REGULACÃO E INOVAÇÃO Uma Nota Sobre a Politica da Ancine

May 30, 2017 | Autor: I. Guedes Alcoforado | Categoria: Regulation, Technological Innovation, Innovation and Creativity (Business)
Share Embed


Descrição do Produto


REGULAÇÃO E INOVAÇÃO
Uma Nota Sobre Política da Ancine de Inovação Tecnológica e Organizacional na Industria Cinematográfica

Ihering Guedes Alcoforado


A promoção da mudança tecnológica na indústria cinematográfica pela Ancine pode focar tanto a inovação como a absorção. Do ponto de vista político, a opção fica por conta do policy-making. Do ponto de vista teórico e da apreensão dos mecanismos de inovação, a referência é Joseph Schumpeter, enquanto que dos mecanismos da difusão é referência é Edwin Mansfield.. Dado a necessária contextualização das políticas tecnológicas sejam elas focadas na inovação e/ou na difusão, tais políticas assumem diferentes configurações, as quais são determinadas em parte, pelo ambiente sócio técnico que tem entre seus elementos as regras legais (polity) e, em parte, pela orientação política (politics) por meio da agenda.

A abordagem da inovação tecnológica na indústria cinematográfica requer algumas precauções decorrentes da natureza da produção e da inovação neste setor. Com relação a indústria cinematográfica admite-se que ela é concentrada em poucos novelos urbanos e, assenta-se em atividades criativas que se integra em organização industriais especificas, tanto no que se refere a produção, como a distribuição e exibição, as quais operam de forma coordenada.[FREEMA, 2014] Em função disso é necessário considerar a indústria cinematográfica como portadora das características de mais de uma das categorias da taxonomia de Pavitt ( 1984), a qual classifica a trajetória de mudança tecnológica a partir das fontes e dos regimes de apropriação. Para evidenciar este aspecto é necessário distinguir a inovação "na" indústria, da inovação "da" indústria.
Do ponto de vista da inovação "na" indústria cinematográfica o que se considera são as fontes das inovações no seu processo de produção, as quais se revelam tanto nas inovações de processo como nas inovações organizacionais. No plano das inovações de processo, o que se constata é que a indústria cinematográfica não se destaca pelo investimento em P & D de seus equipamentos, já que ela é absorvedora de inovação tecnológicas geradas em outras industrias. Uma decorrência da absorção das novas tecnologias na produção são inovações organizacionais necessárias a exploração das economias de escala e de escopo das novas tecnologias incorporadas (mas também do trabalho criativo, seu principal insumo).
Já do ponto de vista da inovação "da" indústria cinematográfica o foco é no produto, cujas inovações são decorrentes tanto das novas tecnologias incorporadas (a exemplo dos filmes em 3D), como da criatividade dos seus trabalhadores, o que assegura a partir de uma mesma base tecnológica a produção de artefatos singulares e com identidade própria. A natureza do trabalho criativo necessário a produção cinematográfica é considerado como uma das causas para o não estabelecimento dos princípios do fordismo nesta indústria (mechanized assembly-line methods), dado que nenhum filme comercialmente viável pode ser igual a qualquer outro filme. [SCOTT, 2005, p. 4]
Em função do exposto acima uma politica de promoção à inovação na indústria cinematográfica deve ter necessariamente dois eixos: um focado na inovação no processo e na sua organização, ou seja, tem em conta o processo até o produto; e, o outro eixo, focado no produto, envolvendo a distribuição, exibição, e até mesmo a recepção.
Em decorrência desta dualidade, a política focada no processo na indústria cinematográfica deve se assentar numa compreensão da dinâmica da indústria cinematográfica, o que envolve sua resistência a forma de produção fordista e, a consequente adoção de uma forma pós-fordista de produção aglomerada, a especialização flexível. E isso sem desconsiderar que as inovações tecnológicas na cadeia cinematográfica são inter-relacionadas, ou seja, uma inovação tecnológica no âmbito da produção pode tornar imperativo uma inovação correspondente no âmbito da distribuição e/ou da exibição. E, mais, a orientação dessas relações pode ser alterada e até mesmo invertida, a depender do ambiente sócio técnico no qual se insere a indústria. Nos EUA onde se localiza a indústria fonte das inovações no processo de produção cinematográfica existe indício que até recentemente o "elo absorvedor primário" é a produção, a qual determina novas exigências aos elos da distribuição e da exibição. No Brasil, onde não existe a indústria fonte que alimenta aos inovações no processo de produção cinematográfica, o "elo absorvedor primário" é o resultado de uma decisão política, ou seja, depende da política governamental de incentivo a inovação tecnológica na indústria cinematográfica.

A orientação política brasileira neste âmbito é expressa no Programa Cinema Perto de Você da ANCINE, voltado para a ampliação e digitalização do elo exibidor, tornando imperativo a inovação no elo da produção e da distribuição. Esse programa instituído pela Lei N0. 12.599, 23/03/2012 estabelece objetivos contraditórios pois, de um lado, enfatiza a "atualização tecnológica" do elo exibidor com salas e complexos de exibição digitalizados, e, do outro, ampliar e facilitar o acesso de forma a inserir novos estratos sociais. Esta aparente contradição é rebatida não intervenções concretas: de um lado, os incentivos (linhas de crédito e medidas tributárias) voltados para os "complexos de exibição" e, do outro lado, Projeto de Cinema de Cidade.
O curioso desta política da ANCINE é que, mesmo tendo sido concebida por uma agencia de promoção do cinema nacional, apresenta como resultado o aumento da competitividade do cinema americano em detrimento do cinema nacional. De um lado, porque o cinema americano já tinha adotado as inovações na produção e distribuição e, que precisava no Brasil da "atualização tecnológica" dos elos da inovação na exibição para fechar o ciclo do seu produto, enquanto que o restante da cadeia do cinema brasileiro foi pressionado a absorver as inovações tecnológicas para que pudesse ter acesso as novas salas e complexos de exibição. Do outro lado, porque o novo padrão tecnológico viabilizou os "megas lançamentos", aumentando ainda mais as dificuldades do cinema nacional no âmbito da distribuição e da exibição não só nos novos complexos de exibição digitalizados, mas também na rede de distribuição e de exibição que se manteve no antigo padrão, em especial os cinemas objetos do Projeto Cinema de Cidade.
Uma avaliação ex post desta politica da ANCINE, mesmo que superficial, revela as falhas da avaliação do impacto regulatório, o que fica patenteado na necessidade de uma nova regulação para mitigar os efeitos da política aludida, ainda que restrita as salas e complexos atualizados tecnologicamente.

Em função do exposto acima, esta nota tem como objetivo gerar novos subsídios que justifique uma nova política de inovação tecnológica "na" indústria cinematográfica brasileira. Com este propósito o trabalho consta desta introdução, mais três partes e uma conclusão. Na primeira parte, mostro a necessidade de uma política de inovação focada na indústria cinematográfica, tendo em conta potencializar sua capacidade de absorção tecnológica (o que põe em destaque a transferência e absorção em vez do desenvolvimento da tecnologia), a partir de uma compreensão não só da dinâmica organizacional e espacial da indústria cinematográfica, o que envolve uma compreensão das suas articulações localizadas (localized articulations) e dos seus processos básicos no espaço e no tempo; mas, também de uma compreensão dos mecanismos de transferência e absorção de tecnologia em geral e, na indústria cinematográfica em especial. [LIU, 2010; SCOTT, 2005, pp. 1/2] Na segunda parte, apresento um conjunto de instrumentos econômicos de incentivo a transferência e absorção de tecnologia e, justifico sua mobilização na estruturação de uma possível politica da ANCINE. Na conclusão, apresento uma minuta de Lei de promoção a inovação tecnológica e organizacional na indústria cinematográfica, e, aponto os pontos que precisam ser aprofundados num debate envolvendo os concernidos.

REFERÊNCIA

FREEMAN, A (2014) Is Creation an Industry ? A Constructive Critique of the Economics of the Cultural and Creative Industries MPRA Paper No. 52701 https://mpra.ub.uni-muenchen.de/52701/1/MPRA_paper_52701.pdf
LIU, Sifeng et al (2010) Theory of Science and Technology Transfer and Applications. London: CRC Press, 2010

MANSFIELD, Edwin., (1968) The Economics of Technological Change. New York: W. W. Norton & Cia.


MANSFIELD, Edwin. (1971)"Technological Change: An Introduction to a Vital Area of Modern Economics. Norton.

PAVITT, Keith (1984) Sectoral patterns of technical change: Towards a taxonomy and a theory IN Research Policy, 1984. v. 13, v. 6, pp. 343-373.


SCOTT, Allen J., (2005) On Hollywood: The Place, the Industry. Pricenton University Press, 2005

SCOTT, Alle J., (1999) The US Recorded Music Industry: on the relations between organization, location, and creativity in the cultural economy IN Environment and Planning A, 1999, v. 31, pp. 1965-1084




Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.