Repensando a sociedade contemporânea: Semiótica e alfabetização Visual no ensino de artes

June 15, 2017 | Autor: Priscila Brasil | Categoria: Semiótica, Cultura Visual, Ensino De Artes, Alfabetização
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REPENSANDO A SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA: SEMIÓTICA E ALFABETIZAÇÃO VISUAL NO ENSINO DE ARTES

PRISCILA BATISTA BRASIL1 PATRÍCIA CRISTINA SORIA2

RESUMO: Este artigo tem por objetivo repensar a sociedade contemporânea a partir da semiótica peirceana e da alfabetização visual no ensino de artes. Sabendo que hoje vivemos numa época em que somos diariamente bombardeados por imagens, seja pela TV, no celular ou na rua, e que essas imagens são signos que dão forma ao nosso modo de pensar e agir, muitas vezes não temos as ferramentas necessárias para compreender e fazer uma leitura crítica dessas imagens. Partindo desses pressupostos, encontramos o seguinte problema: A alfabetização visual no ensino de artes pode capacitar o aluno para que ele saiba ver, ler e interpretar o mundo em que vive, criando assim um adulto mais crítico? Para responder ao problema proposto, realizou-se uma pesquisa bibliográfica utilizando autores como Lúcia Santaella e Ana Mae Barbosa, entre outros, definindo conceitos sobre o que é semiótica, o que é cultura visual e a respeito da importância da leitura de imagem no ensino de artes. Como resultado, nesse processo de pesquisa, descobriu-se como uma opção metodológica para o problema, a abordagem triangular de Ana Mae Barbosa, que associada a teoria semiótica, pode contribuir para que ocorra uma alfabetização visual na sala de aula que englobe a leitura de imagem e a cultura visual, capazes de capacitar os alunos para a compreensão do mundo contemporâneo.

Palavras-chave: Ensino de Artes. Semiótica. Cultura Visual. Abordagem Triangular. Alfabetização Visual.

ABSTRACT: This article aims rethink contemporaneous society from the peircean semiotic and visual literacy in the arts teaching.Knowing that nowadays we live in a time that we are daily bombed by images from TV, mobile phone or even in the streets and these images are signs which give shape to our way of thinking and act, many times we don´t have the required tools to understand and make a critical reading of these images. Based on these assumptions , we find the following problem: The visual literacy in the arts teaching can enable the student to see, read and understand the Aluna do curso de Licenciatura em Artes Visuais - Unicesumar – Maringá-PR (2015). Graduada em Comunicação Social com habitação em Publicidade e Propaganda pela Universidade do Oeste Paulista - Unoeste de Presidente Prudente-SP (2014). E-mail: [email protected] 2 Professora do curso de Artes Visuais na Unicesumar. Especialista em Educação e Política Brasileira pela Universidade Estadual de Maringá-UEM. Especialista em Docência no Ensino Superior pela Unicesumar de Maringá-PR. Graduada em Educação Artística com Habilitação em Artes Plásticas pelo Centro Universitário de Belas Artes de São Paulo. E-mail: [email protected] 1

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world he lives, making thereby an adult more critical? To answer the proposed problem, it was carried out a bibliographic research of authors as Lúcia Santaella and Ana Mae Barbosa, among others, defining concepts about what semiotic is, what visual culture is and about the importance of the image reading in the arts teaching. As a result, in this research process discovered as a methodological option to the problem, the triangular approach of Ana Mae Barbosa, which associated with semiotic theory, can contribute to happening the visual literacy in the classroom that includes the image reading and the visual culture in order to enable the students to understand the contemporaneous world.

Keywords: Arts Teaching. Semiotic. Visual Culture. Triangular Approach. Visual Literacy.

1 INTRODUÇÃO

A sociedade contemporânea tem produzido um volume imagético sem precedentes na história. As novas tecnologias, fruto dessa sociedade, têm auxiliado e facilitado essa produção e reprodução. Dessa forma, essas imagens estão em tudo e em todo lugar a todo momento. Seja no celular, na tv, na internet, nos jornais, revistas, na moda, na publicidade, e representam nosso meio ambiente visual diário. São imagens que dão forma a nosso modo de imaginar, conceber, produzir; sugerindo como devemos ser, pensar ou nos comportar. Todas essas imagens fazem parte de uma cultura chamada de cultura visual, que nada mais é do que, toda produção cultural de uma sociedade que pode ser comunicada visualmente. Estamos emersos nessa orgia visual e na maioria das vezes, mesmo tendo uma profunda necessidade de significado, não somos capazes de interpretá-los para dar sentido e compreender o mundo em que vivemos. As imagens são signos, que compõem elementos significantes e estruturantes em toda comunicação visual. Na semiótica, um signo é qualquer coisa que substitui ou representa algo para alguém, sob qualquer relação ou qualquer título. Interpretar os signos é extremamente importante para o ser humano; e compreender a forma como as pessoas interpretam esses signos é fundamental para se estudar a cultura visual formada a partir dos mesmos. É neste contexto que as discussões sobre a necessidade de uma alfabetização visual no ensino da arte se situam. Partindo desses

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pressupostos busco responder o seguinte problema: A alfabetização visual no ensino de artes pode capacitar o aluno para que ele saiba ver, ler e interpretar o mundo em que vive, criando assim adultos mais críticos? Este artigo não se propõe a resolver o problema da alfabetização visual, mas desenvolve um processo de pesquisa para ajudar na compreensão do tema. Primeiramente apresenta-se uma breve introdução dos conceitos da semiótica, utilizando como base apenas a teoria semiótica do pensador norte-americano Charles Sanders Peirce muito estudada no Brasil pela autora Lucia Santaella. Num segundo momento, define-se o que é cultura visual e suas relações com a arte e a sociedade contemporânea. Por fim, identifica-se a importância da imagem e da alfabetização visual e suas proximidades com o ensino de artes, apresentando algumas metodologias de leitura de imagem. Como resultado, seleciona-se a Abordagem Triangular da professora Ana Mae Barbosa, como uma metodologia no ensino de artes capaz de auxiliar na alfabetização visual, e que pode ser relacionada à semiótica para a formação desse aluno que saiba ver, ler e compreender a sociedade contemporânea.

2 SEMIÓTICA UMA BREVE INTRODUÇÃO

A Semiótica provém da raiz grega ‘semeion’, que significa signo. Segundo Noth (1995, p.16) “a Semiótica é a ciência dos signos e dos processos significativos (semiose) na natureza e na cultura”. Quando falamos em signo, não tem nada a ver com os signos do zodíaco, mas sim, os signos relacionados a linguagem. A Semiótica é a ciência que tem por objeto de investigação todas as linguagens possíveis, ou seja, que tem por objetivo o exame dos modos de constituição de todo e qualquer fenômeno como fenômeno de produção de significação e de sentido. (SANTAELLA, 2012, p. 19)

Apesar da Semiótica ser uma ciência extremamente nova, a preocupação com o estudo das linguagens e signos é muito antiga e está presente desde as origens do pensamento filosófico, onde Platão e Aristóteles já se preocupavam em definir o signo em seus discursos sobre a linguagem.

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A doutrina do signo, que pode ser considerada como semiótica avant la lettre, compreende todas as investigações sobre a natureza dos signos, da significação e da comunicação na história das ciências. E a origem dessas investigações coincide com a origem da filosofia: Platão e Aristóteles eram teóricos do signo e, portanto, semioticistas avant la lettre. (NOTH, 1995, p. 18).

Após isso, a Semiótica tem caminhado por entre as diversas áreas, mas somente no início do século XX, passou a ser reconhecida como ciência e utilizada como método em função desse interesse pelo papel da linguagem verbal e não verbal. Santaella (2012, p.13), afirma que o Século XX “viu nascer e está testemunhando o crescimento de duas ciências da linguagem. Uma delas é a Linguística, ciência da linguagem verbal. A outra é a Semiótica, ciência de toda e qualquer linguagem. ” Vale ressaltar que existem várias correntes da Semiótica moderna, porém utilizaremos como base apenas a teoria semiótica do pensador norte-americano Charles Sanders Peirce, um dos grandes lógicos-matemáticos da segunda metade do século XIX.

2.1 SEMIÓTICA PEIRCEANA

Charles Sanders Peirce nasceu em 1839, em Cambridge, no estado norteamericano de Massachusetts, e concebeu a Semiótica por volta de 1875, aperfeiçoando sua teoria até seus últimos dias de vida, morrendo aos 74 anos de idade, em 1914. Segundo Lucia Santaella (2002), Peirce se dedicou ao desenvolvimento de uma lógica entendida como teoria geral, formal e abstrata dos métodos de investigação utilizadas nas mais diversas ciências. Essa teoria dos signos é capaz de explicar e interpretar todo o domínio da cognição humana. De acordo com Losada (2010), Peirce se intitulava como pragmatista devido à base fenomenológica de suas teorias, delimitando seu conceito de signo de forma bem distinta da formulada pela linguística. “Para ele, o pensamento é uma semiose, ou seja, a projeção contínua de um signo em outro signo” (LOSADA, 2010, p. 230). Ele desenvolveu a teoria semiótica para discutir como ocorre o conhecimento, não como privilégio da filosofia ou da ciência, mas processos cognitivos de modo geral. Peirce (2015, p.63), define que: “um Signo, ou Representamen, é um Primeiro que se coloca numa relação triádica genuína tal com um Segundo, denominado seu Objeto, que é capaz

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de determinar um Terceiro, denominado seu Interpretante, que assuma a mesma relação triádica com o Objeto na qual ele próprio está em relação com o mesmo Objeto. A relação triádica é genuína, isto é, seus três membros estão por ela ligados de um modo tal que não consiste em nenhum complexo de relações diádicas.”

Entendemos então que Signo é tudo aquilo que representa, ou substitua algo para alguém em dadas circunstâncias, ou seja, segundo Santaela (2002), o signo vai criando na mente das pessoas, um signo equivalente ou mais desenvolvido e assim sucessivamente. Quando falamos em algo, chamamos esse algo de objeto do signo, então o signo está representando esse objeto para alguém, e esse alguém é o interpretante do primeiro signo. Em virtude de o signo estar ligado assim ao fundamento, o objeto e o interpretante, Peirce (2015), declara que a ciência da semiótica tem três ramos: Gramática especulativa, que é o estudo de todos os tipos de signos e formas de pensamento que eles possibilitam; a Lógica crítica, que estuda os diferentes tipos de inferências, raciocínios e argumentos que se estruturam através do signo; e a Retórica especulativa que tem por função analisar os métodos a que cada um dos tipos de raciocínio da origem. A gramática especulativa está na base das outras duas, e trabalha com os conceitos abstratos que determinam as condições gerais que fazem com que certos processos possam ser considerados signos. Por isso, ela é uma ciência geral dos signos. Ao longo de quarenta anos de trabalho, Peirce dedicou-se em fornecer uma linguagem comum a todas as ciências que possibilitasse aos estudiosos entender as relações de seus diversos objetos de estudos e toda sua arquitetura filosófica alicerçada na Fenomenologia. Os estudos de Peirce o levaram a conclusão de que existem elementos formais e universais em todos os fenômenos que se apresentam à percepção e à mente. “Entendemos por fenômeno, palavra derivada do grego Phaneron, tudo aquilo, qualquer coisa, que aparece à percepção e à mente. A fenomenologia tem por função apresentar as categorias formais e universais dos modos como os fenômenos são apreendidos pela mente”. (SANTAELLA, 2002, p. 7) Para Noth (1995), encontrar um número limitado de categorias que servisse de modelo capaz de conter a multiplicidade dos fenômenos do mundo, foi um projeto ambicioso de vários filósofos desde Aristóteles, que conseguiu classificar dez categorias e Kant que elaborou doze. Por outro lado, Pierce desenvolveu uma fenomenologia de apenas três categorias universais que chamou de primeiridade,

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secundidade e terceiridade. Vejamos um exemplo simples de como ocorre esse processo semiótico: Imagine que você vem por uma estrada e bem adiante algo chama sua atenção. Um borrão vermelho que se movimenta. Algo cuja qualidade inicial é ser vermelho e isso é tudo o que você capta dele em um primeiro momento. Ao se aproximar começa a visualizar que o vermelho se agita como um pano. Essa é a segunda característica que você consegue identificar: a relação do vermelho com um pano em movimento. Por fim, mais próximo do objeto, você desvenda sua dúvida: alguém agita uma bandeira vermelha na beira da estrada compreendida imediatamente como sendo aviso de que há perigo mais adiante. (NICOLAU, M. et al. 2010)

A Semiótica de Peirce está relacionada ao modo como vemos o mundo a nossa volta a partir dos signos que compõem o pensamento e se organizam em linguagem. Primeiro os objetos nos aparecem como qualidades potenciais, é aquela primeira impressão. A primeiridade é a categoria do sentimento, “é a consciência imediata, correspondente ao acaso, a variação espontânea, é o sentir puro. Trata-se das possibilidades e qualidades” (DIAS, 2013, p. 883). Na definição de Peirce (2015), “primeiridade é o modo de ser daquilo que é tal como é, positivamente e sem referência a outra coisa qualquer”. No nosso exemplo é a fase em que você vê apenas um borrão vermelho. Quando, depois daquela primeira impressão procura-se uma relação de identificação, passamos para a secundidade. A secundidade é a interação diática entre o eu e o outro, “é a consciência reagindo em relação a uma realidade cotidiana [...]. É a percepção da realidade em que interagimos”. (DIAS, 2013, p. 883). É a categoria da comparação, que segundo Noth (1995) começa quando relacionamos o primeiro fenômeno com o segundo, que acontece quando relacionamos nosso borrão vermelho com uma bandeira. Por fim, quando nossa mente começa a interpretar o que se trata, chegamos a terceiridade. Esta é a categoria da mediação, da cognição. “É a camada da inteligibilidade por meio da qual interpretamos o mundo, aproximação ou junção das duas primeiras categorias em uma síntese intelectual. Trata-se do pensamento em signos, do crescimento contínuo, da mediação ou processo” (DIAS, 2013, p. 883). Então desvendando nosso exemplo, na terceiridade compreende-se que a bandeira vermelha é um aviso convencionado de que há perigo na estrada.

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O pensamento é um processo de contínua projeção de um signo em outro signo, num movimento infinito da construção do saber, e hoje os signos estão em tudo e em todos lugares. Basta um retrocesso para nos darmos conta de que, desde o advento da fotografia, então do cinema, desde a explosão da imprensa e das imagens, seguida pelo advento da revolução eletrônica que trouxe consigo o rádio e a televisão, então, com todas formas de gravação sonoras, também o surgimento da holografia e hoje com a revolução digital que trouxe consigo o hipertexto e a hipermídia, o mundo vem sendo crescentemente povoado de novos signos. (SANTAELLA, 2002, p. XIV)

Segundo Santaella (2002), a teoria de Peirce vai muito além de uma mera teoria dos signos, ela é também uma metodologia, constituindo-se numa enorme fundação para qualquer tipo de pesquisa de qualquer espécie fornecendo as categorias para análise da cognição já realizada. Dessa forma, a crescente evolução dos signos e sua constante proliferação desenfreada, cria cada vez mais, a necessidade de uma leitura e diálogo com eles em um nível mais profundo. A Semiótica entra então como uma ciência, uma metodologia, capaz de auxiliar a compreensão e a interpretação do tempo e da sociedade em que vivemos.

3 CULTURA VISUAL NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA

O homem surge na história como um ser cultural que age socialmente apoiado dentro de uma cultura. Ostrower (1987, p.13) entende por cultura todas “as formas materiais e espirituais com que os indivíduos de um grupo convivem, nas quais atuam e se comunicam e cuja experiência coletiva pode ser transmitida através de vias simbólicas para a geração seguinte.” Para Santaella e Noth (1998), desde as pinturas pré-históricas, as imagens têm sido meios de expressão da cultura humana, mesmo antes do aparecimento do registro da palavra pela escrita. Hoje, na sociedade contemporânea, é certo afirmar que nossa era é visual e “não surpreende que já tenha sido dito que estamos entrando num período histórico no qual a imagem desbancará a palavra escrita” (GOMBRICH, 2012, p.41). Tudo é baseado no que vemos, na imagem, nas aparências, na estética, e a partir delas formamos conceitos e tiramos conclusões.

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Estamos, assim, numa época que parece que se desloca ao discurso moral baseado na beleza, na ordem, no equilíbrio e na transcendência da cultura da imagem e da expressão artística. Estamos diante de uma bifurcação em que se torna necessário, mais do que em épocas anteriores, a reflexão baseada no estudo, no debate público e rigoroso que contribua para caracterizar uma nova cultura provida de uma ética que possibilite interpretar e adir de maneira não acomodada diante de uma forma de pensamento que se apresente ao mesmo tempo como maneira frenética e sem possibilidades de trégua. (HERNANDEZ, 2000, p. 29).

As imagens estão em todo lugar, na TV, na rua, na moda, na publicidade, na internet, em fotos de jornais e em revistas, nos fazendo as vezes até ter a impressão de que elas nos invadiram. Com certeza não é somente impressão, mas as imagens bombardeiam nosso meio ambiente visual desde o levantar até o dormir. São “imagens para deleitar, entreter, vender, sugerindo o que devemos vestir, comer, aparentar, pensar” (SARDELICH, 2006, p. 451), moldando e transformando quem somos culturalmente e socialmente. Foi no final dos anos 1970, que se viu um crescente interesse pelo que veio chamar-se cultura visual. Mathew Rampley (apud Vilas-Boas, 2010, p. 30) define cultura visual como “o conjunto de ideias, crenças e usos de uma sociedade e as formas como lhes é dada expressão visual”. Ou seja, toda produção cultural de uma sociedade que pode ser comunicada visualmente, como por exemplo pinturas, fotografias, moda, design, propagandas, sites, televisão, dispositivos multimídias entre outras, constitui o foco da cultura visual, e seu objetivo e tentar compreender essa condição cultural, suas manifestações materiais e simbólicas e o efeito que ela exerce, sobre as identidades individuais e coletivas. Entendemos então, que o tema de estudo da cultura visual é a contextualização da visualidade na vida cotidiana, e seu objeto de investigação ou metodologia são delimitados por questões que surgem da vida diária. A produção de imagens faz parte da nossa cultura, de quem somos, e está inserida em nós. O problema é que nem sempre somos capazes de consumir essa cultura imagética de forma consciente e crítica, mas apenas absorvemos de forma pacífica e sem contestação. Mirzoeff (2003), confirma essa ideia dizendo que, apesar da imagem ser característica do mundo contemporâneo, isso não significa que se conheça ou entenda aquilo que se observa. A distância entre a riqueza da experiência visual na cultura contemporânea e a habilidade para analisar esta observação cria a oportunidade e a necessidade de converter a cultura visual em um campo de estudo. É preciso então, ferramentas

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específicas para que se possa auxiliar a compreensão, e nesse momento temos os estudos da cultura visual como estratégia. Os estudos culturais, [...] têm oferecido muitas formas de pensar sobre o estudo, quer da cultura popular quer do aparentemente uso mundano das imagens nas nossas vidas diárias. Um dos objetivos dos estudos culturais é fornecer aos observadores, cidadãos e consumidores, as ferramentas para obterem um melhor entendimento de como os meios visuais nos ajudam a compreender nossa sociedade. (STURKEN & CARTWRIGHT, apud VILASBOAS, 2010, p. 25)

A importância dos estudos da Cultura Visual na leitura e entendimento das imagens que a sociedade contemporânea nos confronta, fez com que a cultura visual, de acordo com Vilas-Boas (2010, p.32), começasse a “assumir a sua vertente mais social e ‘popular’, secundarizando a importância conferida as artes visuais e alargando o espectro das suas preocupações à história social da arte”. As imagens agora desempenham funções sociais, distanciando-se das obras de arte e dos museus para focalizar sua atenção na experiência cotidiana da sociedade. Prestar atenção à compreensão da cultura visual implica aproximar-se de todas as imagens [...] e estudar a capacidade de todas as culturas para produzi-las no passado e no presente com a finalidade de conhecer seus significados e como afetam nossas “visões” sobre nós mesmos e sobre o universo visual em que estamos imersos. (HERNANDEZ, 2010, p. 51)

É por isso que essa nova realidade social, tornam obrigatórias mudanças na arte-educação. Rampley (2005 apud Duncum 2011, p.15), declara que “a arte há muito tempo deixou de ser a mais importante expressão visual de identidade cultural”. Hoje a internet tem disseminado milhares de outros meios para a expressão visual. Dessa forma, o educador tem que estar atendo aos objetos da Cultura Visual da sociedade, e a arte deve ser estuda junta com cultura visual. Durante muito tempo a arte lutou pela sua valorização e inclusão na educação. Somente em 20 de dezembro de 1996, foi sancionada a lei n. 9.394/96, que considera obrigatória a arte na educação básica. O art. 26, 2º§ confirma dizendo que “O ensino da arte constituirá componente curricular obrigatório, nos diversos níveis da educação básica, de forma a promover o desenvolvimento cultural dos alunos” (BRASIL, 1996). É com este cenário que se chegou ao final da década de 90, mobilizando novas tendências curriculares em Arte, pensando no terceiro milênio. São características desse novo marco curricular as reinvindicações de identificar a área por Arte (e não mais por Educação Artística) e de incluí-la na estrutura curricular como área, com conteúdos próprios ligados à cultura artística e não apenas como atividade. (BRASIL, 2010, p.30).

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Agora, o ensino de arte se vê diante de uma nova luta que é acompanhar as transformações da sociedade contemporânea. Muitos arte-educadores, fora do Brasil, tem defendido que o conteúdo da arte-educação deveria pautar-se pela cultura visual. Esse grupo abrange profissionais como Duncum, Hernandez, Freedman, Walker, Chaplin, entre outros, que fundamentalizaram suas fontes na teoria crítica, que reúne diversos campos de estudos. No Brasil, temos a arte-educadora Ana Mae Barbosa, sendo protagonista de discussões constante da qualidade das imagens e do papel ativo dos sujeitos na leitura destas, entendendo que uma das funções da arte/Educação é fazer a mediação entre a arte e o público. Ana Mae foi pioneira na produção teórica sobre Arte/Educação no Brasil. Foerste (2010, p.102), diz que Barbosa “sobretudo, mantém a ênfase na construção de propostas de ensino que levem à escola obras de arte e imagens de outras visualidades e de metodologias capazes de tratar a arte ‘como conhecimento e não somente como um grito da alma’.” A professora Ana Mae Barbosa e seus colaborados, na década de 1980, a partir das atividades educativas desenvolvidas no Museu da Arte Contemporânea, da Universidade de São Paulo, sistematizou um posicionamento teórico-metodológico, conhecido

como

Abordagem Triangular, defendendo

a

aprendizagem dos

conhecimentos artísticos a partir da inter-relação entre o ler, contextualizar e fazer arte. Ao longo dos anos, a abordagem triangular foi se modificando, e deixando o contexto do museu (MAC-USP) para o contexto da sala de aula. Hoje a abordagem triangular também busca as diferenças e similaridades da recepção da Arte e da Cultura Visual, e dentro da Cultura Visual se interessa em desenvolver o pensamento crítico sobre publicidade, Design, Moda, entre outros. Para Lampert (2010), a abordagem triangular de Ana Mae Barbosa é plenamente compatível com a cultura visual contemporânea tanto em relação à produção artística, ou às questões que se vinculam a reflexões Críticas, quanto ao olhar sobre o contexto de forma não linear. Ana Mae já utilizava Cultura Visual na Arte/Educação antes de a Cultura Visual ter nome próprio, e defende sua utilização. Defendo a Cultura Visual e a Arte na escola, ambas contextualizadas socialmente, historicamente e vivencialmente. O pós-modernismo trouxe para as análises da Artes as mesmas propostas de análise crítica usadas para as imagens de outros meios e categorias. (BARBOSA, 2010, p. 21)

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Arte e Cultura Visual devem conviver nos currículos e salas de aula. Preparando os alunos para o entendimento das artes visuais, se prepararia os alunos para a compreensão da gramática visual de qualquer imagem, artística ou não, na sala de artes, ou no cotidiano. Para Barbosa (1995), torná-los conscientes da produção humana de alta qualidade é uma forma de prepara-los para compreender e avaliar todo tipo de imagem, conscientizando-os do que estão aprendendo com essas imagens.

4 IMAGEM E ALFABETIZAÇÃO VISUAL NO ENSINO DA ARTE

As imagens sempre desempenham papel fundamental de luta pelo significado, seja legitimando ou contestando noções existentes e estruturas de poder que apoiam. Para Duncum (2011), ao apelarem para os sentidos e as emoções, as imagens exercem profunda influência; ao mesmo tempo, os espectadores detêm o poder de resistir a significados dominantes, e também criar seus próprios significados. Isso se souber fazer a leitura correta dessas mesmas imagens. Quando falamos em ler uma imagem, a frase parece um pouco fora de ordem, já que a leitura normalmente nos pressupõe uma interpretação de palavras e texto. Para Vilas-Boas (2010, p.75), mesmo a leitura pressupondo uma sequência de signos alfabéticos para obtenção de significado, as imagens “solicitam um processo mental temporal semelhante à leitura de um texto, e mesmo uma imagem fixa constrói seu significado só depois de um trajeto do olhar pela mesma, numa sucessão de esgares que acumulam a descodificação dos diferentes signos visuais que a compõem. ” Num universo tão visual como o nosso atualmente, a leitura visual começará a ser uma questão de sobrevivência. Alguns autores como Walker & Chaplin (2002) chegam a afirmar que a nossa sociedade sobreviveria sem a linguagem verbal, mas não sem a linguagem visual. A comunicação visual está se tornando cada vez mais importante nos domínios da comunicação pública e não ser visualmente letrado começará a causar problemas no nosso próprio desenvolvimento social. Alexandre Melo (apud Vilas-Boas, p.63) considera que estamos:

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Emersos numa permanente orgia visual, ao ponto que já não nos percebemos sequer da natureza da matéria que nos rodeia e envolve. A esse respeito sejamos claros: são imagens. Imagens que são concebidas, produzidas e postas em circulação e que, na dinâmica da sua circulação, dão forma aos nossos modos de imaginar, conceber, produzir, circular e ser.

Sem as ferramentas necessárias para a compreensão, esse volume de mensagens imagéticas serve para suprimir a visão crítica, formando um senso comum médio colocado a serviço da máquina de consumo da sociedade capitalista. A tendência contemporânea coloca então a necessidade da leitura de imagens na sala de aula. Kress & Van Leeuwen (apud Vilas-Boas, 2010, p. 75) diz que “inevitavelmente, isto conduzirá a novas e mais regras e a um ensino normativo mais formal”, por isso o ensino da linguagem visual é tão importante nas escolas, mas não que ele substitua a linguagem verbal, não é na realidade uma questão de privilegiar um ou outro, mas estuda-las em conjunto. Hernández (2010), afirma que o professor tem de despertar o olhar curioso, para o aluno desvendar, interrogar e produzir alternativas frente às representações do universo visual que o cerca. Gentile (2013), é mais clara, dizendo que na escola, isso significa que o ensino de Arte deve ganhar uma perspectiva mais profunda, onde o aluno, além de conhecedor de artistas e estilos, precisa ser leitor, intérprete e crítico de todas as imagens presente em seu cotidiano. 4.1 METÓDOS DE LEITURA DE IMAGEM NO ENSINO DE ARTE

A expressão leitura de imagens começou a ser discutida no campo educacional no final dos anos 1970, devido à disseminação de aparelhos audiovisuais e fundamentada nas teorias sobre a percepção e psicologia da forma – Gestalt – e da semiótica (SARDELICH, 2006). Alguns autores criaram interessantes métodos de leitura de imagem como forma de aproximar as artes visuais de crianças e jovens. Entre eles então, para fins de embasamento teórico, foram escolhidos os métodos de Feldman, Parsons e Ana Mae Barbosa. Nos anos 1970, Edmund Burke Feldman, apontou em sua obra Becoming Human Through Art: Aesthetic Experience In The School quatro processos a serem seguidos para a leitura da imagem que são distinguíveis, mas interligados entre si. São eles: “prestar atenção ao que se vê, descrição; observar o comportamento do que

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se vê, análise; dar significado à obra de arte, interpretação; decidir acerca do valor de um objeto de arte, julgamento.” (BARBOSA, 2010, p.46) O método de Feldman pode ser classificado como comparativo, pois ele sempre sugere que as leituras sejam entre duas ou mais obras, a fim de que os alunos evidenciem as semelhanças e diferenças, tirando suas próprias conclusões da leitura comparada. Para isso, segundo Kehrwald (2000), Feldman sugere que a leitura de imagem fosse realizada em quatro estágios: A descrição, a análise, a interpretação e o julgamento. No primeiro estágio, temos a descrição que Kehrwald (2000, p.2), “se refere a prestar atenção ao que se vê e, a partir da observação, listar apenas o que está evidente” ou seja, prestar atenção nos elementos das obras, identificando, por exemplo, o artista, o material utilizado, entre outros. No segundo estágio, entra a análise, observando os elementos entre si e como eles se relacionam. Depois, chega o estágio da interpretação e que segundo Kehrwald (2000), é quando se busca estabelecer relações entre a imagem e a realidade no sentido de apropriar-se de tudo que foi realizado anteriormente. Para finalizar, o estágio do julgamento: No quarto estágio, o do julgamento, emitimos um juízo de valor a respeito da qualidade de uma imagem, decidindo se ela merece ou não atenção. Nesta etapa as opiniões são muito divergentes, pois algumas obras têm um significado especial para algumas pessoas e nenhum valor para outras. Mas é senso comum que um bom trabalho é o que tem o poder de encantar muitas pessoas por um longo tempo. (KEHRWALD, 2000, p.2)

Logo após o surgimento do método de Feldman, nos anos de 1980, surge Michael Parsons, com sua obra Compreender a Arte, propondo um outro método que se baseava na compreensão das imagens pela pessoa em diferentes cinco estágios. Segundo Rizzi (2007), ele foi um dos autores que mais contribuíram para o conhecimento de como as pessoas se relacionam com as obras de arte. No primeiro estágio, seria a preferência pessoal, ou seja, de acordo com Rizzi, (2007, p.67) “gosto intuitivo pela maioria das obras, reação ao tema do quadro por associações livres; aceitação de tudo sem distinção. Não há ainda a consciência do ponto de vista dos outros”. Depois no segundo estágio, aconteceria a relação entre o sujeito com a obra, observando aquilo que ele acha bonito, com um tema bonito, “o observador já tem a capacidade de distinguir aspectos relevantes dos irrelevantes em termos estético’’ (RIZZI, 2007, p.67). No terceiro estágio, a expressão do artista é

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observada, buscando compreender as intenções do artistica, e o que ela pode procporiconar. Assim, chega-se aos dois últimos estágios, onde encontramos: -Quarto estágio – a nova perspectiva aqui é consideração da significação da obra como sendo mais social que individual, integrada a uma tradição e resultado do trabalho de um conjunto de pessoas ao longo do tempo. Manifesta-se a capacidade de relacionar diferentes obras e estilos, e há uma história da sua interpretação. Tudo o que a Arte exprime é reinterpretado em termos de forma e estilho e o juízo estético é considerado como reacional e passível de objetividade. Palavras síntese: estilo e forma. -Quinto estágio – um estilo deixa de ser uma categoria preestabelecida e torna-se um conjunto criado com uma determindo objetivo: a Arte é prezada como forma de levantar questões e não por transmitir verdade. E isso exige a transcedência da específica dimensão cultural. A essência desse estágio é a busca de fundamentos para a interpretações e os juízos que devem estar acessíveis a toda gente. É quando é distinguido mais claramente o jupizo da interpretação. A interpretação é a reconstrução do sentido: o Juízo é avaliação que se faz do valor do sentido. Palavra síntese: autonomia. (RIZZI, 2007, p. 68)

Ao olharmos para essas duas metodologias, vemos que elas se referem aos aspectos estruturais do desenvolvimento estético, da composição e linguagem visual da obra. A Proposta Triangular para o ensino da arte, complementa esse desenvolvimento ao incluir a contextualização, além de ter sido a responsável pela incorporação do termo “leitura de imagem” ao vocabulário dos professores de Artes (KEHRWALD, 2006). A abordagem triangular sistematizada por Ana Mae Barbosa, propõe que a composição do programa do ensino de Arte seja elaborada a partir das três ações básicas que executamos quando nos relacionamos com a Arte: Ler obras de arte, contextualizar e fazer arte. A leitura de obra de Arte envolve o questionamento, a busca pelo conhecimento e a capacidade crítica do aluno, que inclui necessariamente as áreas de Crítica e Estética. O fazer inclui o domínio da prática artística, e por fim, o Contextualizar, onde operamos o domínio da História da Artes e outras áreas, estabelecendo relações que permitam a interdisciplinaridade no processo de ensino-aprendizagem.

Araújo e

Oliveira (2013), fazem uma melhor explanação prática do processo: -Leitura da obra de arte. Apreciação, percepção, sensibilização, leitura de imagem por meio da gramática visual. Conhecer os elementos visuais da obra, para descobrir e discutir questões que ela revela. Conhecer a obra e compará-la com obras e artistas de outras épocas ou não, interpretando-a subjetivamente. -Fazer artístico. Momento de criação, produção, de representação e expressão artística. A obra observada é uma boa referência para estimular o indivíduo a criar artisticamente, experimentando diferentes linguagens, sem

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que seja uma cópia ou modelo estereotipado da obra observada. Deve-se preservar a criatividade e a livre expressão na criação de uma nova obra. -Contextualização da obra de arte. Conhecer/analisar a história da obra e o contexto de sua produção, bem como o artista e época em que foi produzida, relacionando-a com o contexto atual, pensando a obra de arte de uma forma mais ampla, para, consequentemente, ampliar o conhecimento em arte. (ARAUJO E OLIVEIRA, 2013, p.74)

Entretanto, essa abordagem também apresenta uma tendência do Ensino de Arte que parte da leitura e contextualização da imagem de qualquer categoria, não apenas da arte, mas inclusive das mídias comunicativas, como publicidade, design, etc. O objetivo de Ana Mae Barbosa é a construção de uma proposta de ensino que eleja o princípio e a referência do homem e seu meio ambiente natural e social. Para Foerste (2010, p.110), a Abordagem Triangular de Ana Mae Barbosa: [...] defende que educação estética não se restringe apenas ao Ensino da Arte, mas deve ser uma preocupação de todas as áreas do conhecimento humano. Parte do princípio de que a Arte é um componente de herança cultural de um povo, assim sendo, deve estar presente na sala de aula, ser contextualizada e analisada. Reiteradas vezes reforça a ideia de que não deve ser exigida a interpretação gráfica fiel à obra, pois não defende a cópia, assim como não preconiza uma leitura daquilo “que o artista quis dizer” com a obra, mas sim daquilo “que a obra diz a você”.

A alfabetização defendida por Ana Mae Barbosa, se realiza pelo exercício da leitura como análise crítica junto ao contexto. Esse seria o caminho para o desenvolvimento de um olhar crítico sobre o mundo e para as imagens que fazem parte dele. Assim, “o aluno é considerado leitor, intérprete e autor” Bredariolli (2010, p.35). Essa é a concepção educacional é um dos fundamentos da Abordagem triangular que pode capacitar o aluno para que ele saiba ler e interpretar o mundo em que vive. MEDEIROS (2010), reitera a importância da Abordagem Triangular para a educação em Artes Visuais e para a formação dos alunos, possibilitando aos educandos apreciar imagens e pensar sobre o que estão vendo, tendo em vista que na atualidade vivemos rodeados por imagens e não fomos educados para pensar criticamente sobre elas. Dessa forma, foi escolhido para uma relação com a semiótica, entre os métodos de leitura de imagem, a Abordagem triangular, que também busca as diferenças e similaridades da recepção da Arte e da Cultura Visual, e dentro da Cultura Visual se interessa em desenvolver o pensamento crítico sobre as imagens nas três ações oferecidas.

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4.2 ABORDAGEM TRIANGULAR E SEMIÓTICA

A teoria semiótica nos permite penetrar no próprio movimento interno das mensagens, no modo como elas são engendradas, nos procedimentos e recursos nelas utilizados. Permite-nos também captar vetores de referencialidade não apenas a um contexto mais imediato, como também a um contexto estendido, pois em todo processo de signos ficam marcas deixadas pela história, pelo nível de desenvolvimento das forças produtivas econômicas, pela técnica e pelo sujeito que as produz. Frente a esse potencial, não há nada mais natural, portanto, do que buscar guias para um método de análise a ser aplicado a processos existentes de signos e às mensagens que elas transmitem, tais como as imagens. Ana Mae Barbosa não relaciona a Abordagem Triangular aos fundamentos da semiótica, mas Teresinha Losada (2010), faz uma bela associação dessas duas teorias. Diante da necessidade de uma melhor compreensão das imagens cotidianas, usaremos essa associação feita por Losada, para finalizar todo o percurso caminhado até este ponto, neste artigo. Podemos relacionar e aplicar as categorias fenomenológicas da teoria semiótica peirceana que engloba a primeiridade, secundidade e terceridade, à Abordagem Triangular, nas ações de ler, contextualizar e fazer. Sabendo que Peirce define a semiótica como um método de descobrir métodos, e que para ele o pensamento é uma semiose, ou seja, uma projeção contínua de um signo, em outro signo, é totalmente possível mesclar essas duas teorias. Podemos associar o “ler”, em nível de primeiridade. “[...] este é o nível da experiência estética pura e imediata, seja na apreciação das obras de arte, ou de qualquer outra coisa ou fenômeno que se nos apresente aos sentidos.” (LOSADA, 2010, p.233). É aquela primeira impressão do aluno, sem muito compromisso. O “contextualizar” remete à esfera da secundidade, entendido como mediação, como confronto de qualidade, de significados e de valores. A busca pelo sentido, a contextualização do meio. O “fazer” liga-se ao nível de terceiridade. Para a realização do fazer, é necessário o conhecimento adquirido nos processos anteriores. O conhecimento é o signo instituído. Seguindo esta lógica associativa, Losada (2010), afirma a hipótese de que o conhecimento liga-se à esfera do “fazer”, ou seja, a construção mental que configura a síntese da terceiridade.

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Uma

das características da

Abordagem Triangular é

promover

o

desenvolvimento do aluno como emissor. Para Peirce, as impressões da primeiridade, e a contextualização da secundidade, gera os quase-signos. A efetiva construção do conhecimento, o fazer, se dá apenas na dimensão representativa, um momento de síntese intelectiva que se dá na terceiridade, (LOSADA, 2010). O fazer, nesse sentido, é o momento em que se institui o conhecimento, o momento em que resulta o fazer artístico e crítico. Depois de qualquer um desses fazeres, tanto artístico como crítico, passamos a ver o mundo diferente, a contextualizar diferente, fazendo novas e diferentes sínteses, resultando num processo contínuo de aprendizado. As três dimensões da abordagem triangular, recompõem a dinâmica fenomenológica do processo de construção do conhecimento, permitindo o diálogo e a alfabetização visual, capaz de formar um aluno que saiba ver, ler e compreender a si e ao mundo em que vive.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A semiótica torna capaz a aproximação de diversos conhecimentos interdisciplinares e teorias, para que cheguemos à um resultado. Os estudos sobre cultura visual, relacionados aos métodos de leitura de imagem surgidos nos últimos anos, vem influenciando teórico e metodologicamente o ensino da arte e o modo como são formados os alunos. A abordagem triangular apresentada por Ana Mae Barbosa, que voltada para a compreensão da cultura visual, da multiplicidade de imagens presentes numa sociedade cada vez mais tecnológica e imagética, à qual estamos inseridos e pertencemos, vai muito além do apenas “fazer” no ensino da arte, enraizado por muitos anos nas aulas de artes. O aluno precisa ver, ler o mundo em que está inserido, contextualizando com o seu tempo, como seu meio, e assim dessa forma, aplicar os conhecimentos adquiridos no fazer. Dessa forma acredita-se possível uma alfabetização visual do aluno, que o tornará um indivíduo mais crítico e social, capacitando-o para ler e interpretar a sociedade contemporânea.

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6 REFERÊNCIAS

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