Resenha sobre: A imagem da Grécia Antiga como uma ferramenta para o colonialismo e para a hegemonia europeia, de Martin Bernal.

July 7, 2017 | Autor: Gabriel Forgati | Categoria: Martin Bernal, Imperialismo, Estudos Clássicos no Brasil, Estudos Clássicos
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ SETOR DE CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA – MEMÓRIA E IMAGEM (1º PERÍODO 2015) HISTÓRIA ANTIGA Prof. Dr. RENATA SENNA GARRAFONI

Resenha sobre: A imagem da Grécia Antiga como uma ferramenta para o colonialismo e para a hegemonia europeia, de Martin Bernal.

Adriene Mitally Ramos de Paiva Daniel Donato Ribeiro Gabriel Antonio Forgati Michele Souza de Oliveira

O AUTOR Martin Gardiner Bernal (Reino Unido, 1937-2013) graduou-se em 1961 em Estudos Orientais pela Kings College da Universidade de Cambridge, na Inglaterra, Reino Unido. Concomitantemente, especializou-se em história e linguagem chinesa, estudando um período na Universidade de Pequim (1960). Seguiu sua pósgraduação nas Universidades estadunidenses de Berkeley (1963) e Harvard (1964), obtendo o doutorado pela Universidade de Cambridge em 1966 (Socialismo Chinês de 1913). Aí permaneceu até se transferir para a Universidade de Cornell, nos Estados

Unidos,

em

1972



tornando-se

professor

titular

de

Estudos

Governamentais (Government) e Oriente Próximo em 1988 – aonde permaneceu até sua aposentadoria, em 2001. Em virtude da Guerra do Vietnã (1955 - 1975) e de seus desdobramentos, o britânico também se aprofundou no assunto, assimilando ainda o idioma vietnamita. Bernal foi um grande estudioso do Oriente. Em seu livro Black Athena (publicado em três volumes: 1987, 1991 e 2006), discorre sobre a influência egípcia na cultura e no idioma da Grécia Antiga, desmistificando a noção de ser a civilização que legou o Ocidente. 1

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ESTRUTURA TEXTUAL O artigo de Martin Bernal foi incluído no livro “Repensando o Mundo Antigo”, organizado por Pedro Paulo Funari, que reúne ainda trabalhos de Luciano Canfora e Laurent Olivier. Traduzido por Fábio Adriano Hering e Glaydson José da Silva. Foi publicado em 2005 pelo Setor de Publicações do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas. O livro é iniciado com uma apresentação de Funari, discorrendo sobre o estudo da História Antiga, enfatizando este no Brasil. Precedendo o artigo de Bernal, o tradutor Hering faz sua apresentação ao discurso do historiador britânico. “A imagem da Grécia Antiga como uma ferramenta para o colonialismo e para a hegemonia européia” foi publicado originalmente no livro Social Construction of the Past, em 1994. Neste artigo, dividido em dois capítulos (“Dois modelos para a origem da Grécia Antiga” e “Modelos da história da Grécia e Antropologia”), o autor discorre sobre como modelos e construções sobre a antiguidade grega, feitos no século XIX e XX, foram usados de forma a afirmar a superioridade europeia em relação aos povos não europeus.

RESUMO Bernal começa o artigo elucidando o caráter político do estudo da Antiguidade e desmistificando o aparente isolamento deste quanto aos assuntos do presente. Afirma que os estudos da Antiguidade tomam padrões e posições sociais conforme a época que os desenvolvem – conceito alemão de Zeitgeist, que molda esses padrões conforme o contexto. Isso fica evidente no uso que as nações neocolonialistas do século XIX fizeram da representação do passado antigo, justificando, com o seu modelo deste, suas ações imperialistas sobre os outros povos e legitimando seu poder não só político, mas também cultural sobre eles. Na parte que se segue, o autor tratará dos dois modelos que interpretam as origens da Grécia Antiga. O primeiro deles, o Modelo Antigo, diz que a Grécia teria se originado a partir do contato entre os povos nativos com os povos fenício e egípcio; estes últimos teriam civilizados aqueles primeiros. Já o segundo modelo, o 2

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Modelo Ariano, afirma que a Grécia Antiga originou-se da invasão de povos falantes da língua indo-europeia vindos do Norte que dominaram a “fraca” população nativa. Bernal, então, constrói uma crítica acerca deste segundo modelo, relacionando-o às ideologias racistas, e até mesmo sexistas, provenientes da época em que foi formulado (século XIX e XX): primeiramente, este modelo eliminava as influências orientais que pudessem ter havido na origem da Grécia Antiga, quando afirmava que os gregos eram racialmente puros, entende-se brancos, caucasianos, não semitas e não africanos; seriam os gregos também superiores, pois eram o primeiro povo civilizado, vale destacar, ocidental, uma vez que separa-se a Grécia do Oriente, tornando-a totalmente europeia. Esse Modelo Ariano derruba o Modelo Antigo, uma vez que este não se mostrava vantajoso às intenções imperialistas do século XIX e XX. O Modelo Ariano tinha uma relação direta com essas intenções. Essa relação que o autor sustenta deste modelo com o século XIX consiste em pontos que fica evidente a vantagem ideológica e política que ele fornece às nações imperialistas europeias. Em uma época em que a Europa estava em plena expansão imperial, ideais de progresso emergiam, juntamente com ideais racistas, e o autor cita até mesmo os ideais românticos, o Modelo Ariano vem legitimar toda essa expansão e otimismo imperialista europeu, uma vez que tomava os gregos como os antepassados culturais dos europeus, como o modelo a ser seguido, e seria o legado europeu, deixado pelos gregos, de civilizar os outros povos. Civilizar, pacificar, estabelecer ordem. Legitimava também a superioridade europeia, permitia a subjugação do resto do mundo não europeu pelo imperialismo. A própria visão sobre a Grécia é abordada por Bernal e as formas como essa se modificou ao longo da história pelos interesses dos países europeus e depois pelos Estados Unidos como na ideia do “eixo ocidental” utilizada na Primeira Guerra Mundial. Diante dessa análise, Bernal mostra como é falho, além de “ser política e culturalmente pernicioso” o Modelo Ariano, e finalmente, menciona a necessidade de uma discussão acerca dessa ideia e uma possível elaboração de um modelo mais próximo do Modelo Antigo que admitiria tanto a origem indo-europeia dos gregos quanto a influência e o intercâmbio cultural entre os gregos e os povos orientais,

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heterogeneidade essa que, para Martin Bernal, seria a verdadeira razão da grandeza dos gregos.

COMENTÁRIOS FINAIS A partir da leitura do artigo de Martin Bernal, é inevitável uma relação com os estudos do britânico Richard Hingley, ainda mais no que diz respeito à elaboração de um discurso que embasasse e justificasse a atuação da Europa na corrida imperialista do século XIX. Ainda em paralelo a Hingley, sobre o que é tratado no artigo “Diversidade e Unidade Cultural” (2009), ambos pesquisadores discorrem sobre como as sedes dos Impérios Coloniais – e posteriormente os Estados Unidos da América – julgaram-se herdeiras da missão civilizadora da Grécia (e da Roma) Antiga. Bernal vai ainda mais além, dissertando sobre como os modelos propostos sobre a origem da Grécia foram usados, inclusive, na justificação da moldagem do autoritarismo de direita na primeira metade do século XX na Europa. Bernal procura, em seus trabalhos, resgatar a origem oriental da Grécia e desmistificar a ideia de que seja essa civilização o “berço” do Ocidente. A negação, pelos estudiosos do século XIX, da origem fenícia (alfabeto) e egípcia (noção de civilidade e culto e nomeação dos deuses), e seus motivos é estudada com afinco pelo britânico. Essa aversão à produção cultural do Oriente (mas não ao Oriente em si), é também explorada pelo palestino Edward Said, que publicou seu livro Orientalismo em 1978, escrevendo sobre a “criação do Oriente pelo Ocidente.” Novamente é posto em cheque as teorias historiográficas elaboradas em um período de particular interesse de quem detinha o intelecto mais influente de escrever uma história eurocêntrica. A atual geração de historiadores tem buscado desenvolver um pensamento crítico para o estudo da própria História, buscando escrever aquilo que seja o mais fidedigno ao real, resgatando o que de fato o passado trouxe até nossos dias. REFERÊNCIAS BERNAL, Martin. “A imagem da Grécia Antiga como uma ferramenta para o colonialismo e para a hegemonia europeia.”, in: Repensando o mundo antigo – 4

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Martin Bernal, Luciano Canfora e Laurent Olivier (Funari, P.P.A. – org.), Textos Didáticos n º 49, IFCH/UNICAMP, 2005. PROFESSOR Martin Bernal, ‘Black Athena’ author, dies at 76 | Cornell Chronicle. Disponível em: . Acesso em 14 de abril de 2015. MARTIN

Bernal



Wikipedia,

the

free

encyclopedia.

Disponível

em:

. Acesso em 14 de abril de 2015. MARTIN Bernal: Historian best known for his controversial 'Black Athena' books



Obituaries



News



The

Independent.

Disponível

em:

. Acesso em 14 de abril de 2015.

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