-testes: quatro com “feirantes”; e dois com técnicos da Epagri. Muitas questões, que apresentaram certa dificuldade inicial de entendimento foram refinadas, enquanto que outras questões, vistas como necessárias, foram inseridas. Segundo Gil (1991, p.132) “a finalidade desta prova... é evidenciar possíveis falhas na redação do questionário...”. Em cada pré-teste era observado: 1) Clareza – vocabulário, conteúdo e compreensão das perguntas; 2) Tempo gasto para responder as perguntas; 3) Instruções suficientes para o correto preenchimento; 4) Influências de uma questão na outra e ordem precisa; Tendo procedido estas correções cabíveis e obtido a validade, os instrumentos foram aplicados nas amostras selecionadas. Para interpretação dos dados, procedeu-se a análise e a sistematização destes através dos softwares Sphinx® e Excel®, a fim de identificar padrões de similaridade entre as associações e avaliar alguns dos aspectos analisados bem como identificar oportunidades de melhorias para a integração das associações de produtores. 8

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4. RESULTADOS Nesta seção mostrar-se-á os resultados obtidos referentes à possibilidade de construir uma rede de cooperação a partir das atividades desenvolvidas pelos feirantes de Joaçaba, investigando, conjuntamente, a intencionalidade de integração e expansão das demais associações congêneres da região do estudo. A seguir apresentam-se os resultados obtidos junto aos feirantes. Em seguida mostram-se os resultados da investigação feita nas associações similares da região. 4.1 A Feira Livre de Joaçaba. A Feira Livre de Joaçaba é composta por 20 produtores, sendo que 11 deles (55%) residem no município de Joaçaba e os demais nos municípios vizinhos de Luzerna, Herval D’Oeste e Ibicaré. Os produtores têm sua propriedade localizada a uma distância média 12 km do centro da cidade de Joaçaba, com um máximo de 27 km e um mínimo de 4 km. As propriedades contam com uma média de 2,6 homens-dia de unidades de trabalho por propriedade, com um mínimo de 1 e um máximo de 5 homens-dias. A área média é de 38 ha, com um máximo de 89 ha e um mínimo de 500 m2. Apenas uma propriedade utiliza mão-de-obra contratada. É interessante notar que a única propriedade que utiliza força de trabalho externa à família difere das demais, quanto à renda bruta da feira, mas não quanto à renda total da propriedade. Esse proprietário parece ter sua orientação para o trabalho distinta da generalidade proposta por Gasson (1973ª). A Tabela 2 ilustra a diferença desta propriedade, relativamente ao restante do grupo. Note-se que, embora com estrutura menor, esta propriedade tem melhor desempenho na feira, e igual à media no desempenho geral (renda total da propriedade). Tabela 2 – Mão-de-obra contratada x Área, Força de trabalho, Distância da propriedade à feira, Renda da Feira, Renda da Propriedade Mão-de-obra Contratada

Não Sim

Área

(ha) 38,85 12,01 média 37,44

Força de Distância Renda Bruta da trabalho Propriedade Feira (Homens-dia ) (km) (R$) 2,61 12,65 2290,06 2,00 4,00 4845,00 2,58 12,17 2424,53

Renda Total da Propriedade (R$) 8543,72 7905,00 8.513,68

Nota 1 : Os números enquadrados correspondem às médias por categoria significativamente diferentes (teste t) do conjunto da amostra (ao risco de 5%) Nota 2: Um produtor (outlier), com renda destoante do grupo, foi excluído.

A Tabela 3 mostra as médias das atividades tradicionais desenvolvidas nas propriedades, com os respectivos indicadores médios de área plantada, produção, e percentual comercializado. Tabela 3 – Atividades tradicionais e indicadores de produção e comercialização

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Atividadei Milho Feijão Suínos Frango Leite Derivados Leite Erva mate

% de produtores que Área (ha), plantel Produção / exercem a atividade (cb), Erva (nº pés) Produtividade 90 11,90 589 sc/ano 70 1,61 11,36 sc/ano 50 212,7 ---70 1458,9 ---75 ----38,67 l/dia 50 ----24,20 kg/mês 85 2401 4608 kg/2anos

% comercializado 40,34 63,41 94,40 67,10 66,67 87,90 92,94

Questionados quanto à participação em associações e a importância de cada uma delas, os respondentes evidenciaram ser a Feira Livre a mais importante forma de associação para 70% deles. A Tabela 4 mostra as associações às quais os respondentes estão vinculados e importância dada a cada uma delas, numa escala com três níveis de importância. Tabela 4 – Associações de vínculo do feirante e respectiva importância de cada uma Qt. Cit. Fre Qt. cit. Freq. (ordem 1) q. (ordem 2) 4 14 70,0 20,0% % Cooperativa de crédito (Credirio) 1 5,0 4 20,0% % Coperio 2 10,0 6 30,0% % Perdigão 1 5,0 0,0% 0 % Tirol 1 5,0 1 5,0% % Frimesa 1 5,0 0 0,0% % Sindicato dos Trabalhadores 0 0,0 1 5,0% % Asso. De Produtores da 0 0,0 10,0% 2 Comunidade Rural % TOTAL OBS. 20 20 Associação Feira Livre

Qt. cit. Freq. (ordem 3) 2 10,0%

20

Qt.cit. (soma) 20

Freq. 100%

2

10,0%

7

35,0%

5

25,0%

13

65,0%

1

5,0%

2

10,0%

2

10,0%

4

20,0%

0

0,0%

1

5,0%

5

25,0%

6

30,0%

1

5,0%

3

15,0%

20

Quando se realiza o cruzamento entre a Renda Total da propriedade e as Associações de vínculo dos feirantes, percebe-se que os feirantes associados a Cooperativa de Crédito tem uma renda significativamente superior àqueles associados ao Sindicato de Trabalhadores ou à Frimesa, como demonstra a Tabela 5

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- Cruzamento entre Associação de Vínculo e Renda Total da Propriedade Associação de vínculo Renda Total da Propriedade Feira Livre 8510,11 Cooperativa de crédito (Credirio) 15299,29 Coperio 8989,69 Perdigão 7905,00 Tirol 11302,67 Frimesa 1859,00 Sindicato dos Trabalhadores 3991,17 Não participo de nenhuma associação Associação de Produtores da Comunidade Rural 7932,00 Nota: Os valores enquadrados correspondem às médias por categoria significativamente diferentes (teste t) do t : conjunto da amostra (ao risco 10%) Tabela 5

A Tabela 6 mostra os tipos de benefícios que as associações trazem aos produtores.

Tabela 6 – Benefícios percebidos pelos feirantes, oferecidos pelas associações. (ordem decrescente) Tipo de Benefício

Qt. cit.

Freq.

14 3 1

70,0% 15,0% 5,0%

1 3 8

5,0% 15,0% 40,0%

1 1 3

Freq. Qt. cit. (soma) 5,0% 16 5,0% 7 15,0% 12

1

5,0%

3

15,0%

8

40,0%

12

60,0%

1ii

5,0%

1iii

5,0%

0

0,0%

2

10,0%

0

0,0%

1

5,0%

1

5,0%

2

10,0%

0

0,0%

1

5,0%

2

10,0%

3

15,0%

(ordem 1)

Garantia de Comercialização Depósito e venda da produção Assistência Técnica Financeiro (empréstimos,venda a prazo,.....) Outras Repasse de informações estratégicas (tendências de mercado, preços e clima,etc) Aquisição de insumos em conjunto TOTAL OBS.

20

Qt. cit.

Freq.

(ordem 2)

20

Qt. cit. (ordem 3)

20

Freq. 80,0% 35,0% 60,0%

20

É evidente a preocupação dos entrevistados com uma infra-estrutura que lhes assegure o depósito e venda da produção e, principalmente, a garantia de comercialização. 17 deles (85%) citaram estes dois fatores como sendo os maiores benéficos em primeira ordem. Quanto à análise é realizada sobre importância geral (soma dos três benéficos mais importantes – conforme mostram as duas últimas colunas da tabela 6), verifica-se que 16 respondentes (80%) ratificaram a importância da garantia de comercialização. A assistência técnica e o suporte financeiro são percebidos por 12 dos entrevistados (60%) 11

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como benefício a ser categorizado entre os mais importantes. O deposito e venda da produção está entre os três mais importantes para 7 dos entrevistados (35%), sendo o mais importante para 3 deles e o segundo em importância para outros 3. Interessante observar que opções como repasse de informações estratégicas e aquisição de insumos em conjunto não são vistas como importantes pelos feirantes, permitindo inferir uma deficiência na cultura organizacional destes produtores (e das associações de vínculo) para um trabalho estratégico coletivamente organizado. Segundo 19 feirantes (95%), não existe nenhuma forma de comunicação entre eles no sentido de estabelecer um equilíbrio entre a oferta e a demanda dos produtos que são levados para comercializar na feira. Quando questionados sobre a possibilidade de planejar a produção “por cotas”, de forma a regular a oferta e a demanda, a maioria dos feirantes demonstrou-se receptivo à idéia, conforme demonstra a Tabela 7. Tabela 7 – Percepção do planejamento por cotas Qt. cit. 1 0 3 9 7 20

Não gosto da idéia e não aderirei a ela Não gosto da idéia, mas preciso pensar melhor Não tenho opinião formada (indiferente) Gosto da idéia, mas preciso pensar melhor Excelente idéia, e aderirei com certeza TOTAL OBS.

Freq. 5,0% 0,0% 15,0% 45,0% 35,0% 100%

Verifica-se que a renda total da propriedade, para daqueles agricultores simpáticos à adoção de cotas de produção, tem uma média significativamente maior que os que não intencionam aderir à idéia. A Tabela 8 mostra os resultados agrupados da Tabela 7, quando cruzados com a renda total da propriedade. Tabela 8 – Cruzamento Renda x produção por cotas Não gosto da idéia Gosto da idéia

Renda Total da Propriedade 2433,33 9649,50

Nota: Os valores enquadrados correspondem às médias por categoria significativamente diferentes (teste t) do conjunto da amostra (ao risco de 10%).

Para 16 feirantes (80%) o impacto da legislação sanitária levou à redução da oferta de produtos de origem animal, por não ser viável atender a legislação. Outros 15%, apesar de considerarem viável atender a legislação, confirmam o impacto negativo desta sobre as vendas. Na percepção dos feirantes, as receitas advindas dos produtos vendidos na feira correspondem a 39,65% do total da receita bruta da propriedade. Este percentual, quando calculado pelos pesquisadores (baseado na quantidade de produtos vendidos na feira e comparado com os produtos mencionados na Tabela 3) é de 54,40%. O desvio, de 12,75 pontos percentuais, é aceitável uma vez que os dados foram coletados através de entrevista estruturada, na qual o respondente não tinha tempo para cálculos. Além das atividades tradicionais, cuja renda foi levantada na Tabela 3, a pesquisa buscou identificar quais produtos e em que quantidade os feirantes comercializavam. Foram identificados e quantificados 90 produtos que são levados para serem comercializados na Feira Livre. Em sua maioria produtos de produção primária. Não se 12

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apresenta, aqui, a relação completa por exigüidade de espaço, imposto pelas restrições metodológicas para a apresentação do artigo. Uma análise mais acurada da relação de produtos comercializados na feira evidencia que, dentre os dez produtos que geram maior renda bruta, nove tem valor agregado pelo processo produtivo e apenas um (beterraba) é produto primário. A Tabela 9 mostra os dez produtos comercializados, com maior renda bruta. Tabela 9 – Os produtos comercializados na Feira Livre de Joaçaba que geram maior Renda Bruta (média mensal anualizada) Renda por unidade Renda (RS) (R$) Produto Unidade Produção % feira vendido na Feira Livre Cuca simples Unidade 176,00 442,40 89,75 2,51 Salame verde 1º Kg 109,20 424,00 60,50 3,88 Cuca recheada Unidade 144,00 420,00 83,00 2,92 Bolo Unidade 144,00 396,00 83,00 2,75 Anholine Kg 155,00 384,00 58,00 2,48 Pão Unidade 204,00 353,74 70,60 1,73 Beterraba Maço 67,54 336,00 74,31 4,97 Salame seco 1º Kg 64,67 290,00 74,50 4,48 Queijo Kg 97,60 210,00 64,20 2,15 Macarrão Kg 51,00 156,00 76,25 3,06

A Tabela 9 permite observar ainda, que metade desses produtos requerem inspeção sanitária para sua comercialização a qual está proibida na Feira Livre de Joaçaba, pelo fato de os feirantes não contarem com infra-estrutura para legalizar a comercialização. Esta evidência permite inferir que o potencial de venda dos produtos de origem animal é bastante superior ao constatado na pesquisa, e que a demanda se elevaria pela qualidade (e conseqüente confiabilidade) inerente que a estrutura propiciaria. Apresentam-se, a seguir, os resultados da pesquisa sobre as iniciativas associativistas, buscando avaliar as potencialidades para criar redes de cooperação regionais. 4.2 Iniciativas de Associativismo Rural Esta parte da pesquisa teve como unidade de análise as “associações” existentes no polígono regional compreendido pelas cidades de Campos Novos, Videira, e Caçador, perfazendo um total de 33 municípios, explicitados na Figura 3, que mostra, também, a quantidade de associações de produtores pesquisadas, por município. Verificou-se que, os tipos de associações mais citadas foram as Associações de Produtores, com 22 citações (44,9%), enquanto que a Feira Livre ficou em segunda colocação com 10 citações (20,4%). Existe uma média de 24 membros em cada associação. A estimativa de produção média por associação para produtos hortigranjeiros é de 13.607,82 Kg/mês, enquanto que a estimativa de produção média de frutíferas é de 12.224,55 Kg/mês. Os produtos de origem animal têm uma estimativa de produção média de 7.425,45 Kg/mês. Essas associações regionais apresentam, afinal, um potencial produtivo de 149,68 toneladas/mês de produtos hortigranjeiros, 134,47 toneladas/mês de frutíferas e 81,68 toneladas/mês de produtos de origem animal, além de expressiva quantidade de mel (6 toneladas/mês). 13

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Cidade Qt. Cit. Freq. Cidade Videira 6 12,2% Herval D' Oeste Caçador 3 6,1% Ibian Matos Costa 3 6,1% Ibicaré Abdon Batista 2 4,1% Iomerê Água Doce 2 4,1% Joaçaba Arroio Trinta 2 4,1% Lebon Régis Lacerdópolis 2 4,1% Luzerna Ouro 2 4,1% Macieira Timbó Grande 2 4,1% Monte Carlo Zortea 2 4,1% Pinheiro Preto Brunópolis 1 2,0% Rio das Antas Calmon 1 2,0% Salto Veloso Campos Novos 1 2,0% Tangará Capinzal 1 2,0% Treze Tílias Celso Ramos 1 2,0% Vargem Erval Velho 1 2,0% Vargem Bonita Fraiburgo 1 2,0% Figura 3 – Número de associações de produtores rurais pesquisadas, por município

Qt. Cit. 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1 1

Freq. 2,0% 2,0% 2,0% 2,0% 2,0% 2,0% 2,0% 2,0% 2,0% 2,0% 2,0% 2,0% 2,0% 2,0% 2,0% 2,0%

A Tabela 10 mostra os produtos comercializados por estas associações.

Tabela 10 – Produtos comercializados pelas associações Produtos comercializados Quantidade de citações Não resposta 14 Hortigranjeiros 11 Frutíferas 12 Origem animal 11 Grãos 1 Mel 10 Outros 8 TOTAL OBS. 49 *A freqüência total é maior que 100% devido à questão ser de múltipla escolha.

Freqüência* 28,6% 22,4% 24,5% 22,4% 2,0% 20 16,7%

Esses produtos (Tabela 10) são comercializados, em sua maioria, no âmbito local, conforme consta na Tabela 11. Tabela 11 – Local de comercialização

14

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Local de venda dos produtos: Não resposta Mercados Feira livre Terceiros Cooperativa Associação Outros TOTAL OBS.

Quantidade de citações 17 8 7 8 6 0 11 49

Freqüência 34,7% 16,3% 14,3% 16,3% 12,2% 0,0% 22,4%

Questionados quanto ao Serviço de Inspeção Sanitária, para os produtos de origem animal, quatro associações (8,2%) afirmaram possuir Inspeção Sanitária Municipal e três (6,1%) afirmaram possuir Inspeção Sanitária Estadual. Uma associação (2%) está em fase de regularização e, a grande maioria das associações, somando um total de 23 (46,9%), não contam com eles. Não responderam 18 (36,8%). Interessante observar que três (30%) das dez associações que produzem mel já possuem certificação com a rede Eco Vida. Outras quatro (40%) estão em busca da certificação. Três (30%) ainda estão viabilizando a “casa do mel”. Quanto à oferta de produtos para outras regiões, com o objetivo de expandir o mercado, 25 associações (51,0%) ressaltaram ter interesses e perspectivas em aumentar a oferta e vender os produtos em outras regiões. Apenas uma associação (2,0%) “está pensando” nesta possibilidade e 12 associações (24,5%) afirmaram não possuírem projetos e perspectivas no momento. Não responderam a este questionamento 11 associações (22,5%). Questionados quanto à possibilidade de realizar parceria ou uma rede de cooperação para comercializar os produtos junto com outros produtores de outras cidades a fim de ganhar mais espaço no mercado e ampliar os negócios, verifica-se que 23 associações(46,9%) já pensaram nesta possibilidade, duas associações (4,1%) ainda não pensaram e 10 associações (20,4%) ressaltaram que esta possibilidade está fora de seus planos. Não responderam 14 (28,6%). Cabe fazer menção que uma das associações entrevistadas, que produz soja orgânica e possuí certificação do Instituto Bio Dinâmico de São Paulo, está buscando com urgência um maior número de associados para expandir a produção e baixar os custos para a exportação. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS E CONCLUSÕES A partir dos resultados obtidos, pode-se inferir que a alternativa “ótima” teórica seria compor uma rede de cooperação entre feirantes e demais associação congêneres, existentes na região, de forma a obterem sinergia e ganho de escala. Teoricamente, “todos teriam a ganhar”. Importa, entretanto, observar algumas complexidades para implementar esta intencionalidade. Em primeiro lugar, conforme observa Gasson (1973, 1973ª), os agricultores podem ser descritos como tendo uma predominância de orientação para o trabalho do tipo intrínseca ou expressiva. Essa característica os induz, entre outras coisas, a terem satisfação em serem proprietários e serem independentes nas decisões. Numa rede de 15

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cooperação, pela necessidade do trabalho ser coletivamente organizado, há a pressuposição implícita de que os participes são interdependentes. Assim, qualquer tentativa deve levar em conta aquelas características e criar estratégias para reorientá-las. Em segundo lugar, mas talvez até mais importante, é preciso considerar que, conforme argumenta Simon (1978), “o contexto decisional está definido por informação incompleta, recursos limitados, multiplicidade de objetivos, conflitos de interesse”. A estratégia de formar redes de cooperação ilustra, com plenitude, a complexidade do processo decisório numa estrutura organizacional desta natureza. Está implícito, na ‘idéia’ de redes, a troca de informações e compartilhamento de recursos, que em princípio tenderiam a favorecer o processo decisional. Entretanto, dado que, para sua estruturação, inúmeros agentes (stakeholders) estão envolvidos, administrar a multiplicidade de objetivos e conflito de interesses, e tornar viável a troca de informações e recursos, é um dos desafios cruciais para a governança da rede. Finalmente, conforme argumenta Elster (1990), os stakeholders precisam crer na idéia de redes, de forma que a estrutura seja função de sua ‘vontade’ intrínseca. Isto é, devem perceber que serão beneficiados com o processo no longo prazo, e dessa forma orientem suas decisões no sentido de fazer vingar os interesses coletivos, mesmo quando tendo que, em certos momentos, compartilhar recursos/informações que poderiam, no curto prazo, lhe prover um ganho maior. Tecidas essas considerações teóricas, vejamos o estudo empírico. A Feira Livre de Joaçaba é composta por 20 produtores associados, enquanto que as associações dos demais municípios entrevistados possuem uma média de 23 produtores associados, indicando similaridade no que se refere à quantidade de associados. Verifica-se também, no que se refere à produção, que tanto a Feira Livre de Joaçaba como suas congêneres regionais produzem frutíferas, hortigranjeiros e produtos de origem animal e têm similaridades no que se refere às dificuldades de comercialização, sejam de escala, de estrutura, ou de logística (de entrada e de saída). Em sua maioria, as associações demonstram interesse e potencialidade de expandir a produção e comercialização, bem como de realizar parcerias para um trabalho cooperativo integrado. As associações detêm competências e/ou know-how similares e/ou complementares, e recebem apoio/suporte de um mesmo órgão estimulador do desenvolvimento agropecuário (a EPAGRI). As deficiências, sejam de ordem financeiras ou estruturais, podem ser supridas por meio de ações coordenadas pró-ativamente, de forma a racionalizar a utilização dos recursos de fomento a produção e comercialização, notadamente por serem similares e por terem um agente coordenador-central (EPAGRI) comum como elemento de apoio e suporte. Isto pode possibilitar ações integrativas buscando a racionalização na utilização de recursos. Para isto a EPAGRI, como principal articulador do processo, juntamente com outros stakeholders, deve promover ações de forma integrada (por meio de seus técnicos, locados nos diferentes municípios), de forma que, ao atender a expectativa de uma comunidade/associação, o façam pensando em um sentido mais amplo e abrangente (sistêmico). Isto é, por exemplo, ao projetar e buscar recursos para construir uma estrutura para comercializar produtos de origem animal, considerem, também, as necessidades e potencialidades de todo o entorno de forma a evitar que esta ação se repita em cada localidade. Tais precauções trariam benefícios de escala e sinergia, por um lado, mas necessitariam de ações coordenadas entre os próprios escritórios da Epagri e dos demais 16

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agentes, e um grande trabalho de base junto às comunidades envolvidas. Potencial existe. Mas é preciso criar condições para que os agentes se articulem e propiciem as condições necessárias para a formação de Redes de Cooperação que promovam o Desenvolvimento Regional. Nesse sentido, a participação e organização de organismos de apoio, como universidades, organismos de fomento tecnológico e instituições de financiamento, em torno de uma proposta comum torna-se crucial para atingir os objetivos esperados. i

(a) 35% dos produtores de suínos trabalham em regime de integração; (b) 5% (um) dos produtores de frango trabalham em regime de integração. Importa notar que um produtor aloja 19.500 animais, “puxando” a média para cima. Se este for eliminado da amostra, a média alojada caí para 71,15 animais e o percentual comercializado para 64,35%. (c) 35% dos produtores de leite trabalham em regime de integração; (d) 10% (dois) dos produtores têm acima de 5000 pés de erva mate. Retirando-se estes, a média de plantas por propriedade fica em 1121 pés. Não há alteração significativa na Produtividade e no % comercializado

ii

Para este respondente a Feira-livre é tida como “fonte de sobrevivência” O Produtor não identificou a causa da importância ______________________________ iii

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