Repressão no Irã: os casos de Mona Mahmudnizad e Neda Soltan (Repression in Iran: the cases of Mona Mahmudnizad and Neda Soltan)

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Originally published in newspaper O Imparcial (Araraquara City) in May 19, 2009.

Repressão no Irã: os casos de Mona Mahmudnizad e Neda Soltan Marcos Alan Ferreirai O cenário politico iraniano foi alvo de detidas análises pelas agências de notícias nacionais e internacionais na última semana. Os protestos e a violência que se seguiu às eleições de 12 de junho estarreceram o mundo e geraram diversos questionamentos sobre o regime teocrático fundado em 1979 com a Revolução Islâmica liderada por Aiatollah Khomeini. Em alguns veículos de imprensa, o debate foi sobre o porquê de um ataque tão forte ao governo iraniano quanto à violação de direitos humanos, se outros governos como o dos EUA os violam em outros contextos como o de Guantánamo. Creio que neste sentido devemos tomar o cuidado para não cair em uma armadilha de um pensamento simplista de “se o mais poderoso faz, por que o mais fraco é criticado?” Primeiro, ambos devem ser criticados e o caso de Guantánamo foi amplamente criticado pela imprensa e produtores culturais – inclusive com a produção do ótimo filme “Caminho para Guantánamo”. Da mesma maneira, não há como ser piedoso nas críticas ao que o governo iraniano tem feito, com participação inclusive do candidato opositor a Mahmoud Ahmadinejad, Mir Hossein Mousavi. Nunca é demais lembrar que durante o período que Mousavi foi o Primeiro-Ministro do Irã (1981-88), o país julgou e executou diversos opositores e minorias. Entre estas, estavam dez mulheres condenadas à forca em Shiraz por ensinarem no ano de 1983 a Fé Bahá’í – religião surgida no Irã no século XIX que prega basicamente a unidade das religiões, da humanidade e do gênero humano. Neste caso em especial foi estarrecedor e alvo de críticas internacionais a morte de Mona Mahmudnizad, jovem de 17 anos que foi julgada por dar aulas de religião bahá’í para crianças, uma espécie de escola dominical desta Fé. Mona foi interrogada e torturada antes de sua execução, fato mostrado pelas feridas visíveis em seu corpo posteriormente no necrotério. Se antes a mártir pela liberdade no Irã fora Mona, a nova vítima mais uma vez é uma mulher, Neda Agha Soltan. É compreensível que a morte de Neda fosse mais divulgada que a de Mona. Haja vista que Neda viveu sua mocidade na era da comunicação, na qual infelizmente a imagem do selvagem tiro que acertou seu rosto foi amplamente divulgada através do YouTube. Mas a brutalidade e a crueldade da morte das duas foram similares. Ambas, diga-se de passagem, foram vítimas da ignorância religiosa e do apego ao poder do regime teocrático iraniano.

Mona e Neda não são as únicas que sofrem na mão do governo persa e seus aliados civis (em especial os basij, policiais civis à paisana que podem andar armados e que são pejorativamente e ironicamente denominados em Teerã como “polícia moral”). Em 2005, a região de Mahabat assistiu a um assassinato público de 20 curdos que protestavam pelos direitos civis. Como informa a Anistia Internacional, na ocasião a saída para conter o protesto foi simples e efetiva: abrir fogo com fuzis AK-47 contra a multidão curda que protestava pacificamente. Outros casos estarrecedores se multiplicam, como a morte de azerbaijanos. Como exemplo é importante lembrar do caso recente de Mehdi Qahemsadeh, julgado e morto em 2008 por ser um “inimigo do islã”. Neste contexto cabe questionar: é justo relativizar a violação dos direitos humanos no Irã atual? O sangue de Mona, Qahemsadeh e Neda não pode ser relativizado por uma discussão de quem viola mais os direitos humanos. É fato conhecido que o governo que subiu ao poder em 1979 não relativiza nos tiros, forcas e cassetetes. Neste sentido, torna-se cada vez mais importante a divulgação e a condenação ao governo de Teerã, sem relativismos e com plena consciência de que ali existe um governo que nada tem de teocrático, mas que tem muito do fascismo, no sentido mais amplo do termo.

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Marcos Alan Ferreira é Professor Assistente no Departamento de Relações Internacionais da ESPM-SP. É também membro do GEICD/UNESP e NPPA/UNESP.

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