Redes sociais e empresas jornalísticas: como o novo comportamento de consumo pode afetar estratégias digitais

July 15, 2017 | Autor: S. C. da Silveira | Categoria: Digital Journalism, Social Media, Jornalismo Digital, Jornalismo Online
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Redes sociais e empresas jornalísticas: como o novo comportamento de
consumo pode afetar estratégias digitais[1]


Social networks and journalistic companies: how the new consumer behavior
can affect digital strategies


Stefanie C. da Silveira[2]




Resumo: As redes sociais on-line fazem parte da transformação provocada
pela tecnologia nos hábitos de produção, consumo e distribuição da mídia e
do público. A partir disso, as empresas de mídia se adaptam e se inserem no
contexto das mídias sociais. O valor da informação é definido a partir das
lógicas da oferta e da procura. Isso quer dizer que este conceito acaba por
ser reestruturado pelas empresas na tentativa de resgatar o interesse do
público no cenário atual. Isso pode levar a uma redução no número de
notícias e um aumento nas informações mais leves sobre saúde,
relacionamentos, entretenimento e estilo de vida. Dentro deste contexto,
examinamos (de forma não participante), brevemente, a atuação dos dois
maiores jornais de São Paulo (maior Estado do Brasil em número de
habitantes) no Facebook, Folha de S.Paulo e Estado de S. Paulo, a fim de
perceber se a estratégia digital adotada pelas empresas pode significar que
os veículos optem por divulgar informações de cunho mais leve e popular. A
partir desta observação, apresentamos uma visão inicial acerca da atuação
das empresas jornalísticas dentro de sites de redes sociais de acordo com a
criação de valor na era digital.

Palavras-Chave: jornalismo digital, redes sociais, Facebook


Abstract: The online social networks are part of the transformation over
the use of technology in the behaviour of media and public production,
consumption and distribution. In that scenario, media companies adapt and
insert themselves in the social media context. The value of information is
defined from the logic of demand. This means, the concept is reestructured
from media companies in the attempt of regain the public interest nowadays.
It might lead a reduction in the news volume and increase of casual news
like health, relationships, entertainment and lifestyle. Inside this
context we briefly analyse (in a non-participant way) the performance from
two of the biggest newspapers in São Paulo (most populous Brazilian state)
on Facebook - Folha de S.Paulo and Estado de S. Paulo - with the objective
of apprehend if their digital strategy can result in the increase of casual
and popular news appearance in both media vehicles. Based on the
observation of their news publications we present an introductory view over
the performance of news companies inside social networks and how they
create information value in digital times.

Keywords: digital journalism, social networks, Facebook




Introdução

As redes sociais on-line se consagram cada vez mais como um dos pontos
fundamentais ligados à transformação provocada pela Internet, tecnologias
digitais e mobilidade nos hábitos de produção, consumo e distribuição da
mídia. Partindo desde o princípio do aparecimento de softwares de interação
como BBS, IRC, ICQ e MSN até os sites e aplicativos mais populares
atualmente, como Facebook, Twitter e Instagram, as redes sociais online
interferem na forma como o público produz, recebe e distribui informação e
igualmente, na forma como as empresas de mídia, antes detentoras da maior
parte dessas operações, realizam os seus papeis de produção, broadcasting e
interação com o consumidor.

Recuero (2008) esclarece que os sites de redes sociais, como Facebook e o
falecido Orkut, são uma consequência da apropriação de ferramentas de
interação mediada por computador pelos atores sociais. No entanto, esses
sites se diferenciam de outros tipos de software de interação social pela
forma como permitem a visibilidade e a articulação da rede e dos laços
entre seus participantes.

De acordo com pesquisa do Pew Research Center[3], o site de rede social que
mais se sobressai para o consumo de informações é o Facebook. Segundo a
pesquisa, 64% dos entrevistados usam o serviço e dentre esses, 30% obtém
notícias diariamente por meio dele. Além de receber informações, metade dos
usuários de redes sociais on-line compartilhou notícias, imagens ou vídeos,
ou ainda, discutiu um evento noticioso dentro da rede.

Ao mesmo tempo em que revela uma conexão entre notícias e redes sociais, a
pesquisa também indica que os leitores que chegam ao site jornalístico via
mídia social ou ferramentas de busca tendem a ser mais rápidos em suas
visitas e menos exploradores de outras páginas e links internos, em
comparação aos leitores que chegam ao site diretamente via home do site[4].


Em outro estudo de 2010 realizado pelo Pew Research Center, os dados
indicam que seis em cada dez americanos consomem notícias a partir de uma
combinação de plataformas on-line e off-line, e a Internet é a terceira
plataforma mais popular, atrás somente das redes local e nacional de
televisão.

No novo ambiente multi-plataforma de notícias, o relacionamento
das pessoas com as notícias está se tornando portátil,
personalizado e participativo. Chama-se a atenção para as novas
métricas: portabilidade, 33% dos donos de telefones celulares
acessão notícias em seus dispositivos; personalização, 28% dos
usuários de Internet customizaram suas homepages para incluir
noticias e tópicos de seu interesse; participação, 37% dos
usuários de Internet comentaram ou compartilharam noticias em
sites de redes sociais como Facebook e Twitter (Purcell, 2010,
p.2).

O estudo afirma ainda que o consumo de noticias é uma atividade socialmente
orientada e engajadora, na medida em que o público é parte do processo no
compartilhamento destes produtos. Outro ponto da pesquisa, trata do fato
que uma porção significativa dos entrevistados afirmou julgar os sites de
notícias pelo grau com que eles facilitam o compartilhamento destas em
redes sociais e usam esse critério como definidor na hora de escolher a
partir de qual local irão postar as informações que desejam. 

Como se pode perceber pelos dados apresentados até aqui, as transformações
acarretadas pela tecnologia e apropriação desta pelos consumidores geram
uma fragmentação no consumo de informação e uma consequente especialização
da oferta por parte das empresas de comunicação. Picard (2013) entende o
desenvolvimento comunicacional desta forma e aponta que a tecnologia ajuda
a redefinir as lógicas da oferta e da procura que, por sua vez, acabam
definindo o valor da informação. "Por mais de cem anos o negócio das
organizações noticiosas não era o conteúdo e os seus consumidores, mas sim
a oferta de audiência para os anunciantes (p. 21)".

O autor esclarece como o conceito de valor dentro das organizações
jornalísticas acaba por ser ressignificado diante das atuais transformações
por que passa o mercado. "A aplicação do conceito de criação de valor nos
media é relativamente nova e o seu uso é crucial por conta da mudança do
controle sobre o conteúdo dos media para as audiências que estão em
desenvolvimento nas sociedades da informação (p. 25)". Segundo ele, na
tentativa de resgatar o interesse do público, as empresas de comunicação
procuram levar aos consumidores conteúdos que estes queiram ler, ver e
ouvir. Como é impossível atender aos desejos de cada membro do público, as
redações fazem pesquisas de opinião e optam por publicar o que acreditam
ser o desejo da maioria dos leitores. Isso significa que as notícias se
reduzem e aumentam as informações sobre saúde, relacionamentos,
entretenimento e estilo de vida. 

De acordo com Picard, isso faz com que os concorrentes acabem por encaixar-
se também no mesmo segmento, fornecendo produtos muito parecidos, com
informações e contexto semelhantes, buscando atender o mesmo tipo de
público. "O resultado é uma variedade muito pequena da concorrência de
mídia, enquanto o público é servido por uma igualdade excessiva, projetada
para fornecer serviços comuns a fim de atrair maiores audiências (p. 29)".

Dentro do contexto aqui apresentado, buscamos observar a atuação dos dois
maiores jornais de São Paulo (maior Estado do Brasil em número de
habitantes) no Facebook, Folha de S.Paulo e Estado de S. Paulo. Isto
porque, desejamos observar, de forma inicial e não participante, como
ocorre a inserção destes veículos dentro dos sites de redes sociais a
partir da ótica da criação de valor na empresa jornalística. Questionamos
se esta pode ser encaixada no movimento apresentado por Picard (2013) onde,
na busca de recuperação de uma crise financeira e de consumo, as empresas
jornalísticas acabam por reduzir a produção de notícias mais relevantes e
focam na distribuição de material leve, sobre assuntos mais casuais. A
partir desta observação e cruzamento com os dados teóricos, pretendemos
apresentar uma visão inicial de um trabalho piloto acerca da atuação das
empresas jornalísticas dentro de sites de redes sociais.


1. Criação de valor por empresas jornalísticas

Picard (2013) defende que o declínio no interesse do público pelas empresas
jornalísticas e seus produtos ocorre porque estas não acompanharam o
desenvolvimento da sociedade e a mudança estrutural no comportamentos dos
indivíduos enquanto consumidores de informação e tecnologia. Segundo o
autor, os conteúdos produzidos hoje ainda estão centrados em instituições e
formatos tradicionais do século passado, que não refletem os interesses de
uma parte significativa do público. Falta às empresas a capacidade de
cobrir e noticiar as novas formas de envolvimento dos sujeitos com as
instituições, a economia e também o Estado.

Tabernero (2013) também acredita que a crise enfrentada pelos meios de
comunicação não se dá apenas por uma questão econômica e tecnológica, mas
por uma mudança geral de hábitos na sociedade que envolvem o
desenvolvimento territorial, mudanças na forma de se locomover, a questão
da habitação e também as transformações nas posições de trabalho e
profissão. A adaptação dos meios a essas transformações e às exigências do
público, acrescida de elementos objetivos e subjetivos da indústria
jornalística, pode levar à configuração de um produto com altos níveis de
qualidade e consumo.

A crise que vem sendo enfrentada pela indústria jornalística nos últimos
anos força gestores e empresários a tentar encontrar alternativas de
financiamento para os produtos noticiosos. Muitas são as possibilidades já
implantadas ou pensadas como crowdfunding, paywall, micropagamentos e
native advertisement. Todas elas, em maior ou menor grau, demandam a
conquista do público e o convencimento a ele de que vale a pena pegar pelo
conteúdo produzido e distribuído pela empresa em questão. Isso significa
que, ao demandar o financiamento por parte do consumidor, é preciso
considerar profundamente o valor que está sendo criado e oferecido para que
convença-o da validade do investimento financeiro.

A disposição do público em pagar por um conteúdo está diretamente
relacionada ao valor que este atribui ao produto que lhe é oferecido. A
marca, a qualidade e o serviço presentes ali precisam, necessariamente, ser
relevantes para o indivíduo em si para que ele possa definir sua posição
quanto ao pagamento da publicação. Num movimento atual em que a economia da
escassez é substituída pela economia da abundância, a decisão sobre
consumir um produto específico e ainda pagar por ele está cada vez mais nas
mãos dos consumidores.

Nas décadas de 1970 e 1980, momento do apogeu da cultura de massa, o
contexto vivido pelos públicos era de uma economia da escassez de escolhas.
Havia um número específico de canais de televisão e estações de rádio
disponíveis para serem consumidos. A circulação de jornais e revistas
estava limitada geograficamente aos locais onde era viável a sua
distribuição, levando em conta os recursos financeiros empregados no
processo e os interesses das empresas. O contexto em que se vive hoje se
apresenta de forma diferente. Vive-se um momento de economia da abundância
de escolhas.

Há um número muito maior de canais de televisão em função da TV por
assinatura e a quantidade de estações de rádio também cresceu. Além disso,
não é preciso estar no lugar de origem dessas estações de rádio e TV para
ter acesso ao seu conteúdo, grande parte dos veículos de comunicação está
presente na Internet e seus produtos podem ser acessados de qualquer lugar
do mundo. Da mesma forma ocorre com jornais e revistas. A circulação dessas
publicações hoje é geográfica e temporalmente irrestrita. Os jornais são
lidos através do computador e sua atualização é feita continuamente. As
revistas, além de estarem disponíveis online, criam conteúdos diferenciados
e inéditos para quem acessa o material pela Internet. Através das redes
sociais, das trocas de arquivos pela rede, da banda larga, o acesso à
produção musical e até mesmo à participação nesta indústria é largamente
facilitado (ANDERSON, 2006).

Picard (2013) divide os tipos de valores envolvidos com o trabalho das
empresas jornalísticas. Valor social é aquele ligado a interesses amplos e
coletivos; comunitários; valor individual é aquele ligado aos desejos e
necessidades individuais dos sujeitos, variando de pessoa para pessoa;
valor econômico é, obviamente, aquele que envolve dinheiro tanto de um lado
quanto de outro da equação. Além disso, também é preciso levar em
consideração os valores de troca e de uso. O primeiro está ligado ao quanto
o usuário está disposto a investir naquele conteúdo, seja na forma de tempo
ou dinheiro. O segundo trata do quão útil aquele produto é para o sujeito e
o quanto ele atinge os valores individuais do consumidor.

A semelhança entre os produtos jornalísticos, a dependência e uso das
mesmas agências de notícias, a falta de criatividade dos jornalistas e a
comoditização da notícia faz com que o valor do conteúdo produzido caia e
seja percebido pelo leitor como mais do mesmo, levando-o, possivelmente, a
um pensamento de "por que pagar por algo que posso ter de graça e igual via
outra fonte?". Diferenciação, exclusividade, aprofundamento e originalidade
são alguns dos valores que podem tornar um conteúdo jornalístico mais útil
ao consumidor criando, consequentemente, valor individual, econômico, de
troca e uso.

2. Dados, observação e apontamentos

Os jornais O Estado de S. Paulo e Folha de S. Paulo ocupam respectivamente
a quarta e a primeira posição no ranking nacional de circulação de jornais,
de acordo com a Associação Nacional de Jornais[5]. Em São Paulo, são os
dois maiores periódicos diários em circulação no Estado e capital, ambos
com média superior a 200 mil exemplares. Em suas versões para a web, os
dois jornais possuem o sistema de paywall, onde o usuário pode visualizar
uma parte das notícias gratuitamente, sendo, num segundo momento, obrigado
a fazer um cadastro para continuar, e após esse passo, o leitor precisa
pagar pelo acesso para ler o material completo da publicação.

Nas suas presenças nas redes sociais, os dois jornais têm comportamentos
semelhantes, apesar de a Folha possui uma quantidade maior de fãs. No mês
escolhido, de forma aleatória, para análise, a Folha de São Paulo tinha
4.846.240 fãs em sua página no Facebook e o Estado de São Paulo totalizava
2.818.963 fãs. Ao longo do dia, os jornais vão postando em suas linhas do
tempo as notícias mais atuais publicadas em seus sites e também as
reportagens que saíram na edição do dia do jornal impresso. Não há um
número fixo de postagens diárias e os intervalos entre cada publicação
tendem a ser de aproximadamente 10 a 20 minutos, variando conforme a
quantidade de notícias que surgem no dia.

Para realizar a observação piloto do comportamento destas empresas no
Facebook, foram escolhidos três dias aleatórios no mês de janeiro,
definindo apenas que um estaria no final de semana e os outros no começo da
semana, para identificar possíveis diferenças nos comportamentos das
publicações feitas. Optamos pelos dias 24, 25 e 26 de janeiro,
respectivamente, domingo, segunda-feira e terça-feira. Durante a
observação, as postagens feitas pelos jornais foram divididas em
categorias, a fim de que pudessem ser melhor catalogadas. Dividimos as
categorias da seguinte maneira: 1) Esporte, com informações que envolvessem
qualquer prática esportiva, times etc; 2) Entretenimento, com publicações
que envolvessem celebridades, cultura, shows e música; 3) Cotidiano leve,
com informações leves sobre o cotidiano de cidades, como previsão do tempo,
matrículas em escolas, loterias; 4) Cotidiano hard, com informações mais
pesadas como enchentes, crise hídrica, assaltos; 5) Mundo, com o noticiário
internacional; 6) Opinião, com artigos e colunas; 7) Economia, com as
informações da economia nacional e internacional; 8) Política, com o
noticiário envolvendo os três poderes e denúncias de corrupção; 9) Ciência,
com publicações que envolvessem divulgação de informações ligadas a
descobertas científicas.

Tabela 1. Catalogação de publicações feitas pela Folha de S.Paulo
"Folha (4.846.240 "24/01"25/01"26/01"
"fãs) " " " "
"Esporte "4 "11 "2 "
"Entretenimento "8 "13 "7 "
"Cotidiano leve "3 "11 "7 "
"Cotidiano hard "6 "6 "3 "
"Mundo "3 "7 "4 "
"Opinião "1 "2 "0 "
"Economia "5 "1 "2 "
"Política "2 "3 "4 "
"Ciência "1 "0 "0 "
"Total "33 "54 "29 "

Tabela 2. Catalogação de publicações feitas pelo Estado de S.Paulo
" Estadão (2.818.963 "24/01"25/01"26/01"
"fãs) " " " "
"Esporte "1 "1 "4 "
"Entretenimento "5 "3 "10 "
"Cotidiano leve "3 "7 "12 "
"Cotidiano hard "2 "4 "8 "
"Mundo "3 "2 "5 "
"Opinião "1 "3 "2 "
"Economia "3 "1 "5 "
"Política "4 "5 "8 "
"Ciência "3 "0 "2 "
"Total "25 "26 "56 "

Ao longo da observação realizada durante os três dias, podemos perceber
que, os dois jornais publicaram muitas informações de categorias leves e
casuais, mas não eximiram-se por completo de apresentar o noticiário do dia
com informações cotidianas e de política. Além disso, percebemos também que
nos dias de semana, o número de informações casuais foi maior do que no
final de semana. Para fins de comparação, os dados finais dão conta que, no
primeiro dia, 45% das informações publicadas pela Folha de S.Paulo foram de
entretenimento, esporte ou cotidiano leve. No segundo dia, o total subiu
para 65% e, no terceiro, 55%. Quando comparamos os números com o total de
notícias de linha mais hard news (economia, política e cotidiano hard),
vemos que, no primeiro dia, do total de postagens da Folha, 39% pertenceu a
esta categoria, no segundo dia temos 19% e, no terceiro dia, 31%. Ou seja,
há uma distribuição maior de informações casuais e leves do que do
noticiário ligado a questões políticas e econômicas.

No primeiro dia de observação, o Estado de S. Paulo, publicou 36% de
informações pertencentes às categorias de entretenimento, esportes e
cotidiano leve. No segundo-dia, foram 42% e, no terceiro, 47%. No
comparativo com o total de notícias de linha mais hard news (economia,
política e cotidiano hard), temos, no primeiro dia, 36% de postagens nesta
categoria, no segundo dia, 39%, e, no terceiro dia, 38%. Embora a área de
publicações casuais esteja acima no comparativo, os números mostram-se
próximos e não tão discrepantes.

Por se tratar de uma observação curta e experimental, não se pode afirmar
categoricamente que as empresas de mídia aqui vistas estão tomando o rumo
da publicação de informações mais populares e casuais na tentativa de
buscar a audiência e atender a um suposto desejo do público. No entanto,
podemos ver um indicativo de que este movimento está latente no
comportamento das empresas jornalísticas e que um olhar mais atento à
crises enfrentada pelo meio pode mostrar caminhos diferentes a serem
tomados que não acabem por desqualificar o produto noticioso.

Anderson, Bell e Shirky (2013) são categóricos em dizer que não há como o
jornalismo sobreviver seguindo o formato praticado nos últimos 50 anos, uma
vez que as condições técnicas, materiais e de modo de produção já não se
aplicam ao século 21. A crise atual vivida pela indústria jornalística dá
conta de um processo de estagnação de um modelo de negócios baseado na
venda de espaço publicitário. Ao longo de sua história, a imprensa manteve-
se a partir da oferta de audiência para os anunciantes. No momento em que a
audiência adquire poderes de produção, controle maior do consumo e
redistribuição do conteúdo a um custo muito baixo, as empresas entram em
crise, pois já não são as únicas detentoras de espaço e opção de conquista
para os anunciantes. "A fonte básica do subsídio publicitário é a falta de
opção; enquanto o anunciante tiver de contar com o meio de comunicação para
aparecer, esse meio vai poder usar os fundos obtidos para bancar o
jornalismo, independentemente da preferencia do anunciante (p.34)".

Os autores seguem afirmando que além das mudanças trazidas pela própria
tecnologia em si, os sites de redes sociais online fizeram com que surgisse
uma nova categoria de anúncio publicitário de contato mais eficaz com a
audiência e que acaba não entrando no subsídio de conteúdo jornalístico.
"Quando um número satisfatório de empresas decidiu que redes sociais eram
um meio aceitável, o estoque disponível de anúncios passou a ser em função
do (ilimitado) interesse das pessoas umas nas outras, e não da capacidade
do veículo de comunicação de criar conteúdo ou manter a audiência (p.35)".
A Internet permitiu que se medisse com profunda precisão o alcance da
publicidade, criando uma lógica muito mais favorável ao marketing direto.

Além disso, as transformações na indústria agora demandam um contato maior
do jornalista com seu público. Entender o que o atrai, como ele chega à
notícia, o que faz com que ele distribua o conteúdo, são fatores
fundamentais para conquistar o consumidor de conteúdo do novo século.
Também é preciso ter em mente que, nos dias atuais, levando em conta
aspectos como mobilidade e mídias sociais, o público chega à notícia muito
mais através de sua rede de contatos do que pela própria homepage da
publicação.

Considerações finais

A atuação das empresas jornalísticas nas redes sociais quando voltadas
somente para uma tentativa de estar presente no ambiente digital, sem
estratégia definida e como tentativa de inovação na criação de valor e
superação da crise da indústria acaba caindo na generalização de conteúdos
e falta de distinção ente concorrentes. Picard (2013) diz que quando
gestores de comunicação realizam avaliações sobre o que acreditam ser o
desejo da audiência de forma generalizante acabam por reduzir a quantidade
de notícias relevantes publicadas e optando pela postagem de informações
mais leves sobre saúde, relacionamentos, entretenimento e estilo de vida.

De acordo com o autor, este tipo de atitude incorre na homogeneização da
concorrência que acaba por localizar-se nos mesmos segmentos e na
publicação de informações semelhantes, comportamento que pode ser
considerado auto sabotador em tempos de redes sociais on-line e
proliferação de conteúdo gratuito na rede. Projetar o futuro da indústria
de notícias em termos simplistas (transmitindo o que se acredita que a
audiência deseja) também é problemático, uma vez que esta é uma fórmula
para a destruição de valor. Há sempre alguém que pode fazê-lo mais barato e
de forma mais atraente.

O consumo de notícias e informações está diretamente ligado às condições de
oferta e procura, como em outros mercados. Se a procura por assuntos
relacionados a entretenimento e lazer aumenta, consequentemente aumentará
também a produção deste tipo de conteúdo nas plataformas distribuidoras. Da
mesma forma, se um veículo de comunicação cria um produto de sucesso entre
o público, a tendência é que outras empresas sigam pela mesma linha e
acabem criando algo semelhante para aproveitar a direção aberta. As ofertas
mais habituais em cada mercado ajudam a criar hábitos de consumo entre o
público.

No entanto, o momento atual demanda que o mercado jornalístico se
diferencie dos outros. Trabalhamos com uma indústria de informações, não
com uma indústria de chocolates. É preciso ter consciência do papel social
representado pela instituição jornalística, mas não apenas isso, é preciso
também ter consciência da evolução do público, da maior possibilidade de
conhece-lo individualmente e da demanda de oferta de produtos
personalizados e geograficamente contextualizados.

A crise da indústria jornalística precisa ser encarada como um momento não
somente de buscar um novo modelo de receita, mas também um novo modelo de
negócios que afetará a produção, a distribuição, o consumo de informações e
também a essência da profissão que precisa estar atenta às necessidades do
público e da sociedade digital do novo século.


REFERÊNCIAS

ANDERSON, C.W.; BELL, Emily & SHIRKY, Clay. Post-Industrial Journalism -
Adapting to the Present, Tow Center for Digital Journalism, Columbia
Journalism School, 2013. Recuperado em 25 de setembro de 2013 de:
http://towcenter.org/research/post-industrial-journalism

ANDERSON, Chris. A Cauda Longa. Rio de Janeiro: Elsevier, 2006.

ANDERSON, Monica; CAUMONT, Andrea. How social media is reshaping news.
2014. Pew Research. Recuperado em 13 de outubro de 2014 de:
http://www.pewresearch.org/fact-tank/2014/09/24/how-social-media-is-
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PICARD, Robert. Criação de valor e o futuro das organizações jornalísticas.
Porto: media XXI, 2013.

PURCELL, Kristen et al. Understanding the participatory news consumer: How
Internet and cell phone users have turned news into a social experience,
Pew Internet & American Life Project, 2010.

RECUERO, R. Redes Sociais na Internet. Porto Alegre: Sulina, 2008.

TABERNERO, Alfonso Sánchez. Os conteúdos dos meios de comunicação. Porto:
media XXI, 2013.

-----------------------
[1] Trabalho apresentado na Divisão Temática Ibercom, Estudos de
Jornalismo, do XIV Congresso Internacional IBERCOM, na Universidade de São
Paulo, São Paulo, de 29 de março a 02 de abril de 2015.
[2] Doutoranda em Comunicação no PPGCOM/ECA-USP; [email protected]
[3] http://www.pewresearch.org/fact-tank/2014/09/24/how-social-media-is-
reshaping-news/

[4] http://www.journalism.org/2013/10/24/the-facebook-news-experience/


[5] http://www.anj.org.br/a-industria-jornalistica/jornais-no-
brasil/maiores-jornais-do-brasil
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