Remuneração variável nos contratos administrativos: um instrumento do princípio da eficiência.

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REMUNERAÇÃO VARIÁVEL NOS CONTRATOS ADMINISTRATIVOS: UM INSTRUMENTO DO PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA1 Nadja Lírio do Valle Marques da Silva Resumo O presente trabalho se ocupa do estudo da cláusula de remuneração variável, instituto contratual facultado à Administração Pública pelas Leis 11.079/04 (Lei das Parcerias Público-Privadas) e 12.462/11 (Lei do Regime Diferenciado de Contratação), e sua relação com o princípio da eficiência. Por se tratar de mecanismo recente, há um esforço no sentido de definir conceito e conteúdo da cláusula, bem como suas limitações e características essenciais, de maneira a permitir a adequada compreensão de como esta cláusula pode ser incorporada às concessões e parcerias público-privadas, de maneira a ampliar a eficiência de tais contratos. Realizada esta análise, este trabalho molha os pés em águas ainda não navegadas e indica desafios e perspectivas a ser explorados na aplicação da remuneração variável a contratos administrativos para os quais não haja a sua provisão, bem como sugere aplicação alternativa do mecanismo. Abstract This paper concerns itself with the variable remuneration clause, a new contractual institute, made available to the Public Administration through Bills 11.079/04 (Public-Private Partnerships) and 12.462/11 (RDC) and its relationship with the efficiency principle. Given the novelty character of its subject, this paper focuses on defining a conceptual definition of this clause, as well as its limitations and basic characteristics, so as enable the comprehension of how this clause may be incorporated in public concessions and public-private partnerships to enhance the efficiency of these contracts. Finally, after this analysis, this paper dips into uncharted waters, indicating challenges and frontiers yet to be explored in the application of the variable remuneration onto the administrative contracts for which there is no provision of such a clause, as well as an alternative application of the institute.

INTRODUÇÃO A opção constitucional pelo procedimento licitatório como caminho de materialização das contratações públicas tem sofrido severas críticas, por tratar-se de processo excessivamente burocrático, lento e custoso2, sendo necessária sua reformulação de maneira a se alcançar a verdadeira eficiência 1

O presente artigo é uma adaptação de trabalho de conclusão de curso apresentado como requisito para a conclusão do curso de graduação em Direito na Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas – IBMEC. 2 SUNDFELD, Carlos Ari – Novo direito para a gestão pública? Revista de Direito da Procuradoria Geral, Rio de Janeiro. Edição especial, 2012

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contratual, que não mais pode ser entendida exclusivamente a partir daquilo que se traduz no processo licitatório, que cria um ambiente fictício; muitas vezes na execução da contratação antes proposta se verificará que ela produz um resultado positivo ilusório3. Além disso, muitos são os elementos hoje envolvidos na prestação de serviços e nas políticas públicas – quer pela própria Administração, quer pelo parceiro privado –, não mais sendo suficiente a busca exclusivamente pela solução que apresente o menor preço. Neste sentido, diversos novos modelos contratuais e mesmo procedimentos para a escolha da proposta mais vantajosa para a Administração têm sido desenvolvidos, como o pregão eletrônico, as parcerias público-privadas e o regime diferenciado de contratação, cada qual trazendo novas alternativas relacionadas à pactuação. Uma dessas inovações é a remuneração variável vinculada, introduzida pela Lei das Parcerias Público-Privadas (Lei 11.076/04), e repetida na Lei do Regime Diferenciado de Contratação (Lei 12.462/11), ainda em fase de construção quanto ao seu conteúdo e possibilidades. A baixa densidade teórica do instituto tem resultado, de outro lado, em pouca incidência prática – o que determina um círculo vicioso no que toca à exploração do potencial desse tipo de cláusula na consecução de uma avença que bem atenda e equilibre interesses de contratante e contratado. O que se pretende no presente artigo é contribuir para esse processo de desenvolvimento conceitual, a partir de sua análise crítica, bem como verificar a sua instrumentalidade para a concretização do princípio da eficiência administrativa, consolidado no caput do art. 37 da Constituição Federal. O primeiro item se ocupa, portanto, do estudo da remuneração variável, de maneira a definir seu conteúdo, suas hipóteses de cabimento, os critérios apontados pelas Leis 11.079/04 e 12.462/11 como justificadores do incremento da contraprestação a ser percebida pelo parceiro privado e os limites à sua incidência. O segundo item se ocupa de examinar o princípio da eficiência enquanto corolário da Administração Pública, delineando seu conteúdo e

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SOUTO, Marcos Juruena Vilela. Licitações e controle de eficiência – repensando o princípio do procedimento formal à luz do “placar eletrônico”! Revista de Direito da Procuradoria Geral do Estado, Rio de Janeiro. Edição especial, 2012.

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significado na atuação estatal, para subsidiar a análise de sua relação com a remuneração variável nos contratos administrativos. Finalmente, no item final, se fará a análise da relação entre o princípio da eficiência e a remuneração variável, e se apontarão novas perspectivas e desafios na instrumentalização deste instituto. 2. REMUNERAÇÃO VARIÁVEL Uma premissa relevante à compreensão da abordagem aqui utilizada é a de que, em razão do extenso rol de direitos fundamentais elencados na Constituição Federal de 1988 e dos instrumentos para sua garantia trazidos por ela, tem-se experimentado uma proliferação de demandas por serviços a serem prestados pela Administração, a qual recorre a arranjos celebrados com particulares para a execução de tais atividades. A concessão de serviços públicos, um dos instrumentos que surgiu para a satisfação de tais demandas era, em sua origem, arranjo que tinha como características essenciais a exploração do serviço por conta e risco do concessionário e a remuneração proveniente exclusivamente das tarifas pagas pelos usuários do serviço. Esta formulação, no entanto, passou por uma reavaliação, comportando diversas novas espécies desse mesmo tradicional arranjo contratual, que melhor se ajustam às particularidades de cada atividade ou serviço a ser prestado. 2.1. EFEITOS DA PLURALIDADE DE MODELOS DE CONCESSÃO NA REMUNERAÇÃO DO CONCESSIONÁRIO A pluralização das técnicas de colaboração entre os setores público e privado levou à flexibilização do “modelo tradicional” de remuneração do concessionário, não mais restrito ao pagamento de tarifas pelos usuários, mudança de paradigma que foi consolidada pela Lei 11.079/04. Este diploma legal, ao introduzir no sistema jurídico nacional as chamadas parcerias público-privadas, viabilizou a outorga contratual de atividades que, embora passíveis de delegação antes mesmo de sua edição, por não serem rentáveis o bastante para permitir a execução por conta e risco

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exclusivos do concessionário, não podiam ser disciplinadas pelo modelo clássico4. Ao tratar dos reflexos da evolução do conceito de concessão no que diz respeito à remuneração do concessionário, Schwind5 indica ter havido transformação em três frentes diversas. Em primeiro lugar, passou-se a admitir que o concessionário seja remunerado por meio de recursos provenientes da exploração de todas as potencialidades do serviço, não mais se restringindo exclusivamente à cobrança de tarifas dos usuários do serviço em si, mas conferindo ao prestador a faculdade de explorar também receitas acessórias à prestação do serviço, hipótese já prevista no art. 11 da Lei 8.987/95. Prosseguindo por essa linha, a Lei 11.079/04 atenuou a assunção integral do risco pelo concessionário, ao permitir a aplicação de ajudas financeiras ou subsídios estatais no âmbito dessas atividades, de modo a viabilizar atividades que revelem déficits crônicos ou cujos riscos sejam tão elevados que, se compensados por meio de aumento da tarifa, resultariam em valores proibitivos para os usuários – violando o princípio da modicidade tarifária, corolário do serviço público. Neste sentido, Sundfeld6 ressalta que a Lei das Parcerias Público-Privadas veio instituir um “sistema de garantias, que protegesse o concessionário”, que envolvem o pagamento do que chama de “adicional de tarifa” pela Administração – que em verdade significa o aporte de recursos nas concessões patrocinadas7. Finalmente, passou-se a reconhecer também que a Administração pudesse assumir integralmente o encargo de efetuar pagamentos diretamente ao concessionário, sem que isto resultasse na descaracterização da técnica 4

O mesmo instrumento legislativo também criou a chamada concessão administrativa – instrumento que permitiu à Administração celebrar contratos nos quais é ela a usuária direta ou indireta do serviço concedido. 5 SCHWIND, Rafael Wallbach. Remuneração do concessionário: concessões comuns e parcerias público-privadas. Belo Horizonte: Forum, 2010, p. 32-34. 6 SUNDFELD, Carlos Ari. Guia jurídico das parcerias público-privadas in Parcerias públicoprivadas. SUNDFELD, Carlos Ari (Coord). São Paulo: Malheiros. 7 Outro instrumento que tem por objeto central a manutenção da modicidade tarifária, implicando em aporte de recursos pela Administração é a tarifa social. Trata-se de uma escolha discricionária no sentido de o poder concedente suportar parcela do custo da tarifa, quando seu aumento for necessário à garantia do equilíbrio econômico-financeiro do contrato. Os dois instrumentos diferem-se no que tange ao grau de discricionariedade e à duração da prestação pela Administração. Na concessão patrocinada, desde a elaboração do edital há a previsão da exata parcela da remuneração com que se obriga o Poder Concedente, e este compromisso se estende por toda a duração do contrato. Já a tarifa social é resultante de uma opção política, que pode ser revista a qualquer momento, e que durará por tanto tempo quanto for conveniente e oportuno.

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concessionária. Não se trata de ajuda financeira, mas sim de prestação de serviço do qual a Administração é usuária direta ou indireta, e por isso mesmo, é responsável pelo pagamento da contraprestação – modelo consolidado nas concessões administrativas. Tratando da distinção entre os contratos de PPP e outros modelos de parcerias com o setor privado, Souto8 aponta que a tarifa nem sempre é suficiente para remunerar as concessões comuns, sendo necessário um sistema de garantias e de subsídios públicos que não era contemplado pela Lei 8.987/95 – vez que a sua sistemática visava prioritariamente o investimento privado. Em seguida o autor faz menção a um artigo 9, presente no texto original da Lei 8.987/95, que permitiria à Administração garantir uma receita mínima ao parceiro privado, mas cuja restauração não seria suficiente a superar as dificuldades apresentadas pela sistemática da concessão clássica e nem permitiria a partilha de riscos, necessária por vezes para impulsionar a execução de determinadas atividades de interesse público pelo particular. O autor ressalta, no entanto, que qualquer eventual contribuição por parte da Administração Pública deveria se limitar a uma garantia de renda mínima, devendo a remuneração se dar, primordialmente em função do rendimento oferecido pelo concessionário. No que tange especificamente à previsão da cláusula de remuneração variável, o autor sinaliza: “É bem verdade que a ideia original era a remuneração variável, em função do desempenho (tal como consta do art. 1º, parágrafo único e 2º, X da Lei nº 14.868, de 16.12.2003, do Estado de Minas Gerais, que inspirou o projeto federal); o parágrafo único do art. 7º da Lei Federal transformou-a em faculdade, o que pode desnaturar os objetivos da PPP.”10

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SOUTO, Marcos Juruena Villela. Direito administrativo das parcerias. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 31-30. 9 “Art. 24. O poder concedente poderá garantir, no contrato de concessão, uma receita bruta mínima ou, no caso de obras viárias, o correspondente a um tráfego mínimo, durante o primeiro terço do prazo da concessão.” BRASIL. Lei 8.987 de 13 de fevereiro de 1995. Diário Oficial da União - p. 1917. 10 VILLELA SOUTO, Marcos Juruena. Direito administrativo das parcerias. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005, p. 30.

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2. 2. CONCEITO A remuneração variável, introduzida pela Lei 11.079/2004 e reproduzida na Lei 12.462/2011, é mais um dos instrumentos orientados a viabilizar a aplicação do modelo de concessão de serviços públicos, porém tem por objetivo garantir uma prestação mais qualificada, estabelecendo metas que permitam uma variação da contraprestação a ser percebida pelo parceiro particular, uma vez verificadas condições pré-determinadas no contrato, em cláusula específica. Importante ressaltar que esta variação no resultados da contratação é especial, própria dos contratos que a adotam, e que não deve ser confundida com eventual refixação remuneratória, quer em razão de alteração contratual realizada pela Administração, para fins de reequilíbrio econômico-financeiro, quer resultante de instabilidade da demanda pelo serviço prestado. A remuneração variável, delineada na Lei de PPPs, será vinculada a aspectos específicos do desempenho do concessionário, verificado a partir de metas e padrões de qualidade e disponibilidade definidos no instrumento contratual11. A Lei do RDC incorporou igualmente essa mesma alternativa convencional, e determina que esta parcela adicional da contraprestação terá por base metas, padrões de qualidade, critérios de sustentabilidade ambiental e prazo de entrega definidos no instrumento convocatório e no contrato12. A partir de suas previsões legais, pode-se conceituar a remuneração variável como mecanismo facultado à Administração, nas modalidades de concessão em que haja aporte de recursos estatais, para vinculação de parte da contraprestação a ser percebida pelo particular a seu desempenho na execução da atividade concedida, submetendo-a ao 11

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“Art. 6 A contraprestação da Administração Pública nos contratos de parceria públicoprivada poderá ser feita por: (...)§ 1o O contrato poderá prever o pagamento ao parceiro privado de remuneração variável vinculada ao seu desempenho, conforme metas e padrões de qualidade e disponibilidade definidos no contrato.” BRASIL. Lei 11.079 de 30 de dezembro de 2004. Diário Oficial da União - Seção 1 - 31/12/2004, p. 6. 12 “Art. 10. Na contratação das obras e serviços, inclusive de engenharia, poderá ser estabelecida remuneração variável vinculada ao desempenho da contratada, com base em metas, padrões de qualidade, critérios de sustentabilidade ambiental e prazo de entrega definidos no instrumento convocatório e no contrato.” BRASIL. Lei 12.462 de 04 de agosto de 2011. Diário Oficial da União – 05/08/2011, p. 1.

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atendimento de critérios definidos no contrato, que traduzam um ganho de qualidade para a Administração ou para o serviço concedido. Um desafio presente neste novo modelo é garantir que os aspectos essenciais característicos da atividade concedida sejam atendidos sem que isto justifique incremento na remuneração do concessionário, isto é, que a mera prestação do “núcleo mínimo” do serviço não resulte em enriquecimento sem causa do particular. É mecanismo que tem por objetivo equilibrar os riscos assumidos pelo particular, estimulando a obtenção de benefício adicional, não essencial ao objeto da concessão, mas que a Administração entende relevante o suficiente a justificar maior dispêndio, caso seja concretizado. 2. 3. HIPÓTESES DE CABIMENTO A remuneração variável é mecanismo disponível para as concessões de serviço público nas modalidades patrocinada e administrativa, bem como nas licitações e contratos elencados no rol do art. 1º da Lei 12.462/11. O art. 10 deste último diploma legal é explícito em reservar o seu uso para a “contratação das obras e serviços, inclusive de engenharia”. Assim, nos contratos celebrados sob o regime diferenciado de contratação cujo objeto seja o mero fornecimento de bens, não caberá a aplicação do mecanismo. Esta exclusão se justifica por serem os contratos de aquisição de bens, em regra, de trato instantâneo, e o não atendimento das especificações quanto às características do objeto e o prazo estipulado para sua entrega, na forma do art. 14 da Lei 8.666/93, ultrapassa o conceito de mau desempenho, caracterizando o efetivo descumprimento contratual, para o qual há previsão de penalidades específicas13.

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Schwind sustenta ser possível previsão legal no sentido do cabimento de remuneração variável nos contratos para aquisição de bens, uma vez que é possível contrato para o fornecimento regular de bens durante determinado período, ou o estabelecimento de metas diferenciadas que proporcionem vantagens adicionais à Administração (SCHWIND, Rafael Wallbach. Remuneração Variável e Contratos de Eficiência no Regime Diferenciado de Contratações Públicas in JUSTEN FILHO Marçal, PEREIRA, Cesar A. Guimarães (coord) O regime diferenciado de contratações públicas (RDC): comentários à lei nº 12.462 e ao decreto nº 7.581.).

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O mesmo não pode ser dito nas hipóteses de prestação de serviços ou realização de obras, uma vez que a capacidade de prognose do conteúdo da prestação devida pelo contratado, em razão da duração destes contratos, é mais limitada, não tendo a Administração como prever, a título de exemplo, o surgimento de inovações tecnológicas que possam alterar as condições da prestação, em especial no que tange à qualidade do serviço. A cláusula de remuneração variável abre espaço para que se incorporem estas eventuais transformações sem, no entanto, ser necessário o aditamento do contrato. Um outro aspecto importante da disposição contratual em análise nos contratos de concessão de serviços públicos é que o estabelecimento de metas e padrões de qualidade que resultem em incremento da contraprestação pecuniária estimula não só a adequada oferta do serviço – requisito mínimo -, mas o atingimento de tais objetivos, garantindo ao particular maior margem de lucro sem pôr em risco os padrões mínimos de qualidade – o que termina por trazer benefícios à Administração e aos usuários. 2. 4. CRITÉRIOS PARA DEFINIÇÃO DA REMUNERAÇÃO VARIÁVEL A remuneração variável, prevista no art. 6º, §1º da Lei 11.079/04, será vinculada ao desempenho do parceiro privado “conforme metas e padrões de qualidade e disponibilidade definidos no contrato”. Já o Regime Diferenciado de Contratações, acresce a esses elementos, “critérios de sustentabilidade ambiental e prazo de entrega definidos no instrumento convocatório e no contrato.” Percebe-se que em ambas as hipóteses, o legislador optou por uma fórmula genérica, deixando a critério do administrador a definição das hipóteses em que se aplicará o mecanismo da remuneração variável. Esta opção legislativa se coaduna com a percepção de que é a Administração o personagem mais capacitado para decidir sobre as fórmulas aplicáveis a cada um dos contratos celebrados, tendo em conta a natureza do serviço ou do interesse público a ser atendido.

2.4.1 Previsões de metas

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Critério mais maleável dentre os previstos na legislação sobre o tema, tem na fixação de objetivos a ser alcançados pelo parceiro privado – que podem ter diversas naturezas – a justificação para variação da remuneração a ser percebida. A escolha de tais metas deverá, obrigatoriamente, resultar em benefício para a Administração ou para a coletividade, devendo ser factíveis, sob pena de tornar-se inútil o instituto. Ressalta-se aqui que os objetivos fixados devem ser alheios ao mínimo essencial caracterizador da prestação contratada, e os benefícios alcançados traduzirão vantagem que não guarda relação com os aspectos primordiais da atividade concedida.

2.4.2 Padrões de qualidade Os padrões de qualidade que justifiquem a remuneração variável deverão, tal qual as metas, ser objetivos, úteis e alcançáveis. Estes standards respeitarão o patamar de qualidade mínimo essencial do serviço prestado, indicando sempre uma melhora em relação a este. A remuneração variável tem por fundamento a busca de benefícios externos ao objeto primordial do contrato, de sorte que estabelecer incremento da contraprestação recebida pelo particular em razão do simples atendimento de parâmetros mínimos de qualidade resultaria em desvio de finalidade do instrumento, e em enriquecimento sem causa do concessionário.

2.4.3 Critérios de sustentabilidade ambiental O RDC inova, em relação à Lei de PPPs ao trazer a possibilidade de remuneração variável com base em critérios de sustentabilidade ambiental expressamente, embora seja possível, em razão do significado abrangente da expressão “metas”, celebrar parceria público-privada que tenha este parâmetro como base para incremento na contraprestação do parceiro privado. Os padrões de sustentabilidade ambiental estabelecidos deverão ser embasados tecnicamente, e deverão gerar benefício aferível ao vetor declarado relevante, sob pena de invalidade. A indicação legal deste critério como um dos standards segundo os quais se pode conferir remuneração variável ao concessionário se justifica prima facie pelo compromisso do 9

ordenamento jurídico nacional com a preservação do meio ambiente, direito fundamental difuso, com previsão no art. 5º, LXXIII da Constituição Federal. Relevante ressaltar que a Lei 8.666/93 já traz a sustentabilidade como objetivo a ser garantido pelas licitações, quando seu art. 3º fala do desenvolvimento nacional sustentável; e a adoção deste vetor no campo ambiental já foi objetivo inclusive de disciplina infralegal14. Vale

apontar

que

a

compreensão

mais

moderna

de

sustentabilidade emancipa esse vetor para além da fronteira ambiental, valorizando também a sustentabilidade social, e outros aspectos. Nesse cenário, a inserção da sustentabilidade como objetivo a ser tutelado nas contratações pela Administração viabiliza a sua exigência, ainda que a custos mais altos, mas seu estabelecimento como critério a justificar incremento na contraprestação a ser percebida pelo concessionário estimula a adoção de procedimentos, processos e práticas sustentáveis.

2.4.4 Prazos de entrega Também incluído pela Lei 12.462/11, o estabelecimento de prazo de entrega diferenciado em relação ao originalmente contratado como justificativa a alteração da contraprestação originalmente celebrada deve, como os demais critérios, trazer benefício adicional à Administração ou ao interesse público. É critério dos mais objetivos, uma vez que a sua aferição não demanda conhecimentos técnicos aprofundados ou juízo subjetivo. Importante ressaltar, no que diz respeito a este parâmetro, que o prazo mais reduzido deverá ser factível, e que por tratar-se de mecanismo de remuneração variável, o particular sempre poderá não observar o prazo reduzido, abrindo mão do incremento remuneratório. Finalmente, como com os 14

Em 19 de Janeiro de 2010 foi publicada Instrução Normativa SLTI/MP 01/2010 do Ministério do Planejamento que dispõe: “Art. 1º Nos termos do art. 3º da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, as especificações para a aquisição de bens, contratação de serviços e obras por parte dos órgãos e entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional deverão conter critérios de sustentabilidade ambiental, considerando os processos de extração ou fabricação, utilização e descarte dos produtos e matérias-primas. Art. 2º Para o cumprimento do disposto nesta Instrução Normativa, o instrumento convocatório deverá formular as exigências de natureza ambiental de forma a não frustrar a competitividade. Art. 3º Nas licitações que utilizem como critério de julgamento o tipo melhor técnica ou técnica e preço, deverão ser estabelecidos no edital critérios objetivos de sustentabilidade ambiental para a avaliação e classificação das propostas.”

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demais standards, não poderá se relacionar exclusivamente ao mínimo essencial do objeto do contrato, devendo sempre resultar em ganho adicional, isto é, o prazo especificado deverá ser sempre menor do que o habitualmente estabelecido para a prestação e caso o prazo reduzido não traduza qualquer ganho para a Administração, será inválida a sua previsão contratual. 2.5. GANHOS PROPORCIONADOS PELA ADMINISTRAÇÃO O art. 70 do Decreto Federal nº 7.581, ao tratar do mecanismo da remuneração variável, determina que eventuais ganhos provenientes de ações da própria Administração Pública não serão considerados no cômputo do desempenho do contratado15. Trata-se de previsão que não consta, quer da Lei 11.079/04, quer da Lei 12.462/11, porém que não precisava ser expressamente disposta. A regra simplesmente esclarece a vinculação obrigatória entre o incremento remuneratório a ser percebido pelo particular e os ganhos que sua própria atuação proporcione à Administração, já que não faria sentido algum aumentar a remuneração do contratado por benefícios que resultem de atuação da própria contratante. A interpretação do dispositivo deve se dar com razoabilidade, sendo certo que nem sempre será fácil identificar o “responsável” pelo ganho, que por vezes poderá resultar de atuação conjunta da Administração e do contratado – hipótese em que a atuação do particular deverá ser considerada caso o resultado obtido esteja previsto como critério para obtenção de remuneração adicional. Ocorrência mais sensível será aquela em que seja necessária atuação prévia da Administração como condição para a execução do contrato – como, por exemplo, liberação de uma determinada área para o início de obra pública contratada. Neste caso, a Administração terá cumprido mera precondição, o que não será suficiente a justificar a aplicação do art. 70, §2º do 15

Art. 70. Nas licitações de obras e serviços, inclusive de engenharia, poderá ser estabelecida remuneração variável, vinculada ao desempenho do contratado, com base em metas, padrões de qualidade, parâmetros de sustentabilidade ambiental e prazo de entrega definidos pela administração pública no instrumento convocatório, observado o conteúdo do projeto básico, do projeto executivo ou do termo de referência. (...)§ 2o Eventuais ganhos provenientes de ações da administração pública não serão considerados no cômputo do desempenho do contratado.

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Decreto nº 7.821/11, uma vez que se trata de obrigação assumida pela contratante, sem a qual o particular jamais poderia iniciar a execução do contrato. No entanto, se o contratado aproveitar esta oportunidade e antecipar também o cumprimento de sua obrigação, então poderá fazer jus ao incremento em sua contraprestação, se o contrato assim dispuser. 2.6. RESPEITO AO LIMITE ORÇAMENTÁRIO A remuneração total a ser percebida pelo contratado, incluídos os adicionais referentes ao atendimento das metas (expressão utilizada aqui em seu significado mais amplo), deverá respeitar o limite orçamentário fixado pela Administração Pública para aquela contratação específica. Ainda que não seja possível prever, quando da dotação orçamentária, o total efetivamente devido – já que não se sabe de antemão se o contratado atingirá as metas que autorizarão eventual incremento remuneratório –, o Administrador deverá garantir que a remuneração (inclusive a parcela adicional e contingente) a ser percebida pelo particular esteja integralmente prevista no orçamento. Quando da opção pela adoção da sistemática de contraprestação variável, o administrador deverá ter dois cuidados: antes da contratação, deverá garantir que haja provisão orçamentária que comporte o total de remuneração possível, isto é, com todos os acréscimos cabíveis, atendidas as metas fixadas no contrato; e na duração da concessão, deverá monitorar de perto o cumprimento dos objetivos pré-estabelecidos para, na hipótese de não cumprimento, realocar os valores equivalentes. Trata-se de questão de responsabilidade fiscal, uma vez que o instrumento da remuneração variável não pode resultar em incerteza absoluta quanto ao montante de recursos públicos empregados, tampouco poderá resultar em “capital em caixa”, isto é, não atendidas as metas, o administrador tem o dever de reverter o valor em favor de outra questão de interesse público. 2.7. DEVER DE MOTIVAÇÃO O art. 10, Parágrafo Único da Lei 12.462/11 determina que a remuneração variável será motivada, e o art. 70, §1º do Decreto Federal 7.581 12

estabelece que a motivação se dará quanto aos parâmetros escolhidos para a aferição do desempenho do particular contratado, quanto ao valor a ser pago e quanto ao benefício a ser gerado para a Administração Pública. O dever de motivação, no entanto, não se encerra a estes três itens, mas se aplica também à opção pela contratação pela sistemática do regime diferenciado de contratação e da remuneração variável, uma vez que ambas escolhas são facultadas à Administração. No tema do dever de motivação quanto à escolha pelo regramento do RDC, sem previsão expressa na Lei 12.462/11, o que poderia levar a uma compreensão de que a Administração estaria dispensada de apresentar suas razões, Valle aponta que: “Tal compreensão, todavia, parece incompatível com uma Administração que hoje se entende sujeita sempre a imperativos de legitimação, que em plena pósmodernidade decorrem não do sujeito da decisão, mas sim das razões que determinam a escolha pública investigada, que hão de expressar a conformidade do agir do Estado ao interesse público concretamente considerado. (...) Essa particular escolha – a da adoção do RDC – estará a envolver a consideração de outros elementos de vantajosidade que podem ser compartilhados entre contratante e contratado; e ainda aqueles reputados favoráveis ao Poder Público não diretamente relacionados à lógica econômica, como previsto, por exemplo, no art. 4º, § 1º da Lei 12.462/2011, que recepciona como diretriz possível a essas contratações, a consideração de elementos como os benefícios diretos ou indiretos de natureza social ou ambiental.”16 Esta compreensão segue aquela expressa por Moreira Neto17, destacando que no Estado Democrático de Direito, o interesse público sempre vinculará qualquer manifestação do poder estatal – seja constitucional, legislativo, administrativo ou judiciário –, é dizer, o critério de legitimação das decisões repousa não exclusivamente numa legalidade estrita, mas também na 16

VALLE, Vanice Regina Lírio do. Viabilidade jurídica do regime diferenciado de contratações: sobre a arte de evitar que a cauda abane o cachorro. Fórum de Contratação e Gestão Pública (Impresso), v. Ano 10, p. 76-86, 2011. 17 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Legitimidade e discricionariedade. Novas reflexões sobre os limites e controle da discricionariedade. 4ª ed., Rio de Janeiro: Editora Forense, 2002, p. 21, 25-26).

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prática de atos que, no espaço conferido pela legislação, expressem expressões legítimas. Nesta mesma linha de raciocínio, a opção por estabelecer parâmetros a justificar a remuneração variável deverá ser motivada, indicando particularmente em que medida estes elementos que permitirão alteração da contraprestação percebida pelo concessionário não compõem o núcleo mínimo do serviço a ser prestado – evitando assim a sua utilização para desvios e favorecimentos indevidos. 3. A EFICIÊNCIA NO ÂMBITO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA Antes de adentrar a discussão sobre a origem, conceito e conteúdo do princípio da eficiência administrativa, é relevante estabelecer o que se entende por Administração Pública, vez que será esta a protagonista das atividades que se qualificação como eficientes ou não. Para fins do presente trabalho, se adotará o conceito de Administração Pública de Moreira Neto, sintetizado como “as atividades preponderantemente executórias, definidas por lei como funções do Estado, gerindo recursos para a realização dos objetivos voltados à satisfação de interesses especificamente definidos como públicos”18. O princípio da eficiência foi expressamente incluído no texto constitucional, como postulado basilar da Administração Pública por meio da Emenda 19/98, que teve por objetivo central implementar o modelo de Estado Gerencial no Brasil, adotando os princípios da “nova gestão pública” (new public management) como meio para superar as deficiências do serviço público, profundamente afetado pelas práticas clientelistas e patrimonialistas do sistema implementado após a Reforma Burocrática19.

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MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo: parte introdutória, parte geral e parte especial. 16 ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 123. 19 BRESSER-PEREIRA, Luiz Carlos. Reflexões sobre a reforma gerencial brasileira de 1995. Disponível em < http://www.bresserpereira.org.br/view.asp?cod=1217>, último acesso em 06 de junho de 2015.

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A eficiência administrativa é elemento integrante do conteúdo daquilo que a doutrina denominou “boa administração”20, hoje já tratado por diversos autores, dentre eles Valle21 como direito fundamental. A menção expressa ao princípio da eficiência no caput do art. 37 da Constituição Federal traduz um compromisso com a qualidade da atuação da Administração. Naquilo que tange ao presente trabalho, busca conferir uma série de direitos aos usuários dos diversos serviços prestados diretamente pelo Estado ou por seus delegados, impondo obrigações efetivas aos prestadores22. 3. 1. ORIGEM O conceito de “eficiência” não tem origem na Ciência do Direito, mas sim na Teoria da Administração, sendo o principal objeto de pesquisa de seus autores23. A partir do estudo das organizações, para sistematizar seu funcionamento e alcançar maior retorno dos investimentos, os teóricos da Administração Científica se centraram na busca pela melhor metodologia de execução das atividades de suas organizações. Para estes teóricos, era importante identificar os métodos mais eficazes e eficientes para alcançar os resultados pretendidos pela organização, em intrínseca relação entre recursos (materiais e imateriais) investidos e o retorno percebido. Segundo esta linha, a eficácia estaria relacionada com a capacidade de determinado método atingir os objetivos e resultados

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É de Juarez Freitas o conceito de boa administração aqui utilizado: “Trata-se do direito fundamenta à administração pública eficiente, eficaz, proporcional, cumpridora dos seus deveres, com transparência, motivação, imparcialidade e respeito à moralidade, à participação social e à plena responsabilidade por suas condutas omissivas e comissivas; a tal direito corresponde o dever de a administração pública observar, nas relações administrativas, a cogência da totalidade dos princípios constitucionais que a regem”. FREITAS, Juarez apud VALLE, Vanice Regina Lírio do. Direito fundamental à boa administração e governança. Belo Horizonte: Fórum, 2011, p. 78 21 VALLE, Vanice Regina Lírio do. Direito fundamental à boa administração e governança. Belo Horizonte: Fórum, 2011. 22 CARVALHO FILHO. José dos Santos. Manual de Direito Administrativo 26ª ed. rev., ampl., e atual. até 31-12-2012. São Paulo: Atlas, 2013. p. 30. 23 Henri Fayol e Frederick Winslow Taylor foram os primeiros a usar uma aproximação mais científica da administração, realizando análises empíricas sobre a organização das fábricas – seu principal objeto de estudo – e os fatores que afetam sua produção, buscando aumentar sua eficiência. Foi em seus estudos e livros que surgiu o primeiro conceito de eficiência. CHIAVENATO, Idalberto. Introdução à Teoria Geral da Administração. 8. ed. São Paulo: Makron, 2011.

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predeterminados, ao passo que a eficiência guardaria relação com a boa execução de determinada atividade24. Esse conceito, surgido no início do século XX, foi adotado e adaptado pelas demais ciências, tendo sido incorporado ao estudo da Administração Pública em meados da década de 1980, ambiente em que seu núcleo se consolidou na procura por produtividade e economicidade, como mecanismo para impedir o desperdício de dinheiro público. A lógica da busca pela eficiência na atuação da Administração Pública foi trazida expressamente ao ordenamento jurídico nacional com a reforma administrativa implementada pela Emenda Constitucional 19/1998, que a incluiu no rol de princípios do art. 37. Uma primeira crítica feita à inclusão deste princípio no texto constitucional tinha por cerne a compreensão de que se tratava de mero reforço de característica e obrigação já implícita à gestão do interesse público, uma vez que jamais se poderia aceitar por razoável que a Administração fosse ineficiente25. Ademais, a previsão, no art. 70 da Constituição Federal de que os Tribunais de Contas realizem a análise dos atos dos gestores de bens e dinheiros públicos sob a ótica da economicidade já seria suficiente a obrigar o Estado a uma atuação eficiente, de forma que a previsão constitucional do referido princípio seria mera figura de estilo. No entanto, essa percepção da modificação constitucional em questão é reducionista e ignora que a sua inclusão no Texto Fundamental objetiva superar a visão meramente economicista. A leitura da eficiência administrativa deve ter em conta o objetivo da emenda que a trouxe ao ordenamento jurídico, e indica muito mais um compromisso com a boa administração e com a qualidade dos serviços prestados direta ou indiretamente pelo Estado26. Mais do que reduzir custos, a Administração deve

24

CHIAVENATO, Idalberto. Introdução à Teoria Geral da Administração. 8. ed. São Paulo: Makron, 2011. 25 PEREIRA JUNIOR, Jessé Torres. Da reforma administrativa constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 41-47. 26 Esta leitura da constitucionalização do princípio da eficiência como mais do que mera obrigação com a economicidade, mas como consagração daquilo que viria a ser consolidado como de o direito fundamental à boa administração foi empreendida por Diogo de Figueiredo Moreira Neto, numa abordagem que buscava conferir sentido à reforma empreendida pela EC 19/1998 (MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Apontamentos sobre a reforma administrativa. Rio de Janeiro: Renovar, 1999, p. 38).

16

buscar o ponto ótimo entre a demanda a ser satisfeita, os recursos – materiais ou imateriais – a serem investidos e o atendimento dos interesses sociais envolvidos (geração de emprego, sustentabilidade ambiental, etc). Ressalta-se, no entanto, que vários dos propósitos e demandas postos à Administração, como por exemplo a construção de uma sociedade solidária (objetivo fundamental da República Federativa do Brasil, previsto no art. 3º da Constituição Federal27), podem exigir uma atuação que não é necessariamente a que aponta menor valor absoluto. Algumas das prestações, como aquelas relativas à assistência social, poderão significar o aporte de vultosos recursos, por vezes sem atingir um resultado financeiramente mensurável, sem que isto signifique ineficiência do programa ou da atuação estatal. Assim, fica claro desde já que aquilo que se entende por “eficiência administrativa” se verificará caso a caso, em uma análise relacional entre objetivos delimitados, recursos aplicados e resultado alcançado. 3. 2. CONCEITO O conceito de eficiência administrativa evoluiu e evolui conforme o fazem o conteúdo e os limites da atuação da Administração. À época da legalidade estrita, acreditava-se ser o atendimento à letra da lei e a observância do procedimento suficientes a garantir que a atividade estatal fosse eficiente. Posteriormente, a economicidade e a produtividade passaram a ser elementos integrantes da atividade administrativa, em razão da influência das teorias da administração. O princípio em estudo estaria assim a determinar um compromisso da Administração Pública com a otimização de seus recursos, com uma redução de custos em sua atuação. No que diz respeito à economicidade, destaca-se que não se confunde com a eficiência, embora os dois princípios guardem relação muito próxima, já que o primeiro é princípio constitucional previsto no art. 70 da Constituição Federal e elemento central do controle externo da Administração Pública. Bugarin, explica a sua relevância, esclarecendo que se tratou de 27

“Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I – construir uma sociedade livre, justa e solidária”. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado, 1988.

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“opção estratégica do constituinte de 1988 pela racional fundamentação das decisões politicamente motivadas concernentes à alocação do conjunto escasso de recursos públicos a disposição dos agentes delegados da sociedade, na sua primordial missão de atender, da melhor maneira possível, aos legítimos e urgentes anseios individuais e coletivos presentes em nossa perversa realidade socioeconômica. Neste sentido, economicidade, num plano políticoeconômico, se vincula ao necessário, e ainda não consolidado processo de avaliação das decisões públicas sob o prisma da análise de seus custos e benefícios para a sociedade, ou para a comunidade a que se refere.”28 O art. 70 da Constituição Federal impõe ao administrador um compromisso

inafastável

de

encontrar

a

solução

mais

adequada

economicamente ao gerir a coisa pública29. A lógica economicista, de redução de custos pura e simples, é característica daquilo que Sundfeld denomina “direito administrativo dos clipes/DAC”, que é o direito “da Administração de papelaria, que age por autos e atos, trata direitos e deveres em papel, é estatista, desconfia dos privados, despreza a relação tempo, custos e resultados, não assume prioridades”30. Importante destacar aqui que a Constituição de 1988 trouxe um extenso rol de direitos fundamentais dotados de eficácia imediata, o que levou a uma transformação na visão do conteúdo da atividade administrativa. Mais do que mera gestora de bens públicos ou provedora de serviços essenciais, a Administração passa a ser responsável e responsabilizada – inclusive judicialmente constitucional.



pela

Foi

satisfação

essa

das

transformação

garantias na

positivadas

percepção

do

no papel

texto da

Administração Pública que impulsionou a busca por novos instrumentos e parcerias capazes de satisfazer às sempre crescentes demandas da população, o que levou, ainda que indiretamente, à pluralização dos modelos e modalidades contratuais e licitatórias disponíveis. 28

BUGARIN, Paulo Soares. O princípio constitucional da economicidade na jurisprudência do Tribunal de Contas da União. Belo Horizonte: Fórum, 2004, p. 117. 29 Neste sentido, FREITAS, Juarez. O controle dos atos administrativos e os princípios fundamentais. 3ª ed. atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 73. 30 SUNDFELD, Carlos Ari. Direito administrativo para céticos. 2 ed. rev. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 147.

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Em razão da diversidade de demandas oriundas do rol de direitos fundamentais incluídos no texto constitucional e da complexidade das atividades exercidas pelo Estado, passou-se a impor à Administração uma postura ativa na busca por “um melhor exercício das missões de interesse coletivo que incumbe ao Estado, que deve obter a maior realização prática possível das finalidades do ordenamento jurídico, com os menores ônus possíveis”31, dever que expressa por meio da positivação do princípio da eficiência. A inclusão expressa no texto constitucional, por meio da Emenda 19/1998, do princípio da eficiência vem reforçar um compromisso com mais do que a mera economicidade, mas com a melhor atuação possível, atendendo-se ao maior espectro possível de interesses públicos com os menores encargos à sociedade. Esta interpretação resulta da compreensão de que não se pode aceitar que o ordenamento jurídico se compadeça com meras “figuras de estilo”32, de que não há, no Direito, palavras inúteis. Moreira Neto, ao tratar do tema do princípio da eficiência explica: “com o desenvolvimento dos conceitos de administração pública gerencial, que revelam grande influência do pragmatismo do direito público anglo-saxônico, passou-se a reconhecer não ser o bastante a prática de atos que, simplesmente, estejam aptos a produzir os resultados juridicamente dele esperados, o atendendo apenas ao conceito de eficácia. Exigiu-se mais: que esses atos fossem praticados com tais qualidades intrínsecas de excelência, de modo a possibilitarem o melhor atendimento possível das finalidades para ele previstas em lei”33. Assim, a eficiência no âmbito da Administração Pública está muito mais ligada a um dever geral de melhor realização do interesse público,

31

ARAGÃO, Alexandre Santos de. O princípio da eficiência. Revista Brasileira de Direito Público – RBDP Belo Horizonte, n. 4, ano 2 Janeiro/Março 2004. Disponível em: . Acesso em: 30 de abril de 2015. 32 GABARDO, Emerson. Princípio constitucional da eficiência administrativa. São Paulo: Dialética, 2002, p. 94. 33 MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo: parte introdutória, parte geral e parte especial. 16ª ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 115.

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buscando-se a plena satisfação dos administrados com os menores custos para a sociedade como um todo, uma obrigação para com os resultados. É esta mudança na percepção do âmbito de atuação estatal que propicia o surgimento daquilo que Sundfeld34 chama “direito administrativo dos negócios/DAN”, que tem foco na obtenção de resultados, gerenciando a escassez de tempo e de recursos, adotando práticas opostas às do DAC, justificadas por máximas como a continuidade do serviço público, interesse público e eficiência. Este é o modelo que se faz presente nas empresas estatais e nas prestações de serviços cuja falta ou deficiência possa resultar em crises ou perdas eleitorais. Finalmente,

a

eficiência

enquanto

princípio

administrativo

expresso tem por função orientar a atuação administrativa, servindo como critério jurídico para a análise das possíveis contradições entre distintos fins públicos e orientando as escolhas e a distribuição de recursos disponíveis, em função dos fins e objetivos públicos35. Ressalte-se aqui, no entanto, que a Administração Pública passou a ter, com o advento da Constituição Cidadã, duas grandes linhas de atuação, ambas voltadas à satisfação do interesse público, porém com características que afetarão direta e diferentemente o conceito de eficiência administrativa: a prestação de serviços pura e simples, e a garantia de valores constitucionais coletivos. No campo da prestação de serviços, a eficiência terá maior aproximação com o conceito economicista, buscando o ponto ótimo entre a atividade executada e o volume de recursos aplicados sem, é claro, abrir mão da qualidade, segurança e continuidade do serviço. Já no campo da tutela de valores constitucionais, esta lógica não se aplica, em razão da relevância intrínseca daquilo que se pretende atingir, que por vezes justificará maior dispêndio, para um resultado que não se perceberá tão claramente. A análise da eficiência passará sempre por uma avaliação relacional, sendo impossível afirmar de plano se determinada ação é eficiente, em abstrato. Para que se possa dizer que uma política pública ou contrato 34

SUNDFELD, Carlos Ari. Direito administrativo para céticos. 2 ed. rev. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2014, p. 147-148. 35 GABARDO, Emerson. Princípio constitucional da eficiência administrativa. São Paulo: Dialética, 2002, p. 97.

20

administrativo atende ao princípio constitucional em comento, será necessária a comparação entre os objetivos pretendidos e aqueles efetivamente alcançados. Assim, não se consegue traçar um conceito único de eficiência para toda e qualquer atuação administrativa ou para todos os contratos de que participe o Estado, já que conteúdo do princípio variará segundo o interesse público a ser atingido. Na lição de Onofre Alves Batista Júnior, “o grau de eficiência exigido varia, naturalmente, de acordo com a atividade pública analisada; da mesma forma, sofre alterações ao longo do tempo, em decorrência do contexto político, dos recursos tecnológicos disponíveis, das aspirações sociais, etc.36” 3. 3. ELEMENTOS DA EFICIÊNCIA ADMINISTRATIVA Apesar da dificuldade em delinear um conteúdo universal do princípio da eficiência administrativa, há elementos que auxiliam na sua verificação no caso concreto. A despeito de sua característica multiforme, o mandamento constitucional em análise impõe à Administração uma atuação, na persecução do interesse público, que atenda a diversos aspectos da ideia de atividade eficiente. São elementos essenciais da atuação estatal eficiente a eficácia, a universalidade dos resultados, a produtividade, a economicidade, a celeridade e a qualidade na prestação. A depender do tipo de atividade desenvolvida pela Administração, diversos outros aspectos entrarão na equação de eficiência, como por exemplo, no caso dos serviços públicos, se verificará a continuidade, segurança, regularidade, cortesia na prestação e modicidade tarifária. É em função desta característica multifacetada da atuação estatal que a cláusula de remuneração variável não é obrigatória para todas as concessões em que haja aporte de recursos estatais e também explica a adoção, tanto pela Lei 11.079/04 e pela Lei 12.462/11, de cláusula de textura aberta, permitindo que a Administração indique, casuisticamente, as metas a

36

BATISTA JÚNIOR, Onofre Alves. Princípio constitucional da eficiência administrativa. Belo Horizonte: Mandamentos, 2004, p. 213.

21

justificarem o aumento na contraprestação a ser percebida pelo parceiro privado. 3. 4. EFICIÊNCIA E DISCRICIONARIEDADE Administração Pública, como já se mencionou, é conceito que envolve atividades preponderantemente executórias e a gestão de recursos para a satisfação do interesse público. Ao administrador são disponibilizados variados instrumentos para a realização dos objetivos delineados. No campo da prestação de serviços, por exemplo, podem estes ser executados diretamente pelo próprio Estado, ou pode haver a transferência desta atividade, por meio de concessão, permissão ou autorização. Isto se põe em razão do volume e variedade de demandas apresentadas, cabendo ao gestor a definição de qual seja o mecanismo mais hábil a atingir o objetivo definido. A decisão discricionária sobre como lidar com determinada demanda, deve se consolidar por meio de racionalidade própria, suscetível de controle, sendo vedada a arbitrariedade. A opção legislativa por deixar ao administrador certa margem de escolha implica na possibilidade de eleição de uma dentre várias soluções vinculadas ao fim que se pretende atingir. Neste tema, ressalta Batista Júnior que “atribui determinado poder-dever ao administrador para que ele cumpra determinada função. É para cumprir determinada função, pois, que um poder-dever é atribuído. O poder, portanto, é atribuído com vista a um determinado fim, e não o contrário. Sua atribuição se dá de forma teleologicamente amarrada e instrumental”.37 Percebe-se, portanto, que para toda escolha discricionária há um rol de opções limitado, dentre as quais deve o administrador eleger aquela mais adequada à persecução do fim público objeto da política que se desenha. A discricionariedade não implica, no entanto, em liberdade absoluta. Há elementos que sempre vincularão ou orientarão a escolha, sob

37

BATISTA JÚNIOR, Onofre Alves. Princípio constitucional da eficiência administrativa. Belo Horizonte: Mandamentos, 2004, p. 292.

22

pena de invalidade da decisão. São absolutos os limites como a competência, os pressupostos fatuais, a forma e formalidades exigidas por lei. São, por outro lado, padrões condutores do poder discricionário os valores e princípios constitucionais. Nestes termos, a eficiência será parâmetro a ser considerado nas tomadas de decisão, em especial no que toca aos modelos contratuais adotados, bem como às cláusulas facultativas como a remuneração variável, de maneira a desenhar a solução mais adequada ao interesse público que se pretende satisfazer com aquela contratação.

4. REMUNERAÇÃO VARIÁVEL E PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA: DESAFIOS E PERSPECTIVAS

4. 1. RELAÇÃO ENTRE A CLÁUSULA DE REMUNERAÇÃO VARIÁVEL E O PRINCÍPIO DA EFICIÊNCIA ADMINISTRATIVA O princípio da eficiência administrativa, tida como a busca pela otimização dos resultados atingidos pela atuação estatal, a ser avaliada a partir de elementos como a eficácia, universalidade de resultados, produtividade, economicidade, celeridade e qualidade da prestação oferecida, foi incluído expressamente no rol de princípios orientadores da atividade administrativa, devendo a opção por um modelo contratual em desfavor de outro passar também por este crivo de legitimidade, conforme demonstrado no subtítulo anterior. A flexibilização da sistemática de remuneração não resulta em incerteza, quer para o concessionário, quer para a Administração Pública, uma vez que há clara designação das condições que resultarão em acréscimo na contraprestação, e que o núcleo essencial do contrato permanece sendo obrigatório. A variação corresponderá a ganho adicional relativo a um ou mais dos parâmetros pré-estabelecidos em lei e no contrato, que não estão vinculados ao conteúdo mínimo do serviço concedido. É justamente por permitir que a Administração indique objetivos secundários ao núcleo essencial do contrato que justificarão a alteração da

23

remuneração que o mecanismo atende ao princípio da eficiência – não no seu sentido mais evidente, de qualificação mínima do serviço, mas numa acepção mais ampla que compreende uma maximização das possibilidades de incremento de qualidade –, desde que a cláusula que o institua seja bem desenhada. Como se explicitou no item anterior, são elementos nucleares do conceito de eficiência administrativa a eficácia, a universalidade de resultados, a produtividade, a economicidade, a celeridade e a qualidade. Cada um destes aspectos do princípio pode ser abarcado no desenho de cláusulas de remuneração variável, encontrando no próprio mandamento constitucional seu signo de legitimidade. A cláusula de remuneração variável serve, inclusive, de instrumento de superação da assimetria de informações característica das relações entre a Administração Pública e o particular contratado. Ao administrador caberá definir os parâmetros mínimos da prestação

e os

objetivos que se pretende alcançar, porém permite-se que o concessionário, que tem domínio técnico dos elementos envolvidos na atividade, estabelecer os meios pelos quais estas metas serão atingidas. Por tratar-se de mecanismo bastante recente (sua primeira aparição foi na Lei 11.079, editada em 2004) e aplicável a contratos que se estendem por longos períodos (a duração das concessões especiais pode variar entre 5 e 35 anos38), ainda não se dispõe de evidencias empíricas que permitam determinar com clareza os efeitos de sua aplicação nas concessões de serviços públicos. O que se percebe é que se trata de mecanismo bastante interessante, e com potencial para influir positivamente na prestação de serviços, eis que serve de incentivo ao concessionário para buscar a melhor atuação – e com isto, garantir o incremento de remuneração. Isto dependerá, no entanto, do desenho contratual estabelecido em cada concessão, o qual

38

“Art. 5o As cláusulas dos contratos de parceria público-privada atenderão ao disposto no art. 23 da Lei no 8.987, de 13 de fevereiro de 1995, no que couber, devendo também prever: I – o prazo de vigência do contrato, compatível com a amortização dos investimentos realizados, não inferior a 5 (cinco), nem superior a 35 (trinta e cinco) anos, incluindo eventual prorrogação”. BRASIL. Lei 11.079 de 30 de dezembro de 2004. Diário Oficial da União - Seção 1 - 31/12/2004, pág. 6.

24

deverá indicar com clareza os objetivos secundários que por meio deste instituto a Administração pretende alcançar. 4. 2. REMUNERAÇÃO VARIÁVEL E CONCESSÕES COMUNS A remuneração variável é prevista expressamente para as hipóteses de concessões patrocinadas e administrativas (Lei 11.079/04) e aquelas celebradas sob o regime diferenciado de contratações (Lei 12.462/11), sem autorização legal específica para sua aplicação em se cuidando de concessões comuns, assim denominadas aquelas celebradas por meio do procedimento previsto na Lei 8.987/95. No entanto, a sua aplicação a esta modalidade contratual pode ser interessante, em especial no que diz respeito à qualidade da prestação – uma das maiores preocupações e reivindicações dos usuários. A

grande

dificuldade

em

se

aplicar

este

modelo

de

contraprestação vinculada ao desempenho às concessões comuns está no fato de que nestas, a remuneração do prestador de serviço é realizada por meio do pagamento de tarifas pelos usuários. É de se apontar, todavia que a extensão do instituto às concessões ordinárias não transmudaria necessariamente a sua natureza, eis que o evento determinante do pagamento pelo Poder Público seria contingente (atendimento das metas específicas), e não envolveria diretamente a prestação do serviço adequado como definido pelo art. 6 o da Lei 8987/95. Não se pretende aqui apresentar um modelo a ser adotado, mas apenas sinalizar uma aplicação alternativa do instituto, que pode trazer benefícios à Administração e aos usuários de serviços públicos, mas que depende de um estudo mais aprofundado para que se formate a sua utilização, em especial por não haver previsão legal específica39. 4. 3. REMUNERAÇÃO VARIÁVEL NEGATIVA

39

Neste tema, é interessante destacar que o Governo de São Paulo, por meio do Decreto nº 56.232, de 2 de julho de 2015, estabeleceu que parcela da remuneração dos concessionário de transporte coletivo será vinculada ao grau de satisfação do usuário, o que indica a relevância desta aplicação do instituto da remuneração variável.

25

Outra aplicação interessante ao instituto da remuneração variável é a possibilidade de fixação de parâmetros que resultem, não em aumento da contraprestação percebida pelo concessionário, como defende boa parte da doutrina já publicada no tema, mas em diminuição da mesma. O efeito envolveria não um ganho de retribuição, mas a prefixação dos efeitos financeiros associados ao inadimplemento de cláusulas contratuais específicas. Perceba-se que não há, em princípio, obrigatoriedade de que a variação na remuneração seja positiva, isto é, de incremento, em nenhuma das leis que a regulamentam. Assim é que, tanto o art. 6º da Lei 11.079/04 quanto o art. 4o. da Lei 12.462/11, dispondo sobre a referida cláusula, limitam-se a associar sua incidência ao desempenhos e metas definidos no contrato. Mesmo o Decreto Federal nº 7581/11, que regulamenta o Regime Diferenciado de Contratações, dispondo sobre essa mesma cláusula, repete a fórmula legal, aludindo a remuneração variável, vinculada ao desempenho do contratado, com base em metas, padrões de qualidade, parâmetros de sustentabilidade ambiental e prazo de entrega definidos pela administração pública no instrumento convocatório, observado o conteúdo do projeto básico, do projeto executivo ou do termo de referência. Não

havendo,

portanto,

qualquer

vedação

legal

ao

estabelecimento de cláusula de remuneração variável negativa – que importe em decréscimo na contraprestação devida ao concessionário –; resta estudar as vantagens que tal aplicação possa trazer. Um benefício que se vislumbra é o ganho em eficiência, se é que se pode dizer assim, na repressão ao concessionário que descumpra ou desrespeite o núcleo essencial do serviço concedido. Isto porque, nos modelos de concessão existentes, na hipótese de inadimplência caberá, genericamente, a imposição de advertência, multa, suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração ou declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública, na forma do art. 87 da Lei 8666/93. Disto

decorre

que,

em

havendo

inadimplência

pelo

concessionário, a Administração Pública primeiro realizará o pagamento integral da contraprestação devida, e aplicará uma das sanções indicadas – as

26

quais ainda serão amplamente recorríveis, tanto no âmbito interno quanto perante o Poder Judiciário. Com

a

previsão

de

remuneração

variável

negativa,

a

Administração poderá, praticada a infração contratualmente prevista, descontar do valor integral da contraprestação, o percentual equivalente ao desempenho deficiente. Trata-se de evento contratual quanto ao qual, em regra, não caberá qualquer recurso, eis que as partes, ao celebrar o contrato de concessão, aceitam as condições estabelecidas. Esta formulação do instituto, para fins de repressão ao inadimplemento pelo concessionário atenderá às mesmas limitações e diretrizes previstas para a aplicação tradicional da remuneração variável, porém sua motivação estará vinculada à essencialidade do aspecto a justificar o decréscimo remuneratório. Isto é, enquanto a remuneração variável em sua aplicação já amplamente difundida se refere a ganhos de qualidade – expressão aplicada aqui em sentido amplo – e não pode atingir no núcleo essencial das atividades concedidas, na remuneração variável negativa invertese a lógica: os parâmetros a justificar a diminuição da contraprestação do concessionário deverão, obrigatoriamente, estar vinculados a aspectos essenciais do serviço, não sendo possível a penalização do parceiro particular por descumprimento de elemento não-essencial. 5. CONCLUSÃO São muitos os aspectos ainda a ser enfrentados no estudo da remuneração variável. A análise de sua efetiva contribuição no que diz respeito à eficiência administrativa permanece mais no âmbito da teoria, por duas razões centrais: a primeira se refere à novidade do mecanismo, cuja previsão legal tem pouco mais de dez anos, e os contratos em que seu uso é autorizado são de longa duração; some-se a isso, o fato de que se trata de cláusula contratual facultativa, aplicável apenas às concessões especiais e ajustes celebrados sob o regime diferenciado de contratação – o que resulta em um campo ainda menor de pesquisa. A remuneração variável será instrumento da eficiência na medida em que possibilitar a busca por objetivos de interesse público outros que não 27

aqueles essencialmente vinculados ao objeto dos contratos de concessão, porém só resulta em onerosidade para a Administração na medida exata em que o concessionário alcançar as metas definidas pelo próprio poder concedente. Além disso, por meio de sua aplicação, é possível estabelecer prêmios pelo cumprimento de obrigações em prazo mais célere ou por atender a especificações de qualidade que exorbitem o núcleo essencial do serviço concedido e a superação da assimetria informacional quanto às variadas possibilidades na execução da atividade concedida. No entanto, os benefícios trazidos por sua aplicação aos contratos de concessão, em especial naqueles já em vigor, ainda serão verificados, vez que não houve transcurso de tempo suficiente para a plena realização dos resultados intentados.

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