REGIMES TOTALITÁRIOS ONTEM E HOJE tempos diferentes, mesmas estratégias

June 5, 2017 | Autor: Maristela Castro | Categoria: Direito Civil, UNICEUB
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PEDAGOGA- Mestranda em DIREITO/Políticas Públicas UNICEUB. Assessora de Ensino Superior
Hannah Arendt, Origens do Totalitarismo, antissemitismo, imperialismo e totalitarismo. Companhia de bolso, S.P., 3ª reimpressão, 2012, pág 550.
IDEM, pág. 553
Pandemia: em uma escala de gravidade, a pandemia é o pior dos cenários. Ela acontece quando uma epidemia se espalha por diversas regiões do planeta. Em 2009, a gripe A (ou gripe suína) passou de epidemia para pandemia quando a OMS começou a registrar casos nos seis continentes do mundo. A aids, apesar de estar diminuindo no mundo, também é considerada uma pandemia. Disponível em: http://educacao.uol.com.br/disciplinas/geografia/surto-epidemia-pandemia-e-endemia-entenda-qual-e-a-diferenca-entre-eles.htm . Acesso em 23/01/2016.
CAMPOS, Amanda. Entenda as diferenças entre xiitas e sunitas. Disponível em http://ultimosegundo.ig.com.br/mundo/2015-07-29/entenda-as-diferencas-entre-xiitas-e-sunitas.html acesso em jan/2016
FERNANDES, Cláudio. Estado Islâmico – Grupo terrorista - "O título de califa era dado aos antigos sucessores de Maomé, que possuíam autoridade política legitimada pela religião islâmica". Disponível em:,
http://historiadomundo.uol.com.br/idade-contemporanea/estado-islamicogrupo-terrorista.htm ,.acesso em jan/2016
O que Allahu Akbar realmente significa- Disponível em: http://iqaraislam.com/conheca-o-islam/o-que-allahu-akbar-realmente-significa/ , acesso em 18/01/2015.
" "Allahu Akbar" é mais do que apenas uma frase; é um modo de vida. Isso significa que Deus é maior do que qualquer outra coisa na Terra, seja a opressão de um tirano cruel matando seu próprio povo ou maior que seus próprios caprichos e tentações. Antes do muçulmano entrar na oração, ele deve proferir "Allahu Akbar" em voz alta. Uma vez que ele faz isso, ele entra na Presença Divina. Isso porque, naquele momento, ele deixa o mundo inteiro para trás, a fim de oferecer a oração ritual. Assim, "Deus é o Maior". No curso de um dia, os muçulmanos vão pronunciar essa palavra, "Allahu Akbar", pelo menos dezessete vezes, uma para cada ciclo de oração ritual. No entanto, existem muitos muçulmanos que proferem com suas bocas "Deus é o Maior", e suas ações desmentem essas palavras sagradas."




REGIMES TOTALITÁRIOS ONTEM E HOJE
tempos diferentes, mesmas estratégias

Maristela Barcelos Castro

INTRODUÇÃO
A história da humanidade, do início do século passado para cá, passou por acontecimentos surpreendentes que mudaram o cenário mundial e transformaram definitivamente o modo de viver e relacionar-se no mundo. A descoberta da penicilina em 1928 que alterou a expectativa de vida da população trazendo cura às doenças bacterianas antes mortais, os avanços científicos e tecnológicos que permitiram ao homem a chegada à lua em 1969, o desenvolvimento industrial que alterou relações familiares, de trabalho, econômicas e políticas e a criação da World Wide Web em 1990, delinearam outro mundo, com outras concepções e crenças.
Outro grande, mas desastroso acontecimento foi a 2ª Guerra Mundial que, em 1945, utilizou-se da maior descoberta científica da época, a bomba de nêutron, conhecida como Bomba Atômica. Utilizada duas vezes apenas em toda a sua história explodiu nas cidades de Hiroshima e logo a seguir, Nagasaki que, por ordem dos EUA em combate contra o Japão, praticamente desapareceram. Apenas nesses dois momentos a Bomba Atômica matou mais de 200 mil pessoas de imediato e, ao longo dos anos seguintes e em decorrência da radiação e mutações genéticas, dezenas de milhares ao longo das décadas. Depois desses episódios nunca mais foi usada, no entanto aterroriza a humanidade até os dias de hoje pelo seu poder de destruição.
Dentro do mesmo contexto de guerra anterior, outra grande mudança no mundo, a que nos deteremos e abordaremos aqui mais detalhadamente sob o olhar de Hannah Arendt, diz respeito aos movimentos totalitários ocorridos durante a 2ª Guerra Mundial. Stalinismo, com Stalin, na URSS e o nazismo, com Hitler, na Alemanha. Esses movimentos, inteiramente novos por suas características e estratégias no ocidente, trouxeram terror e pânico ao mundo. O mais estranho, revelador e digno de reflexão para Arendt, é que nasceram de mundos não-totalitários. Isso evidenciaria a fragilidade dos povos, à mercê de organizações que surgem, muitas vezes, no seio das democracias e que as destroem facilmente e as reorientam à outras modelagens políticas, inclusive ditatoriais, imperialistas e totalitárias inimaginadas.
Se é possível surgir de modelos não-totalitários um governo totalitário as esperanças, segurança e pilares democráticos se abalam e justificam o pânico do mundo ocidental diante da expansão de regimes que fazem do terror, da força e da morte suas mais importantes e mortíferas armas.
Depois de rompida a tênue linha que separava mundos totalitários dos não-totalitários a autora percebe que o risco é iminente e por isso, alerta ao combate irrestrito desses tipos de organizações. Hannah Arendt, filósofa e teórica da política, dedicou-se exaustivamente a tentar compreender os governos totalitários nazistas e stalinistas sob os aspectos políticos, filosóficos e humanos. Contudo, percebia que essa compreensão jamais chegaria a um termo final antes, seria incessante e perturbadora até a morte. Outrossim, não compreendê-lo não a colocou em lugar mais tolerante na luta contra as formas de totalitarismos antes, iniciou rapidamente sua jornada de combate irrestrito.
Nesse artigo, que compõe a finalização da disciplina de Cultura e Direito do curso de Mestrado em Direito/Políticas Públicas do UNICEUB tratar-se-á de alguns aspectos referentes ao totalitarismo ontem e hoje no mundo como a) reflexões de Hannah Arendt sobre como se deu a estratégia totalitária durante a 2ª Guerra Mundial no que se refere ao convencimento de uma população inteira aos objetivos nazistas, recrutamento e mundo fictício criado e mantido durante todo o período considerando a estrutura e forma de governo adotado e b) o Estado Islâmico hoje, suas formas de atração, recrutamento, terror, violência e crueldade espalhados pelo mundo.
O TOTALITARISMO QUE HANNAH ARENDT CONHECEU
Nesse ponto abordaremos algumas questões importantes sobre o desenvolvimento do movimento totalitário na visão de Arendt na 2ª Guerra Mundial. Para a autora a organização apresentou características muito singulares para chegar e se perpetuar no poder. No entanto, serão abordados aqui apenas três. No primeiro caso, uma das estratégias usadas foi a ampliação de um sentimento nacionalista/racial de soberania que não poderia ser interrompido nem diminuído e que gerou, em curto espaço de tempo, cumplicidade entre o povo. Esse sentimento implantado estrategicamente nas mentes dos indivíduos e do povo dizia respeito às suas brilhantes capacidades e força resultante de sua origem ou raça.
A estratégia da superioridade dos alemães, arianos, de forma geral destinava-se apenas à propaganda de massa em vista da captação de simpatizantes e fiéis militantes. Para os nazistas, os alemães ainda não eram uma raça superior, mas o seriam a partir do nazismo. A nova raça seria criada e disseminada de duas formas: a) em vista das experiências genéticas desenvolvidas durante o período que só foram possíveis pelo uso irrestrito e cruel de cobaias humanas, vivas ou mortas. Essas experiências eram feitas em laboratórios muitas vezes localizados junto aos campos de concentração onde havia fartura de "material" humano e b) pela eliminação de todas as outras etnias e raças. Essa segunda estratégia era, segundo Arendt a maior, que pressupunha a dominação do mundo, ainda que de forma lenta, gradual e cruel.
Não havia pressa para expandir o território e a superioridade ariana, seria apenas uma questão de tempo, planejamento e organização. Nesse caso, todo indivíduo ou nação que pudesse de alguma forma, atrapalhar o desenvolvimento desse plano era considerado inimigo e, por isso, exterminado, fosse quem fosse, inclusive alemão.
A partir do trabalho de purificação e construção do arianismo nasceria o "império mundial germânico" com uma raça pura e controle total sobre territórios e povos. Para o movimento ariano a tarefa principal era demonstrar a possibilidade de fabricar superhumamos e aniquilar os impuros e medíocres, mais que vencer a guerra. Seus maiores objetivos estavam no futuro, não no presente. Aspecto importantíssimo que Arendt expõe é que as ações do grande Líder, olhadas de fora, poderiam parecer mirabolantes e prodigiosa loucura, no entanto, faziam parte do plano engendrado do movimento o qual se realizaria plenamente no futuro, não necessariamente no presente ou pela vitória nas batalhas.
No segundo caso, com o poder já instituído e o povo subjugado, a questão era sustentar o mundo fictício criado. A verdadeira realidade a ser experienciada e vivida seria àquela permitida e planejada. Sem essa tarefa cumprida a tentativa nazista não conseguiria ser sustentada. Essa árdua tarefa, de não apenas apresentar um mundo irreal que pudesse ser desejado por todo o povo, mas ainda, sustenta-la e expandi-la, foi um importante ganho nos anos em que seu Líder esteve no poder.
Evitar o confronto entre os acontecimentos do mundo real e o criado foi sustentado e fortalecido pelo completo desprezo do Líder pelos fatos do mundo real, o isolamento imposto ao país tanto dos fatos e acontecimentos externos, como dos internos e ainda sua resoluta e implacável observância às normas criadas. A grande maioria do povo não desconhecia o que acontecia no mundo ou nos campos de concentração. Eles foram isolados da realidade dos fatos. Inclusive, muitos militares que levavam os prisioneiros aos campos de concentração em comboios superlotados não sabiam do que acontecia dentro desses campos e, talvez, nem quisessem saber apesar de todas as evidências. Apenas obedeciam as ordens de seus comandantes.
Conhecer os fatos e outras visões dos acontecimentos colocaria em risco o plano maior do führer. Isolar o povo do que ocorria debaixo de seus olhos, ressignificando os horrores como necessários e proveitosos à expansão dos planos e império foram estratégias utilizadas ao longo de todo o percurso totalitário e assegurou, de certa forma, o número de simpatizantes e cúmplices do movimento.
Mentir ao povo e ao mundo de forma sistemática foi definitivo para o ambiente criado pelo grande Líder. Estadistas totalitários mentem com consistência por que necessitam transformar a opinião pública negativa, as denúncias dos meios de comunicação e as declarações desagradáveis e contrárias em simples enunciados sem valor, falsos e opostos à verdade fictícia anteriormente afirmada e consolidada por ele.
Logicamente, antes de estarem consolidados os planos a estratégia de cindir com a realidade é altamente perigosa. No entanto, uma vez firmada e implantada, as palavras mentirosas foram facilmente absorvidas. Nesse sentido, Arendt faz uma reflexão que os simpatizantes do movimento nunca souberam ao certo o que estava acontecendo apenas aceitavam e acreditavam no que dizia o grande Líder.
O "paradoxo de que a 'sociedade secreta à luz do dia' nunca é tão conspirativa em sua natureza e em seus métodos como depois de ter sido aceita como membro da comunidade das nações em pleno gozo de seus direitos" fazia sentido nesse contexto e o mito, uma vez criado, não careceria mais de longas explicações e justificativas. O aparente paradoxo já estava explicado e a confiança, estabelecida.
Por fim, o último aspecto aqui ressaltado é o expediente utilizado pelo totalitarismo de atomização do indivíduo, ou seja, encaminhar ao isolacionismo o indivíduo retirando-o da família, da sociedade e inclusive do mundo real. Grupos, organizações e sociedades não poderiam existir sob risco de derrocada do plano maior. Cada indivíduo seria muito menos perigoso e mais fácil de ser controlado que se organizado em grupos grandes e políticos.
Nesse diapasão, a sociedade foi desierarquizada e fragmentada indivíduo a indivíduo. Fato era que não havia hierarquia ou status de poder no totalitarismo impostos pelos governos totalitários. Fora o Líder e poucas pessoas de sua absoluta confiança, todos eram iguais, o que estabelecia um ambiente de cumplicidade e suposta isonomia.
Ainda aconteciam nomeações a cargos, tantas quantas fossem necessárias para manter o mundo fictício criado, mas não possuíam valor algum na soma de resultados verdadeiramente desejados pelos nomeados, era uma farsa. Certa feita o próprio Hitler explicou a razão dessa estratégia dizendo que ao nomear cargos permanentes estaria criando um círculo de expectativas e privilégios de saber o que o Líder iria fazer que ele não poderia cumprir. Sentia-se insubstituível e não haveria de delegar isso a alguém ou se dedicar a poucos quando, na verdade, sua pretensão era maior que qualquer grupo, cargo ou hierarquia criada, era o mundo.
As estratégias utilizadas no totalitarismo tenham sido no nazismo, no stalinismo ou com Mussolini na Itália foram muito parecidas, com raras especificidades, no entanto conseguiram, em curto prazo e com grande eficiência, cumprir parte dos planos estabelecidos inicialmente.
Fazer com que indivíduos se sentissem importantes e partes de uma missão, criar um mundo coeso com uma (i)lógica restritiva e fragmentada, mas em cumplicidade com milhares de outras pessoas que faziam também parte dessa mesma missão grandiosa, não foi o mais difícil a ser alcançado, mas deu certo por um período de tempo.
Assim sendo pode-se entender que, sustentar as mentiras mentindo compulsivamente para fortalecer o movimento, aprisionar as massas através de verdades que trouxessem ganho ao movimento, atomizar o indivíduo de forma que se sentisse tão importante quanto qualquer outro companheiro, independente de cargo ou função ou construir um mundo de cumplicidade, culpa e sentimento de que não há volta a não ser a morte foram algumas das estratégias bem-sucedidas nos movimentos totalitários que aterrorizaram o mundo que, assombrado, assistiu, sua ascensão e queda sem fazer ou entender muita coisa, como até hoje se dá.
O ESTADO ISLÂMICO E O TOTALITARISMO NOS DIAS DE HOJE
Nesse segundo momento será analisado o Estado Islâmico, um dos maiores desafios apresentados no mundo atual. Seus métodos, estratégias de guerra, aliciamento e recrutamento se utilizam de metodologias ativas e tecnologias da informação e comunicação disponíveis na rede mundial de computadores e, talvez por isso, sua capilaridade e real possibilidade de expansão seja tão mais perigosa, perversa e assustadora que os métodos anteriormente adotados no meio do século passado.
O terror totalitário hoje assombra o contexto internacional de forma intensa e iminente que deve ser combatido igualmente com a mesma força, contundência e tecnologias. Hoje, o possível inimigo não mora ao lado, está acessível por demais e, muitas vezes, dentro da maioria das casas no planeta em uma interconexão global silenciosa e assustadora, a internet.
Fora os países árabes a Europa, principalmente, tem sido vítima de aliciamento juvenil e muitos dos pacatos jovens europeus, filhos de europeus, estão sendo seduzidos e transformados em máquinas mortíferas. Nessa missão, que muitas vezes recebem de casa pela internet, abandonam família, casa, escola ou trabalho e partem mundo afora em busca de algo que lhes deem sentido de viver e existir, crentes que estão sendo chamados por Ala para uma grande missão. É importante aqui diferenciar os mulçumanos e o islamismo dos terroristas radicais do Estado Islâmico. Apesar da confusão que a mídia induz costumeiramente em seus comentários e notícias sobre o mundo islâmico e o Estado Islâmico um e outro são completamente diferentes em doutrina, crenças e atos praticados.
Poder-se-ia espantados, tanto quanto Arendt, perguntar sobre como de um povo religioso, com valores altos de vida e pós-vida pode nascer um mundo de terror e violenta crueldade que hoje se espalha em nível global como se fosse uma pandemia mundial e avassaladora? Assiste-se perplexos, que é possível nascer no seio de altos valores, humanos e religiosos, um mundo distorcido, absolutista e tirânico.
Assim sendo, será conceituado aqui como mulçumano todo àquele(a) que adere ao Islã, uma religião monoteísta que observa os ensinamentos de Maomé como representante maior de Ala, o deus islâmico. Maomé, fundador do Islamismo, foi quem escreveu o Alcorão e apresentou os ensinamentos de Ala como mais que uma religião, uma concepção de vida onde a crença e a fé são as estruturas da política, da economia e do modus vivendi e operandi na sociedade.
As guerras religiosas do mundo mulçumano iniciaram com a morte de Maomé e duas fortes correntes religiosas se formaram e tornaram-se majoritárias, os Xiitas e os Sunitas. Cada uma delas pretendia a sucessão do grande líder. A partir disso uma violenta rede de intrigas e mortes se iniciou para essa conquista da comunidade islâmica no mundo. Os Xiitas e os Sunitas divergem em algumas questões como o radicalismo frente aos ensinamentos do livro sagrado, o Alcorão, onde está contida a lei islâmica.
Os Xiitas, conhecidos por serem mais tradicionais às leis do islamismo, são hoje minoria no mundo islâmico e os Sunitas, menos no caso do EI, que foram se atualizando em termos de interpretações e acolhimento às transformações que o mundo vem passando são hoje maioria, em torno de 90% da população Islã. Eles são seguidores do Suna, livro onde é descrita a vida de Maomé. Para esses, Estado e religião são únicos e devem estar totalmente integrados à vida do cidadão.
Em 2014 muita coisa mudou no mundo islâmico e o grupo terrorista Sunita chamado Estado Islâmico, derivado da conhecida organização Al-Qaeda liderada por Osama Bin Laden, morto pelos EUA em 2011 no Paquistão, anuncia ao mundo a autoproclamação de seu califa, Abu A-Bagdhadi. Seu formato de ações extremistas e violentas com ataques principalmente contra a Síria e o Iraque estuprando mulheres, massacrando cristãos e Xiitas entre outras terríveis ações, têm mobilizado e aterrorizado o mundo nos dias de hoje.
Alguns dos objetivos do Estado Islâmico são: a) expansão pelo Oriente Médio, b) conexão à Europa e ao mundo de forma geral e c) proselitismo, recrutando pessoas mundo afora, principalmente na Europa, estabelecendo um califado, fundado no modelo teocrático radical e uma liderança mundial de terror.
Ao que parece, e para espanto do mundo ocidental, combater o Estado Islâmico e seus principais objetivos é uma luta que beira à insanidade. A expansão do EI no mundo oriental médio também se fortalece pelo extermínio de populações inteiras com demonstrações públicas e ao vivo pela internet de assassinatos selvagens, inumanos e cruéis.
Sem qualquer tipo de restrição aos locais de bombardeio ou as pessoas a serem atingidas, sejam adultos ou crianças, civis ou militares que não professam sua crença, doutrina e seu deus, aos gritos de "Allahu Akbar" , matam e cometem atrocidades. A morte se alastra e a fome de matar e de poder global parece não saciar.
Um dos instrumentos de maior alcance que o movimento tem nas mãos é a rede mundial de computadores. É por ela que pessoas têm sido recrutadas e doutrinadas ao terrorismo e o trabalho de expansão global de simpatizantes e seguidores do EI. Jovens em tenra idade são aliciados a um mundo fictício onde são convencidos que um deus os escolheu para cumprir uma missão. Com promessas de uma vida separada e comissionada às ações de limpeza étnica e religiosa uma falsa ideia de vida com sentido e utilidade é implantada e esses jovens se entregam, de corpo e alma, ao chamado do grande Líder cometendo atrocidades.
Para sustentar o mundo irreal utilizam-se de vários modelos e metodologias muito conhecidas entre os jovens. Filmes de guerras e games violentos são utilizados como instrumentos didáticos de ensino e acompanhamento das aprendizagens. Nesses materiais o foco é aprender a matar violentamente e perseguir o inimigo até a morte. O modus operandi é sempre o mesmo, erradicar os que não acreditam em Ala através de morte sem piedade e cruel.
Web aulas são oferecidas gratuitamente sobre leitura do Alcorão, orações e como viver a vida religiosa radical. Para alguns ainda, o convite para servir a Alá e ao EI na própria Síria como soldado, homem-bomba ou ainda instrumento sexual, para o caso de meninas, vêm como uma escolha do próprio deus e é exibido como o máximo da fé e do sentido de vida. A Europa estupefata interceptou alguns fugitivos, inclusive meninas europeias adolescentes, que estavam partindo de seus países para a nova terra, a procura de seu líder.
O fenômeno mundial de cooptação de exército de Ala tem surpreendido e espantado o mundo ocidental e notícias de recrutamento de crianças na Síria de até oito anos para lutarem no exército e tornarem-se homens-bomba causam espanto e terror geral. Essas crianças, iniciadas desde cedo em treinamentos pesados de guerra serão o futuro do movimento e, certamente, superarão em muito as atrocidades hoje cometidas pelos seus superiores.
Percebe-se que muitos jovens, apesar de suas vidas aparentemente organizadas e suas necessidades satisfeitas, com estudo e profissão estabelecidos se vêm envolvidos em promessas de vida boa e fácil através da lavagem cerebral de limpeza étnica/religiosa/política islâmica radicalista. Instituições humanitárias têm trabalhado no sentido de trazer essas meninas e meninos do pensamento radical para uma vida real e contam que o retorno é um árduo caminho de volta, mas que deve ser feito a qualquer preço.
Não é sem razão que Arendt parte, na sua tentativa de compreender, do desconcertante entendimento de que os movimentos totalitários podem nascer no seio de sociedades não-totalitárias e sugere que nesse processo a auto-compreensão poderia ser um dos caminhos para o fio de Ariadne.
Perguntas como de onde vêm o financiamento dessa guerra, de onde vêm as armas compradas e como são aliciados jovens no mundo inteiro para seu exército precisam ser honestamente respondidas para melhor combater o totalitarismo que assola o mundo atual e suas fontes de sustentabilidade. Certamente Hannah ficaria surpresa com os avanços e as proporções que um movimento totalitário no mundo de hoje pode chegar. Movimentos totalitários não se tornam o Estado, mas o usam para a manutenção do mundo fictício e de uma fictícia ordem.
REFLEXÕES ENTRE ONTEM E HOJE
Parece inacreditável que ao estudarmos os movimentos totalitários ocorridos na segunda grande guerra mundial e as estratégias utilizadas em 1945 para chegarem e permanecerem no poder, consideradas à época como a excrescência do século XX, possam hoje, em 2016, em plenos século XXI, ainda serem tão familiares e efetivas. Claro que há novos instrumentos à disposição, que anteriormente não havia.
A rede mundial de computadores trouxe nesse século a possibilidade de conquista, conhecimento e aprendizagens jamais imaginadas. Entretanto, na mesma proporção que pode ser usado positivamente para entretenimento, aproximação, comunicação e informação entre as pessoas, pode ser também para a destruição, disseminação de radicalismos doentios, violência, crimes e morte.
É importante perceber, mesmo sem compreender, como Arendt afirmava, que os mesmos planos, técnicas e estratégias anteriormente utilizadas no passado ainda hoje o são na atualidade e com grande eficiência e eficácia por terroristas. Talvez essas técnicas tenham muito mais a ver com a essência do ser humano e suas necessidades que com qualquer outra coisa. Oferecer grandes motivos às pessoas para existirem, grandes ações a serem feitas e a própria seleção, "dentre muitos, fui escolhido" pode ser muito atraente, dependendo do nível de maturidade, consciência do real e estrutura sócio-emocional.
A sociedade tal qual tem se constituída nos séculos XX e XXI oferece muito pouco em termos de desenvolvimento das potencialidades humanas ligadas ao sentido de existir comunitário. Cada indivíduo precisa correr atrás dos seus sentidos particulares e intrínsecos, descobrindo dentro de si o próprio sentido. A globalização trouxe inúmeras vantagens, mas inúmeros efeitos colaterais indesejáveis e um deles é o isolamento e a sensação de anonímia. Nesse sentido, ter uma missão, ser útil ou escolhido é um bom argumento para motivar as pessoas e as retirarem do encapsulamento e clausura para uma irreal ideia de significado e grupo.
Nesse diapasão, para o totalitarismo hoje, descrito aqui como o Estado Radical Islâmico, implantar falsas crenças como a de que a pessoa é escolhida por deus para cumprir uma grande missão de expansão do Islamismo sobre a face da terra pode parece loucura inicialmente, mas para as pessoas envolvidas e seduzidas, fazer sentido.
Outra estratégia utilizada, a de apresentar/criar e sustentar um mundo fictício em um todo organizado e com certo sentido e utilidade pode trazer segurança a quem entra nesse mundo controlado. A padronização de modelos, o recrutamento, as capacitações, o envolvimento religioso fundamentalista e as atividades/ações práticas que devem ser realizadas trazem um fortalecimento no sentido de estar fazendo algo progressivamente útil e que a cada etapa transposta outros desafios virão e serão superados, a metáfora perfeita do game que tanto atraem os jovens na atualidade.
Nesse mundo fictício, a doutrina religiosa que é também política, acolhe a violência em seu seio como uma limpeza religiosa/política necessária e conclamada por deus, uma causa a defender em nome de Ala e, tudo isso, através do "game". Nessa causa todos que não professam a doutrina radical islâmica são inimigos, de onde se retira a premissa que o mundo ocidental é ameaçador e deve ser eliminado.
Nesse mundo/jogo de inimigos mortais para sustentar a falácia de guerra santa é importante os soldados se afastarem de suas famílias, de sua comunidade, escola ou trabalho cindindo ao máximo com o mundo real e se dedicando exclusivamente aos serviços de Alá.
Essa cruzada religiosa em busca de novos fiéis passa, muitas vezes, despercebida. Nem mesmo a família reconhece as mudanças bruscas de comportamento e tardam a se aperceber do que acontece no "seguro" quarto da casa, separado da violência do mundo. Quando isso acontece, muitas vezes é tarde e, o envolvimento mental, quando não físico, já deformou caráter, mente e personalidade de forma devastadora.
Para Arendt, o povo alemão, os soviéticos e italianos, berços do totalitarismo ocidental, se aperceberam muito tardiamente da terrível situação em que seus países se encontravam nesses regimes. Havia, segundo ela, uma aparente cumplicidade que se demonstrava por uma simpatia do povo pelos seus líderes. Somente muito tempo depois de esses líderes tomarem o poder, reorganizarem a sociedade e darem cabo aos seus planos e estratégias iniciais foi que esses povos, e o mundo, se aperceberam dos horrores, das crueldades cometidas e das falácias outrora ditas e prometidas caírem ao chão.
Hoje, não se sabe ao certo o quão avançado e disseminado está o totalitarismo do Estado Radical Islâmico no Oriente Médio, Europa e pelo mundo. Ao que parece, no entanto, pode estar mais avançado do que se espera e mais preparados para abater e fragilizar qualquer um desses lugares do que se possa entender e acreditar. Haja vista os horrores iniciados na Europa ao longo de ano de 2015.
Os países originários desse movimento, o mundo árabe, pouco parece se importar com o que acontece no mundo, e suas antigas e eternas guerras, apenas se somam a mais uma. Arendt encontraria a mesma cumplicidade encontrada naquela época hoje no mundo. Somente, bem aos poucos, e teme-se seja já adiantada a hora, o mundo se organize para um combate mais coordenado e sistematizado. Salvo engano, compelidos por três grandes forças: a) pela diáspora de grandes massas populacionais fugitivas das barbáries cometidas, cada vez mais cruéis e violentas, b) pelos ataques terroristas que vêm sofrendo nos seus próprios países e c) porque seus filhos estão sendo recrutados para o totalitarismo radical islâmico pondo em risco o futuro dessas gerações.
No primeiro caso, os noticiários hoje registram diariamente o movimento de dispersão de mulçumanos pelo mundo. As fronteiras de países vizinhos que estão em paz são hoje os lugares mais procurados e sonhados, até a exaustão se for preciso, para a busca da liberdade. A fuga para países democráticos e sem guerra têm levado milhares de pessoas para a Europa causando um desiquilíbrio demográfico, político e econômico assustador.
No segundo caso, a migração tem gerado uma preocupação e descontentamento mundial sobre como acolher essas pessoas, assentá-las e subsidiá-las com possibilidades de reconstruírem suas vidas. Agregada a essa preocupação, outra mais perigosa, é a questão de quem está vindo para pedir asilo nesses países. Poderá também, junto com a massa humana, vir os próprios terroristas em busca de novos espaços e entrada nesse mundo que hoje se vê forçado à solidariedade além fronteiras?
No terceiro e último caso aqui levantado o perigoso recrutamento de crianças e jovens europeus tem causado pânico nas famílias desse continente. Aeroportos estão vigilantes no sentido de abordarem e até impedirem, se for o caso, jovens passageiros, meninas ou meninos, de embarcarem aos países árabes desacompanhados dos pais.
CONCLUSÃO
Os acontecimentos e descobertas científicas desses três últimos séculos trouxeram ao ser humano uma sensação de poder sobre a natureza e sobre os próprios homens até então não imaginado. No entanto, o custo dessas descobertas, tem despertado nesse ser humano certos comportamentos políticos, sociais e econômicos desastrosos.
As catástrofes ocorridas e o empoderamento do homem/deus trouxe desenhos novos que movimentaram direitos humanos, busca de liberdades, oportunidade de construção de individualidades e um ensimesmamento em relação à coletividade que mudaram as paisagens sociais. Talvez essa realidade contribua hoje para comportamentos estranhos, violentos e egoístas, inclusive a falta de empatia e reconhecimento do outro como ser que tem vontades, sonhos, desejos e suas próprias verdades respeitadas.
O totalitarismo no século XXI no ocidente aparece com força redobrada e armas quase incontroláveis. Ao que parece, a luta não acabou nem acabará tão facilmente. Ainda que haja importantes similaridades entre as táticas utilizadas pelos movimentos totalitários ocorridos durante a 2ª Guerra Mundial, o que ocorre hoje no mundo, é imensuravelmente maior.
Para esses movimentos hoje não existe limite territóriais, não existe dificuldade para entrar dentro das casas e quartos e alcançar jovens em plena adolescência angustiados e perplexos com esse mundo, deprimidos pela sensação de inutilidade e falta de sentido.
O perigo hoje pode ser devastador proporcionalmente ao que foi no passado. Infelizmente, ainda não se criou uma força que ameace o totalitarismo Radical Islâmico e parece que ainda está longe. O planeta não está preparado para essa batalha, que pode estar, inclusive, dentro de casa.
Há que se refletir, em termos mundiais, sobre alguns valores que essa sociedade atual tem dado crédito e importância. Talvez esses valores tenham distorcido o sentido de viver e existir nesse mundo. A pergunta sobre onde essa geração tem falhado não pode calar porque dessas falhas que oportunistas, como um vírus na rede diante de uma fragilidade, têm entrado e realizado seu trabalho.
Com certeza esta geração que está crescendo precisa de acompanhamento de responsáveis e da responsabilização da sociedade pelos seus filhos. Rigor e proteção às crianças, aos jovens e às famílias precisam ser pensados em termos mundiais.
Talvez ainda seja possível parar e retrair o crescimento do movimento Radical Islâmico no planeta, caso contrário, o extermínio humano poderá vir antes mesmo daquele que hoje mais nos preocupa, a degradação ambiental. Talvez, antes de destruir o planeta pelas imundícies que se fabricam e liberam no ambiente, se destrua a si próprio.


Referências
ARENDT, Hannah. Origens do Totalitarismo, antissemitismo, imperialismo e totalitarismo. Companhia de bolso, S.P., 3ª reimpressão, 2012.
PANDEMIA- significado. Disponível em: http://educacao.uol.com.br/disciplinas/geografia/surto-epidemia-pandemia-e-endemia-entenda-qual-e-a-diferenca-entre-eles.htm , acesso em fev/2016.
CAMPOS, Amanda. Entenda as diferenças entre xiitas e sunitas. disponível em http://ultimosegundo.ig.com.br/mundo/2015-07-29/entenda-as-diferencas-entre-xiitas-e-sunitas.html acesso em jan/2016.
O QUE ALLAHU AKBAR REALMENTE SIGNIFICA- Disponível em: http://iqaraislam.com/conheca-o-islam/o-que-allahu-akbar-realmente-significa/ , acesso em 18/01/2015.
FERNANDES, Cláudio. Diferença entre Xiitas e Sunitas. Disponível em: http://historiadomundo.uol.com.br/idade-contemporanea/diferenca-entre-xiitas-e-sunitas.htm acesso em jan/2016.
FERNANDES, Cláudio. Estado Islâmico – Grupo terrorista. Disponível em: http://historiadomundo.uol.com.br/idade-contemporanea/estado-islamicogrupo-terrorista.htm acesso em jan/2016.

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