Regularidades discursivas e proficiência no vestibular indígena

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O Corpo ISSN: 2236-8221

Página 1 04.08.2013 ISSN: 2236-8221

Jornal de popularização científica Edição n. 42, Março de 2015

Vitória da Conquista, Bahia.

EXPEDIENTE DE O CORPO Editores

[email protected]

http://www.marcadefantasia.com/o-corpo-e-discurso.htm

George Lima Nilton Milanez

O corpo é discurso Nesta edição, O Corpo é discurso apresenta um artigo por Milena Maria Sarti, da Faculdade de Tecnologia e Ciências, FTC. Além disso, o Corpo traz um artigo por Luana de Souza Vitoriano, da Universidade Estadual de Maringá, UEM. O Corpo é Discurso traz também um Pocket Comix por Renato Lima e notícias ligadas ao universo acadêmico e da Análise do Discurso, no Brasil.

Organizador Nilton Milanez George Lima Editoração eletrônica (MARCA DE FANTASIA) Henrique Magalhães

CONSELHO EDITORIAL Dr. Elmo José dos Santos (UFBA) Dra. Flávia Zanutto (UEM) Dra. Ivânia Neves (UFPA) Dra. Ivone Tavares Lucena (UFPB) Dra. Mônica da Silva Cruz (UFMA) Dr. Nilton Milanez (UESB) Dra. Simone Hashiguti (UFU))

Acesse o site do Labedisco: www2.uesb.br/labedisco

O “Lampejo do Sentido - Arqueologia e Corpo em Michel Foucault” é um curso que abordará a trajetória da problematização arqueológica reivindicada por Michel Foucault, especialmente na obra “Arqueologia do Saber” (1969), referência básica para compreendermos os movimentos e saberes sobre o corpo na história hoje. As inscrições podem ser feitas pessoalmente ou pelo e-mail do Labedisco ([email protected]). Para isto, escreva para o email deixando seu nome completo, área de atuação acadêmica (graduação, pós-graduação) e instituição, dizendo a razão pela qual gostaria de fazer o curso. O curso é totalmente gratuito! Organização: Nilton Milanez e Samene Batista P. Santana

Para maiores informações a respeito do curso acesse o blog do evento: http://lampejodosentido.blogspot.com.br/

Página 2

O Corpo

Apresentação

vertiginosa queda da demanda para a cura

cuja biografia individual pode ser narrada.

Tendo em vista uma suposta cri-

psicanalítica, cuja causa o psicanalista

O direito a self-expression dos indivíduos

se da psicanálise frente às demandas de

reconhece como própria ao trajeto históri-

faz da psicanálise cúmplice da democra-

tratamento na atualidade (BIRMAN, 2005,

co pós-freudiano que a Psicanálise assu-

cia burguesa, mas de uma forma subver-

2014), este artigo visa iluminar qual língua

miu. Segundo o autor, a Psicanálise deixou

siva: a biografia individual que representa

fala a Psicanálise clínica através de, pode- de ocupar, silenciou seu lugar de crítica a existência do indivíduo moderno como mos assim dizer, dois grandes eixos norte-

social, ou melhor, seu lugar de uma

epicentro da economia capitalista, da

adores: os sintomas e o diagnóstico estru-

“biografia anti-individualista” (DE CERTEAU,

política democrática e do discurso cientí-

tural ou diferencial. Mobilizaremos de for-

2011), fiel à crítica freudiana da modernida-

fico só é mobilizada na Psicanálise para

ma proposital esses dois eixos da prática

de, para se restringir “[...] a mais uma

poder ser subvertida (DE CERTEAU, 2011).

clínica, pois acreditamos que tanto os sin-

perspectiva terapêutica na qual a harmo-

Em outras palavras, a modernidade cons-

tomas quanto o diagnóstico representam

nia do sujeito no campo social seria a fina-

truiu sua unidade no indivíduo moderno, e

pontos estratégicos de (con)fusão da lín-

lidade maior” (BIRMAN, 2005, p. 205). Vale

a Psicanálise, enquanto discurso moder-

gua da Psicanálise com a língua da ciência

dizer que com essa falência da perspectiva

no, emerge como crítica da modernidade,

médica. (Con)fusão esta que parece estar

crítica social da psicanálise parecem ter

logo, como crítica à sua unidade, o indiví-

relacionada com a suposta crise da psica-

sido incorporadas em seu campo teórico

duo. Com isso, a tradição psicanalítica é

nálise na atualidade. A partir da retomada

uma “perspectiva normativa pela qual a

por excelência a de uma teoria crítica da

das diferenças inequívocas entre essas

medicalização do social pode se realizar modernidade, ou seja, uma teoria crítica

duas línguas, verticalizada pelo recorte

sem resistências” (BIRMAN, 2005, p. 205,

de um tipo de sociedade, e que resguarda

proposto, objetivamos resgatar a perspec-

grifos do autor).

um lugar de emancipação ao indivíduo que

tiva de uma prática clínica de crítica social

Conforme De Certeau (2011), o

coincide com o momento em que a Psica-

que a psicanálise reconhece, e deve levar

privilégio que a psicanálise atribui à histó-

nálise “[...] desfaz, a partir do interior,

a efeito em suas dimensões ética e políti-

ria pessoal visa, não sua redução a uma

essa figura histórica e social que é a uni-

ca.

terapia individual, mas o reenvio a um tipo

dade padrão do sistema em que o freudis-

de sociedade. Isso significa afirmar que a

mo se desenvolve” (DE CERTEAU, 2011, p.

condição de possibilidade de existência da

88).

A psicanálise no divã Para Birman (2005) ocorreu uma Página 3

psicanálise é a existência de um sujeito

Com efeito, a biografia individual O Corpo

de que se vale a Psicanálise, paradoxal-

entre as exigências da pulsão e as exigên-

da medicalização do sofrimento psíquico

mente, não faz uma apologia do indivíduo,

cias da civilização, para afirmar com o

se hegemonizassem como lugares discur-

mas sim se apresenta como uma

Freud de 1908, em sua obra A moral sexual

sivos para tratar do psiquismo, e por

“biografia anti-individualista”: “[...] a

civilizada e a doença nervosa dos tempos outro lado, para que a própria psicanálise

novidade do freudismo consiste no uso da

modernos, que era possível desfazer esse enfrentasse uma crise de demanda, por-

biografia para destruir o individualismo

conflito, anular o vão e produzir uma har-

que ‘se a solução é possível, eu quero a

postulado pela psicologia moderna e con-

monia entre as exigências da pulsão e da

via que dá menos trabalho para me sentir

temporânea” (DE CERTEAU, 2011, p. 100-

civilização. Resumindo, a cura do desam-

melhor’. Com isso, assistimos atualmente

101). Ao ser herdeira do postulado da

paro prevaleceu sobre a gestão do desam-

o campo da palavra, enquanto lugar privi-

sociedade liberal e burguesa, a psicanáli-

paro, nos termos de Birman (2005): a psi-

legiado que a psicanálise ocupou em rela-

se desfaz a verossimilhança kantiana do

canálise não soube sustentar a peste, e de

ção ao campo teórico do psiquismo, ser

indivíduo moderno, livremente racional e

selvagem se mostrou bastante massificada

substituído pelo campo das luminosas

autônomo, destruindo a sua “maioridade”

e excessivamente civilizada (BIRMAN,

evidências do corpo orgânico, pelos trata-

a partir da descoberta do inconsciente,

2014).

mentos psicofarmacológicos, pelas tera-

enquanto o que reenvia todo indivíduo

As consequências desse silencia-

adulto ao seu sujeito infantil, à

mento para a clínica, para a população em

“minoridade” de não ser senhor em sua

geral, e para a própria psicanálise, foram

própria morada.

nefastas, por que, grosso modo, os psica-

“[...] a cura do desamparo prevaleceu sobre a gestão do desamparo [...]”

Se a tradição da Psicanálise

nalistas passaram a “vender” algo que é

inscreve-a historicamente em um lugar

da ordem do impossível de se cumprir - a

estranhamente familiar ou excêntrico em

saber, a cura do desamparo, a eliminação

relação à discusividade que a torna pos-

da falta, o que produziu efeitos. Ao fazerem

sível, podemos então voltar a indagar

desse impossível algo da ordem de um

com Birman (2005): como a psicanálise

possível ou curável, os psicanalistas nada

pode recuar de crítica social (à moderni-

mais fizeram do que (re)produzir subjetivi-

dade) para ser atualmente uma terapêu-

dades impotentes ou incapazes, restando

tica na qual a harmonia do sujeito no

pouco para estas se transformarem em

campo social seria a finalidade maior?

indivíduos adoecidos/doentes, sob a hege- pela neurociência: se a harmonia do sujei-

Segundo Birman (2005; 2014), por que a

monia discursiva dos significantes prove-

to no campo social é possível, a lógica que

Psicanálise silenciou a crítica freudiana

nientes do logos da ciência médica.

opera é a (ilusão) da eficácia disso. Dize-

feita em sua obra de 1930, O mal estar na

Esse posicionamento acrítico da

pias de curta duração, pelo cognitivismo e

mos ilusão, pois como o desamparo não

civilização, que se refere à existência de Psicanálise colaborou sobremaneira para cessa de se produzir e a falta não cessa um incurável vão que provém do conflito Página 4

que, de um lado, a via da patologização e

de não se escrever, insistem enquanto O Corpo

impossível, a falaciosa indústria da cura

de saber se sua abordagem comtempla

à posição que o psicanalista se autoriza a

do impossível - transformado em sofri-

tais patologias” (sic). Em outro momento,

assumir diante das queixas dos pacientes

mento a ser extirpado - prospera a todo

também recente, foram ouvidas de um

em relação a seus sintomas e, sobretudo,

vapor. Como pontua Birman (2005, p.

jovem adolescente encaminhado para

em suas demandas por solução a estes.

221): “Esses saberes, com suas tecnologi-

atendimento psicológico as seguintes pala-

Como sabemos, no campo da ciência mé-

as específicas, vêm ao mundo para fazer

vras, quando perguntando o porquê de

dica, os sintomas são sinais de um mau

a mesma promessa e alimentar a mesma

estar no consultório: “É porque sou

funcionamento do corpo orgânico que

ilusão de harmonia possível, como acre-

TDAH” (sic).

indicam a potencial existência de uma

ditava o primeiro Freud. [...] tudo seria

Não é preciso ser bom entende-

doença. Logo, nesse campo do saber cien-

dor (ou talvez seja) para perceber a forma

tífico, o médico dispõe do binômio saúde/

Em função do exposto, ratifica-

pela qual esses dois sujeitos, que desco-

doença para que, a partir do sintoma

mos aqui a intenção de resgatar a língua

nhecem o que dizem através do que enun-

apresentado, sejam feitos, segundo uma

da Psicanálise através de uma revisão

ciam, estão sendo falados por um Outro, e

lógica de causa e efeito e por meio de

dos eixos norteadores de sua prática

da mesma feita, estão convocando para a

uma “investigação armada” (DOR, 1991),

clínica, os sintomas e o diagnóstico, bem

ocupação de um determinado lugar, e não

um diagnóstico etiológico, um prognóstico

como no que estes devem diferir radical-

outro, o dever ser de um psicanalista. A

e a assunção do tratamento mais apropri-

mente dos homônimos no campo científi-

tornada evidente (con)fusão entre sofri-

ado para a cura do sintoma e, consequen-

co da medicina para que seja levada a

mento psíquico, patologia a ser tratada e

te, restituição da saúde (DOR, 1991).

efeito na clínica a perspectiva de crítica

função performativa dos diagnósticos -

Já no campo da psicanálise, os

social da Psicanálise.

que cria a realidade subjetiva daquilo que o

sintomas sempre guardam a dimensão de

diagnóstico enuncia - pode fazer com que

uma aspiração de liberdade (DUNKER,

Os sintomas e o diagnóstico diferenci-

muitos psicanalistas respondam a tal con-

2015). Isso significa que a psicanálise,

al ou estrutural

vocatória a partir da dimensão do que

longe de se tratar de uma clínica da elimi-

Freud ([1913] 1976] denotou como furor

nação do sintoma, trata-se de uma clínica

possível em nome da razão científica”.

Não raro presenciamos nos consultórios particulares e públicos a

sanandis da eliminação do sintoma. E aí de bem dizê-lo. Isso quer dizer que o sin-

chegada de pacientes nomeados por uma

começam os problemas em relação a (con)

toma continua sendo a expressão de um

certeza diagnóstica “psi”, sem falicidade

fusão da língua que fala a Psicanálise com

mau funcionamento, mas, sobretudo, de

ou objeção e, notadamente, amparada

a Língua que fala a ciência médica.

um mau funcionamento, caso a caso, da

por manuais como o DSM. Recentemente,

Um dos maiores desafios que a

forma como o sujeito se fez resposta ao

recebi mensagem de uma mulher jovem

psicanálise enfrenta hoje por ter abando-

que demanda o Outro, em seus imperati-

pedindo para marcar um atendimento

nado ou silenciado seu lugar de crítica

vos de gozo (LACAN, [1972/73] 1985). Com

clínico individual e as palavras foram

social, seu lugar de subversão do individu-

isso queremos dizer que o sintoma para a

estas: “Tenho TOC e depressão e gostaria

alismo, pode ser verticalizado em relação

psicanálise é habitado por um sujeito do

Página 5

O Corpo

desejo que grita por socorro diante de

implicação do sujeito em relação a sua

Podemos conceber a partir daí

sua mortificação pelas formas de gozar

estrutura, à sua realidade e causalidade

a função do diagnóstico na língua da psi-

que o próprio sintoma realiza e denuncia.

psíquicas, esgotadas sob a insígnia de um

canálise: o nomear diagnóstico não deve

Desse ponto de vista, o foco

auto conhecimento sobre si (gozo) como

operar com um lugar discursivo garanti-

sobre a eliminação do sintoma, ou o se

“deprimido”, “TOC”, “TDAH” etc. Segundo o

dor de reconhecimento ao sujeito do gozo,

render ao furor sanandis de que fala

dito popular, o psicanalista aí não deixaria

devolvendo-o e/ou legitimando a condição

Freud, equivaleria, antes de tudo, a pres-

‘nada a desejar’, e estaria fazendo qual-

de indivíduo (não dividido), mas sim como

crever ou agenciar o gozo, ou seja, de

quer outra coisa, mas não estaria mais

um lugar discursivo que marca, mas que

uma certa maneira se aliar a forma como

fazendo psicanálise.

não dispensa o sujeito de ter que criar um

É no que o sintoma remete a uma

saber fazer com a falta/desejo, onde an-

estrutura psíquica (a saber, neurose, psi-

tes era sintoma. Restituindo-o assim ao

cose e perversão) que o psicanalista está,

lugar de sujeito-barrado (dividido), cujos

por assim dizer, atrás (DOR, 1991), ou seja,

potenciais desejantes estão para além da

é no que o sintoma remete a posição assu-

forma como é falado pelo Outro - já que

mida pelo sujeito do inconsciente diante da

se tratam de singularidades -, o diagnós-

barra da castração que o psicanalista está

tico em psicanálise, segundo Dor (1991)

atrás. E isso não é da ordem de um univer-

não responde a uma previsibilidade noso-

salizável e, obviamente, enseja um grande

lógica de causa e efeito entre sintoma e

trabalho por vir ao sujeito. Como adverte

diagnóstico, mas sim a uma posição diag-

Quinet (2003), a psicanálise não dita con-

nóstica, sujeita a um devir de confirma-

dutas, modos de agir segundo algum uni-

ção, que permite algum balizamento pela

o sujeito se fez resposta ao Outro, em

versal válido para todos. Trata-se de uma

feitura de um esquema de análise. Confor-

detrimento da aspiração de liberdade que

ética relativa a implicação do sujeito, pelo

me Nasio (2001), esse esquema é o que

o sintoma representa. Tomando o lugar

dizer, no gozo que seu sintoma denuncia –

vai presidir a escuta do analista face às

daquele que nomeia o que o sujeito tem e

ética de bem dizer o sintoma. Pois lá onde

fantasias de resposta ao Outro que a nar-

lhe fornece a promessa de um caminho

há sintoma, está o sujeito. Não atacar o

ração do sintoma do paciente apresenta.

de cura ou eliminação do sintoma, pela

sintoma, mas abordá-lo como uma mani-

Conforme Nasio (2001), o esque-

mediação do logos científico em uma

festação subjetiva, significa acolhê-lo para

ma de análise é uma construção indispen-

relação de causa e efeito entre sintoma e

que possa ser desdobrado, fazendo aí

sável para levar o psicanalista a ficcionar

diagnóstico, o psicanalista nada mais

emergir um sujeito. Tratar o sintoma não

o inconsciente do paciente, suas fantasias

faria do que ajudar o paciente a não criar

significa necessariamente barrar ao sujei-

dominantes, enquanto o que reenvia aos

um saber sobre como “segurar essa

to ‘o acesso ao real que o sintoma denota

traços estruturais (DOR, 1991). Uma vez

barra”, naturalizando a cegueira e a des-

e dissimula’ (QUINET, 2003).

feito e elaborado, não mais se pensa so-

“Tratar o sintoma não significa necessariamente barrar ao sujeito ‘o acesso ao real que o sintoma denota e dissimula’”

Página 6

O Corpo

bre isso, até que ele se precipite numa

do sujeito se posicionar frente à castração

cada vez mais convocado por quem ainda

cena imajada na própria narratividade do

simbólica, i. é., menos como classificação

o procura em sofrimento, a inadequação

paciente (NASIO, 2001). Por isso, dar a

calcada no binômio saúde/doença (primo

ou indeterminação do sujeito desejante

palavra a quem é de direito, e relançar o

do binômio ideológico normal/patológico)

em relação ao campo social e seus dispo-

sujeito às associações compõem os nor-

e mais como uma perspectiva referente a

sitivos de discurso é o que ainda deve

tes éticos e políticos da técnica psicanalí-

uma nosografia estrutural, pertinente à

legitimar a psicanálise em suas dimen-

tica, sendo pela via de suas elaborações

investigação não universalizável do incons-

sões ética e política.

simbólicas que o sujeito irá aceder ao

ciente. Essa visada subjetiva, feita caso a

direito de nomear o objeto de seu desejo,

caso, acerca das estruturas psíquicas

REFERÊNCIAS:

onde era falado pelo Outro. Também por

desloca o diagnóstico em Psicanálise de

isso, a cura em psicanálise não guarda

qualquer afinidade com o diagnóstico pro-

como referência os critérios de saúde e

veniente da ciência médica.

BIRMAN, J. O Mal-estar na modernidade e a Psicanálise: a Psicanálise à prova do Social. Physis: Revista de Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, nº15, pp. 203-224, 2005.

doença, mas sim o critério da “produção

Levando a efeito essa posição

de singularidades” (BIRMAN, 2014) via

diagnóstica não prescritiva estaria marca-

desmobilização da estrutura psíquica de

da a não equivocidade da Psicanálise como

negação da castração e de travessia da

teoria do psiquismo que realiza uma crítica

fantasia, enquanto ficção/fixão pela qual

social. Isso porque elaborar um diagnósti-

o sujeito revive um gozo pleno junto ao

co clínico não significaria barrar ao sujeito

Outro e abre mão da verdadeira liberda-

o direito de elaborar e construir singular-

de que é o desejo/falta-a-ser, exatamen-

mente seu lugar no mundo, à medida de

te o real que grita através do sintoma.

seu desejo, ou ainda, não significaria dispensá-lo do trabalho de ter de encontrar a

Considerações finais

sua felicidade/falicidade frente a um incu-

Em primeiro lugar cabe desta-

rável desamparo que não é harmonizado

car que para além do diagnóstico dife-

pela razão científica: o direito à procura da

rencial ou estrutural da neurose, psicose

felicidade/falicidade deve passar pela não

e perversão em Psicanálise, tais estrutu-

garantia de poder encontrá-la de forma

ras psíquicas que norteiam a prática

razoável ou prêt-à-porter, o que significa

diagnóstica no raciocínio freudiano e

ao analista ser responsável por ser sufici-

lacaniano estão relacionadas aos diferen-

ente, por sustentar junto ao paciente uma

tes modos de constituição do sujeito na

posição de suposto saber, e não de quem

dialética edipiana. Todas as estruturas

antecipadamente já sabe. Por mais que

são criterizadas como diferentes modos

para esse dever ser iluminado ele seja

Página 7

______. Mal-estar na atualidade: a psicanálise e as novas formas de subjetivação. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2014. DE CERTEAU, M. História e Psicanálise: entre ciência e ficção. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2011. DOR, J. Estruturas e clínica psicanalítica. Rio de Janeiro: Taurus, 1991. DUNKER, C. I. L. Mal-estar, sofrimento e sintoma: uma psicopatologia do Brasil entre muros. São Paulo: Boitempo Editorial, 2015. (Coleção Estado de Sítio). FREUD, S. Sobre o início do tratamento (Novas recomendações sobre a técnica da psicanálise I) (1913). Rio de Janeiro: Imago, 1976. (Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud, Vol. XII, pp. 161-187). LACAN, J. O seminário, livro 20: Mais ainda (1972/73). Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1985. NASIO, J. –D. Os grandes casos de psicose. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Editor, 2001. QUINET, A. Psicanálise e Psiquiatria: controvérsias e convergências. Rio de Janeiro: Editora Forense Universitária, 2003.

O Corpo

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O Corpo

Renato Lima

é graduado em Pintura pela Escola de Belas Artes - UFRJ. Para saber mais sobre o autor e suas produções, acesse também o site Pockets - Histórias de Bolso ou a página de Facebook Pocketscomics.

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O Corpo

IV Simpósio Nacional de Letras e Linguística e III Simpósio Internacional de Letras e Linguística

O Simpósio Nacional de Letras e Linguística e Simpósio Internacional de Let ras e Linguística traz em sua quarta edição o tema "Linguagem, Literatura e Ensino: desafios e possibilidades". O evento será realizado na Regional Catalão da Universidade Federal de Goiás, nos dias 25 a 28 de agosto de 2015 e receberá propostas de Grupos de Trabalhos (GT’s) e Mesas-redondas, dentro da temática proposta. Contaremos, ainda, com várias atividades específicas como, conferências, minicursos e atividades culturais.

Para saber mais a respeito do IV SINALEL Clique Aqui!

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O Corpo

Considerações iniciais

coerência dessas marcas linguísticas, e

mesmo que possuam sua própria língua,

O Vestibular para os Povos Indíge-

contrastar os resultados entre as seis

têm a necessidade de certificar a profici-

nas no Paraná é um processo seletivo

redações a fim de identificar tanto as re-

ência, nessa língua, em sua modalidade

específico para os sujeitos indígenas, que

gularidades discursivas, quanto as regula-

oral, e em sua modalidade escrita, para

oportuniza o ingresso desses candidatos

ridades estabelecidas no processo de

que tenham a possibilidade de “entrar”

ao Ensino Superior. No vestibular específi-

construção dos enunciados conforme os

nas relações de saber-poder que envol-

co a proficiência em Língua Portuguesa,

padrões requeridos na modalidade escrita

vem questões políticas, sociais, econômi-

especialmente em sua modalidade escrita,

da Língua.

cas e culturais. Sendo assim, as línguas

é exigida como um requisito fundamental

Ancoramos-nos na Análise do Dis-

étnicas, como é o caso das línguas indíge-

para a aprovação dos vestibulandos. Sendo

curso, de linha francesa, em especial nas

nas, perdem seu valor, enquanto instân-

assim, as redações desse processo seleti-

categorias da função enunciativa proposta

cias de inserção social, pois não são usa-

vo tornam-se valioso campo investigativo,

por Michel Foucault (2012), pois o campo

das fora de seu contexto étnico, isto é,

já que é possível, a partir delas, averiguar

enunciativo de onde o sujeito indígena dis-

são empregadas, na maioria das vezes,

as habilidades linguístico-discursivas dos

cursiviza traça uma linha entre funciona-

nas próprias comunidades de origem com

candidatos, e comprovar (ou não) satisfa-

mento enunciativo e memória e nos delimi-

o intuito de manter a preservação cultu-

tório desempenho linguístico na língua

ta possibilidades de leitura. E, também, na

ral.

nacionalizada no Brasil.

Linguística funcional para refletir sobre o

Para compreender o processo

De tal forma, como corpus para a

funcionamento linguístico das categorias

seletivo do vestibular específico para

prática analítica da presente pesquisa,

gramaticais: conjunção e advérbio, dada a

indígenas, a relação dos candidatos com a

selecionamos seis redações escritas, no

possibilidade de esses elementos revela-

Língua Portuguesa, e a proficiência des-

ano de 2003, por candidatos do III Vestibu-

rem o exercício linguístico-discursivo utili-

ses sujeitos na Língua preeminente do

lar para os Povos Indígenas no Paraná, a

zado na redação do vestibular indígena.

país, recorremos à função enunciativa (FOUCAULT, 2012), para desvelar nas pro-

fim de abranger as utilizações das modalidades adverbiais e dos conectivos, presen-

Resultados e Discussão

tes nas produções textuais, bem como

A Língua Portuguesa constitui-se

constatar o modo como a proficiência em

enquanto a língua nacional do Brasil, nesse

Língua Portuguesa é atestada (ou não) na

sentido, todas as etnias adjacentes ao país,

Página 11

duções textuais seus quatro eixos fundantes: Materialidade, Sujeito, Referencial, e Campo associado. A partir do movimento analítico O Corpo

averiguamos que cada escolha linguísti- mo enunciado” (FOUCAULT, 2012, p.108)

Por conseguinte quantificamos os

ca, em especial, as marcas adverbiais e damos visibilidade ao fato de que a recor-

dados a fim de obter o número exato de

dos conectivos, constituintes das produ- rência de advérbios iguais era intensa

ocorrências e refletir sobre como esses

ções textuais nos permitem lançar um tanto dentro de uma redação, quanto em

dados também significavam sintática e

gesto de olhar sobre o posicionamento de relação às outras redações. Assim sendo,

discursivamente. Abaixo os gráficos que

sujeito que os candidatos indígenas assu- em diversos momentos a repetição de

estabilizam os resultados encontrados:

mem dentro dessa materialidade. Destar- palavras estabelecia sentidos semelhantes te, o modo como os vestibulandos articu- entre uma redação e outra, ou seja, meslam seu discurso, e sobre o quê, especifi- mo que o enunciado fosse completamente camente, eles escolhem tratar como diferente, as significações evocadas a

Gráfico 1: Quantificação dos advérbios.

objeto discursivo delimita as possibilida- partir da utilização de determinado advérdes de significações para seus enuncia- bio ou conectivo eram as mesmas. Essas dos, e dialoga, mesmo que superficial- recorrências nos levaram a desnudar as mente, com o campo associado que res- regularidades estabelecidas entre escolha palda o vestibular indígena, enquanto linguística e as possibilidades de sentido processo multicultural. Todos esses eixos produzíveis. que compõem a função enunciativa vão

Para pensar nas relações discursi-

possibilitar uma leitura mais abrangente vas presentes nas produções textuais, por sobre as significações e regularidades meio das marcas linguísticas, organizamos das marcas linguísticas adverbiais e dos todas as ocorrências adverbiais e dos conectivos escolhidos pelos candidatos. conectivos na tabela ilustrada a seguir: Ao considerar que quando “uma formulação idêntica reaparece – as mes-

Tabela 1: Banco de dados.

Fonte: Autora.

Gráfico 2: Quantificação dos conectivos.

mas palavras são

utiliza-

das, basicamente

os

mesmos nomes, em suFonte: Autora.

ma, a mesma frase,

mas

não forçosamente o mesPágina 12

Fonte: Autora.

O Corpo

Diante desses dados depreende-

desejo em preservar sua cultura materna,

mos as regularidades as quais essas

ensinar e aprender apenas sobre as tradi-

escolhas linguísticas são circunscritas:

ções do seu povo.

REFERÊNCIAS BECHARA, Evanildo. Moderna gramática portuguesa. 37ª Edição, RJ: Nova Frontei-

Esquema 1: Regularidades discursivas.

Considerações finais A prática analítica desenvolvida trouxe visibilidade para a forma como os vestibulandos estruturam seu texto, em níveis sintáticos e discursivos, e o modo como as marcas linguísticas utilizadas nas produções textuais revelam o entrelugar

ro, 2009. DALL'AGLIO-HATTNHER, Marize Mattos. Uma análise funcional da modalidade epistêmica. ALFA: Revista de Linguística 40, 1996. FOUCAULT, Michel. A arqueologia do sa-

cultural ao qual esses sujeitos estão sub-

ber. Tradução de Luiz Felipe Baeta Neves.

O esquema exposto revela em

mersos. Por meio da utilização das modali-

8ª Edição, RJ: Forense universitária, 2012.

quais contextos os seis textos analisados

dades adverbiais os candidatos estabele-

__________. A ordem do discurso. Tra-

manterão regularidades: nas preferên-

cem valor de verdade à prática discursiva

dução de Laura Fraga de Almeida Sam-

cias adverbiais e dos conectivos, em tipo do vestibular, enquanto detentora dos sa- paio. 22ª Edição,SP: Edições Loyola, 2012. (circunstância que essas modalidades

beres legitimados na sociedade, e, conjun-

exprimem), e em variedade lexical

tamente, sustenta essa verdade com as

GONÇALVES, Raquel Fregadolli Cerqueira

(escolhas sintáticas); nas características

ligações/relações que constrói entre os

Reis. Cidadania, inclusão e biopolítica: a

enunciativas, isto é, o tipo e variedade enunciados por meio dos conectivos. lexical são empregadas para desenvolver

Apesar das redações investigadas

os mesmos estilos argumentativos, e

apresentarem alguns equívocos em rela-

suscitarem significações similares; e no

ção aos usos padrões da gramática nor-

posicionamento do sujeito, o gesto de mativa, e em determinados momentos

identidade linguística em contradição no processo seletivo vestibular dos povos indígenas do Paraná, 2012. Dissertação (Mestrado)- Programa de Pós-graduação em Letras na Universidade Estadual de Maringá, Maringá, 2012.

leitura trará visibilidade ao jogo discursi-

essas inadequações prejudicarem a coe-

vo dos sentidos produzidos (produzíveis)

rência, e a coesão do texto, as redações,

TASSO, I; JUNG, N; GONÇALVES, R.F; Práti-

marcando um sujeito cindido por duas

em geral, certificam aos candidatos a pro-

cas discursivas e acontecimento: Letra-

posições a de candidato do vestibular, e a

ficiência em Língua Portuguesa. Uma vez

mento e proficiência em língua portugue-

de sujeito indígena alheio ao processo

que, eles se subjetivam à língua oficial do

sa no vestibular para os Povos Indígenas

seletivo. Essas escolhas linguísticas nos

país, nas práticas sociais não indígenas, e

no Paraná. In: TASSO, I; SILVA, É. Língua

levam a perceber esse sujeito no entrelu-

demonstram, de modo satisfatório, o co-

(gens) em discurso: A formação dos

gar cultural, que ora defende a entrada

nhecimento sobre o funcionamento linguís-

objetos. SP: Pontes Editores, 2014, p. 21-46

na cultura do Outro, ora manifesta seu

tico e discursivo da língua nacional.

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O Corpo

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O Corpo

Dica de O Corpo Leitura dos E-book “A Análise do Discurso na Literatura - rios turvos de margens indefinidas”, organizado por Cleudemar Alves Fernandes, Marisa Martins Gama-Khalil e José Antônio Alves Júnior

Como analisar a categoria narrativa do espaço? Esta obra resulta de pesquisas desenvolvidas por integrantes do GPAD/UFU/CNPq voltados para o estudo de obras literárias à luz da Análise do Discurso. Os trabalhos que a integram cumprem a finalidade precípua de colocar em debate percursos e propostas das pesquisas atualmente desenvolvidas em Análise do Discurso e contribuem para uma problematização e revisão das bases fundadoras da AD face aos objetos literários tomados para análise; expressam também reflexões acerca dos deslocamentos próprios à constituição desse campo disciplinar, uma vez que o objeto também pede a teoria, trazem suas contribuições para os estudos da linguagem de uma forma geral, e revelam, em especial, um panorama das tendências atuais das análises de produções literárias sob o foco da AD francesa.

Leitura do Anais “Imagem e(m) discurso: a formação das modalidades enunciativas”, organizado por Ismara Tasso e Jefferson Campos

Esta coletânea coloca-nos diante de uma primeira indagação: é possível a relação entre imagem e discurso? Certamente, os autores convidados por Ismara Tasso e Jefferson Campos empenharam-se em responder, com propriedade, a esta questão. O que significa problematizar o modo como lemos e nos relacionamos, na condição de leitores e de espectadores, por meia dessa modalidade de expressão da experiência humana. A imagem é acontecimento, portanto, discurso. Eis o mote do livro: não tomar a imagem e discurso como fenômenos distintos. Nesse sentido, seu título é bastante feliz, na medida em que convida o leitor a entrar em um universo de pesquisas no interior do qual uma das formas materiais dos enunciados efetivamente ditos pelos homens é a imagem, e, como tal, isto é, como enunciado, ela tem valor de acontecimento. Pedro Navarro

Colaboradores

O Corpo é Discurso é o primeiro jornal eletrônico de popularização científica da Bahia. Popularização da Ciência

A pesquisa científica gera conhecimentos, tecnologias e inovações que beneficiam toda a sociedade. No entanto, muitas pessoas não conseguem compreender a linguagem utilizada pelos pesquisadores. Neste contexto, a grande mídia e as novas tecnologias de comunicação cumprem o papel de facilitadores do acesso ao conhecimento científico. Para contribuir com esse processo, em sintonia com o espírito que anima o Comitê de Assessoramento de Divulgação Científica do CNPq, criamos esta seção no portal do CNPq. Seja bem-vindo ao nosso espaço de popularização da ciência e aproveite para conhecer as pesquisas dos cientistas brasileiros e os benefícios provenientes do desenvolvimento científico-tecnológico.

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