Ressonâncias do discurso de Dorado Montero no Direito Penal brasileiro

July 11, 2017 | Autor: R. Watanabe de Mo... | Categoria: Direito Penal
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Liberdades.

17 | Publicação do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais |  nº 17 – setembro/dezembro de 2014  |  ISSN 2175-5280  |

Expediente | Apresentação | Entrevista | Spencer Toth Sydow entrevista Ramon Ragués | Artigos | Audiência de custódia e a imediata apresentação do preso ao juiz: rumo à evolução civilizatória do processo penal | Aury Lopes Jr. | Caio Paiva | Reflexões acerca do Direito de Execução Penal | Felipe Lima de Almeida | Existe outro caminho? Uma leitura sobre discurso, feminismo e punição da Lei 11.340/2006 | Mayara de Souza Gomes | A ampliação do conceito de autoria por meio da teoria do domínio por organização | Joyce Keli do Nascimento Silva | Quis, ubii, quibus auxiliis, cur, quomodo, quando? | Tânia Konvalina-Simas | Os problemas do Direito Penal simbólico em face dos princípios da intervenção mínima e da lesividade | André Lozano Andrade | História | Ressonâncias do Discurso de Dorado Montero no Direito Penal Brasileiro | Renato Watanabe de Morais | Resenha de Livro | Jó, vítima de seu povo: o mecanismo vitimário em “A rota antiga dos homens perversos”, de René Girard | Wilson Franck Junior | Milton Gustavo Vasconcelos Barbosa | Resenhas de Filmes | A vida é notícia de jornal. Análises do contemporâneo a partir do filme “O outro lado da rua” | Laila Maria Domith Vicente | Match Point: sorte na vida ou vencer a qualquer preço? | Yuri Felix | David Leal da Silva

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Ressonâncias do discurso de Dorado Montero no direito penal brasileiro Renato Watanabe de Morais

Mestrando do Departamento de Direito Penal, Medicina Forense e Criminologia da USP. Membro efetivo da Comissão de Política Criminal e Penitenciária da OAB-SP.

Sumário: 1. Introdução; 2. Linhas gerais sobre o Correcionalismo de Dorado Montero; 3. A utopia e outros “poréns”; 4. Execução penal; 5. Drogas para uso pessoal; 6. Conclusão e perspectivas; Bibliografia. Resumo: O estudo das escolas penais se faz importante tanto para uma análise crítica do atual Direito, quanto para a propositura de novos modelos que possam vir a aproveitar os pontos positivos propostos ou tentados no passado. A partir da análise da escola Correcionalista, através do pensamento de seu principal precursor, Dorado Montero, buscar-se-á demonstrar que suas ideias, ainda que pouco estudadas deste lado do oceano Atlântico, encontram significativa repercussão e aplicação prática, visando contribuir, assim, com mais um elemento para a análise crítica do atual sistema penal. Palavras­‑chave: Escolas penais. Correcionalismo. Execução penal. Estupefacientes. Moral.

1. Introdução Ao longo de alguns séculos, o ser humano se debruça sobre a complexa problemática de seu próprio convívio com outro ser da mesma espécie que a sua. O dom do racionalismo que foi adquirido acabou por gerar uma dificuldade instransponível. Ora, se aos demais animais, classificados por nós mesmos como irracionais – ainda que, ao final, não se há a confirmação definitiva de tanto – foram dadas ferramentas instintivas e de sobrevivência, aos homo sapiens foi somada a capacidade de abstração e formulação de comportamentos e desejos que acabam transbordando as fronteiras do mero existir. Regras que valham para todos e que, ainda que não gozem de unanimidade, precisam ser respeitadas para que um mínimo existencial coletivo se mostre viável. Quaisquer que sejam suas respectivas naturezas, morais, religiosas, jurídicas, costumeiras, são obstáculos artificiais criados por um grupo – ou mesmo, por um indivíduo – que detém o poder de escolha para a aceitação de um ser no organismo social.



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A ideia contratualista de Estado aparece nesse sentido de criação de uma abstração técnica que, ao limitar uma parcela da liberdade de cada indivíduo, assume a responsabilidade de tornar racional a operacionalização dos anseios contrapostos inseridos na coletividade.1 No entanto, observa-se que essa ideia é passível de contraposição. Engels afirma que o Estado, na realidade, é a prova de que a sociedade se encontra num estágio de conflito econômico interno insuperável. Dessa forma, para que as classes não se extingam num embate infértil, surgiu a necessidade de criação de uma força que estaria acima da própria sociedade, mantendo-a “dentro dos limites da ‘ordem’”.2 Mas essa força não pode ser compreendida como um ente pacificador. Marx afirma que o Estado só existe enquanto órgão de dominação de classes, ou seja, uma classe sendo oprimida por outra, sob o argumento de racionalidade de um Estado neutro e igualitário.3 Assim, a resposta do Estado vai se dar em diversos graus, conforme a classe dominante entender o que é mais ou menos grave de acordo com certos interesses. Esses interesses recaem sobre assuntos que podem ser percebidos por todos, não importando a eventual adesão às demais regras não jurídicas. Assim, não cabe às normas dotadas de sanção estatal a tutela de matérias referentes a questões, por exemplo, de cunho moral ou religioso, visto serem relativas ao arbítrio individual, e não inerentes de toda a coletividade.4 Entretanto, em sendo a lei uma formulação de exercício de poder, o grupo que o detiver, formado por seres humanos com interesses próprios advindos de sua racionalidade, acabará por estabelecer como catraca para o ingresso de novos atores a obediência a um sistema que não é benéfico coletivamente. 1 2 3 4



ROUSSEAU, Jean-Jacques. O contrato social. Trad. Antonio de Pádua Danesi. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999. p. 20. ENGELS, Friedrich. A origem da família, da propriedade privada e do Estado. Trad. Leandro Konder. 9. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1984. p. 191. LENIN, Vladimir Ilitch. O Estado e a Revolução: o que ensina o marxismo sobre o Estado e o papel do proletariado na revolução. Trad. Aristides Lobo. São Paulo: Expressão Popular, 2007. p. 27. Quando se está diante de uma sociedade em que não há margem de manifestação de diferenções acepções morais, está-se observando uma coletividade submissa às vontades que comunicam somente aqueles que possuem o controle dos meios de produção. “Uma vez que a pessoa moral não é outra que não o sujeito da sociedade da produção mercantil, a lei moral deve então manifestar-se como regra das relações entre os proprietários de mercadorias. Isto confere inevitavelmente à lei moral um caráter antinômico. Por um lado, esta lei deve ser social e situar-se assim acima da pessoa individual; por outro lado, o proprietário de mercadorias é, naturalmente, detentor da liberdade (isto é, da liberdade de apropriação e de alienação) de maneira que a regra que determina as relações entre os proprietários de mercadorias deve ser igualmente transposta para a alma de cada proprietário de mercadoria, para que possam constituir sua lei interna. (...) Kant atribuiu a esta forma [seu conceito de moral] uma figura lógica acabada que a sociedade burguesa atomizada se esforçou para transpor para a realidade, libertando a pessoa das amarras orgânicas da época patriarcal e feudal. Os conceitos fundamentais da moral perdem assim seu significado se os desligados da sociedade de produção mercantil e se tentamos aplicá-los a uma outra estrutura social”. PACHUKANIS, Evgeni Bronislávovich. Teoria geral do direito e marxismo. São Paulo: Ed. Acadêmica, 1988. p. 106-107.

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A dramaticidade do cenário se expande quando se verifica o ferramentário desenvolvido para a sistematização do cardápio de ônus e bônus. O Direito vai se valer do meio comunicativo baseado na escrita e acaba por padecer, naturalmente, de seus destinos. A palavra dança num pivô eterno em que se encontra fixa em determinada e certa correspondência simbólica, mas dotada de movimentos giratórios que podem girar, ampliar, reduzir o que ela própria pode significar e o alcance de seus sentidos. O meio de comunicação entre seres humanos não é preciso. Os instrumentos dele decorrentes também não o serão. A situação comunicativa entre os agentes é permeada de diversos fatores que envolvem a própria constituição de cada um.5 O próximo passo da bailarina dependerá da marcação no palco para seu próximo movimento, determinada pelo coreógrafo que detém, afinal, a possibilidade de escolha. Uma criação com fins de estabilização social, que se vale de elementos imprecisos e que busca regular a vida, exemplo perfeito de inexatidão. A norma se mostra como uma lei física incompleta. Para cada ação, há uma reação. A proporcionalidade há de ser dada pela racionalidade, e não pela lei da natureza – enquanto, claro, a lei de talião permanecer nos livros de história do direito. Se a reação será positiva ou negativa, há de se realizar uma profunda e infindável discussão sobre o certo e o errado. Afinal, a correção dos fatos da vida só se verifica perante um paradigma. A intensidade da resposta aos atos negativos dependerá do grau de racionalidade de cada sociedade – racionalidade, aqui, entendida como capacidade de impor limites válidos e coerentes aos anseios bestiais de cada um, sobretudo, novamente, de quem pode determinar o certo e o errado. Não se trata de defender alguma variável anarquista, como em certo momento de sua vida o fez justamente o personagem mais notável da escola penal a ser tratada nesse curto trabalho. Mas de tentar entender os limites da atuação e da eficácia do Direito, tendo em mente o jogo de forças e interesses que motivam o Estado. Se o Direito Penal é a resposta mais severa a uma conduta humana, surge a necessidade de se estudar quais as formas mais razoáveis para a aplicação da sanção. Ou, mesmo, se há razoabilidade alguma na sanção, na existência do próprio Direito Penal. Para tanto, teorias são destrinchadas para buscar justificativas, restrições, alternativas e/ou métodos para a pena. O correcionalismo é uma escola penal que não encontrou solo fartamente fértil para seu desenvolvimento doutrinário no Brasil, muito pela não verificação de seus pressupostos na realidade.6 Consensualmente, suas estrofes encontram métrica

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FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Direito, retórica e comunicação: subsídios para uma pragmática do discurso jurídico. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 57-59. REALE JUNIOR, Miguel. Instituições de direito penal: parte geral. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006. v. 1, p. 56.

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condizente em nossa legislação infanto-juvenil, cujo desenvolvimento se deu de maneira muito próxima à legislação espanhola.7 Contudo, a execução da pena do adulto criminoso, poucas vezes é analisada sob viés correcionalista. Ainda assim, seu estudo se mostra pertinente devido à repetição de discursos que é possível encontrar na doutrina desenvolvida na Alemanha na primeira metade do século XIX e no nosso Direito Penal. Ainda que se argumente pela inexistência de influência direta, diagnosticam-se semelhanças, que acabam por facilitar uma diversificada leitura crítica. Com linhas próximas, que quase se tocam, os defeitos e as belezas de cada um podem passar pelas mesmas observações. Mesmo que não seja feito um estudo apurado, de esgotamento, de todos os pontos de contato, o levantamento de determinadas situações já se mostra suficiente para demonstrar a importância do estudo detido das escolas penais.

2. Linhas gerais sobre o Correcionalismo “Mas uma veshka que não gostei foi quando puseram coisas tipo clipes na pele da minha testa, de modo que as pálpebras foram puxadas para cima, para cima, para cima até que eu não conseguisse fechar meus glazis por mais que tentasse. (...) Era [um vídeo sobre] a Guerra de 1939-45, e havia soldados sendo pregados a árvores com fogueiras acesas embaixo deles e tendo seus yarblis cortados fora, e dava até pra videar a gúliver de um soldado sendo cortada por uma espada, e depois a cabeça rolando com a rot e os glazis ainda parecendo vivos (...) – Parem o filme! Por favor, por favor, parem! Não consigo suportar mais. – E então a goloz do Dr. Brodsky disse: – Parar? Parar, você disse? Ora, nós mal começamos”.8 A ideia de que o sentenciado deve passar por um tratamento, e não sofrer uma mera sanção, um castigo pelo ato cometido, encontrou forte legitimação na escola positivista espanhola, de forma que essa se expressou no que se convencionou chamar de Correcionalismo.9 As primeiras manifestações do Correcionalismo em solo espanhol podem ser percebidas ainda no século XIX, por meio da doutrina de Ramón de la Sagra e de Manuel Montesinos, que acreditavam na correção daqueles que infringiram a norma penal. Os espanhóis encontraram na filosofia de Karl Krause forte influência em seu pensamento dogmático penal, ainda que este não tenha encontrado grande repercussão na Alemanha. Parte-se da ideia de uma concepção política de fraternidade 7 8 9



SHECAIRA, Sérgio Salomão. Sistema de garantias e o direito penal juvenil. São Paulo: RT, 2008. p. 68. BURGESS, Anthony. Laranja mecânica. Trad. Fábio Fernandes. São Paulo: Aleph, 2004. p. 103-107. ANITUA, Gabriel Ignacio. Histórias dos pensamentos criminológicos. Trad. Sérgio Lamarão. Rio de Janeiro: Revan, 2008. p. 324.

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e tolerância, em que o Estado, como consubstanciação da comunidade fraternal, não deveria substituir o privado na busca de sua vingança, mas, sim, na melhoria moral dos membros do organismo social.10 Dentro do Direito Penal, tal viés de melhoria do indivíduo foi construído, na primeira metade do século XIX, pelas mãos de Karl Röeder e sua dissertação Comentatio an poena malum esse debeat.11 A também chamada teoria da melhoria se mostrou presente nos anseios por reformas penitenciárias e almejava a melhora moral das pessoas presas, conforme critérios humanitários. Assim, a pena deixa de ser resposta repressiva estatal e passa a ser um bem concedido ao criminoso. Grande difusor de tal linha de raciocínio foi o catedrático da Universidade de Salamanca Pedro Dorado Montero, embora se alegue ele próprio não tenha feito parte da escola.12 Nascido em 1861, tendo tomado lugar como Professor auxiliar na Faculdade de Direito da Universidade de Salamanca em 1887,13 o estudioso refuta frontalmente a ideia de Garófalo a respeito da existência de um delito natural, de forma que o crime não era nada além de uma criação política,14 ou seja, trata-se de uma qualificação atribuída pelo próprio ser humano (um meio social A ou B) a um terceiro. Não afasta a ideia de determinação da pessoa, mas o que pode ser um crime numa sociedade, será ato heroico em outra.15 Aqui, encontra-se a justificativa para sua negação à inocuização do delinquente: se a sociedade cria o delito, o máximo que ela pode fazer quando este for cometido, é a educação do agente. Ainda que se reconheça a existência de um delinquente nato, ou seja, independentemente da constatação que o crime é fruto social, há pessoas que não gozam de capacidade desde o nascimento de convívio harmônico social, tal reconhecimento em nada afetará, primeiro porque se trata de reconhecimento falho do ponto de vista científico, já que não há como realizar uma verificação objetiva e, segundo, porque isto não lhe retira a necessidade de tratamento.16 Dorado Montero reconhece a danosidade do sistema penal, de forma que se faz necessária sua substituição por um sistema mais justo e mais conveniente tanto para a sociedade/Estado, quanto para o próprio indivíduo a quem recai a pena.17

10 11 12 13 14 15 16 17



Idem, p. 325. BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral 1. 19. ed. rev., ampl. e atual. São Pulo: Saraiva, 2013. p. 111. Idem, p. 112. Biografia de Pedro Dorado Montero, disponível no sítio da Universidade de Salamanca, disponível em: . Acesso em: 3 jan. 2014. ANITUA, Gabriel Ignacio. Op. cit., p. 326. ZAFFARONI. Eugenio Raul. Tratado de derecho penal – Parte general. Tomo II. Buenos Aires: Ediar, 1987. p. 250. MONTERO, Pedro Dorado. Bases para um nuevo derecho penal. Buenos Aires: Depalma, 1973. p. 63. Idem, p. 60.

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Parte, ainda o autor, de um determinismo mitigado, em que o homem estaria pré-disposto a agir de certa forma, mas é o meio social que acaba por prescrever quais são as ações. Concepción Arenal chega a questionar por que, por exemplo, entre homens igualmente desvirtuados, eventualmente apenas um deles chegará a cometer um delito. Sua resposta reside na complexidade da ação humana e na influência que o próprio homem acaba recebendo de outros elementos externos e que não exerce controle.18 “Em outras palavras, o homem é determinado a não ser delinquente, já que não existe a categoria de delinquente nato nem de delito natural, mas sim é a sociedade que diz quais são as condutas delitivas e quais não são”.19 O criminoso tem o direito de exigir da sociedade que seja educado, assim, o direito penal, gerador de dor institucionalizada, passaria a ser um direito protetor dos criminosos. Não seria mais aplicação de uma pena da forma que se concebe, mas, sim, exercício de um direito. A pena não é voltada ao cidadão em abstrato, mas o indivíduo real que, através do crime, demonstrou uma imperfeição que necessita ser emendada. Para Dorado Montero, o Estado deveria tratar os criminosos como pessoas que necessitam de auxílio, visto que seriam seres que não gozam do discernimento necessário e exigido para o convívio social, razão pela qual, inclusive, não haver diferenciação entre imputável e inimputável. O criminoso é um débil de corpo e de espírito, de forma que necessita, não de castigo, mas de fortalecimento e de ajuda.20 Não se observa relevância alguma do conceito de livre-arbítrio, uma vez que o criminoso é um ser que cujas faculdades mentais são prejudicadas por uma anomalia de vontade.21 Para Zaffaroni, esse determinismo presente na obra de Dorado Montero pode ser entendido como a única manifestação do determinismo que realmente é coerente.22 Uma vez não havendo livre-arbítrio, para Montero, não há o que se falar em culpabilidade ou mesmo ius puniendi. A coerência vem justamente da eliminação da responsabilidade individual. A diferença na análise causalista da ação entre a escola correcionalista e a manifestação positivista demonstrada até aquele momento reside no método empregado. Se, de um lado, o positivismo estava baseado na observação empírica, o Correcionalismo aproxima-se do causalismo a partir de uma contemplação apriorística, de cunho mais filosófico que

18 SÁINZ CANTERO, José António. Ideas criminológicas en los ‘estudios penitenciarios’ de Concepción Arenal. In: BAUMANN, Jürgen; HENTIG, Hans von; KLUG, Ulrich et al. Problemas actuals de las ciencias penales y la filosofía del derecho en homenaje al profesor Luis Jiménez de Asúa. Buenos Aires: Pannedille, 1970. p. 600. 19 ANITUA, Gabriel Ignacio. Op. cit., p. 326. 20 MONTERO, Pedro Dorado. Op. cit., p. 63. 21 BITENCOURT, Cezar Roberto. Op. cit., p. 112. 22 ZAFFARONI. Eugenio Raul. Op. cit., p. 249-250.



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técnico-científico propriamente dito.23 Assim, para o primeiro, o que era o resultado de uma aplicação no plano fático do método indutivo, para o segundo, era um dedução filosófica. Aqui, Mir Puig acaba por, se não discordar, ao menos não concordar em plenitude com Zaffaroni, pois, pelo acima exposto, se o positivismo rechaça por completo o livre-arbítrio, não necessariamente o faz o Correcionalismo.24 De qualquer forma, quanto ao criminoso natural, como já abordado, Dorado Montero deixa claro que sua (in)existência é irrelevante para o que se propõe. A responsabilidade penal deve ser tratada como coletiva. O fenômeno delitivo seria resultado de uma série de elos envolvendo questões sociais e históricas, de maneira que, como elas tiveram influência direta na deformidade do indivíduo – este fruto daquela –, a falta por ele cometida há de ser distribuída sobre toda a comunidade.25 Serão entendidos como criminosos, conforme a escola, todos aqueles que atentem às regras médias determinadas por um determinado meio social. Pode ser taxada como tal qualquer pessoa que esteja em desacordo com o imposto pela sociedade (ou, ao menos, por aqueles que conseguem impor seus critérios) como necessário para uma vida social organizada.26 Ainda assim, entende-se que todas as pessoas podem possuir alguma utilidade pública. A estranheza proposital da oração é o argumento que impede que seja adotada a inocuização ou mesmo a sentença final ao criminoso. Inicialmente, solução injusta, já que o indivíduo cometeu o crime por uma manifestação de sua deficiência e não de sua vontade, e insensata, pois não resolve a problemática social, visto que o delito é criação política,27 e mesmo que não aparentemente, todo homem tem alguma característica que pode ser aproveitável.28 “Esta utilização dos delinquentes, que aparenta ser a forma mais racional, e a seu tempo, a mais conveniente, de tratá-los, pode se dar de diversas maneiras: desde a aplicação das penas usuais com fins de intimidação, de coação psíquica, de prevenção especial, ou de correção, até o uso de procedimentos higiênicos, fisiológicos, ginásticos, alimentares, pedagógicos (...). Todos eles, sem embargo, adentram-se

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MIR PUIG, Santiago. Introducción a las bases del derecho penal. Concepto y método. 2. ed. Montevidéu: B de F, 2003, p. 269. Idem, p. 270. MONTERO, Pedro Dorado. Op. cit., p. 74-75. Idem, ibidem, p. 63. ZAFFARONI, Eugenio Raul. Op. cit., p. 250. Na página seguinte, Zaffaroni realiza uma pequena digressão a respeito da aparente contradição presente no pensamento de Montero: “O pensamento de Dorado parece sofrer de uma contradição, que assinala Antón Oneca, porque se o relativismo valorativo nos leva a afirmar que um sistema de valores se impõe somente pela força, não se enxerga o porquê de se ter que renunciar ao uso da força para intimidar aqueles que são mais débeis. Rivacoba trata de demonstrar que não há contradição porque Dorado se refere a um Estado cooperativo futuro e Antón o trata sob uma ideia de Estado contemporâneo” (tradução livre). 28 MONTERO, Pedro Dorado. Op. cit., p. 64.



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no conceito geral de proteção e auxílio, se bem empregados, conquanto ao mesmo tempo caritativos, que servem a certos indivíduos deles necessitados”.29 A função da justiça penal, por seu pensamento, caso almeje-se pelo ideal da racionalidade, é de buscar uma resposta ao fato da vida visando à conservação e melhoramento do organismo social, de forma a limpar, curar, qualquer enfermidade que possa se mostrar presente. Recuperar a célula danosa, impedir que produza maiores danos e fazer com que volte a ser funcional para o corpo. Há de se impor como objetivo da administração da justiça a higienização e a profilaxia social. Desaparece, afinal, o juiz, o Estado personificado numa pessoa severa, austera e aurora-se a figura de um médico indulgente, sabedor dos augúrios humanos que trabalha para salvar o delinquente e tratar para que não recaia em sua enfermidade.30 Aproximase do exercício da medicina clínica, com uma minuciosa pesquisa que precise com exatidão diagnóstico, prognóstico e tratamento. Para tanto, o julgador não pode ser mais aquele que tem predominante expertise nas letras jurídicas. Deve, pois, expandir sua cultura científica. A mera combinação, obscura para maior parte populacional, de normas de complexa cognição reproduzida em códigos e leis estatais, em verdade pode se mostrar danosa,31 pois pode tolher a capacidade do juiz em encontrar o melhor remédio para a enfermidade do criminoso-paciente,32 além de impor-lhe uma preocupação que acaba retirando-lhe daquilo que deveria ser seu principal foco: a emenda da pessoa em prol da sociedade. O grau de conhecimento dos novos juízes penais deve ser elevado em todas as ciências que contribuem para o aperfeiçoamento do indivíduo. Nenhum campo do conhecimento humano ou mesmo as enfermidades individuais devem ser alienígenas ao julgador do novo direito penal proposto. Questiona-se, inclusive, a necessidade de conhecimento do Direito. Bastaria o bom conhecimento e o bom senso para que alguém pudesse assumir o posto de juiz, desde que pudesse se valer do todo o arbítrio que seu conhecimento lhe possa oferecer.33 A lei pode assumir até um caráter impeditivo no escopo de término da delinquência, já que os julgadores estão à ela atados. Em verdade, ela até pode existir, desde que sua aplicação não seja compulsória e o juiz possa decidir pela sua aplicabilidade.34 29 30 31 32 33 34



Idem, ibidem, tradução livre, p. 64-65. Idem, p. 65. Idem, ibidem, p. 69-70. Idem, p. 81. Idem, p. 82. Idem, p. 85.

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Um item que mereceu grande dedicação de Dorado Montero foi, por consequência lógica de sua linha de raciocínio, a individualização da pena. Reforça que se deve evitar tratamentos genéricos, mas, sim, uma análise cada vez mais profunda na condição em que o sentenciado se encontra. Insiste no discurso: para estabelecer um plano de cura, faz-se necessário um estudo individualizado e conforme o caso concreto. Por vezes, nem mesmo a enfermidade per si é importante, mas as circunstâncias específicas da pessoa que a faz manifestar. Não se trata de castigar delitos, mas de curar criminosos.35 Como o foco está totalmente no indivíduo, o dito direito penal moderno dá grande importância para o passado do criminoso. Se para o direito repressivo, não haveria grande destaque para os antecedentes, já que a pena seria independente desses fatores, pois o que se julga é o fato, para o direito moderno, de cunho preventivo,36 o passado do criminoso abunda em relevância. Inclusive o histórico familiar deve ser levado em consideração para que se tenha um diagnóstico preciso.37 O crime visto autonomamente acaba assumindo um papel secundário, pois um ato isolado não pode ser entendido como determinante para qualificar um ser.38 Portanto, o foco do Direito Penal não residiria mais no grau de lesão, mas na periculosidade do agente.39 Interessante notar que, para Dorado Montero, o modelo aqui proposto resolveria uma das questões que suscitam grandes discussões até hoje: a necessidade de harmonização racional entre as sanções penais e as sanções de cunho administrativo.40 Em ambas, observa-se um desrespeito a uma previsão normativa, uma falha volitiva do agente, logo, a resposta deve ser a mesma. A problemática relativa à tentativa e à consumação também perderia relevância, já que não se julga mais o ato em si, pois não houve a consumação por ato alheio ao poder de atuação do agente.41 Em suma, a pena a ser aplicada há de ser a privativa de liberdade,42 para que a medida saneadora possa ser aplicada e não pode ficar limitada a um prazo determinado, persistindo até a cura do sujeito. O arbítrio judicial deve ser o mais amplo 35 Idem, p. 75-76. 36 Nesse sentido Montero vai entender que é possível até um agir prévio ao cometimento de qualquer ato delinquente, uma antecipação total de tutela. “(...) a função penal no sentido moderno, profilático e terapêutico, pode e deve entrar em ação, ainda que não haja delinquentes (...), isto é, indivíduos perigosos de quem se pode fundadamente temer, vistos seus antecedentes e conduta anterior, que cometerão delitos amanhã, e mesmo quando, até o momento, não tenham cometido delito algum. O médico social não necessita, pois, esperar para que o delito se consuma; basta-lhe a ameaça de sua provável comissão próxima (...)” (Idem, ibidem, tradução livre, p. 79-80). 37 Idem, p. 78. 38 Idem, p. 79. 39 Idem, p. 81. 40 Idem, p. 85. 41 Idem, Ibidem. 42 BITENCOURT, Cezar Roberto. Op. cit., p. 112. Neste ponto, observa-se discordância com o autor da referência. Uma das leituras possíveis da concepção de Dorado traz a ideia de que a pena não necessariamente deve ser a de privativa de liberdade, mas, aquela adequada ao sujeito em questão, que,



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possível no que tange à individualização da pena, numa operação médico-clínica em que há de se verificar qual o melhor remédio para a doença específica do paciente. A função da pena é de tutela social, já que se trata de um homem perigoso, mas que, com o tratamento adequado, pode vir a ser útil para a coletividade.43

3. A utopia e outros “poréns” O posicionamento de Dorado Montero é permeado de contradições que podem ser compreendidas pelo seu posicionamento político e filosófico. De formação católica, acabou abandonando a religião quando de seu doutorado em Madri, mesmo que nunca tenha proferido uma palavra posterior de discordância ou negação. Tal fato ocorreu, pois acabou por sofrer forte influência da doutrina filosófica de Krause, graças ao seu Professor Francisco Giner de los Ríos e do contato com o positivismo italiano.44 A publicação da obra Bases del nuevo derecho penal acabou, inclusive, por gerar um incidente com o clero de Salamanca, para onde retornou e obteve sua cátedra. “Por ocasião de sua obra Bases del Nuevo Derecho Penal, um incidente penoso ocorreu com o bispo de Salamanca, que o excomungou já que professorou ideias ‘lombrosianas’ ideias, quando, em verdade, as combateu Dorado”.45 Ele ainda pode ser entendido como um anarquista em transição para o socialismo. Quando postula por um juizmédico sem amarras do Direito, em última análise, apregoa uma redução severa daquele que é o principal instrumento de manifestação estatal. Ao mesmo tempo, era um defensor das ideias socialistas,46 tendo escrito muitos textos e conferido palestras defendendo a ideologia.47

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eventualmente, pode até ser a de prisão. Concepción Arenal, inclusive, dedicou grande parte de seus estudos ao tema penitenciário, sempre inclinada para sua redução (Cf. SÁINZ CANTERO, José António. Op. cit., p. 597). Idem, ibidem, p. 112-113. ZAFFARONI, Eugenio Raul. Op. cit., p. 246. Idem, ibidem, tradução livre, p. 247. Idem, p. 251. CALI, Edmundo René Bodero. Pedro Dorado Montero, el desmitificador de la Salamanca. In: Homenaje póstumo al Dr. Edmundo Durán Díaz. Santiago de Guayaquil: Facultad de Jurisprudencia de la Universidad Católica de Santiago de Guayaquil, 2002, disponível em: . Acesso em: 4 jan 2014, p. 38.

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Se, por um lado, dá-se plena liberdade para que o juiz possa estabelecer o melhor tratamento para o criminoso, mediante uma análise individualizada e concreta, por outro lado, abre-se a possibilidade do surgimento de um juiz-rei. Quando de sua formulação nos moldes burgueses, o Direito passa a ter o escopo de limitação dos poderes soberanos da monarquia. Com o desenvolvimento da sociedade capitalista, o Direito ganha um viés de legitimador do status quo estabelecido por aqueles que detêm a maior parcela de poder que são os monopolizadores da produção mercantil, como já aqui referido. Não havendo mais espaço para o desenvolvimento burguês, resta o término do modelo monárquico e a reformulação de uma nova dinâmica de poder. O discurso e a técnica do direito tiveram, ao longo da história, a função de dissolver o fato da dominação dentro do poder para fazer aparecer duas coisas. De um lado, os direitos legítimos da soberania e, de outro, a obrigação legal da soberania. Foucault, ao longo de seus estudos, tenta estudar o direito não somente como uma ferramenta de dominação, mas, também, até que ponto e sob que forma o direito põe em prática, veicula relações que não são relações de soberania, mas sim de dominação. Por dominação, não se deve entender o fato de uma dominação global de um sobre os outros, ou de um grupo sobre o outro, mas as múltiplas formas de dominação que podem se exercer na sociedade.48 Se Dorado Montero consegue perceber que o crime é uma construção e que seu conteúdo é variável muito antes do desenvolvimento plena da ideia de que o crime não existe enquanto entidade ontológica (algo que só vai ocorrer muitas décadas adiante, com o desenvolvimento da criminologia crítica), ele acaba pecando quando defende o retraimento do direito quando da aplicação da sanção. Uma vez sendo a lei o instrumento que externaliza a vontade de uma minoria oriunda de classes privilegiadas que pode manipular o conjunto social em seu favor, quando se propõe uma total liberdade àqueles que são dotados de um conhecimento científico suficiente para cuidar das mais diversas enfermidades humanas, acaba por defender uma mera mudança do monopólio do poder. Talvez, um monopólio ainda mais evidente, já que se baseia numa suposta meritocracia científica. A ideia de Montero é de tratar o criminoso como enfermo, transformando o aparato penal em um grande sistema de saúde, pronto para devolver pessoas emendadas à sociedade. Essa visão utilitarista acaba se mostrando mais uma contradição em seu pensamento, pois, advogado dos pensamentos socialistas acaba por atender à demanda capitalista liberal de reabastecimento de mão de obra.49 Numa sociedade industrial, com o aumento exponencial da produção e da 48 FOUCAULT, Michel. Soberania e disciplina. Microfísica do poder. Trad. e Org. Roberto Machado. Rio de Janeiro: Ed. Graal, 1979. p. 181. 49 Sobre o uso do aparato penal para conter o avanço da pobreza, WACQUANT, Loïc. Punir os pobres: a nova gestão da miséria nos Estados Unidos. Trad.



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demanda, não é interessante a existência de uma parcela muito grande da população que não esteja em acordo com os valores e regras vigentes e, ainda, não produzindo.50 Essa mecânica foi observada justamente quando do desenvolvimento da medicina social a partir do século XVIII. Em suas pesquisas, Foucault trabalhou com a seguinte hipótese: a medicina moderna se tornou individual porque penetrou no interior das relações de mercado, tendo em vista a economia capitalista que zela pela relação médico-doente, preterindo, assim, a dimensão global, coletiva da sociedade.51 Foucault mostra o contrário. Em verdade, a medicina moderna é uma prática social que domina uma tecnologia do corpo e tendo apenas como um de seus usos o tipo individual, que acaba por valorizar essa relação médico-doente. Para esclarecer essa indagação, Foucault menciona que na história da medicina na Idade Média, prevalecia a medicina do tipo individualista, de forma que as dimensões coletivas seriam discretas e limitadas.52 Por este e por outros indícios, Foucault prefere a hipótese de que o capitalismo, a partir do fim do século XVII em diante, em vez de ter transformado a medicina coletiva em privada, fez justamente o contrário. Ocorre a socialização da medicina, pois o corpo se torna força de produção, força de trabalho, existindo o interesse, desta forma, de controlar a sociedade por meio do indivíduo. Investe-se, primeiramente, no âmbito biológico, somático e corporal, para só em seguida controlar as consciências e ideologias.53 O corpo se transforma em uma realidade biopolítica e a medicina passa a ser uma estratégia biopolítica, que serviu e serve para o controle do corpo. Mas, apesar do corpo ter sofrido investimentos político e sociais como forma de trabalho, esta não foi a primeira forma assumida pela medicina e, sim, a última, já na segunda metade do século XIX. O mercantilismo era a teoria econômica ou prática política que predominava nas ações e decisões daquele momento. Com o objetivo de melhor controlar a produção e, por sua vez, a quantidade de população ativa, a Alemanha desenvolve a chamada política médica de Estado. Este sistema teria um modo muito mais completo de observação da morbidade, ao requerer a contabilidade de médicos e hospitais das diversas regiões da Alemanha, além do registro dos diferentes fenômenos epidêmicos ou endêmicos. Eliana Aguiar. 2. ed. Rio de Janeiro: Revan, 2003. p. 19 e ss. 50 Bauman trata, inclusive, da importância de estar inserido na sociedade de consumo, não apenas na movimentação da máquina econômica, mas, também, na própria criação da identidade do indivíduo. Modernidad líquida. Trad. Mirta Rosenberg. Buenos Aires: Fondo de Cultura Económica, 2004. p. 82 e ss. 51 FOUCAULT, Michel. O nascimento da medicina social. Microfísica do Poder. Trad. e Org. Roberto Machado. Rio de Janeiro: Ed. Graal, 1979. p. 79. 52 Idem, ibidem, p. 80. 53 Idem, ibidem.



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Essa mesma lógica pode ser transposta ao pensamento correcionalista se levar em consideração a ideia de utilidade social que o criminoso pode vir a ter, caso passe pelo tratamento. Inclusive, há um ponto importante que toca os dois últimos tópicos aqui levantados. Neste trabalho de melhoria do criminoso, por meio do remédio receitado pelo médico-juiz, há de se questionar quando seria a “alta” do paciente. Em outras palavras, uma vez que a pena somente se encerraria quando o criminoso estivesse curado, esta cura deve ser tomada em comparação a um paradigma. Este, por sua vez, nada mais é que o padrão valorativo imposto pelo juiz, que faz parte, como já aludido, de uma camada social muito específica. Dorado Montero deixa muito clara sua intenção de melhoria moral do criminoso. Mas permanece a crítica de o que seria esta moral. Em um Estado Democrático de Direito, a legitimidade do Direito Penal é resultado do reconhecimento do livre desenvolvimento da personalidade de seus cidadãos. Dessa forma, o Direito Penal é incompatível com o desejo de limitar a individualidade de cada ser humano, ainda que se trate de um preceito moral dominante. “(...) a imoralidade ou a reprovabilidade ética de um comportamento não podem legitimar uma proibição penal, se os pressupostos de uma convivência pacífica não forem lesionados. Não se pode fundamentar a punibilidade do homossexualismo, alegando trata-se de uma ação imoral, pois um comportamento que se desenrola na esfera privada, com o consentimento dos envolvidos, não tem quaisquer consequências sociais e não pode ser objeto de proibições penais”.54 O exemplo de Roxin acerca da homoafetividade é muito sintomático neste aspecto. Há de se recordar que a prática foi considerada crime por grande parte do século XX em diversos países europeus.55 Ou seja, por uma concepção moral de o que viria a ser correto ou errado, cria-se um tipo penal que exalta o suposto valor social ainda que contrário ao próprio humanismo apregoado pelos estudiosos do Correcionalismo. Se é verdade que o Direito estabelece uma relação de poder, é verdade que acaba por efetivamente limitar o arbítrio estatal. Desde que, claro, assuma-se uma posição de diálogo com a referida ideia de Estado Democrático de Direito. Ideologia, esta, que se desenvolve mais tecnicamente ao longo do século XX, sobretudo com as ondas renovatórias do constitucionalismo, e que, portanto, não haveria como cobrar tal senso crítico de Montero.

54 ROXIN, Claus. Estudos de direito penal. Trad. Luís Greco. 2. ed. rev. Rio de Janeiro: Renovar, 2008. p. 37. 55 Para fins de exemplo, cabe citar a Romênia, cuja criminalização da homossexualidade deixa de vigorar em 2001. A Bulgária já havia tomado esta posição em 1951, a Noruega em 1972, Portugal, em 1982 e a Alemanha revoga o §175 de seu Código Penal em 1994 que, originalmente, além de relações homoafetivas, condenava a relação entre pessoas e animais.



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Está-se diante de um modelo de Estado em que se pauta na defesa e na garantia de voz por parte das minorias, sejam elas, sob o aspecto numérico, social ou cultural. Sobretudo, quando se tem em mente uma população diversificada. Cada grupo social terá, por fatores sociais e psicológicos, infinitas reações diversas a um mesmo comportamento. Dorado Montero, como exposto, compreende que o que é crime num local, pode ser um ato heroico em outro. Porém, reside aqui outro ponto de conflito de sua teoria. Se o conceito de crime é volátil, indaga-se qual o parâmetro e qual a justificativa para o poder do juiz em determinar uma correção ao criminoso, sendo que seu ato pode ser potencialmente positivo. Assim sendo, é importante sacramentar que não se pode confundir democracia, com o poder nas mãos de uma maioria numérica. Um Estado Democrático de Direito é aquele que garante condições materiais igualitárias de convívio entre esses diversos grupos.56 Posto isto, e relembrando que a suposta moral uniforme da sociedade não exista de fato, é imperativo o entendimento que não cabe ao Direito Penal tolher a liberdade de algumas parcelas da sociedade por questões axiológicas que elas não compartilham por ferir seus princípios de autodeterminação como pessoas. Um Direito Penal que acolha para si questões de ordem ética será um Direito conservador e obstáculo às transformações sociais de toda natureza.57 Há de se reputar a plausibilidade quando Antón Oneca afirma a insensatez em tachar por completo a teoria de Dorado Montero de utópica.58 Entretanto, não há como se furtar em identificar algumas propostas irrealizáveis do autor. Ainda que se acredite que na possibilidade de conceber o juiz-médico que cuide do criminoso-paciente, é sobrehumano a propositura de que, para assumir tal posição, o julgador há de ter um conhecimento tão abrangente e completo das ciências terrenas. Se há de se estudar todas aquelas que podem interferir na melhoria do criminoso, mesmo as ciências médico-biológicas vão se mostrar insuficientes.

56 “É um tipo de Estado que tende a realizar a síntese do processo contraditório do mundo contemporâneo, superando o Estado capitalista para configurar um Estado promotor de justiça social que o personalismo e o monismo político das democracias populares sob o influxo do socialismo real não foram capazes de construir”. SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 29. ed., rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 120. 57 BECHARA, Ana Elisa Liberatore Silva. Da teoria do bem jurídico como critério de legitimidade do direito penal. 464 p. Tese (Livre-Docência em Direito) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010, p. 327. 58 ANTÓN ONECA, José. La utopia de dorado montero. Salamanca: Universidad de Salamanca, 1950. p. 86.



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Ademais, não se mostra viável prescindir totalmente da ideia de sanção, seja no Direito Penal, seja em qualquer outra manifestação de relação humana.59 A própria ideia de “corrigir”, “emendar”, só se mostra possível caso tenhamos uma convenção de o que seria certo e o que seria errado. Bem verdade, que para Dorado Montero tal conclusão pareceria óbvia, pela alta carga moralista presente em sua obra. Todavia, o que seria a correção senão a pena pelo ato errado? O estigma da pena permaneceria, mas com outra roupagem. Daí a afirmar que não cabe a sanção sem prazo determinado, mesmo que com o viés sanitarista proposto pela escola penal. Mesmo que se foque no que seria melhor para o delinquente, não deixaria de ser uma retribuição pelo o que ele fez. Ainda assim, prossegue Antón Oneca afirmando que “Ainda fiéis ao conceito tradicional que identifica o pensamento utópico com o irrealizável, temos que reconhecer que a utopia é o que governa o mundo, já que este tem se movido sempre a partir de ideais que permitiam a aproximação, mas nunca a realização completa”.60 A utopia é inerente a qualquer modelo de contenção social que visa à eliminação completa dos conflitos gerados no âmbito da coletividade, ou mesmo que objetiva a “cura” de todos os males que assombram a sociedade. Porém, não é dado afirmar a baixa eficácia dos pensamentos ditos utópicos. Como toda escola doutrinária, o Correcionalismo trouxe aperfeiçoamentos, agregou ideias pretéritas e apontou falhas teóricas que ainda ecoam no Direito Penal atual. Não obstante, os institutos que exercem alguma influência ou gozam de similitude de conceitos com a escola sofrerão (e devem sofrer) as mesmas críticas, com o intuito de atingir seu aprimoramento técnico-racional, ou, até mesmo, levando à conclusão de sua necessidade de limitação.

4. Execução penal É costumeiro e correto afirmar que o Correcionalismo vai encontrar maior campo, no Direito brasileiro, no que diz respeito ao direito juvenil. Toda a estrutura que se encontra presente no Estatuto da Criança e do Adolescente estaria voltada para um tratamento ao jovem com caráter muito mais auxiliador, com uma ampla gama de direitos e, mesmo quando da incidência de uma medida socioeducativa, o foco principal reside na integração do jovem ao meio social, antes de uma mera retribuição – ainda que isto não se verifique na realidade em que é possível afirmar que a medida socioeducativa de internação não passa de antecipação da maioridade penal.61 59 Idem, ibidem, p. 85. 60 Idem, p. 86. 61 Opinião exarada pelo estudioso Fábio Mallart, que acompanhou a rotina da Fundação Casa, local de cumprimento de medida socioeducativa de internação



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Entretanto, pouco destaque será dado a esse aspecto neste trabalho, por não ser este o foco principal. Mesmo que não se esgote o tema, passar-se-á ao elenco de alguns exemplos dentro do âmbito da execução penal de como o Correcionalismo, juntamente com suas críticas e notas, se faz presente. Assim que se inicia a leitura do principal diploma legislativo acerca do tema, é possível encontrar alguns postulados da escola penal. Logo no art. 1.º, a Lei 7.210/84 dispõe: “A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado”. A própria noção de integração é condizente à escola aqui estudada, afinal, se o sentenciado não conseguiu encontrar seu papel dentro da sociedade em que se está inserido, caberia à execução de sua pena o trabalho de integrá-lo. Porém, observa-se, na realidade brasileira, uma arapuca em que o indivíduo não consegue encontrar meio de evitar sua captura. Numa sociedade de grande valorização do consumo, com grande incentivo por parte do próprio Estado, que todos os dias se reúnem em cúpulas para decidir qual a melhor forma de fazer os cidadãos consumirem, mas que encontra profundas cisões sociais, é de grande desproporcionalidade exigir uma adesão completa de todos os cidadãos ao Direito posto.62 Dessa forma, não se trata de pessoas com defeitos na formação de sua vontade. Pelo contrário, são indivíduos que buscam justamente se enquadrar no modelo que a eles foi imposto, porém, sem a oferta das condições para tanto.63 “O suposto monolitismo da ordem social, baseado em um hipótetico consenso, entrou em crise, diante da evidência de que a moderna sociedade democrática é uma sociedade pluralista, antagônica e estratificada, onde coexistem numerosos grupos e subgrupos, com seus respectivos códigos de valores, que tratam de conquistar um espaço social e, sendo possível, o próprio poder político”.64 Observa-se um Estado omisso, que acaba se mostrando para o cidadão somente enquanto Estado-polícia, com o uso do aparato repressivo penal, com a manutenção de forças militares para dirimir conflitos civis até a execução da pena

no Estado de São Paulo. Disponível em Portal PONTE. Na prática, SP já reduziu a maioridade penal, diz antropólogo. Disponível em: , acesso em: 25 ago. 2014. 62 Sobre a grande importância que os delitos patrimoniais ainda têm no espectro de detentos no Brasil, ver SALVADOR NETTO, Alamiro Velludo. Direito penal e propriedade privada: a racionalidade do sistema penal na tutela do patrimônio. Tese (Livre-Docência em Direito) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2013. 63 Pautando-se na teoria da anomia de Robert Merton, seriam aqueles adeptos à inovação, ou seja, aderem aos objetivos propostos pela sociedade, mas procuram seus próprios caminhos para alcançá-los. Cf. SHECAIRA, Sérgio Salomão. Criminologia. 2. ed., São Paulo: RT, 2008. p. 226. 64 GARCÍA-PABLOS DE MOLINA, Antonio. O que é criminologia?. Trad. Danilo Cymrot. São Paulo: RT, 2013. p. 127.



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privativa de liberdade. E, ainda assim, uma execução falha, em que grande parte da Lei de Execuções Penais, e mesmo da Constituição Federal, são sumariamente ignorados. O cenário se torna mais problemático quando se tem em consideração o chamado regime disciplinar diferenciado, doravante RDD. Tal regime se encontra previsto no art. 53 da Lei 7.210/1984 e trata-se de uma sanção disciplinar (apesar do nome “regime”)65 voltada para o sentenciado entendido como de grande perigo conforme algumas hipóteses previstas em lei.66 A lei entra em rota de colisão. Se, de um lado busca uma execução harmônica com a integração social, ao mesmo tempo impõe um regime sancionatório extremamente severo que acaba por retirar ainda mais a humanidade da pena. Do ponto de vista correcionalista há, também, uma dúbia situação. Considerando seu viés humanista, o RDD vai contra os postulados da doutrina. Todavia, pode até ser visto como uma individualização da pena, pois, alguns detentos haveriam de receber tratamentos mais ou menos severos, conforme o respectivo desenvolvimento ao longo da “terapêutica penal”.67 Com claro viés inocuizador, de um ponto de vista moral, o RDD se aproxima das penitencias do Direito Canônico, com o devido isolamento do resto da sociedade para que haja a reflexão acerca dos seus atos cometidos. Ou seja, é possível sua justificação. Outra reminiscência correcionalista é encontrada no art. 31 do mesmo diploma legal, assim redigido: “O condenado à pena privativa de liberdade está obrigado ao trabalho na medida de suas aptidões e capacidade”. A legislação executória penal entende que o trabalho é uma forma eficaz de contribuir com o aperfeiçoamento da inserção social do preso.68 Longe de questionar o direito do preso em requisitar o trabalho, porém alguma dúvida resta

65 JUNQUEIRA, Gustavo Octaviano Diniz; FULLER, Paulo Henrique Aranda. Legislação penal especial. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. v. 1, p. 26. 66 Assim dispõe a Lei de Execuções Penais:

“Art. 52. A prática de fato previsto como crime doloso constitui falta grave e, quando ocasione subversão da ordem ou disciplina internas, sujeita o preso provisório, ou condenado, sem prejuízo da sanção penal, ao regime disciplinar diferenciado, com as seguintes características: I – duração máxima de trezentos e sessenta dias, sem prejuízo de repetição da sanção por nova falta grave de mesma espécie, até o limite de um sexto da pena aplicada; II – recolhimento em cela individual; III – visitas semanais de duas pessoas, sem contar as crianças, com duração de duas horas; IV – o preso terá direito à saída da cela por 2 horas diárias para banho de sol. (...)§ 2.º Estará igualmente sujeito ao regime disciplinar diferenciado o preso provisório ou o condenado sob o qual recaiam fundadas suspeitas de envolvimento ou participação, a qualquer título, em organizações criminosas, quadrilha ou bando”. 67 Não são poucos os julgados que ainda entendem a execução da pena como medida terapêutica. Ex. TJSP, Ag Exec. Penal 0009573-77.2014.8.26.0000, rel. Ivan Sartori, j. 01.04.2014, public. 11.04.2014: “Terapêutica criminal que, no caso concreto, recomenda a observância do sentenciado no regime em que se encontra”. 68 JUNQUEIRA, Gustavo Octaviano Diniz; FULLER, Paulo Henrique Aranda. Op. cit., p. 12.



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quanto à obrigatoriedade, como dispõe a lei. O trabalho e todo o valor carregado por ele são imposições de uma sociedade que precisa de pessoas úteis para sua expansão produtiva.69 A própria pena privativa de liberdade acaba por afastar ainda mais o indivíduo da sociedade, isolando-o ainda mais, como preconizam os estudiosos de fenômenos como o labelling approach (social) e a prisionização (psicológico). Diz Alvino Augusto de Sá: “(...) a vida carcerária é uma vida em massa. Sobretudo para os presos, evidentemente. Como conseqüência, ela lhes acarreta, dependendo do tempo de duração da pena, uma verdadeira desorganização da personalidade, ingrediente central do processo prisionização. Entre os efeitos da prisionização, que marcam profundamente essa desorganização da personalidade, cumpre destacar: perda da identidade e aquisição de nova personalidade; sentimento de inferioridade; empobrecimento psíquico; infantilização, regressão (...)”.70 Dessa forma, não há como se afirmar que a execução penal é dotada de algum caráter ressocializador, sobretudo quando se encara uma realidade prisional com mais de 700 mil de presos e muitos perdendo a vida do mesmo modo que os soldados perderam as suas no filme assistido por Alex, durante uma das sessões do tratamento Ludovico por ele sofrido. O período recluso acaba por trazer muito mais danos que efetivamente benefícios, razão pela não cabe falar em terapêutica penal. Em última análise, a reintegração social, com sua similitude com a ideologia da correção do detento, e a aplicação da atual resposta legal (e, sobretudo, na prática) são verdadeiros oxímoros. Mesmo assim, como aludido em nota, não é raro encontrar na prática forense o uso de termos como “reeducando” ou “terapêutica penal”. Apenas a título exemplificativo, sem o rigor científico que poder-se-ia fazer necessário, apresenta-se o resultado de uma rápida pesquisa realizada junto ao mecanismo de busca de jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. No campo Pesquisa Livre, inseriu-se “reeducando”, a conjunção “e” e a palavra “penal”, para que o sistema buscasse somente por acórdãos em que ambos os termos principais estivessem no texto. Para verificar a atualidade, restringiu-se o período do julgamento das decisões entre 01.01.2013 e 20.12.2013. A busca resultou em 42 acórdãos que, verificados, realmente se tratavam de execução penal e a palavra “reeducando” era utilizada no lugar de sentenciado, condenado, e outros termos que podem ser utilizados a quem se aplica a pena. É 69 Sobre a importância da obediência e imposição da disciplina para a criação de corpos dóceis para a sociedade, FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. Trad. Raquel Ramalhete. 20. ed. Petrópolis: Vozes, 1999. p. 117 e ss. 70 SÁ, Alvino Augusto de. Criminologia clínica e psicologia criminal. São Paulo: RT, 2007. p. 115-116.



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temerário o uso de palavras com significados tão simbólicos e distintos como se sinônimos fossem. Considerando o sistema carcerário nacional, não é possível afirmar que sua estrutura se pauta no viés educacional.

5. Drogas para uso pessoal Outro exemplo de reflexo da doutrina Correcionalista em nosso Direito é observada no art. 28 da Lei 11.343/2006, que regula o tratamento jurídico no Brasil acerca do uso e do comércio de entorpecentes. Assim se encontra redigido o dispositivo legal: “Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas: I – advertência sobre os efeitos das drogas; II – prestação de serviços à comunidade; III – medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo”. Está-se diante de rara hipótese de previsão de crime, sem a respectiva cominação em pena privativa de liberdade. O legislador define, desde pronto, a imposição de alguma espécie de pena restritiva de direitos. Salta aos olhos do estudioso o caráter eminentemente moral das sanções ali prevista, visto não haver intenção retributiva de imposição de dor por parte do legislador, mas, sim, de corrigir o usuário. Ainda que o condenado não venha a encontrar sua liberdade restringida da forma mais severa prevista, observa-se que ele ainda se vê obrigado a se submeter ao tratamento estatal por uma conduta que lesão nenhuma traz à sociedade,71 pressuposto elementar do tipo penal consubstanciado pelo princípio Nullum crimen nulla poena sine iniuria.72 Ainda que se defenda que o consumo de drogas é potencialmente perigoso para o convívio em coletividade, a lesão direta se verifica somente em relação ao usuário. No que tange aos demais indivíduos, há antecipação da tutela penal, sobre um delito que seria de perigo abstrato.73 A pena se mostra somente com o intuito de reforçar a suposta reprovação que a sociedade externaliza no que tange ao uso de substâncias ilícitas. Observa-se algum diálogo com as características de uma conduta classificada como

71 SCHEERER, Sebastian. Dominação ideológica versus lazer psicotrópico. In: RIBEIRO, Maurides de Melo, SEIBEL, Sérgio Dario (org.). Drogas: hegemonia do cinismo. São Paulo: Memorial, 1997. p. 287. 72 MARONNA, Cristiano Ávila. Drogas e consumo pessoal: a ilegitimidade da intervenção penal. Boletim IBCCRIM, Ed. Especial Drogas, out. 2012, p. 4. 73 CARVALHO, Salo de. A política criminal de drogas no Brasil: estudo criminológico e dogmático da Lei 11.343/2006. 6. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 405.



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paternalista. As principais características do paternalismo74 se fazem presentes quando da análise do art. 28 da Lei Antidrogas: a) o preceito legal, ainda que não culmine em pena privativa de liberdade, ainda prevê uma pena, tentando obrigar a pessoa a se abster do uso; b) o Estado não possui confiança de que o usuário pode fazer uso seguro de qualquer das drogas listadas como ilícitas; c) a despeito dos diversos estudos na área, a lógica estatal ainda se encontra pautada na ideia de que a melhor sociedade é aquela livre dos entorpecentes, ainda que o consumo sempre se fez presente em diversas formas de convívio coletivo;75 d) a legislação penal ocorre à margem da vontade e do direito de uso de tóxicos; e) discurso moralizante visando promover supostamente um bem. Observa-se, assim, que a colocação em legislação penal em nada contribui para a adoção de um modelo condizente à realidade e que almeje genuinamente o bem da sociedade. A resposta estatal mais adequada residiria no âmbito da saúde, no âmbito de redução e prevenção de danos,76 mas não na esfera do proibicionismo, já que é sabido da danosidade de diversos outros produtos que, ainda assim, são classificados como lícitos pela legislação nacional. Caso o intuito fosse de efetivamente tutelar a saúde pública, como preconiza a lei, as advertências e os cursos educativos também deveriam ser aplicados aos usuários, por exemplo, de álcool. Portanto, o que se encontra previsto na Lei 11.343/2006 não tem finalidade alguma senão a imposição de um valor, que não necessariamente diz respeito a toda a população. Uma vez que se trata de conduta permeada de preconceitos e desconhecimentos, é algo que deve ter sua reprovabilidade reforçada, negritando-se como é um ato mal, ruim. Ignora-se o fato de que o uso de narcóticos se encontra dentro do direito de autolesão e da liberdade de autointoxicação77 e o Estado somente deveria agir na hipótese de algum dano concreto a terceiro. Deve, portanto, lidar com o cenário como caso de saúde pública, e não de tutela penal dela. “A criminalização do uso de entorpecentes, especialmente no que se refere ao dependente, ignora o funcionamento e dificulta a atuação de outras instâncias do controle social, que poderiam ser muito mais eficientes para lidar com este problema. A criminalização acaba impedindo uma reflexão aprofundada sobre o assunto, que termina por ser tratado de forma simplista e superficial. Este tratamento pode ser verificado especialmente

74 MARTINELLI, João Paulo Orsini. Paternalismo jurídico-penal. 297 p. Tese (Doutorado) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010, p. 100. 75 VELHO, Gilberto. Drogas, níveis de realidade e diversidade cultural. In RIBEIRO, Maurides de Melo; SEIBEL, Sérgio Dario (org.). Drogas: hegemonia do cinismo. São Paulo: Memorial, 1997. p. 62. 76 Do outro lado, os danos sociopolíticos e jurídicos, na mentalidade proibicionista, acabam por ser potencializados, cf. RIBEIRO, Maurides de Melo. Drogas e redução de danos: os direitos das pessoas que usam drogas. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 88. 77 CARVALHO, Salo de. Op. cit., p. 266.



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nas campanhas educativas sobre o tema, que acabam passando mensagens autoritárias, buscando intimidar o público-alvo a não ter contato com as drogas através do medo”.78

6. Conclusão e perspectivas Ao longo desse texto, foi analisada a escola Correcionalista em si, principalmente pela leitura da obra de Dorado Montero, bem como o seu discurso ainda se faz presente em alguns institutos do nosso direito penal. Mais especificamente em relação à execução penal e ao porte de tóxicos para uso pessoal. Entretanto, é claro que esse mesmo raciocínio é passível de ser encontrado em outros pontos do atual estudo do Direito Penal, como a volta do duplo-binário na própria Espanha e as propostas de seu retorno no Brasil, delitos cujo bem jurídico é a moral ou o sentimento, relações entre Direito Penal e Direito Administrativo sancionador, nos atuais debates envolvendo neurociências e ciências penais, entre outros. O que se observa, atualmente, é que um dos grandes diálogos que será travado pelos próximos anos, no que tange à dogmática penal, diz respeito à relação entre as teorias da ação humana penalmente dignas e o avanço da medicina no campo das neurociências. Como bem observa Víctor Gabriel Rodríguez, em sua futura tese de livre-docência,79 a Filosofia sempre se ocupou do debate acerca da liberdade de agir do ser humano. Essa preocupação, naturalmente, acaba por se espraiar pelos outros ramos do conhecimento humano. No campo dos estudos do cérebro do ser humano, são várias as teorias e estudos que abordam o livre-arbítrio e como condicionar o agir de um indivíduo ao que se deseja. Um dos exemplos mais emblemáticos é o procedimento de intervenção cirúrgica no cerébro desenvolvido por António Egas Moniz, médico português, que veio a receber o prêmio Nobel por este trabalho, chamado lobotomia, ou leucotomia.80 Atualmente, a ligação mais visível entre a Medicina e a escola correcionalista se dá no recorrente debate acerca da castração química enquanto condição para retorno do condenado por estupro à sociedade. Tal ideia encontra força no

78 COSTA, Helena Regina Lobo da. Análise das finalidades da pena nos crimes de tóxico:Uma abordagem da criminalização do uso de entorpecentes à luz da prevenção geral positiva. In: REALE JÚNIOR, Miguel (org.). Drogas: aspectos penais e criminológicos. Rio de Janeiro: Forense, 2005. p. 110-111. 79 Cf. RODRÍGUEZ, Víctor Gabriel. Neurociência e direito penal. Palestra ministrada no 20.º Seminário Internacional de Ciências Criminais, 2014, São Paulo. A ser disponibilizado em videoteca do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais. 80 “O procedimento envolvia a inserção de um instrumento cortante no cérebro por meio de duas perfurações no crânio, uma de cada lado da cabeça. O médico então movia o instrumento de um lado para o outro, cortando as conexões entre os lobos frontais e o resto do cérebro”. BBC Brasil. Lobotomia faz 75 anos: De cura milagrosa a mutilação mental. Disponível em: ,http://goo.gl/RKvIt>. Acessado em: 26 ago. 2014.



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Projeto de Lei 5.398/2013 que estabelece esta condição para a progressão de regime e para a concessão de livramento condicional. O Correcionalismo trouxe importantes avanços como a ideia da humanização da pena, da individualização da execução, da discussão acerca dos verdadeiros e dos ideais fins da pena e a prevenção de delitos. Contudo, muitos de seus postulados, dado o avanço da ciência jurídica como um todo, são muito difíceis de serem ainda defendidos devido a uma quebra sistêmica racional construída e, mesmo, por não estar de acordo com um ideal pluralista da sociedade consubstanciado juridicamente na ideia tão propagada do Estado Democrático de Direito. O estudo das escolas penais é de suma importância para que possa buscar soluções para os problemas sociais atuais que, na verdade, são repetições e reflexos de conflitos que se estendem por longa data. Com um conhecimento adequado das experiências propostas e vividas no pretérito, torna-se mais eficaz a racionalização do Direito, evitando repetir erros e prolongando os efeitos positivos gerados.

7. Bibliografia Anitua, Gabriel Ignacio. Histórias dos pensamentos criminológicos. Trad. Sérgio Lamarão. Rio de Janeiro: Revan, 2008. Antón Oneca, José. La utopia de Dorado Montero. Salamanca: Universidad de Salamanca, 1950. Bauman, Zygmunt. Modernidad líquida. Trad. Mirta Rosenberg. Buenos Aires: Fondo de Cultura Económica, 2004. Bechara, Ana Elisa Liberatore Silva. Da teoria do bem jurídico como critério de legitimidade do direito penal. 464 p. Tese (Livre-Docência em Direito) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010. Bitencourt, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral 1. 19. ed. rev., ampl. e atual. São Pulo: Saraiva, 2013. Burgess, Anthony. Laranja mecânica. Trad. Fábio Fernandes. São Paulo: Aleph, 2004. Cali, Edmundo René Bodero. Pedro Dorado Montero, el desmitificador de la Salamanca. In: Homenaje Póstumo Al Dr. Edmundo Durán Díaz. Santiago de Guayaquil: Facultad de Jurisprudencia de la Universidad Católica de Santiago de Guayaquil, 2002. Disponível em: . Acesso em: 4 jan. 2014.



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