Resenha do romance \"Operação Impensável\", de Vanessa Barbara. Folha de S.Paulo (2015)

June 1, 2017 | Autor: Juliana Cunha | Categoria: Literatura Brasileira Contemporânea
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Sábado, 28 dE NovEmbro dE 2015

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Vladimir Safatle discute o papel da afeição na política

Sábado, 28 dE NovEmbro dE 2015

Divulgação

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Moacyr lopes Junior - 9.set.2015/Folhapres

C6 ilustrada

úrSula paSSoS De sãO paUlO

“Aquele que controla a dimensão do visível, do sensível e do perceptível controla o modo de circulação de questões e embates no interior do campo político”, afirma o professor de filosofia da USP e colunista da Folha Vladimir Safatle. Ele acaba de lançar o livro “O Circuito dos Afetos”, no qual busca explicitar a importância dos afetos para a política e para a vida em sociedade. “Política não é só uma questão de circulação de bens e de riqueza, mas é fundamentalmente uma questão de circulação de afetos”, explica ele em entrevista. Sua tese de doutorado, defendida em 2002, tratava da relação entre o pensamento do psicanalista Jacques Lacan (1901-1981) e a dialética e da teoria do sujeito na psicanálise. É a partir dessa base que se desdobraram os estudos que levaram a “Grande Hotel Abismo” (2012, Martins Fontes) e a seu mais novo livro. Neste, ele passa pelas questões sobre o sujeito levantadas nos últimos anos pela filosofia francesa —e que têm repercussão no pensamento sobre a política, as artes e a moral— para mostrar

como alguns acontecimentos são capazes de mudar a percepção de tempo e espaço, obrigando as pessoas a mudar sua maneira de sentir. “Muitas vezes as ações políticas ficam bloqueadas porque a nossa maneira de perceber, de vivenciar e de sentir fica aprisionada por um certo regime de organização de problemas”, diz ele. “Eu me pergunto se muito da miséria política que vivemos atualmente, no Brasil e no mundo de forma geral, não vem dessa dificuldade.” UTOPIA

Ao longo do século 17 convencionaram-se afetos relacionados à vida política. Em Hobbes, o afeto fundamental é o medo, que leva a uma compreensão da sociedade como guerra de todos contra todos, e, em Spinoza, é o seu contrário, a esperança. Tais

afetos levam a interpretações da política que vão, com o medo, da segurança como demanda primordial a, no outro extremo, completa utopia. Safatle, porém, segue Freud e elege como afeto fundamental o desamparo. “Estamos desamparados quando não sabemos como reagir, como lidar com o que é da ordem da radicalidade dos acontecimentos”, diz. Ainda assim, é possível lidar com o que foge ao controle e chegar à emancipação, que, de acordo com ele, “é um reconhecimento de que nunca estarei na jurisdição de mim mesmo, mas de que a relação com o outro

Musicalidadede MuriloMendes caminhaentre rigidezeleveza

não deve ser na forma de dominação ou servidão.” Pensar a política sem pensar os afetos, segundo o professor, é ignorar que eles sempre estarão implicados ali. “A visão de política como racional, que deve afastar os afetos, nunca existiu e nunca existirá, porque parte do pressuposto errado de que os afetos seriam da dimensão do irracional”, diz. “Seria mais correto se perguntar pela racionalidade dos afetos.”

Paradoxos refletem transformações não apenas da obra, mas do escritor Felipe Fortuna

o CIRCUITo dos afETos

aUToR Vladimir Safatle EdIToRa Cosac Naify QUaNTo R$ 59,90 (512 págs.)

Safatle durante o Seminário Queer, no Sesc Vila Mariana

especial para a folha

o poeta mineiro Murilo Mendes (1901-1975) com a mulher, Maria da Saudade, em foto sem data

A poesia de Murilo Mendes parece um ardiloso paradoxo: surpreende pelas imagens, embora projete ora a vertente católica, ora a aresta surrealista, ora o modernista maduro com seu desejo de totalidade. “A nuvem andante acolhe o pássaro/ Que saiu da estátua de pedra./ Sou aquela nuvem andante,/ O pássaro e a estátua de pedra.” Os versos estão em “As Metamorfoses”, de 1944, e bem poderiam definir o autorretrato do poeta: uma “nuvem errante” que circula entre o Rio de Janeiro, as Minas Gerais e os países da Europa que visitou e onde morou por longos períodos. “Nuvem errante” porque o poeta variou muitíssimo no tempo e no espaço, e às vezes se contradisse dentro do mesmo livro. Num artigo no ano de lançamento de “As Metamorfoses”, Lauro Escorel interpreta argutamente a musicalidade do poeta, ao explicar que, muito mais do que a melodia verbal, persistia em Murilo Mendes “uma atmosfera anímica, que confere uma qualidade singular à sua visão do mundo.” A música desencadearia as “visões oníricas” que estão presentes em todos os poemas do livro, às vezes em tom apocalíptico. Eis aqui outro paradoxo muriliano: a música está a serviço da imagem, a melopeia conduz à fanopeia, e tudo parece uma força centrífuga a lançar longe as disparidades.

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FilósoFo FARá bATE-pApo gRATUiTo

Na terça (1º/12), às 20h, Safatle se reúne com os pensadoresPeterPálPelbart(PUCSP), Ricardo Musse (USP) e JorgedeAlmeida(USP)para o debate O Circuito dos Afetos: Corpos Políticos, Desamparo e o Fim do Indivíduo no Sesc Bom Retiro (al. Nothmann,185,tel.11-33323600). Entrada gratuita.

Bastidores do poder apimentam livro de Joyce Pascowitch Memórias de ex-colunista da Folha reúnem histórias da política e dicas para se viver bem roDolFo Viana De sãO paUlO

Joyce Pascowitch foi testemunha ocular de alguns dos eventos mais importantes da história recente do Brasil. Um deles foi o impeachment de Fernando Collor. Em julho de 1992, a então colunista da Folhapublicouemprimeiramão uma nota sobre a Operação Uruguai, farsa montada para explicar o padrão de vida nababesco do presidente, o que poderia livrá-lo da cassação. A história não colou e, cinco meses depois, a maioria dos deputados foi a favor da abertura de processo contra Collor, que renunciou. Joyce estava no plenário da Câmara durante a votação que selou o destino do político. Se a mesma situação ocorresse hoje, 23 anos depois, talvez ela não tivesse a mesma disposição de estar ali. “Eu não consigo mais ter prazer [em assistir a uma sessão da Câmara]”, diz a diretora do Grupo Glamurama, aos 61 anos. “Antes, o homem ia para a política por uma questão de ideal. Isso acabou.” A política nacional toma boa parte de “Poder, Estilo & Ócio”, quarto livro de Joyce. Nele, a jornalista narra o que aprendeu em quase 30 anos circulando por grupos influentes. Ela avisa, por exemplo, que a melhor estratégia para frequentar tais círculos é “nadar sem provocar marola, sem fazer barulho, sem chamar a atenção”. Há pérolas ali, como um certo jantar em 1990: a colunista notou que Zélia CardosodeMelloeBernardoCabral,

respectivamente ministros da Economia e da Justiça de Collor, dançavam coladinhos ao som de “Bésame Mucho”. “Ele me falou algo como ‘essa mulher é muito interessante’”, comenta. “O ministro assumiu o romance, mas me pediu ‘off’.” A informação, contudo, foi ouvida por outras pessoas e, no dia seguinte, a imprensa já divulgava o relacionamento. O namoro entre Zélia e Bernardo não durou muito, ao contrário do casamento entre poder e luxo. As duas coisas são indissociáveis, e Joyce não se furta a falar sobre estilo. No livro estão Paris e Milão, templos da moda, e a experiência da jornalista nessas cidades. Para a autora, luxo é “pegar a essência de sua cultura e usála com criatividade —sem gastar quase nada”. Luxo, acrescenta, também é saber envelhecer. E faz uma seleção de “mulheres que estão envelhecendo de maneira bacana”: a colunista da Folha Nina Horta, as atrizes Diane Keaton e Meryl Streep, entre outras. E quanto a Joyce Pascowitch? “Eu me incluiria nessa lista”, confessa, sem falsa modéstia. “Malho todo santo dia e cada vez com mais força. Mas eu me colocaria nessa lista também porque tenho leveza em relação à vida.”

LIRISMO AMOROSO

Por outro lado, é preciso concordar com Murilo MarcondesMouraquando afirma, no posfácio ao livro, que “As Metamorfoses” “é dos grandes livros da poesia líricoamorosa do autor” —e, novo paradoxo, contexto em que o poetadáacesso,demodomais direto, apesar da ebulição das imagens, à sua mensagem. Existe um veio subterrâneo em “As Metamorfoses” que merece atenção: a experiência da Segunda Guerra. No ponto em que Drummond salientará o aspecto político, em “A Rosa do Povo” (1945), Mendes exibirá a despedida de uma cultura, o fim da inocência, o adeusamuitodaquiloqueformara a sua sensibilidade. Já os treze poemas de “Si-

ciliana” e o bem estruturado livro “Tempo Espanhol” (1959) pertencem a outro momento —terminada a guerra, o poeta viaja intensamente pela Europa, por sua paisagem e por sua cultura, o que trará importantes mudanças na sua poética. Atenua-se o surrealismo e o modo altissonante; afirmam-se os versos precisos, mais descritivos e referenciais: nesses livros, os poemas são escritos na forma de homenagens, de celebração contida do que o poeta está vendo e vivenciando. Surgem as fórmulas: “Quevedo, a angústia do tempo/ Informa tua visão concreta.” Há muito a comentar sobre o tópico dessa “visão concreta”. Assim como a experiência espanhola trouxe elementos definitivos para a poética de João Cabral (por exemplo, o cante a palo seco, o sentido de composição, o realismo à maneira de Gonzalo de Berceo), o tempoespanholdeMendesfaz opoetavoltar-separaaconcretude e para o ordenamento. O que o poeta escreve sobre Goya (“Tem a força de ataque do animal / E a lucidez objetiva do cientista”) aplica-se bem ao país que está visitando e, surpreendentemente, à poesia que faz sobre o país. Haroldo de Campos captou bem essa mudança de curso ao designar o “mundo substantivo” que havia sido alcançado: “‘Tempo Espanhol’ é um livro domado e severo, de maturada maturidade. Poesia magra e dura, sem nenhuma concessão ao sentimentalismo superficial dos melancólicos escudeiros da poesia-liricizante, da poesia-Gemüt (‘coração’).” É impressionante acompanhar a arquitetura da poesia. Em “Tempo Espanhol”, um poema ocasional como “O ChoferdeBarcelona”setransforma em ambiente de reflexão para esse Murilo Mendes transformado pela experiência: um poeta preocupado com a política e a sociedade, mas que não deixa de desejar o infinito e a redenção. fElIPE foRTUNa é poeta e diplomata, autor de “O Mundo à solta” (Topbooks), entre outros.

as mETamoRfosEs / sICIlIaNa + TEmPo EsPaNhol aUToR Murilo Mendes EdIToRa Cosac Naify QUaNTo R$ 36,90 cada aValIaÇÃo ótimo HHH

adriano Vizoni/Folhapress

crítica liTERATURA/RoMANCE

alexandre rezende - 16.abr.2013/Folhapress

Vanessa Barbara cria analogia entre divórcio e Guerra Fria Juliana CunHa eDiTOra-assisTeNTe Da “ilUsTraDa”

PodER, EsTIlo & óCIo

aUToRa Joyce Pascowitch EdIToRa Intrínseca QUaNTo R$ 49,90 (176 págs.);

R$ 24,90 (e-book) laNÇamENTo 1º/12, às 18h30, na Livraria da Vila da Lorena (al. Lorena, 1731, 11-3062-1063)

ilustrada C7

crítica liTERATURA/poEsiA

No recém-lançado livro ‘O Circuito dos Afetos’, filósofo se baseia em Lacan ‘a visão de política como racional nunca existiu, pois parte da suposição errada que afetos seriam irracionais’, afirma ele

HHH

Joyce pascowitch, diretora do Grupo Glamurama e autora de ‘poder, estilo & Ócio’, em seu escritório em São paulo

O casal Tito e Lia vive em uma bolha de jogos de cartas e piadas internas até que um deslize do marido arruína as estruturas do relacionamento. Tito é um programador e ex-militante comunista. Lia é historiadora e estuda a Guerra Fria. Os dois mantêm um casamento perfeito, na visão da narradora: estabelecem um vocabulário próprio, vivem grudados. Amigos mal aparecem, exceto Josef —provável alusão a Stalin—, cole-

ga de infância de Lia que é adotado por Tito. A família faz mera figuração e o zelador do prédio funciona como um enviado especial para combater outros invasores, como baratas que entram no apartamento. Nesse terceiro romance (e sexto livro) da jornalista e escritora Vanessa Barbara, somos inseridos na dinâmica de um relacionamento baseado em relações fraternais um tanto infantilizadas e num teatrinho de casamento tradicional que não parece se encaixar bem nos persona-

gens nem no tempo. O casal trabalha no sentido de criar um mundo só deles. Prezam sua linguagem inacessível, as desculpas para evitar os amigos, os pijamas, a mentira de que passariam dez dias na praia quando na verdade ficariam em casa. A resistência aos invasores surge a todo momento. Uma simples mariposa entrando pela janela é motivo o bastante para Tito querer emparedar o cômodo e nunca mais frequentá-lo. Cabe a Lia enfrentar os infiltrados: é ela quemmataosbichosmenores,

delegando os maiores ao zelador. É ela quem sustenta o isolamentoeusaaliançasozinha. Todo dia, quando ouve o barulho da chave, Lia corre para abraçar Tito. O barulho da chave é uma sirene que marca o retorno ao lar. A chave é ainda o símbolo do lar que Tito leva consigo, uma vez que aliança ele não usa. O fim do casamento não é spoiler —sabemos de antemão que durará cinco anos— e tem tudo a ver com chaves. Um dia, no trabalho, Tito digita um código errado e apaga as senhas de todos os

clientes. Desesperado, resolve aplicar um truque que faz com que o sistema redefina como nova senha a primeira coisa que o usuário digitar. Funciona, mas a partir daí surge um racha no casal. O casamento então replica o golpe de Tito com as senhas: há uma aparência de que nada aconteceu quando na verdade tudo foi redefinido. oPERaÇÃo ImPENsÁVEl aUToRa Vanessa Barbara EdIToRa Intrínseca QUaNTo R$ 40 (224 págs.) aValIaÇÃo bom H

a escritora e jornalista no Mandaqui, seu bairro

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