RESENHA GADAMER Hans Georg O problema da consciencia historica

June 5, 2017 | Autor: Bruno Bio Augusto | Categoria: History, Hans-Georg Gadamer, Post-modernism, História, Teoria e metodologia da história
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Resenha apresentada na disciplina de Teoria II do curso de História da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.

RESENHA: GADAMER, Hans-Georg. O problema da consciência histórica. Rio de Janeiro: Editora FGV, 1996.
BRUNO CEZAR BIO AUGUSTO

Nessa obra resenhada, Gadamer fará uma discussão acerca da consciência histórica dos indivíduos (coletivo) e também da ação de "compreender o passado". Amparados em pensadores como Dilthey, Hidegger, Aristóteles e alguns outros, Gadamer tentará construir uma hermenêutica amparada no texto (histórico) e a epistemologia da história atrelada à Filosofia.
Assim, no capítulo Problemas epistemológicos das ciências humanas Gadamer introduz a consciência histórica como um resultado da relatividade dos sujeitos, ou seja, há diferentes interpretações histórica. Desse modo, não podemos nos referir a "consciência" com singularidade, pois ela vem carregada de múltiplos elementos adentados na história. Assim, as posições antagônicas formam uma compreensão coerente que, apesar de estar no todo, é de caráter particular.
Ter consciência história é ter uma interpretação de mundo, Gadamer se refere à interpretação como "caráter 'estranho' daquilo a ser compreendido". Utilizando da necessidade de compreensão do mundo que os seres-humanos possui, devido a sua incompletude, o autor nos informa que as ciências históricas modernas caracterizam sua reflexão nessa necessidade de saciar o incompleto humano, mas, o erro dessas ciências está no uso metódico. Pois as interpretações dificilmente se assemelharam à ideia do "método pronto e acabado".
O senso histórico precisa ser superado no conceito de que ele necessita nos levar à um passado próximo de nossa realidade, adotando perspectiva de nossas instituições, valores e verdades. Ter senso da história significa expressar no horizonte histórico a vida coextensivo e não nos ampararmos no saudosismo do passado beatificado.
Construir a consciência é assegurar um genuíno fundamento dos conhecimentos naturais e ideais. É o campo das ideias que as ciências humanas iram abraçar, principalmente na Filosofia. Assim, no uso da prática filosófica, os problemas, segundo Gadamer, originados da reflexão humana não são questões para a filosofia resolver, mas sim questões do campo das ideias filosóficas que a história precisa tentar deliberar. Destarte, a reflexão histórica parte da filosofia para a história e não o reverso.
Gadamer nesse primeiro capítulo, procura mostrar que as ciências humanas, mesmo permanentemente recorrendo à filosofia, ainda tem o ranço do século XIX da necessidade do empirismo. Enganosamente há a crença de que o modelo das ciências da natureza (modelo empírico) reflete uma maior probabilidade de acertos – tão desejosos na cientificidade -, assim, os métodos histórico-críticos contemporâneos ainda bebem da fonte do conhecimento prático.
Em uma convenção da subjetividade da história, Gadamer, talvez brincando com a noção de exatidão aclamada pelos cientistas, fala se se os historiadores necessitam tanto de pertencer à um lugar, a história então deva entrar em uma "ciência inexata", uma espécie de limbo dos experimentos de erros e acertos científicos.
Ao invocar o historiador oitocentista Droysen, Gadamer nos mostra que mesmo no século da história positiva estudiosos já questionavam as ideias dos acontecimentos finitos. Nesse contexto, Droysen, invocando os preceitos kantianos – tão utilizados no seu tempo – concebe que de modo algum a epistemologia da história deixa de ser uma tarefa filosófica e passa à ser um arganon lófico.
No capítulo Extensão e limites da obra de Wilhelm Dilthey, Gadamer preambula nas distinções das ideias de Droysen e Dilthey. De tal modo, o primeiro está próximo de uma filosofia do idealismo alemão, ou seja, um hegelianismo que já apresenta críticas da razão pura, amparando com isso o seu pensamento em uma substância viva, que se condiciona segundo o ser que ela habita. Já Dilthey, mesmo operando com "sua ciência do espírito" em lugar da "ciência da razão", se aproxima do britânico Mill e alemão Schleirmacher, que, desde a segunda metade do século XIX encontra sobre a influência do indivíduo uma "mente em branco", onde as experiências (concepções históricas) a preencheriam.
Assim, sobre esse discurso, Gadamer não realça a história como um domínio puramente racional, mas sim em uma especulação dos conhecimentos que integra a mente humana no mundo autônomo das ideias. Portanto, vemos em Dilthey um esforço para fundar filosoficamente as ciências humanas se apoiando em uma epistemologia retirada do rankianismo em uma oposição do idealismo alemão.
Imbricado nas perspectivas históricas dos seres históricos, Gadamer questiona: "Mas tal modo de ser histórico de nossa consciência já não representaria uma limitação intransponível?". Como tentativa de resposta, o próprio autor utiliza o Aufbebung de Hegel na história em campo do saber absoluto, que admite a possibilidade de haver variações na interpretação histórica acerca do objetivo – não um objetivo palpável.
Então, é graças ao momento da aufbebung que podemos questionar a racionalidade das concepções históricas em uma crítica da razão pura e acabada em uma ciência que está demasiada apegada ao racional do mundo, mas que também é simultaneamente revelada em uma aplicação das ideais injustificáveis.
É na transposição do momento histórico que, por Dilthey, Gadamer nos diz que ser submetido às medidas de um tempo compreendido à partir do sujeito. Assim, mesmo entendendo um conhecimento como "universal", a sua compreensão é concebível de maneira individual, ou seja, não significa que ter um "senso histórico" irá precisamente te libertar dos preconceitos da realidade. Assim, para Dilthey, a função da consciência histórica é vencer a relatividade do indivíduo – do indivíduo, não do mundo -, mostrando à esse sujeitos outras relações com a incompletude.
Gadamer apresenta a arte como meio efetivo que privilegia a vida e nos possibilita apontar outras incompletudes humanas. Ela – a arte – nos permite rever a si mesmo em uma profundidade onde a observação, a reflexão e a teoria já não tem acesso.
No pensamento cartesiano de Dilthey, vemos o sentido de uma filosofia diltheyana em que ao mesmo tempo que reivindica para si as observações do espírito, também assemelha nas ciências, não uma ciência pronta e acabada de erros e acertos, mas sim, como Gadamer se referiu, em uma ordem científica "inacabada".
Assim, findando este capítulo e iniciando o outro, as ideias de Dilthey apresentado por Gadamer podem ser decifradas como epistemologicamente pertencente as ciências humanas, mas que, versando para o mundo histórico, necessitam ser decifradas.
No tópico Martin Heidegger e o significado de sua "hermenêutica da facticidade" para as ciências humanas, Gadamer analisa a reciprocidade da interpretação do texto visando a compreensão e adequação do indivíduo. Assim, o que é visado para a pessoa que escreve já não se entende proporcional ao leitor. O texto e o intérprete são absolutamente contemporâneos mas as suas ideias, aquelas "concepções" e "sensos" descrito no outro capítulo, não são necessariamente concomitantes ao escrito.
Desse modo, o próprio texto está configurado como passível de múltiplas hermenêuticas, que, assim, não nos impede de negligenciar a historicidade essencial das ciências humanas e coordená-las pelo campo da metodologia. Portanto, a interpretação é o texto a ser decifrado e compreendido, e seu resultado dependeram da condição do espírito do leitor.
Gadamer continua sua reflexão sobre a obra literária, dizendo que todo texto é suficientemente estranho de primeira leitura, e que, ao colocar conteúdos familiares aos olhos de quem lê, possibilita a decifração. A compreensão textual é a intencionalidade do autor, e sua compreensão, para Gadamer, é a exigência de um Selbstvesinnung para satisfazer quem está lendo, ou seja, quando deparamos com as linhas de um texto temos uma reflexão com nós mesmo.
Em uma conversa acerca da hermenêutica laçada ao espírito e natureza, Gadamer rebate a ideia de que a natureza precisa ser oposição ao espírito. Assim, as ciências humanas e as ciências da natureza devem ser compreendidas a partir da intencionalidade da vida, ou seja, é só assim que conseguimos satisfazer também o selbstbesinnung de Dilthey. E, consequentemente refutando a prática diltheyniana de separar o sujeito histórico da natureza para legitimar a teoria do conhecimento, Gadamar mostra que o próprio conhecimento das ciências da natureza é também uma compreensão da história e da sociedade.
Relativizando Heidegger e Dilthey, a ideia de compreender não é distinta de uma ideia de conhecimento, ou seja, compreender é a forma originária de realizar o "ser-aí humano" do "ser-no mundo". Pelos pensamentos do ser e refutação da ontologia, Heidegger se torna interessante nessa conversa de Gadamer, pois, mostrando um pouco do pensamento pós método do século XIX, o autor encaminha Martin Heidegger na ideia fenomenológica de interpretar o que se mostra, em teoria, "pronto".
Assim, Heidegger vai muito além de toda a metafísica tradicional da filosofia, ele, ao retornar o problema do "ser" que havia intensificado os debates no século 19, assegura uma posição com relação às aporias clássicas do historicismo, ou seja, seu conceito já não é mais uma compreensão apenas ontológica. Para Gadamer, as reflexões de Heidegger possibilitaram o aumento do horizonte da hermenêutica, pois, agora, a ontologia da história não é olhada indubitavelmente para o passado, é desse modo, essencialmente orientada para o futuro, o "vir-à ser". Assim, nesse olhar para o futuro da história, o Zugehorigkeit condiciona as reflexões para a escolha de um pertencimento de uma história que não encontra sua finitude do ser-aí, e sim na reciprocidade do "ser-aí", "ser-acá" e "saber-ser".
O conhecimento histórico não é nem um projeto, nem uma extrapolação de finalidades, nem ainda, segundo Gadamer, uma disposição de coisas, o conhecimento histórico é sim uma mensuratio ad rem. Assim, a relação do conhecimento não pertence aos modos de ser equivalentes numa interpretação histórica, mas sim, na consistência dos vários "modos de ser", ou seja, o fenômeno e a problemática será aprender o(s) significado(s) do que é composto em tais vértices.
Entre o fenômeno e a problemática há um abismo de interpretações que não podem ser vistas com olhos preconceituosos, assim, a vorurtueislose Wissenchaft (ciência sem preconceito), não participa da ingênua reflexão pela qual a tradição das reflexões está encalçada.
Na parte O problema hermenêutico e a ética de Aristóteles, o autor irá discorrer acerca do problema do sentido que se deve dar à um fato que pode ser apreendido de diferentes maneiras por aquele que recebe.
Assegurando no discurso sobre o fenômeno ético de Aristóteles, Gadamer no diz que o sentido, na sociedade, de apreensão do fato histórico é levado pelo viés da ética vigente, mas não somente movido pela ética. Assim, o ser ético aristotélico é o homem que age distinto das forças da natureza, ou seja, o ser ético distingue-se do natural.
Portanto, a étnica humana é o sujeito que sabe decidir em sua ação e compreender como deve agir, e desse encargo da ação jamais "desembaraçar-se". Um desdobramento da ética é as "ciências morais", com seu objeto pautado no homem e no que ele sabe de si mesmo. Pensando não no homem como forma acabada, mas sim uma formulação abstrata do que o homem não é.
No campo da ética temos os conhecimentos, eles, em suas ações, nos dizem dois largos horizontes, o "técnico" e o "teórico". Segunda Aristóteles, a técnica se aprende mas pode ser esquecida, já o "saber teórico ético" nem se aprende e nem se esquece, está no ethos da sociedade. Assim, no "saber ético" temos atrelado o "saber-para-si", sendo a "phronesis" aristotélica, ou seja, o sujeito da phronesis se abre para entender e se relacionar com o outro; distinto da "synesis", que é o tentar conhecer de mim mesmo para mim mesmo.
Amparados em Dilthey, Hurssel e Heidegger o autor afirma que o conhecimento histórico não pode ser descrito como um modelo objetivista, que já está com suas características prontas. O conhecimento histórico deve ser compreendido como uma existência de um "pro-jeto lançado", ou seja, um idealização do que é.
Assim, a distância temporal do sujeito e do tempo histórico não é algo que deva ser transposta ou vencida. É graças a essa distância que temos uma infinidade de características da hermenêutica para interpretar a história, distinguindo os preconceitos falsos e os preconceitos verdadeiros.
Em suma, a obra de Gadamer é interessante pois permite compreender a(s) operações de uma mediação entre o presente e o passado por uma perspectiva do sujeito histórico quanto lançado ao seu futuro do vir-ser. E, nessa interpretação, a temporalidade é importante para construímos o raciocínio das ideias em sua incompletude.


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