Redução do tamanho das famílias e padrão de vida. (final do séc. XX)

September 28, 2017 | Autor: I. Costa | Categoria: História do Brasil, Demografía, Distribuicao de renda
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REDUÇÃO DO TAMANHO DAS FAMÍLIAS E PADRÃO DE VIDA




Iraci del Nero da Costa
Nelson Hideiki Nozoe



Como se apresenta a estrutura das famílias e dos domicílios brasileiros na
atualidade? A redução de seus tamanhos tem garantido nível de vida
superior? Vigoram diferenças inter-regionais de monta? Para tais questões
oferecemos, neste artigo, respostas breves e embasadas em recente
levantamento empírico.

A predominância numérica dos domicílios com estruturas simples fica
exemplarmente evidenciada na região sudeste na qual, para 1980, verificou-
se que eles correspondiam a 85,7% do total de domicílios. Aqueles com
estrutura complexa alcançavam, tão-somente, 13,7%, cabendo aos domicílios
com estrutura indeterminada os restantes 0,6%. Dentre os domicílios com
estrutura simples dominavam, amplamente, os que se distinguem pela presença
da família nuclear (pais e filhos solteiros), aos quais coube o peso de
75,8% do número total de domicílios. Estudos realizados para o Brasil como
um todo chegaram a valores não muito discrepantes dos acima reportados.
Note-se, ademais, que não se observaram discrepâncias de monta entre os
meios rural e urbano. Assim, para 1976, os domicílios de uma só pessoa
somados aos que apresentavam famílias nucleares alcançavam 88,2% no meio
urbano e 90,4% no rural.

No tocante ao número médio de pessoas por domicílio verificou-se, entre
1978 e 1985, sensível decréscimo, o qual expressa tendência de há muito
vigorante. Assim, no correr dos anos apontados, o número médio de pessoas
reduziu-se de 4,82 para 4,33 por unidade domiciliar. Tal decremento
verificou-se com maior intensidade no meio urbano -- cuja média caiu de
4,61 para 4,16 -- do que no rural -- onde o mesmo indicador passou de 5,30
para 4,86. Em termos da intensidade deste processo cabe realçar duas
situações extremas: a da área urbana do Norte, na qual se observou o maior
decremento relativo entre 1978 e 1985 -- 13,2% --, e a da área rural do
Nordeste, na qual o decréscimo alcançou apenas 6,6%.

Outra mudança quantitativa de monta deu-se com respeito ao número de filhos
por família, o qual declinou, no período assinalado, de 2,40 para 2,11, o
que implica uma queda relativa de 12,1%. Tal tendência à queda é universal,
vale dizer, independe da situação rural ou citadina dos domicílios, do sexo
dos filhos, e verificou-se em todas as regiões. Não obstante, a quebra
revelou ritmos distintos conforme o corte efetuado; assim, o meio citadino
conheceu um decremento relativo ligeiramente superior ao observado do campo
(10,6 contra 10,3%). O corte em termos regionais revela decréscimos mais
acentuados no Sul do país, região na qual se deu um declínio de 18,3% no
número médio de filhos por família; já no Nordeste a queda foi de apenas
9,6%. Deve-se acrescentar que essa heterogeneidade regional decorre,
sobretudo, dos decrementos havidos no meio rural, pois, nas cidades, eles
pouco discreparam. Esse comportamento parece refletir diferenças devidas
aos distintos momentos nos quais se deu o ingresso de cada área no processo
denotador de declínio da fecundidade, o qual encontra-se na base das
alterações quantitativas aqui referidas. Pode-se acrescentar, ainda, que na
zona urbana das regiões mais altamente industrializadas do país o aludido
processo, iniciado há mais tempo, já dá mostras de esgotamento, pois o
número médio de filhos por família parece tender, assíntoticamente, para um
patamar inferior.

Assim, embora persistam diferenças inter-regionais e entre os meios rural e
urbano, pode-se esperar, em face da tendência genericamente observada, que,
em futuro não muito distante, ocorra uma aproximação entre as regiões e
entre aqueles meios, tanto no que tange ao número médio de filhos como no
que diz respeito ao número médio de pessoas por domicílio.

Acresce, ademais, que as divergências e mudanças verificadas não se prendem
a discrepâncias ou alterações estruturais, mas vinculam-se a diferenças e
tendências quantitativas no âmbito de um padrão estrutural comum. Como
salientado, os quadros distintos aqui delineadas exprimem momentos de um
processo que nos parece geral; trata-se, basicamente, da mudança de tamanho
das famílias e dos domicílios, os quais passaram, em instantes diferentes
do tempo, a reduzir-se. A informar tal processo encontra-se,
fundamentalmente, a queda da natalidade, a qual, por sua vez, pode ser
associada à modernização de comportamentos decorrentes da urbanização e do
crescimento econômico.

Cumpre notar, também, que tais mudanças não se fizeram acompanhar de
alterações na distribuição dos rendimentos pessoais e familiares, donde
poder-se concluir que a redução do número de componentes da família e dos
domicílios não resulta, inexoravelmente, no estreitamento das disparidades
econômicas.

Em termos da remuneração pessoal, avaliada segundo a unidade "salário
mínimo", verificou-se um ligeiro aumento de nível, o qual, na cidade, viu-
se acompanhado de uma tênue melhoria no perfil distributivo da renda. Esta
última ocorrência, circunscrita ao meio citadino, opera no sentido de
alargar o afastamento relativo entre o campo e as cidades, comportamento
este mais nítido e intenso no Nordeste.

Os movimentos apontados acima ficam mais vincados quando se toma por base o
rendimento domiciliar.

A incapacidade de a composição e a estrutura dos domicílios anularem os
efeitos decorrentes da presença dos fatores estruturais desfavoráveis que
informam as desigualdades regionais e "pessoais" fica patenteada pelo fato
de as discrepâncias intra e inter-regionais verificadas no plano pessoal
acentuarem-se quando se trata com os domicílios.

O confronto entre os perfis de remuneração dos domicílios colocados nas
distintas regiões do País sugere uma correlação universal e direta --
principalmente para os domicílios cujo rendimento mensal não ultrapassa
cinco salários mínimos-- entre o número de integrantes dos domicílios e o
nível de remuneração domiciliar.

A presença da afinidade acima referida, conquanto ocorram notórias
discrepâncias inter e intra-regionais quanto ao nível de rendimento e de
padrão de vida, suscita a possibilidade de se observarem comportamentos
demográficos símiles no quadro de contextos econômicos profundamente
díspares.

A conclusão maior é que a redução no número de integrantes das famílias e
dos domicílios pode resultar num aumento daquelas desigualdades. Estaremos
em face, pois, de uma situação na qual a propagação do processo de
"transição demográfica" não terá acarretado o arrefecimento das
desigualdades de ordem econômica nem propiciado maiores oportunidades de
ascensão social.
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