RELEMBRANDO A PESSOA MAIS SENSACIONAL QUE CONHECI EM 2014: Um caso de Acompanhamento Terapêutico. (Remembering the most extraordinary person that I met in 2014: a case of Therapeutic Accompaniment)

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RELEMBRANDO A PESSOA MAIS SENSACIONAL QUE CONHECI EM 2014: Um caso de Acompanhamento Terapêutico. (Remembering the most extraordinary person that I met in 2014: a case of Therapeutic Accompaniment.) Murianni de Freitas Matos1 Normélia Maria Pinho de Oliveira2

Resumo: Este artigo foi elaborado com base no relatório de estágio 2014, desenvolvido na área de saúde mental no Hospital de Saúde Mental do Estado do Acre – Hosmac, localizado no bairro Sobral. Este artigo trata-se de um estudo de caso de uma paciente do sexo feminino, com 32 anos que está institucionalizada há 15 anos na instituição de saúde mental do estado, HOSMAC, sem contato com a família até o inicio do ano de 2014 e com incapacidade laborativa definitiva. No estudo de caso da paciente é apresentada a eficácia da teoria Comportamental, utilizando técnicas da Terapia por Contingências de Reforçamento no Treino de Habilidades Sociais em sessões estruturadas durante o Acompanhamento Terapêutico realizado com a paciente, buscando assim a modelação de seus comportamentos, extinguindo os inadequados e disfuncionais e aumentando a frequência de seus comportamentos adequados e funcionais. O estágio em Acompanhamento Terapêutico também teve como objetivo propiciar à paciente a aquisição de repertório de comportamento verbal, repertório comportamental e habilidades sociais possibilitando assim uma melhor adaptação à sua família e à sociedade. Palavras-chave: Saúde Mental; Acompanhamento Terapêutico; Habilidades Sociais; Modificação Comportamental. Abstract: This article was elaborated based on the internship report 2014, developed in the mental health field in Mental Health Hospital of Acre - Hosmac, located in the district Sobral. This article is about a case study of a female patient aged 32 who is institutionalized for 15 years in a mental health institution, HOSMAC, without contact with the family until 2014 of and with definitive labor disability. In the study of patient's case is presented the effectiveness of Behavior Therapy, using techniques of the Therapy by contingencies of reinforcement together with Social Skills Training and structured sessions during the Therapeutic Accompaniment, thus seeking the modeling of their behavior thus seeking modeling behaviors, extinction their dysfunctional and inappropriate by increasing the frequency to their appropriate and functional behaviors The internship in Therapeutic Accompaniment also aims to provide the patient the acquisition of verbal behavioral repertoire and social skills thereby providing an adaptation to family and society. Keywords: Mental Healthcare; Therapeutic Accompaniment; Social Skills; Behavior Modification.

1Esse trabalho é resultado da experiência vivencial da primeira autora, sendo orientada e com revisão pela segunda autora. 2 Normélia Maria de Oliveira Pinho: Psicóloga, formada na universidade Gama Filho-RJ em 1977, professora da FAAO e especialista em educação especial.



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1. INTRODUÇÃO O presente artigo apresenta um estudo de caso de acompanhamento terapêutico que foi realizado no ano de 2014 durante o estágio obrigatório supervisionado I, a uma paciente de 32 anos e residente há 15 na instituição de saúde mental Hospital de Saúde Mental do Acre – HOSMAC em cujo acompanhamento foi usada como base teórica a teoria Comportamental, postulada por Skinner, juntamente a Terapia por Contingências de Reforçamento de Guilhardi em conjunto com o Treino em Habilidades Sociais em sessões estruturadas. 1.1. O ACOMPANHAMENTO TERAPÊUTICO O Acompanhamento Terapêutico nasceu nos movimentos políticos ideológico da reforma antipsiquiátrica, luta antimanicomial e psicoterapia institucional. Segundo Ayub (1996), “o primeiro trabalho de AT, dataria de 1937, quando a psicanalista suíça Sechehaye treinou uma enfermeira para cuidar de uma paciente esquizofrênica. Tal acompanhamento abria uma possibilidade de intervenção clínica e não uma prática instituída no campo da saúde mental.” Embora Ayub (1996) faça tal afirmação, Martin et al. (1993) e Barretto (1997) afirmam que “o AT atual, teria surgido na Argentina, no final da década de 1960.” O acompanhamento terapêutico tem papel primordial para o resgate das relações sociais saudáveis e fomenta aumento da qualidade de vida. A aplicação de técnicas comportamentais propicia o supracitado resgate, uma vez que, a técnica de reforço alavanca as probabilidades de repetição e manutenção de comportamentos funcionais. Possibilitando o retorno gradual do indivíduo acometido de problemas mentais as atividades cotidianas em sociedade. A atuação não restrita ao espaço físico de determinada instituição permite ao acompanhante um apanhado de possibilidades de intervir no dia a dia de



seu paciente, podendo assim, lhe trazer novas experiências, vivências e particularidades do dia a dia que talvez, possivelmente tal paciente jamais conseguiria entrar em contato sem a ajuda do acompanhante terapêutico. É importante grifar que o acompanhante terapêutico também pode fazer acompanhamentos com a família do paciente, para que assim consiga estabelecer uma melhora no paciente, pois sem a ajuda da família, o AT pode ficar engessado, já que todos os avanços que o paciente possa vir a ter com o AT, a família pode desestruturar e fazer esse trabalho ser desperdiçado, logo, é de deveras importância que haja um acompanhamento familiar do paciente. O acompanhamento terapêutico de que trata esse artigo teve como base o Comportamentalismo e a Terapia por Contingências de Reforçamento, que se caracteriza por ser uma forma de compreender e lidar com o comportamento humano, essencialmente comprometida com: 1) Arcabouço teóricofilosófico específico: o behaviorismo radical (SKINNER, 1953; 1967; 1969; 1972; 1978; 1980; 1987; 1995); 2) Ação metodológica para investigar e analisar os fenômenos comportamentais: a ciência do comportamento (JEAN, 1958; JABA, 1968; TAVB, 1984; SKINNER, 1938; CATANIA, 1999; KELLER; SCHOENFELD, 1950; FERSTER; SKINNER, 1957; SIDMAN, 1960; FERSTER et al., 1968); 3) Utilização de procedimentos de intervenção terapêutica “tecnologicamente” descritos e “conceitualmente sistemáticos” (BAER et al., 1968), derivados da ciência do comportamento; e 4) Linguagem para descrever os fenômenos interacionais entre terapeuta (pesquisador) e cliente (sujeito), alicerçada na proposta de análise do comportamento verbal de Skinner (1957) (Guilhardi, 2011).Ela tem como presuposto abranger, segundo Guilhardi (2011): Um conjunto de interações comportamentais que ocorrem em diferentes contextos, nos quais uma pessoa com a função de agente de mudança comportamental (terapeuta) influencia os comportamentos de outra pessoa (cliente), que solicitou,

3 da primeira, ajuda para alterar comportamentos e sentimentos que lhe são aversivos e cuja mudança está incapacitada de fazer por si mesma. (GUILHARDI, 2011, p. 5)

E, ainda segundo Guilhardi (2011), a Terapia por Contingências de Reforçamento vai se diferenciar pela maneira como o terapeuta atuará e o compromisso conceitual e experimental que ele adota em sua prática profissional. É importante salientar que a Terapia por Contingências de Reforçamento exige um padrão do terapeuta, onde “todos os comportamentos emitidos pelo terapeuta estão sob controle dos seguintes conjuntos de determinantes (GUILHARDI, 2011): 5) Comportamentos verbais e não verbais emitidos pelo cliente e por pessoas significativas do ambiente social do cliente; 6) Conjunto de procedimentos, metodologia de pesquisa, dados comportamentais e conceitos produzidos pela Ciência do Comportamento (Análise Aplicada e Análise Experimental do Comportamento) e pelo Behaviorismo Radical; e 7) Repertório comportamental pessoal, profissional e científico do terapeuta produzido pela sua história de contingências, enquanto pessoa e enquanto profissional. No Acompanhamento Terapeutico, foi usada então a Terapia por Contigência de Reforçamento e a estrutura da sessão da Terapia Cognitivo Comportamental, que é muito eficiente por padronizar as sessões e assim, facilitar a eficácia do processo terapêutico. A estrutura da sessão é composta por 8 passos, que podem ou não serem modificados pelo terapeuta, sendo o padrão da sessão, de acordo com Finger (2011): 1) Avaliar o humor; 2) Breve atualização (medicação, uso de drogas, sintomas do transtorno); 3) Realizar uma ponte com a sessão anterior; 4) Estabelecer a agenda; 5) Revisar a tarefa de casa; 6) Discutir os tópicos da agenda e utilizar ferramentas terapêuticas; 7) Estabelecer nova tarefa de casa; e 8) Resumir a sessão e dar e solicitar feedback. A avaliação do humor pode ser facilmente avaliada por escalas e/ou



inventários e subjetivamente. É utilizada como um parâmetro para saber como o paciente está se sentindo antes da consulta para então saber quais itens abordar. Já a breve atualização é uma forma do terapeuta ficar ciente da evolução do acompanhamento do paciente, na qual Finger (2011) considera que essa etapa é como uma miniavaliação para acompanhar a evolução do paciente e também identificar possíveis comportamentos que podem vir a prejudicar o avanço da terapia. A ponte com a sessão anterior funciona da seguinte forma, segundo Finger (2011): A TCC é organizada em sessões iniciais, intermediárias e finais. Em cada uma dessas etapas há diferenças quanto à postura do terapeuta e do paciente e quanto ao conteúdo abordado e como a abordagem é feita. Nas primeiras sessões, por exemplo, o terapeuta é muito mais ativo e norteador do que o paciente. É uma fase em que o terapeuta educa sobre o transtorno e a TCC, fazendo com que o paciente compreenda o que está acontecendo com ele e como fazer para melhorar. Na fase intermediária, a responsabilidade pela condução da terapia é dividida entre paciente e terapeuta. O paciente, mais educado quanto ao transtorno e a TCC, é estimulado a contribuir de forma mais ativa nos rumos da terapia. Por fim, na última fase, o paciente é muito mais ativo que o terapeuta, já que teria os instrumentos necessários de análise e modificação de pensamento. A fase final é marcada por técnicas de prevenção à recaída (FINGER, 2011, p. 123).

O estabelecimento da agenda é um ponto que levanta muitas ressalvas e críticas à Terapia Cognitivo Comportamental, pelo fato de acreditarem que o estabelecimento da mesma acarreta à uma limitação do que o paciente poderia trazer a tona na terapia, porém, de acordo com Knapp (2004): O objetivo de estabelecer sobre o que se falará na sessão é justamente oportunizar ao paciente que fale daquilo que realmente tem a ver com o problema e com o cumprimento de

4 suas metas terapêuticas. A agenda é uma organização dos assuntos para que todos sejam abordados e não se fique com a sensação de que se dedicou um longo tempo falando de um assunto sem importância, enquanto o tema importante ficou para a sessão seguinte (KNAPP, 2004, apud FINGER, 2011, p. 124125).

Em resumo, a agenda vem para otimizar o tempo da sessão. De forma alguma ela é rígida e imutável. Muito pelo contrário. Estimula-se, enquanto se faz a agenda, que o paciente altere os tópicos, se assim achar necessário e a dupla terapêutica estiver de acordo (FINGER, 2011). Porém, é necessário ter cuidado, pois, segundo Beck (2007): A falha no estabelecimento da agenda pode gerar um discurso improdutivo e vago durante a sessão, auxiliando pouco ou nada para a resposta da terapia. É importante que o paciente seja instruído, no início da TCC, quanto aos benefícios de preparar uma agenda produtiva (BECK, 2007, apud FINGER, 2011, p. 125). E para que ela seja eficaz é importante que apresente algumas características (WRIGHT et al., 2008): Os tópicos devem relacionar-se diretamente às metas gerais da terapia (metas essas que variam de acordo com o paciente e transtorno), tendo o cuidado de não colocar muitos tópicos para a discussão. Beck (1997) sugere de dois a três tópicos na maioria dos casos; os tópicos devem ser específicos, mensuráveis e focados na resolução de problemas. Por exemplo, desenvolver maneiras de enfrentar a irritação da mãe, dificuldades de seguir a dieta, organizar-se para cumprir as tarefas do trabalho; os tópicos podem ser abordados durante uma única sessão, havendo uma boa probabilidade de que se tire algum benefício. O paciente e o terapeuta devem ter a sensação de que estão avançando, evoluindo entre uma sessão e outra. Para



isso é importante que se tire algum benefício do que se debate nas sessões; os tópicos contêm objetivos atingíveis, logo, realistas. Ao definir a agenda, é importante que o terapeuta saiba que estrutura demais pode ser algo ruim. Além do mais, essas estruturas e roteiros não são imutáveis, e sim norteadores (FINGER, 2011). Outro ponto considerado polêmico por iniciantes na Terapia Cognitivo Comportamental é a tarefa de casa que o paciente realiza nos intervalos da sessão. Tais tarefas de casa são necessárias pois elas propõem ao paciente refletir e levar a terapia para o seu cotidiano, assim acelerando o processo terapêutico. Já sobre a discussão dos tópicos da agenda e a utilização de ferramentas terapêuticas, é importante que o terapeuta aborde os tópicos definidos para a agenda sempre com o objetivo de desenvolver melhoras no sentimento, pensamento ou comportamento do paciente (FINGER, 2011). E, por fim, temos o resumo da sessão e dar e solicitar feedback, onde o terapeuta com a ajuda do cliente faz um resumo do que aconteceu na sessão e uma avaliação. É importante que ocorra o feedback pois, segundo Finger (2011), distorções podem ser trabalhadas antes que a sessão acabe e com isso se evita de ocorrer desmotivação para a terapia.

1.2. A TERAPIA POR CONTINGÊNCIAS DO REFORÇO A TCR foi sistematizada e desenvolvida por Guilhardi (2004) no campo da Terapia Comportamental. Ela é exclusivamente comprometida com a Ciência do Comportamento (SKINNER, 1953) e com o Behaviorismo Radical (SKINNER, 1945; 1969), logo, a TCR inclui pensamentos, ideias, imagens etc. Como objeto de investigação na análise e intervenção terapêutica. Uma característica da TCR é a descrição dos procedimentos terapêuticos utilizados, o que permite a replicação do que ocorreu nas sessões e, portanto, uma avaliação

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objetiva dos determinantes das mudanças. Outra característica importante é a conceituação e integração de todos os fenômenos comportamentais que ocorrem na terapia. Segundo Guilhardi (2004), “a TCR não é exclusivamente verbal e nem se restringe ao contexto da sala de atendimento da clínica.” Ele fala que uma vez que seu foco de interesse é detectar as contingências de reforçamento que operam na rotina do cliente, quaisquer estratégias que maximizem o acesso a tais contingências são utilizadas. Desta forma, observações das interações do cliente no seu ambiente de vida são feitas pelo terapeuta ou por acompanhantes terapêuticos devidamente treinados para tal função. 1.3. TREINO DE HABILIDADES SOCIAIS O THS é um conjunto de procedimentos que ensina como estabelecer relações satisfatórias. O treino de habilidades sociais busca um conjunto de habilidades cognitivas, emocionais, verbais e não-verbais. O déficit em habilidades sociais gera muitas dificuldades e conflitos interpessoais, prejudicando a qualidade de vida e causando e/ou agravando transtornos psicológicos e mentais. Consiste em ajudar a pessoa a ter mais flexibilidade comportamental e resiliência frente a dificuldades, a ser assertivo, a ter capacidade de apresentar-se adequadamente de acordo com o contexto, a ter um autocuidado com sua aparência, a ter capacidade empática e reforçadora, a decodificar emoções, intenções e motivações etc (CABALLO, 2012). 2. ESTUDO DE CASO O caso aqui descrito é de uma paciente do sexo feminino, com 32 anos de idade, completados no dia 21 de março de 2014, internada no Hospital de Saúde Mental do Estado do Acre (HOSMAC), residente em Rio Branco (AC). A paciente é residente há 15 anos do HOSMAC, e



seu diagnostico mais atual é: Transtorno Mental Grave Crônica, Esquizofrenia Simples (CID-10 F20.6), incapacidade laborativa definitiva por ter Transtorno Mental Grave Crônica, Esquizofrenia Simples (F20.6). (informação retirada do prontuário da paciente - HOSMAC)

A definição de esquizofrenia, segundo Karl Jaspers (1883-1969): Ideias delirantes primárias, não-deriváveis ou compreensíveis psicologicamente; Humor delirante procedendo o delírio; Alucinações verdadeiras, primárias; Vivências de influência, vivências do feito; Ocorrência ou intuição delirante (DALGALARRONDO, 2008, p.330). Analisando a vida total do paciente, notase que ocorreu quebra na curva existencial; os surtos fazem parte de um processo insidioso que transforma radicalmente a personalidade e a existência do doente. Segundo o CID-10, que é a A Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde, a Esquizofrenia é caracterizada pela: Alteração das funções mais básicas que dão à pessoa senso de individualidade, unicidade e de direção de si mesmo; Eco, inserção, irradiação ou roubo dopensamento; Delírios de influência, controle ou passividade; Vozes que comentam a ação; Delírios persistentes culturalmente inapropriados; Alucinações persistentes de qualquer modalidade, sem claro conteúdo afetivo (nãocatatímicas); Interceptações ou bloqueios do pensamento; Comportamento catatônico, com flexibilidade cerácea, negativismo, mutismo, etc.; Sintomas negativos (empobrecimento afetivo, autonegligência, diminuição da fluência verbal, etc.); Alteração significativa na qualidade global do comportamento pessoal, perda de interesse e retração social. Os sintomas devem estar presentes por, pelo menos, um mês (DALGALARRONDO, 2008, p.330). Desses sintomas descritos por Jaspers e encontrados no CID-10 foram

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observados na paciente apenas a presença de vivências de influência (de acordo com Jaspers) e, alteração das funções mais básicas; delírios de influência e sintomas negativos como a auto negligência e a diminuição da fluência verbal (de acordo com CID-10). Os comportamentos notados na paciente em relação a estes sintomas apresentados acima são o “Pai Jesus”, que é um delírio de vivências de influência, pelo fato dela o ver a iluminando e olhando por ela. As suas alterações de suas funções mais básicas, como por exemplo, o fato de não possuir uma individualidade e nem direção de si mesma, comportamento muito presente na paciente. Seus delírios de influência, quando a paciente demonstra comportamento passivo e quando acredita que certas coisas acontecem por causa dela, para ela.Em relação aos sintomas negativos, citando a autonegligência pelo fato da paciente não ter cuidado com si mesma, falta de higiene e descuido com à sua própria aparência, saúde e vestimentas (DALGALARRONDO, 2008, p.331) e a diminuição da fluência verbal que a paciente demonstra muito claramente não compreendendo sinônimos comuns do dia a dia. É importante aqui frisar, que um dos sintomas negativos muito comuns em pacientes esquizofrênicos é o empobrecimento afetivo. A paciente não demonstra qualquer empobrecimento afetivo, pelo contrário, demonstrava por meio de gestos e atitudes que sintonizava afetivamente e demonstrava ressonância afetiva no contato interpessoal (DALGALARRONDO, 2008, p.329), e até cuidou algumas vezes desta estagiária quando esta andava muito na beirada da calçada e a até a salvou de alguns pacientes que se aproximavam demais na enfermaria. Segundo dados colhidos junto a paciente e outros membros do staff hospitalar, sua mãe trabalha como empregada doméstica e faz alguns trabalhos costurando. Seu pai é falecido. Suas informações sobre irmãos são imprecisas.



A mãe da paciente informa que aos 2 anos de idade, A. iniciou desmaios. Fazia uso de Diazepam, porém seu tratamento medicamentoso era irregular devido morar no seringal. No primeiro atendimento no Hospital Psiquiátrico Distrital (hoje, HOSMAC), em 08 de dezembro de 1998, morava com a sua avó e havia fugido de casa e levada ao Distrital onde ficou internada por aproximadamente 20 dias até a sua família descobrir seu paradeiro. A paciente tem crises de desmaio, o que é decorrente da epilepsia. A paciente foi admitida para internação no hospital 12 vezes. A paciente passou por acompanhamento terapêutico em AT durante o ano de 2013 com outras estagiárias do Serviço de Psicologia da FAAO. Quando chegamos para atendêla, no dia 07 de maio às 13:48h, foi feita a apresentação das novas estagiárias pelas estagiárias que a acompanharam no ano passado. A paciente apertou a minha mão e sorriu para mim. Minha primeira pergunta a ela depois de feitas as devidas apresentações foi se a mesma gostava de ir no Arte de Ser (Oficina de vivência e expressão pessoal criado pelo psicólogo Fabiano de Carvalho e desenvolvido desde fevereiro de 2009.), lugar que frequentava todas as quartas feiras e onde o nosso acompanhamento iria ocorrer. A paciente respondeu “Gosto” (sic). Perguntei então o que ela fazia, ela respondeu “eu faço pintura, costura, desenho, vejo as pessoa” (sic). E completou “hoje eu vou costurar manga no meu vestido. Não gosto de roupa sem manga, sou crente” (sic).A paciente mantinha uma postura corporal curvada, possivelmente com cifose (Doença que afeta a coluna da pessoa e a deixa corcunda), os olhos sempre voltados ao chão. Não mantinha contato visual mesmo durante a conversação. Durante o caminho ao ADS (Arte de Ser), dentro do automóvel do hospital ela falou que gostaria de ir à igreja: “sinto falta de ir para a igreja, eu ia pra assembleia com a minha mãe. A gente ia em um monte de igreja pros pastores fazerem milagres em mim. Ia nas igrejas dos padres também. A gente ia nas

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igrejas tudo (sic)”, e falou novamente sobre as mangas que costuraria no seu vestido pois só gostava de usar roupa com mangas por causa da sua religião. A sua religião é algo a que a paciente frequentemente se referia durante as sessões de AT. Crenças e costumes religiosos estavam muito impregnados na paciente. O “Pai Jesus” foi tema constante nas primeiras sessões de AT, assim como o fato de usar roupas sem mangas ou shorts a deixavam desconfortável. Ao longo das sessões a paciente foi extinguindo tal comportamento. Outro comportamento que merece atenção foi a sacola, onde a paciente anteriormente guardava lixo que juntava do chão, e passou a não ser mais utilizada com essa função e sim, como algo onde ela guardava alguns pertences pessoais que ganhava ou adquiria. Em algumas sessões a paciente sequer levou a sacola, deixandoa com enfermeiras e nas sessões que ela mantinha a sacola, ela não hesitava em guardar a mesma na mochila da estagiária ou em deixar dentro do carro. A paciente não tinha um autocuidado com sua aparência, sempre se apresentava despenteada e com forte odor corporal. Com o treino de habilidades sociais, a paciente passou a ter autocuidado, sempre se penteando antes de sair, tomando banho adequadamente, limpando as orelhas e escovando os dentes. A paciente frequentemente relatava dores abdominais e torácicas, “dor da morte” (sic) quando se sentia rejeitada ou deixada de lado. Foi levantada a hipótese de que nos dias frios, esse comportamento ficava frequente, porém não foi confirmada por falta de informações necessárias. A paciente não externalizava suas vontades. A Tabela 1 contém os comportamentos observados antes e depois do Acompanhamento Terapêutico. Tabela 1. Quadro comparativo dos comportamentos antes e depois do acompanhamento terapêutico. Quadro de Comparação



Comportamentos antes do AT Sem auto cuidado “Mápostura” Pai Jesus Sacola que guardava o lixo que juntava Dor de morte Nãoconseguiainterag ir Nãoexternasuasvont ades Não falava fatos do passado

sobre seu

Comportamentos depois do AT Passou a pentearse e a ter atenção em suas roupas Melhoranapostura Não faz mais comentários frequentes sobre Não junta mais lixo, e passou a guardar objetos pessoais Nãoregrediutotalm ente Conversa com conhecidos e desconhecidos Passou a externar suas vontades e a fazer pedidos Se refere a fatos do seu passado sejam traumáticos ou não

para ir mais arrumada. Com isso, após algumas sessões a paciente já demonstrava que queria pentear o cabelo e se arrumar antes mesmo que falássemos para que ela fizesse isso e com a roupa a mesma coisa, perguntávamos se ela achava bom ela sair com a roupa que já estava no HOSMAC e ela sempre apresentava senso crítico e vontade de trocar de roupa. No inicio, a paciente não falava sobre as roupas que dávamos a ela para vestir, mas com o passar de algumas sessões, ela passou a escolher suas roupas e demonstrar quando não gostava quando escolhíamos roupas para ela. Quando iniciamos o estágio, uma das principais coisas que me chamou a atenção foi o fato da “má postura” da paciente. Ela sempre estava curvada e aparentada dificuldade para ficar com a postura ereta. Na sessão numero 4, falei sobre a postura dela e perguntei se sentia dores na coluna. Ela respondeu que sim, e por isso se “embiocava mais” (sic) para não sentir mais dores. Expliquei que se

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curvando só a faria sentir mais dores, por isso, era importante que ela sempre tentasse ficar com a coluna ereta. Sempre que ela ficava com a postura ereta, eu reforçava o seu comportamento, fazendo elogios como “Nossa, que linda! Postura reta como a de uma bailarina” e a questionava sobre as dores, que melhoraram segundo a paciente. A paciente tem uma crença muito forte. Se considera evangélica e sempre pedia que a levássemos ao culto. “Pai Jesus”, que é como ela se refere a Jesus, era algo que ela mencionava sempre em nossos acompanhamentos. Que “Pai Jesus” estava sempre olhando e protegendo ela, e que se agradava quando ela não usava roupa sem manga. Tal comportamento não era reforçado, mas ainda assim a paciente não se desvencilhou dele. A “dor de morte” ocorreu em duas sessões diferentes. A primeira vez aconteceu na terceira sessão, quando ainda frequentávamos o Arte de Ser. A paciente primeiro reclamou de dores abominares, e então de dores no peito e um entalo na garganta. Seu comportamento era apertar o peito e abdômen, e segurar o pescoço. Estava muito agitada e chorando compulsivamente, e pediu então que a levássemos de volta para o hospital. Chegando lá ficamos alguns minutos até que a paciente se acalmasse e tomasse medicação. Perguntada sobre a dor, a paciente falava que sempre a tinha e que era a dor da morte, “a morte me chamando” (sic). A indagamos também sobre a frequência que essa dor vinha, e ela respondeu que não sabia, que a dor vinha quando ela queria e quando ela iria morrer, pois era a dor da morte. Já sonolenta, a deixamos para descansar e então fomos embora. A segunda vez, aconteceu na décima terceira sessão. Quando chegamos para o AT, já fomos informadas pela enfermeira que a paciente estava “tristinha e tinha passado mal no dia anterior” (sic). Ao falarmos com a paciente, ela relatou ter tido dor da morte no dia anterior logo após uma briga com outra paciente. A paciente não quis sair para o acompanhamento e então fizemos



uma sessão na área de convivência da sua ala do hospital. A dor da morte da paciente ocorre aparentemente sem explicação. Foi levantada a hipótese de que seria quando a paciente se sentia rejeitada e seus pedidos eram negados, ou seja, quando recebia uma punição. Sobre seus comportamentos no hospital, quando iniciamos o trabalho ela não interagia com outras pessoas de fora do hospital, como atendentes de lojas, lanchonetes, etc. Atualmente ela já consegue interagir, e até manter alguma conversação com estranhos. Ainda sobre a interação, por ela não conseguir interagir direito, a paciente acabava não externalizando as suas vontades, com a melhora nas habilidades sociais, ocorreu uma melhora no seu comportamento verbal e repertório comportamental. Ao final do acompanhamento ela já fazia pedidos, escolhia o que queria e o que não queria, pedia para comprar objetos pessoais, etc. Isso passou a ocorrer pois com o trabalho realizado como Acompanhante Terapêutico, a paciente passou a adquirir repertório comportamental e verbal em habilidades sociais de comunicação, civilidade, assertivas e de enfrentamento e também habilidades sociais empáticas e também sociais de expressão de sentimento positivo. A paciente deixou então de ficar voltada à si mesma e começou a olhar mais o ambiente e as pessoas que estavam a sua volta. Tais habilidades sociais foram determinadas por Del Prettee Del Prette (2001). Segundo Del Prette e Del Prette (2001) no livro Psicologia das Relações Interpessoais, existem muitas habilidades sociais, as seguintes especificadas são as que foram observadas na paciente A.F., foram elas: as Habilidades Sociais de Comunicação (DEL PRETTE; DEL PRETTE, 2001, p.63) que envolvem os elementos básicos de se comunicar, como fazer e responder a perguntas, elogiar, iniciar e manter conversas, etc.; as Habilidades Sociais de Civilidade, que Del Prette e Dell Prette (2001, p.72) afirmam ser desempenhos razoalmente padronizados, como por exemplo, o dizer

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por favor quando precisa-se de algo, agradecer, e desperdir-se. Há também Habilidades Sociais Assertivas de Enfrentamento(DEL PRETTE; DEL PRETTE, 2001, p.73-84), que se caracterizam pelo manifestar opinião, concordando ou não com a opinião de terceiros, fazer, aceitar e recusar pedidos, sempre de forma assertiva sabendo lidar com as opiniões contrárias e com críticas construtivas ou não. As Habilidades Sociais Empáticas que são principalmente o manifestar apoio ao outro e por último, as Habilidades Sociais de Expressão de Sentimento Positivo que é principalmente fazer amizades (DEL PRETTE; DEL PRETTE, 2001, pp. 86-98).

3. CONCLUSÃO É possível ver a eficácia das técnicas utilizadas para com a paciente, notando-se assim a extinção de diversos comportamentos que antes a paciente tinha, que foram então modificados e tornaram-se comportamentos funcionais e habilidosos. Como se nota, a paciente não possuía nenhum repertório comportamental habilidoso ou funcional e cada avanço foi de grande importância em sua vida. Saliento que para que esses comportamentos se solidifiquem, é necessário que a paciente continue com o Acompanhamento Terapêutico para que não haja extinção de seus comportamentos adequados. 4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AYUB, Paula. Do amigo qualificado ao acompanhante terapêutico. Rev. Neuropsiq. da Inf. e Adol., v.4, n.2, p. 3740, 1996. BARRETTO, Kleber Duarte. Acompanhamento Terapêutico: uma clínica do cotidiano. Insight: Psicoterapia, n.73, p. 22-24, 1997. CABALLO, Vicente. Manual de Avaliação e Treinamento de Habilidades Sociais. São Paulo: Santos, 2012.



DALGALARRONDO, Paulo. Psicopatologia e Semiologia dos Transtornos Mentais. 2. ed. Porto Alegre: Artmed. 2008. DEL PRETTE, Z.A.P.; DEL PRETTE, A. Psicologia das Relações Interpessoais: Vivências para o trabalho em grupo. Petrópolis: Vozes. 2001. FINGER, Igor de Rosa. A estrutura da sessão. In: OLIVEIRA, Margareth da Silva; ANDRETTA, Ilana (Orgs.), Manual Prático de Terapia Cognitivo-Comportamental. Editora Casa do Psicólogo, 2011. GUILHARDI, Hélio José. Terapia por Contingências de Reforçamento. In: ABREU, Cristiano Nabuco; GUILHARDI, Hélio José (Orgs.), Terapia Comportamental e Cognitivocomportamental – Práticas clínicas, São Paulo: Roca, 2004. MARTIN, Elisabete Villalobos et al. Acompanhamento Terapêutico: uma modalidade de intervenção psicoterápica. Insight: Psicoterapia, n.34, p. 14-17, 1993. SKINNER, B.F. The operational analysis of psychological terms. Psychological Review, v.52, p. 270-277, 1945. SKINNER, B.F. Science and human behavior. New York: McMillan, 1953. SKINNER, B.F. Contingencies of reinforcements: a theoretical analysis. New York: Appleton-Century-Crofts, 1969. WRIGHT, J.H.; BASCO, M.R.; THASE, M. E. Aprendendo a terapia cognitivecomportamental: um guia ilustrado. Tradução: M.G. Armando. Porto Alegre: Artmed, 2008.

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