Resenha de Discurso e comunicação de Paul Ricoeur

July 11, 2017 | Autor: Carlos Orellana | Categoria: Paul Ricoeur, Paul Ricoeur (in ) Philosophy
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Discurso e comunicação

Paul Ricouer
L'herne
2005






















De acordo com Ricoeur, o línguista e o filósofo têm posições distintas quanto à noção de comunicação. Para o línguista, a comunicação é um ato, é um dado a partir da qual sua ciência é possível. Desse modo, Roman Jakobson, num texto de 1960, numa conferência interdisciplinar sobre "Linguística e poética" , se interroga sobre os fatores constitutivos de todo processo linguístico, de todo ato de comunicação verbal, enumerando seis fatores. Quanto à noção de comunicação não se constitue como um problema, mas é visto como processo linguístico que deve ser compreendido como jogo de combinações dos seis fatores, de suas correlações com as funções linguísticas. O núcleo dessa análise está depositado na relação entre destinador, mensagem, destinatário e canal.
De outro lado, o filósofo concebe a comunicação não como algo em si ou algo dado, ou seja, torna-se enigma. Como descreve Ricoeur, a comunicação não é problematizada de forma radical rompendo com as representações físicas da mensagem, de sua codificação e decodificação. Formamos com Leibniz e Husserl, a ideia de duas mônadas, de duas séries de eventos físicos, na qual os eventos são autônomos e não pertencessem um ao outro. Segundo Ricoeur, a comunicação deve ser pensada como díade, na qual as duas séries de eventos são compreendidos como um conjunto sem intersecção. E assim, a comunicação torna-se um problema, um paradoxo, um paradoxo cotidiano, a comunicação é uma transgressão, no sentido próprio do cruzamento de limites, ou melhor de uma distância intransitável.
Nossa tarefa é compreender o discurso como uma transgressão da incomunicabilidade monádica, ou seja, apresentar o discurso e suas condições de comunicação para além da via transcendental do monadismo e assim dramatizar o paradoxo que se tornou banal que é a comunicação. A comunicação não se torna problema pelo gesto transcendental que suspende o caráter natural (psicanalítico), mas se constitue como problema como campo transcendental e como encadeamento sistematicamente fechado, um espaço de jogo e lógica que nada naturais.
A resposta de Ricoeur encontra-se em apresentar uma teoria do discurso distinta da teoria da linguagem, mas que implica fatores psicológicos: crença, desejo, engajamento, mas esses fatores psicológicos são apresentados sob uma lógica não psicológica do discurso. Assim, Ricouer compreende se o discurso é a incomunicabilidade superada.

Linguística e Discurso

De acordo com Ricoeur, a linguística do discurso está na sua infância e que seu desenvolvimento foi até certo ponto impedido pela importação de modelos semiolinguístico. Assim para retirar a teoria do discurso de uma minoridade que Benveniste numa conferência das Sociedades de filosofia da língua francesa propôs uma linguística do discurso que não seria apenas uma pragmática da linguagem. Discurso e linguagem, segundo Beveniste, não repousam sobre as mesmas unidades; a unidade da língua é o signo; a unidade do discurso é a frase, ou melhor o intentado, é aquilo que o locutor deseja dizer. Outra diferença entre signo e discurso: o significado do signo se reduz a uma diferença imanente ao sistema de signos; o intentado tem um caráter sintético que na Idade Média poderíamos chamar de compositio e divisio. Corresponde a ideia de compreensão global da frase em seu valor contextual, obtido através da dissociação analítica da frase. De onde surge uma nova oposição; o significado do signo ignora a diferença entre sentido e referência. O discurso ao contrário encontra-se no centro da referência que designa a situação e seu locutor: Essa referência tem o caráter de síntese analítica da frase globalmente compreendida que reenvia a uma situação ou objeto particular.
Nesse sentido, Benveniste compreende que se o signo tem por função significar, apenas o discurso tem por função comunicar. Somenete o discurso, portador do intentado, do sentido e da referência é transposta de uma língua a outra, exerce a função de mediação. E a mediação, segundo Benveniste possui um triplo sentido: entre o homem e o homem que assegura a integração social, entre o homem e o mundo que realiza a adequação entre eles, entre o espírito e as coisas, pela regulação que se impõe aos pensamentos.
De acordo com Benveniste, o semantismo social configura-se como atividade na qual os sujeitos através do exercício de enunciação produz significado a partir de sua experiência de singularizacão do discurso. O semantismo como fenômeno anterior a produção de comunicação, mas que constitue as bases da experiência subjetiva do discurso.
Entre a comunicação e o discurso, e por quê o semantismo do discurso é instituidor da comunicação? Benveniste compreende que o discuso produz um paradoxo, de um lado o discurso apresenta um intentado, que é o seu sentido, e uma referência que é sempre singular; de outro lado é da ordem do evento, aparece e desaparece. Essa contradição aparente fornece uma aproximação mais próxima ao paradoxo da comunicação da qual nós debatemos.
Entretanto como reconhecer os fundamentos da comunicação para além da linguística do discurso? E para isso, Ricoeur propõe coordenar e hierarquizar três níveis de apreensão e de tratamento do semantismo do discurso.
No primeiro nível, Ricoeur considera a teoria dos enunciados, baseada na filosofia analítica e na filosofia fenomenológica, propondo estabelecer uma convergência a lógica apofântica. No segundo nível, Ricoeur assume a teoria "speech-acts" inaugurado por Austin, na qual compreende uma lógica do julgamento como em Husserl em Lógica formal e lógica transcendental. E por fim, o nível das intenções baseado na obra e Paul Grice, onde podem ser estudados os fatores ditos psicológicos.

Lógica do sentido e comunicabilidade

Ricoeur compreende que o discurso é acima de tudo um fenômeno ontológico antes de ser lógico, isto é, o discurso assume um sentido por sua qualidade universalizante e singularizante ao mesmo tempo, além de comportar uma pretensão e um engajamento ontológico que exige do sujeito um olhar sobre si. A qualidade ontológica do discurso pode ser verificada no equilíbrio das duas funções do discurso, de um lado a função predicativa de dar características e qualidades a uma coisa; de outro a função de identificação singular pela qual designamos uma coisa em específico.
Ricoeur oferece o exemplo de uma expressão polissêmica na qual é determinada contextualmente. Não é através de variação contextual que é decisivo para compreensão do sentido, mas pelo processo de determinação contextual que essa polissemia é reduzida. O ideal do discurso é de reduzir a polissemia inicial das palavras da linguagem ordinária e dizer apenas uma coisa.

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