Regulação do ensino do design de Moda - para quem?

June 28, 2017 | Autor: Luz Neira García | Categoria: Educational Technology, Brazilian Fashion
Share Embed


Descrição do Produto

Regulação do ensino do design de moda – para quem? Regulating fashion design education: for whom? Sousa, Cyntia Santos Malaguti de; Doutora; FAU-USP; Centro Universitário Senac - SP [email protected] Neira, Luz García; Mestre; FAU-USP; Centro Universitário Senac - SP [email protected] Bastian, Winnie; Mestre; Centro Universitário Senac - SP [email protected]

Resumo A recente expansão do ensino superior no Brasil, sua regulação e a utilização de diferentes instrumentos de aferição de qualidade, têm interferido diretamente na formação em Design de Moda. Este artigo discute as mais recentes orientações do Ministério da Educação e órgãos afins sobre o assunto, confrontando-as com outras diretrizes governamentais e demandas sociais atuais. Palavras Chave: design de moda; currículo; avaliação.

Abstract Recent higher education expansion in Brasil, its regulation as well as the use of different tools for quality evaluation, have interfered directly in fashion design education. This article discusses the most recent guidelines on the subject implemented by the Ministry of Education and related entities, with regard to other government guidelines and present social demands. Keywords: fashion design; curriculum; evaluation.

Regulação do ensino do design de moda – para quem?

Introdução A recente expansão do ensino superior pode ser notada, num primeiro olhar, de diferentes maneiras: o movimento de transformação de algumas das antigas faculdades em Centros Universitários ou a criação de novos centros, o surgimento de cursos superiores em diferentes níveis e modalidades e, ainda, a abertura da área de atuação destas instituições para segmentos entendidos como promissores, mas às vezes alheios à experiência anterior. Dessa forma, a educação superior privada no Brasil passa por um momento de intensa concorrência, e as avaliações promovidas pelo governo têm muito valor: além de aprovar ou não o funcionamento de cursos, qualificam as diferentes ofertas por meio de distintas ações, cujo resultado, acaba se tornando um instrumento utilizado pela própria instituição para manter-se sustentável num cenário competitivo. Nesse ambiente se insere a formação superior em moda. Temos visto o surgimento de vários perfis de cursos em instituições novas ou antigas mas sem tradição na área, diferentes competências destacadas, diversas modalidades de frequência e nomenclaturas variadas. Notadamente após 2006, o governo vem exercendo mecanismos de controle com mais vigor, provavelmente buscando manter uma qualidade mínima que nivele os cursos. Este artigo dedica-se a discutir sobre a fundamentação legislativa e cultural do ensino de moda no país, a partir do resgate de sua regulação e de sua recente história. Explora, com ênfase no estado de São Paulo, tanto a oferta de cursos quanto suas principais características, além de comparar a oferta-referência à aplicação das avaliações. Por fim, discute a intersecção do currículo e das avaliações com as demandas do setor produtivo e também com as políticas governamentais de promoção do desenvolvimento para a internacionalização do design e da moda brasileiros.

A regulação do ensino superior em moda no Brasil O ensino de moda, como carreira de nível superior, é muito recente no Brasil. Considera-se que o primeiro curso criado no país foi o da Faculdade Santa Marcelina em 1987, mas somente em 2002 a moda passou a ser considerada pelo Ministério da Educação (MEC) como um conteúdo curricular específico do design. A partir de então, a formação em moda oferecida pela maioria das instituições superiores no país passou a ser norteada pelas Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Design, consolidadas na Resolução CNE/CES nº 05, de 08 de março de 2004. Este documento influenciou diretamente a conformação dos projetos pedagógicos da área, levando ainda a um processo de ajuste dos cursos criados anteriormente, de modo a manterem o direito de funcionar e conquistarem reconhecimento social. Tais diretrizes têm permeado a cultura de ensino de moda no país: conhecimentos e práticas do campo do design passaram a conviver com os mais tradicionais do campo da moda e a própria cultura do design também começou a se aproximar mais daquela, tratando mais profundamente de aspectos sócio-culturais e simbólicos, entre outros. Após uma fase de ajustes, a medida trouxe benefícios, sobretudo pelo espaço criado para uma articulação mais abrangente, diversa e sistêmica do campo do design como um todo. As diretrizes admitiam, ainda, “modalidades e linhas de formação específicas” conforme as características e demandas de cada região, o que incentivou a criação de diferentes habilitações. A criação do Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior (SINAES), pela Lei n.10.861 que instituiu o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (ENADE) deu-se em 2004. Assim, de um lado as diretrizes estabeleciam parâmetros mínimos, deixando certo grau de liberdade aos diferentes projetos pedagógicos; de outro, o ENADE procurava assegurar que tais parâmetros fossem atendidos, dentro de uma política de melhoria da qualidade do ensino superior no país. 9º Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design

Regulação do ensino do design de moda – para quem?

A partir de 2006, os exames do ENADE passaram a ser aplicados aos cursos de design, sendo utilizada a mesma prova para todas as habilitações em design. Apesar de o exame aplicar-se também aos cursos de design de moda, nenhum dos assuntos abordados nas perguntas de conteúdo específico contemplava aspectos próprios desta área, como pode ser visualizado no Gráfico 1, a seguir1.

Gráfico 1 – Relação de assuntos específicos abordados (30 questões) Na época, o exame voltou-se aos alunos ingressantes e concluintes dos cursos, em substituição ao antigo modelo aplicado pelo Exame Nacional de Cursos (ENC-Provão2), cuja prova era aplicada apenas aos concluintes. Se, por um lado, à ocasião, a aplicação do Enade evidenciou eventuais desajustes existentes nos cursos, direcionando possíveis necessidades de mudanças nos conteúdos curriculares para atender aos exames, de outro ficava a pergunta: até que ponto tal perfil de exame daria conta das particularidades dos cursos com habilitações específicas, como os de design de moda? Seria este mecanismo capaz de subsidiar uma avaliação adequada da formação proporcionada por esse curso? Ainda em 2006, o MEC, por meio do Catálogo Nacional de Cursos Superiores de Tecnologia, contempla também a formação tecnológica em design de moda. Esse documento propôs-se a organizar e orientar “[..] a oferta de cursos superiores de tecnologia, inspirado nas 1

Análise de obra elaborada com base nos documentos que a instruíram. O Provão foi um exame aplicado aos formandos entre 1996 e 2003, com o objetivo de avaliar os resultados do processo de ensino-aprendizagem dos cursos de graduação. Nunca foi aplicado ao Design. Fonte: http://www.inep.gov.br/superior/provao/default.asp. Acessado em 19/04/2010. 2

9º Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design

Regulação do ensino do design de moda – para quem?

diretrizes curriculares nacionais e em sintonia com a dinâmica do setor produtivo e as expectativas da sociedade”3. Esta nova medida estabeleceu como carga horária mínima de tal modalidade 1.600 horas e levou à criação de vários novos cursos no setor, além de “enxugamentos” em cursos anteriormente existentes.

Gráfico 2 – No. de autorizações concedidas para cursos superiores4 de moda

Gráfico 3 – Tipos de curso autorizados 3

www.portal.mec.gov.br. Acessado em 21/04/2010 Bacharelados em Design de Moda, em Moda, Tecnologia em Design de Moda, em Moda, do Vestuário; no estado de São Paulo em março/2010 4

9º Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design

Regulação do ensino do design de moda – para quem?

Gráfico 4 – Número de vagas autorizadas

Gráfico 5 – Carga horária média Em 2009, o ENADE foi novamente aplicado aos cursos de design. Duas modalidades de exame, porém, foram empregadas: uma, voltada aos cursos de bacharelado em design independentemente da habilitação oferecida, e outra dirigida aos cursos tecnológicos, cujo conteúdo variava conforme o perfil do curso, onde inclui-se a moda. A pergunta que fica, sem dados disponíveis sobre os resultados das avaliações, é: quais cursos de design de moda obtiveram as melhores notas, os bacharelados ou os tecnológicos? Finalmente, ainda em 2009, o MEC consultou as IES sobre a proposta de alinhamento da nomenclatura de vários cursos, sugerindo a denominação Curso Superior de Tecnologia em Design de Moda. Essa consulta vem ao encontro das políticas já anunciadas no parecer5 CNE/CES 277/2006, que destaca que “uma estrutura que divide a formação tecnológica em uma multidão de cursos torna muito complexa a implantação de uma política de desenvolvimento industrial”. Isso torna evidente um movimento rumo ao fim, no país, dos bacharelados em design com habilitações específicas. A única modalidade possível de ensino superior em design de moda seria na categoria de tecnólogo. Todos os pareceres, diretrizes, referenciais, legislações e instruções citadas neste artigo, são obtidos no site do MEC – www.mec.gov.br. As provas do Enade, bem como demais informações sobre avaliações, são obtidas no site www.inep.gov.br 5

9º Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design

Regulação do ensino do design de moda – para quem?

Quais os impactos das mudanças ocorridas a partir da criação do SINAES, em 2004? Qual seria a qualificação mais adequada para um designer de moda – bacharel ou tecnólogo? Faz sentido a opção excludente por um ou outro modelo num país como o nosso?

O perfil do criador de moda Como ponto de partida para tais reflexões, é importante confrontar o perfil de formando proposto pelas diretrizes curriculares com o perfil do criador de moda face ao contexto de sua atuação profissional. As diretrizes para os bacharelados em design enfatizam que, com relação ao perfil do formando, eles devem ensejar (§ 3º): [...] capacitação para a apropriação do pensamento reflexivo e da sensibilidade artística, para que o designer seja apto a produzir projetos que envolvam sistemas de informações visuais, artísticas, estéticas, culturais e tecnológicas, observados o ajustamento histórico, os traços culturais e de desenvolvimento das comunidades, bem como as características dos usuários e de seu contexto sócio-econômico e cultural.

O “espírito artístico” destacado no documento, tradicionalmente é cultivado no criador de moda do país, mesmo antes da formalização dos cursos superiores na área. Contudo, no mundo ocidental em geral, a maneira de se compreender o ensino/aprendizagem das linguagens artísticas acompanha a transformação da sociedade. Inicialmente, a educação em arte visava a transferência de técnicas pelo convívio intenso entre mestres e discípulos; no Renascimento caracterizou-se como a prática associada à descoberta do mundo pelo contato do “artista em formação” com os conhecimentos científicos e intelectuais; o início do século XIX, destacou-se pela busca de uma arte liberta de regras. Talvez esse período, por coincidir com o apogeu da figura do ‘grande costureiro’ em Paris, tenha influenciado a moda, levando à atribuição do status de artista ao criador de roupas. A partir do século XX, com a ampliação das redes de comunicação de modo antes inimaginável, o “grande costureiro” expandiu seu raio de ação, tanto pelo valor adquirido pelas marcas, quanto pelo crescimento do prêt-à-porter. Esse movimento, de certo modo, transformou criadores em designers ou, ainda, possibilitou a ascensão destes últimos, que já trabalhavam nos processos produtivos para as massas. Tornou-se necessário o desenvolvimento de competências correlatas ao que poderia ser chamado desenvolvimento do “gênio”, “dom” ou “talento” inato. Assim, a escola ou a “formação oficial” em moda assume um lugar de destaque para o desenvolvimento profissional, tornando-se praticamente obrigatória, pois o reconhecimento social passa pela diplomação. O impacto dessas transformações é notado a partir do percurso histórico da formação em moda no mundo. As características originais da primeira escola, a École Supérieure des Arts et Techniques de La Mod (ESMOD), idealizada pelo alfaiate francês Alexis Lavigne em 1841, foram sendo revistas a partir de uma nova visão de educação – atualmente compreendida como elemento de inserção social –, e dos desafios impostos pelas contínuas transformações das condições de atuação do campo. Novos modos de circulação e consumo da moda exigiram novos modos de criação. Há mais de cem anos, escolas que buscam oferecer uma formação ampla em moda exploram alguma aproximação com o design. De fato, como aponta Moura (2008, p. 70): O design também é uma atividade multi e interdisciplinar que permeia todo o processo no desenvolvimento de um projeto ou de um produto destinado à reprodução, ao acesso ou destinação a um grupo de pessoas e à comunicação. Da etapa de concepção e criação ao relacionamento com o setor de marketing, da etapa de desenvolvimento ao setor de produção, cabe ao designer buscar a melhor solução, 9º Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design

Regulação do ensino do design de moda – para quem?

inclusive pensar e acompanhar a problemática do uso, do descarte e da reutilização dos produtos e seus efeitos na sociedade. Todas as questões apontadas estão presentes e são vivenciadas no design de moda.

A Parsons School of Design, promoveu a primeira especialização em criação de moda em 1904 e, em seguida, outras importantes escolas com as mesmas preocupações abriram suas portas, como o Bunka Fashion College, em 1919 e a Ecole de La Chambre Syndicale, em 1927. Mais adiante, outras mudanças ocorrem nos projetos pedagógicos dos cursos de moda. Além de cumprir as exigências intrínsecas à prática profissional, busca-se acompanhar a internacionalização do mercado, pela multiplicação de ofertas de formação específicas, voltadas para os diversos sub-campos de toda a cadeia têxtil e do vestuário. Esta opção, aliás, se reflete na ampliação do perfil da formação em moda oferecida no Brasil: um profissional que atua no varejo e na produção, assim como na gestão de negócios e marketing.

O ensino superior em moda no Brasil Atualmente a formação em design de moda no Brasil abrange diversas áreas, que podem ser consideradas específicas. Recorrentemente6, os bacharelados são divididos em três tipos de componentes curriculares: os específicos do campo da moda em seu aspecto criativo e produtivo; os teórico-práticos que tangenciam a área de moda; os que declinam das ciências humanas e/ou sociais, que subsidiam os demais grupos. Em ordem, alguns exemplos: • modelagem, desenho de moda, tecnologia têxtil, planejamento de coleções; • gestão/marketing, produção de eventos e comunicação visual/projetos gráficos; • comunicação, estética/história da arte, história da indumentária/moda, filosofia, metodologia do projeto, antropologia/cultura, sociologia. Esse conjunto de componentes curriculares visa atender à demanda do mercado, instrumentando o profissional para atuar de forma integrada à cadeia têxtil e do vestuário em toda sua extensão. Os designers de moda, além de realizarem projetos, vêm sendo preparados para interagir com outros campos de atuação ligados à moda, como revistas especializadas, departamentos comerciais de magazines ou supermercados, equipes de compras e marcas licenciadas. Suas atividades contemplam aspectos que abrangem da ao varejo e, assim, nem sempre se concentram na criação ou no desenvolvimento de produtos de moda; os cursos ainda incluem noções de formulação de identidade de marca, planejamento de visual merchandising, organização de eventos e outros. Sob alguns aspectos, esta pode ser considerada uma tendência no ensino superior, em especial nos bacharelados, ainda que seja evidente o surgimento de cursos mais rápidos e específicos, classificados como tecnológicos ou seqüenciais, que aqui não foram analisados. Considerando-se os bacharelados, é fácil perceber que, por um lado, a carga horária mínima atual estabelecida pelo MEC, de 2400 horas, não seria capaz de abrigar a formação desejável nos aspectos específicos. Por outro, as inúmeras formações ou denominações existentes para cursos semelhantes impossibilitam qualquer controle do Estado sobre a qualidade dos cursos. Frente a essa realidade, que não é exclusiva do design de moda, compreende-se o uso de medidas como o ENADE. Diante da enorme diversidade de modelos de cursos, entre os mais longos e “abrangentes”, porém compartimentados, e as formações curtas específicas, o MEC tem buscado padronizar as ofertas e ainda, aferi-las. Sem dúvida, a combinação dos mecanismos (padronização + verificação por amostragem) é uma medida objetiva de controle dos modos de expansão do ensino superior no país. 6

Foram consultadas as estruturas curriculares de quatro IES da cidade de São Paulo 9º Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design

Regulação do ensino do design de moda – para quem?

A partir do final da década de 1990, a oferta de ensino superior no Brasil cresceu vertiginosamente e as modalidades de graduação foram ampliadas. Além dos bacharelados e licenciaturas nas instituições mais antigas e renomadas, os cursos superiores tecnológicos, que já eram oferecidos há algumas décadas, foram popularizados e ampliados e, ainda, subdivididos, permitindo que o aluno cursasse módulos seqüenciais e obtivesse certificados intermediários sem valor oficial que às vezes até o inabilita para a pós-graduação, mas que serviriam para comprovar algum processo de educação formal. A variedade da formação em moda é grande, como mostram algumas das nomenclaturas identificadas pelo MEC7: • Bacharelado em Moda • Coordenação de Moda • Curso Superior de Tecnologia em Design de Moda • Curso Superior em Tecnologia em Produção de Vestuário • Desenho de Moda • Design de Moda e Vestuário • Design e Negócios da Moda • Design em Moda • Estilismo • Estilismo Industrial • Figurino e Indumentária • Indumentária • Moda, Estilismo e Marketing Tal diversidade justifica, em parte, a proposta atual de convergência na denominação dos títulos dos cursos de formação superior em moda, que passariam a se chamar unicamente Tecnologia em Design de Moda. Segundo o MEC, A Convergência de Denominação (De > Para) é uma lista que apresenta os nomes dos cursos atualmente vigentes [...] A convergência [para Tecnologia em Design de Moda] foi realizada por especialistas nas áreas e deve ser entendida como uma sugestão de nova denominação. Cabe às Instituições de Ensino Superior (IES), com base nas características de cada curso, adotar a denominação que julgar mais pertinente, dentre as opções disponíveis na Convergência de Denominação (De > Para) e, de acordo com a nova denominação adotada, se necessário, adaptar a matriz curricular8.

Como se pode observar, a convergência é apresentada apenas como uma sugestão. Ainda segundo o MEC, o referencial indicado para o curso contempla apenas linhas gerais, por meio de [...] um perfil do profissional formado, os temas abordados durante a formação, as áreas em que o profissional poderá atuar e a infraestrutura necessária para a implantação do curso. Ele não limita as instituições na proposição de cursos, uma vez que traça um referencial que não é limitador, mas apenas orientador. Portanto, cada Instituição de Ensino Superior (IES) pode, respeitando o mínimo apontado no referencial, inserir novas temáticas, bem como delinear linhas de formação no curso.

7 8

Dados apurados nos documentos que sugerem o De – Para proposto pelo MEC www.mec.gov.br

9º Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design

Regulação do ensino do design de moda – para quem?

O documento, portanto, determina apenas o que é mínimo. Mantém-se a possibilidade da Instituição oferecer (o que exigiria a ampliação da carga horária total) outros componentes complementares que constituiriam o que o MEC denomina “linhas de formação”, as quais “particularizam o curso, enfocando aspectos teóricos ou práticos pertinentes para o curso oferecido pela IES no contexto histórico e social em que ela se insere” sem configurar uma habilitação específica. Tais linhas de formação, no entanto, não estariam explicitadas no nome do curso, apenas no projeto pedagógico e estrutura curricular. Aos cursos hoje designados Bacharelado em Design de Moda e aos Tecnológicos em geral, a sugestão do MEC é a unificação da referência à formação pela nomenclatura Curso Superior de Tecnologia em Design de Moda, cabendo somente aos egressos dos cursos de graduação em Design a titulação de Bacharel. Com essa proposta, o MEC diferencia o que vem a ser um curso de Bacharelado, mais abrangente, com preocupações de desenvolvimento científico, dos cursos Tecnológicos, com formação mais específica, dedicados a formar profissionais que atuem nos processos de desenvolvimento e produção em geral. Segundo o Catálogo (MEC, 2006): O Tecnólogo em Design de Moda elabora e gerencia projetos para a indústria de confecção do vestuário, considerando fatores estéticos, simbólicos, ergonômicos e produtivos. A pesquisa de tendências de comportamento, cores, formas, texturas e acabamentos; o estilismo em moda; o desenvolvimento de produtos de moda aplicando visão histórica, sociológica e prospectiva; a elaboração de portifólios e dossiês; a representação gráfica de suas criações; a elaboração de protótipos e modelos, além da análise de viabilidade técnica do projeto, são algumas das atividades deste profissional.

O Bacharel em Design, por sua vez, [...] atua na criação, desenvolvimento e execução de projetos e de sistemas que envolvam informações visuais, produtos, espaços ou materiais contextualizados social e economicamente, observando aspectos históricos, traços culturais e potencialidades tecnológicas de unidades produtivas. É capaz de criar novos produtos ou adequar os existentes às novas condições do mercado, às transformações tecnológicas e às necessidades do usuário. Pode propor soluções com foco na sustentabilidade ambiental. Interage com especialistas de outras áreas, utilizando conhecimentos diversos e atuando em equipes interdisciplinares na elaboração e na execução de pesquisas e projetos.

Considerações finais O esforço realizado pelas instâncias governamentais ligadas ao ensino superior para regulá-lo e manter sua qualidade é, sem dúvida, meritório. No caso do ensino de moda, demonstra o reconhecimento do campo e a valorização do profissional. Por fim, a inserção deste setor na área do design tem fundamentação conceitual e coincide com o tratamento dado pelas mais consagradas instituições de ensino no exterior9. Essas mesmas instituições, porém, têm uma oferta do ensino de moda que permite flexibilidade curricular e a obtenção de diplomas em diversos níveis, o que permite a 9

Os projetos pedagógicos dessas escolas e demais informações foram consultados nos endereços eletrônicos: http://www.newschool.edu/parsons/bfa-fashion-design; http://www.csm.arts.ac.uk/courses/undergraduate/fashion.htm; http://ifa-edu.cn/ifaen/curriculumBachelorController/bachelorIntro

9º Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design

Regulação do ensino do design de moda – para quem?

expansão e o encadeamento do ensino no setor. Entre tais instituições, aquelas cuja identidade se associa ao design diretamente, como a Central Saint Martins College of Arts & Design e a Parsons The New School for Design, não têm um único, mas, ao contrário, vários cursos de bacharelado, com focos específicos, dentro do campo do design. Oferecem, entre outros, bacharelados em Design Gráfico, Design e Gestão, Design e Tecnologia, Design de Moda, Design Têxtil, Design de Interiores, Design de Produto. As orientações para o ensino superior no Brasil, por outro lado, levam a duas situações: bacharelados generalistas e cursos tecnológicos específicos. Além disso, acentua-se o processo de redução da carga horária mínima recomendada para os cursos: 2.400 horas e 1.600 horas, respectivamente. Analisando a questão por outro prisma, observa-se como o design (e, neste contexto, a moda) tem se tornado tema de ações governamentais de forma crescente nos últimos quinze anos. Vale destacar as iniciativas do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, a partir da criação do Programa Brasileiro de Design (PBD) (PIRES, 2007), que reflete a percepção da importância do design na economia. O design passou, então, a ser tema de exposições, concursos, publicações, fóruns de competitividade setorial e até de políticas de promoção do comércio exterior. No caso específico do design de moda, desde 2003 a Associação Brasileira de Estilistas e a APEX-Brasil desenvolvem um projeto de internacionalização da moda brasileira buscando “aumentar as exportações dos produtos destinados ao mercado do ‘novo luxo’ por meio de produtos originais, com marca própria e que possam gerar benefícios para outras cadeias produtivas e à própria marca e imagem do Brasil.”10 O design de moda também tem sido objeto de reflexão e de proposições no âmbito do planejamento estratégico do PBD, como ocorreu em 2006. O documento preparatório elaborado para subsidiar as discussões, intitulado Demanda por Design no Setor Produtivo Brasileiro, apontou, dentre os sete setores que demandariam projetos específicos, o de moda, o que indica tanto a sua emergência no país quanto suas peculiaridades. Conforme o documento, que também aponta a necessidade de implantar cursos que atendam à realidade do mercado (Centro de Design Paraná, 2006, p.10): O segmento de moda é muito amplo e complexo, e envolve diversas cadeias produtivas: a cadeia produtiva do vestuário, a têxtil, e as de diversos outros produtos como jóias, bolsas, calçados, chapéus e acessórios. Neste contexto, as atividades de design recebem o nome de “fashion design” e abrangem toda a extensão das cadeias produtivas, numa abrangência que não encontra paralelo em nenhum outro segmento. A demanda por design existe não apenas na indústria que desenvolve o novo produto, mas também no fornecedor que desenvolve estampas, fivelas, botões e dezenas de outros itens, e desce por toda a cadeia envolvendo o design de vitrines, a produção de desfiles, a arquitetura de lojas, o design de embalagens e muito mais.

Tratando das demandas transversais, salienta-se que o panorama mundial está marcado por um novo dinamismo econômico, no qual a inovação é elemento chave da competitividade. Esta, por sua vez, estaria menos nas empresas e mais nas cadeias e arranjos produtivos, exigindo uma maior capacidade gerencial para decisões estratégicas. Assim, muito autores têm considerado o design thinking11 crucial para que as empresas cheguem ao 10

http://www.apexbrasil.com.br/portal_apex/publicacao/engine.wsp?tmp.area=27&tmp.texto=7201. Acessado em 21/04/2010. 11 Design Thinking é um processo de inovação centrado no usuário que enfatiza observação, colaboração, aprendizagem rápida, visualização de idéias, prototipagem conceitual rápida e análise de negócios concorrentes, que tem influenciado a inovação e as estratégias de negócios. Tem um objetivo de envolvimento amplo e

9º Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design

Regulação do ensino do design de moda – para quem?

degrau mais elevado da escada do design12, que corresponde a uma abordagem estratégica, na qual “o design está incorporado na formulação da estratégia comercial da empresa, participando ativamente no fomento à inovação e no desenvolvimento de produtos e serviços”. (Centro de Design Paraná, 2006, p.6). Novamente a moda foi citada como um dos setores onde a educação deveria fortalecer este enfoque. Diante de tais considerações, Pires (2007, p. 69) ressalta o papel-chave da academia “na criação de projetos pedagógicos, de acordo com a realidade do mundo do trabalho, de modo a formar profissionais capazes de sensibilizá-las [as empresas] para implementar o design como processo e estratégia.” Se a atual regulação do ensino superior no Brasil se dispõe a adequar-se, respondendo às demandas da sociedade e do desenvolvimento do setor produtivo, como justificar as recentes medidas, face ao contexto ora apresentado? Embora seja fundamental que o país construa seu próprio modelo, a inserção no mercado globalizado requer um diálogo e trânsito maior entre propostas educacionais nacionais e estrangeiras. Além disso, a situação descrita aponta para a necessidade de uma abordagem mais sistêmica e encadeada do ensino em moda, sem perder a sintonia com o design.

Referências DANISH DESIGN CENTER. Design Staircase® (2001). In: Facts & Insights, About Design Motivations and Barriers. Copenhagen: Danish Design Center, 2007. LOCKWOOD, Thomas (ed.) Design thinking: integrating innovation, customer experience and brand value. New York: Design Management Institute, Allworth Press, 2009. MOURA, Mônica. A moda entre a arte e o design. In: PIRES, Dorotéia Baduy. (org.) Design de moda: olhares diversos. Barueri, SP: Estação das Letras e Cores Ltda., 2008. (p. 37 – 73). PIRES, Dorotéia Baduy. Design de moda: uma nova cultura. In: Dobras, no. 1, p. 66-73. out. 2007. Centro de Design Paraná. Demanda por design no setor produtivo brasileiro. Curitiba: Centro de Design Paraná, 2006. Disponível em: http://www.designbrasil.org.br/portal/acoes/DEMANDAporDESIGN.pdf Acesso em 27/04/2010. MEC. Catálogo Nacional de Cursos Superiores de Tecnologia. Brasília: MEC, 2006. Disponível em http://catalogo.mec.gov.br. Acesso em 27/04/2010 funciona como uma ferramenta para imaginar estágios futuros e para levar produtos, serviços e experiências ao mercado. Resumidamente trata-se de uma metodologia para inovação e capacitação (Lockwood, 2009). 12 A noção básica da “Escada do Design” é que as empresas podem utilizar o design em vários níveis, dependendo das circunstâncias. No primeiro degrau estão empresas que não usam design e, no quarto, estão as empresas que consideram o design como um elemento estratégico chave. (DANISH DESIGN CENTER, 2007)

9º Congresso Brasileiro de Pesquisa e Desenvolvimento em Design

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.