REFLEXÃO SOBRE: ARQUEOLOGIA, MULTIVOCALIDADE E ATIVAÇÃO PATRIMONIAL: LARGO DO COIMBRA, OURO PRETO-MG¹
MUNIZ, Estella Thaynara Barcelos²; S I LVA , G a b r i e l a P a o l a A g u i a r ³ .
Multivocalidade caracteriza-se pela presença de muitas
1940 o mercado municipal foi demolido pelo SPHAN, pondo
vozes em uma informação (Rivolta 2014). Um texto contendo
em operação o projeto de praça de Lúcio Costa (Figura 3)
várias vozes amplia as ideias e pensamentos.
“com a finalidade de dar maior visibilidade à igreja, uma vez
O texto de Rivolta (2014) levanta questões pouco discuti-
que a volumetria do mercado, na visão dos modernistas, con-
das sobre multivocalidade. O autor diz que “às comunidades
corria com a da igreja, e na tentativa de “devolver” à cidade
quase sempre lhes sobram às sobras da economia turística:
seu aspecto colonial de origem. Junto com o mercado, supri-
a venda de artesanatos e os empregos secundários, mas
miu-se a memória social ali depositada” (Marinho 2015).
poucas vezes tem em suas mãos a gestão comunitária dos
Segundo Vieira (2015) na década de 1970 “o espaço do
negócios [...]”. Este exemplo nos remete ao caso do Largo do
antigo mercado e da praça projetada por Lúcio Costa e exe-
Coimbra na cidade de Ouro Preto-MG, onde o patrimônio ar-
cutada por técnicos da SPHAN é ocupado por uma feira de
queológico e cultural é modificado em prol do turismo arque-
souvenir em pedra sabão para os turistas: ironicamente, a
ológico.
função de mercado foi naturalmente retomada”, resgatando-
O Largo do Coimbra localiza-se próximo a Igreja de São
se a função comercial e social. Atualmente o poder público
Francisco de Assis na cidade de Ouro Preto-MG. Desde o
pretende realocar a Feira de Artesanato em Pedra Sabão no
século XIX o Largo tem passado por transformações estrutu-
Paço da Misericórdia, sem a aprovação dos feirantes, pois a
rais e sociais, pois segundo Gillman (2010) apud Rivolta
comunidade de Ouro Preto atribuiu significado cultural ao
(2014) “o patrimônio cultural sempre gravita abaixo da órbita
Largo do Coimbra, uma vez que a cultura material é um sis-
da filosofia política”, ou seja, o Largo é um exemplo de que
tema simbólico em ação (Hodder 1982 apud Rivolta 2014).
os interesses filosóficos e políticos das instituições governa-
A arqueologia do capitalismo responde à necessidade de
mentais da cidade nem sempre correspondem ao que a co-
uma arqueologia que não atenda somente às elites, através
munidade entende por seu patrimônio cultural e nem sempre
de traços de resistência no registro material, de não centrar-
estão de acordo com suas expectativas e interesses.
se somente nos elementos de prestígio (Martínez 2006). A
A trajetória ocupacional do Largo deu-se da seguinte for-
situação evidenciada no Largo do Coimbra representa hoje
ma. Inicialmente o Largo dava lugar ao pelourinho da cidade.
um exemplo de “fetichização da paisagem” urbana –
No século XIX o Largo foi substituído por um rústico mercado
“processo que, na contemporaneidade, constitui-se numa
de tropeiros (Figura 1). No final do século XIX o mercado rús-
tendência internacional de tomar o patrimônio como merca-
tico foi demolido dando lugar a uma construção neoclássica
doria de consumo” (Luchiari 2006 apud Marinho 2014).
que funcionava como mercado (Mercado Municipal de Antônio Dias) e açougue (Figura 2). Em meados da década de
Figura 1: Mercado Rústico. Fonte: Marc Ferrez
Figura 2: Mercado Municipal. Fonte: Arquivo Público
apud Marinho (2014)
Municipal.
¹ Pôster elaborado como parte da avaliação da disciplina Teorias da Arqueologia II do curso de graduação em Arqueologia da Pontifícia Universidade Católica de Goiás. Orientadora: VAZ, Ludimilia Melo. ²
[email protected] ³
[email protected]
Figura 3: Largo do Coimbra, Ouro Preto, “Anteprojeto para o aproveitamento da área resultante da demolição do mercado. Fonte: SPHAN.
Figura 4: Atual Largo do Coimbra, Ouro Preto. Disponível em: . Acesso em 04 de dezembro de 2015.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS MARINHO, M. A. Resistências e contra-usos do espaço público frente às estratégias das políticas de embelezamento urbano – o caso do Largo de Coimbra em Ouro Preto/MG. Revista Iberoamericana de Turismo – RITUR, Penedo, Vol. 5, Número Especial, p. 105-123, 2015. MARTÍNES, V. M.F. Una Arqueología Crítica: Ciencia, Ética Y Política En La Construcción Del Pasado. Ed. Crítica, Barcelona, 2006.
RIVOLTA, M. C.; MONTENEGRO, M.; FERREIRA, L. M.; NASTRI, J. Multivocalidad y Activaciones Patrimoniales en Arqueología: Perspectivas Desde Sudamérica. 1a ed. Buenos Aires, 2014. VIEIRA, L. C. Largo do Coimbra, Ouro Preto: a trajetória de um espaço frente ao pensamento moderno e à política de preservação da SPHAN. UFB, 2015.