RETRATOS DA ARQUIVOLOGIA PAULISTANA: APLICAÇÃO DAS NORMAS DE DESCRIÇÃO ARQUIVISTÍCA E PERFIL PROFISSIONAL

May 27, 2017 | Autor: Charlley Luz | Categoria: Arquivologia, Arquivistica, Prática Profissional, Arquivos brasileiros
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FUNDAÇÃO ESCOLA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA DE SÃO PAULO III SEMINÁRIO DE PESQUISA DA FESPSP

RETRATOS DA ARQUIVOLOGIA PAULISTANA: APLICAÇÃO DAS NORMAS DE DESCRIÇÃO ARQUIVISTÍCA E PERFIL PROFISSIONAL Ana Paula de Moura Souza / [email protected] Charlley Luz (orientador) / [email protected]

Resumo “Retratos da arquivologia paulistana: aplicação das normas de Descrição Arquivistíca e perfil profissional” é um pesquisa que procura estabelecer um panorama dos arquivos da cidade de São Paulo listados no Cadastro Nacional de Entidades Custodiadoras de Acervos Arquivísticos do CONARQ – Conselho Nacional de Arquivos, com a finalidade de ampliar a discussão acerca das práticas de gestão de documentos e, principalmente, da aplicação e uso das normas de descrição arquivística. Os dados para esta pesquisa foram coletados por meio de visitas técnicas e entrevistas que possibilitaram delinear o perfil profissional dos técnicos que atuam nestas instituições e avaliar o relacionamento e atuação do CONARQ, além de suscitar novas questões, como a atuação do profissional arquivista, graduado em Arquivologia, na cidade de São Paulo. Os instrumentos de pesquisa gerados a partir da Descrição Arquivística correspondem a ligação entre a indagação e resposta; o pesquisador e o documento, portanto, são fundamentais ao acesso as informações contidas nos documentos de arquivo, com sua importância refletida tanto na gestão do acervo como em sua própria divulgação. Dado este fato relevante, não foram poucas as tentativas nacionais e internacionais para se criar regras e normas que padronizassem estes instrumentos de pesquisa, culminando na criação das Normas de Descrição Arquivística.

Palavras-chaves Arquivologia; Ciência da Informação; Descrição Arquivística; Profissional arquivista

Introdução Este artigo foi desenvolvido com base no trabalho de conclusão de curso1 com o mesmo título, que teve como objetivo de demonstrar um panorama sobre a concepção, desenvolvimento e eficácia da aplicação das normas de Descrição Arquivística na cidade de São Paulo, levando em consideração fatores físicos, tecnológicos, financeiros, acadêmicos e humanos. A Descrição Arquivística é um procedimento técnico que visa, segundo a Society of American Archivists (2002), identificar, gerenciar, estabelecer controle intelectual, localizar, explicar o acervo arquivístico e promover seu acesso levando em conta “os elementos formais e de conteúdo dos documentos para elaboração de instrumentos de pesquisa” (ARQUIVO NACIONAL, 2005). Em muitos países, como os EUA e a Inglaterra, na década de 1970, já existiam iniciativas locais para o estabelecimento de padrões e diretrizes da descrição arquivística para a criação de instrumentos de pesquisa uniformes e consistentes. Em meados dos anos 70, a modernização das rotinas de trabalho, o uso intensivo de computadores e empreendimentos colaborativos em rede, despertou várias iniciativas para o desenvolvimento de diretrizes para uniformização dos instrumentos de pesquisa, a fim de facilitar o compartilhamento e a reunião de informações de vários arquivos, surgindo, assim, diversas iniciativas locais, como nos EUA e Inglaterra, mas a primeira proposta de norma internacional partiu do Canadá, em 1988. Com esta proposta, o CIA formou uma Comissão ad hoc com a finalidade de discutir e desenvolver a norma, lançando em 1994 a ISAD(G) Norma Geral Internacional de Descrição Arquivística. Da mesma forma, em 1996, outra norma, em complemento a esta, foi elaborada, a ISAAR(CPF) - Norma Internacional de Registro de Autoridade Arquivística para Entidades Coletivas, Pessoas e Famílias, com o intuito de descrever as autoridades produtoras de documentos. Na mesma época, o Brasil passou a fazer parte dos grupos de discussão e, com estímulo do CIA, foi criada a Norma Brasileira de Descrição Arquivística – NOBRADE, para atender as necessidades específicas de descrição nas instituições arquivísticas nacionais. Dando continuidade ao trabalho de normalização internacional, mais duas normas foram criadas: a ISDF - Norma Internacional para Descrição de Funções, lançada em 2008, com o objetivo de descrever as funções dos produtores de documentos e a ISDIAH - Norma Internacional para Descrição de Instituições com Acervo Arquivístico, em 2009, com o intuito de auxiliar na descrição das instituições custodiadoras de arquivos, bem como os serviços oferecidos aos pesquisadores (CONARQ, 2006; CIA, 2008; CIA, 2009).

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Monografia apresentada à Escola de Pós Graduação da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo como requisito para obtenção do grau de especialista do curso de pós graduação em Gestão de Documentos de Arquivo, orientador: Prof. Esp. Charlley Luz. 2014.

A cidade de São Paulo possui índices sócio-econômicos impressionantes2, presumindo que o volume de informações em circulação em diversos meios e suportes nesta cidade seja tão gigantesco quanto e, também, que profissionais qualificados sejam incumbidos de gerir, preservar e propiciar seu o acesso. Dada esta grandiosidade, para delimitar o universo desta pesquisa, optou-se por escolher instituições arquivísticas paulistanas listadas no Cadastro Nacional de Custodiadores de Acervos Arquivísticos do CONARQ, totalizando dezesseis instituições. Para firmar conceitos, justificar o tema e suscitar as questões para a realização da pesquisa, foi fundamental a realização do levantamento bibliográfico, no qual foram consultados bancos de teses, dissertações e bibliotecas de universidades onde são ministrados os cursos de Biblioteconomia e Arquivologia; periódicos especializados em Ciência da Informação e outros repositórios digitais, favorecendo, desta forma, a discussão do problema e a formulação das hipóteses. Visitas técnicas e entrevistas constituiram o caminho mais adequado para tornar concreto o alcance dos objetivos deste trabalho para obtenção de dados, os quais foram organizados, analisados e interpretados. As entrevistas seguiram um roteiro estruturado, com questões abertas e divido em módulos, cada um com um objetivo específico. Princípios arquivísticos Diante da diversidade de relacionamentos humanos, há uma variação imensa de registros decorrentes de atividades, ações e decisões, que servirão de comprovantes ou apenas guardarão a memória de determinadas épocas, lugares, instituições ou pessoas. Em contrapartida, também são diversificadas as formas de apresentação, armazenamento, recuperação e acesso destas informações. Existem desde caixas e fichários com documentos em papel, objetos tridimensionais em containers e até documentos digitais gravados em toda sorte de mídias e grandes data-centers com acesso remoto: a cloud computing, constituindo arquivos, os quais identificamos como a Designação genérica de um conjunto de documentos produzidos e recebidos por uma pessoa física ou jurídica, pública ou privada, caracterizado pela natureza orgânica de sua acumulação e conservado por essas pessoas ou por seus sucessores, para fins de prova ou informação. De acordo com a natureza do suporte, o arquivo terá a qualificação respectiva,

como,

por

exemplo:

arquivo

áudio-visual,

fotográfico,

iconográfico, de microformas, informático (ABNT, 1986)

2

Segundo a estimativa populacional para os municípios brasileiros em 2013, realizada pelo IBGE, São Paulo 2 possui cerca de 11.821.873 habitantes, sendo considerada a cidade mais populosa do Brasil e da América do Sul. Além disso, São Paulo é considerada o cerne financeiro e corporativo da economia brasileira, representando 2 11,77% do PIB, ocupando o primeiro lugar na relação dos 100 maiores municípios brasileiros.

Contudo, tais registros apenas serão reconhecidos como documentos arquivísticos se tiverem sido produzidos no transcorrer de atividades que justificam sua existência, guardem entre si relações orgânicas e sirvam de apoio para os processos gerenciais com absoluta confiabilidade (BELLOTTO, 2006, p. 37). Estes documentos possuem atributos peculiares de quem os produziu, guardando a evidência das decisões tomadas, direitos adquiridos e compromissos assumidos, inseridos, então, nos processos de trabalho, o qual é um conjunto de atividades coesas dirigidas a um objetivo ou meta específica do produtor dos documentos. Os vínculos entre os processos de trabalho tornam o arquivo um todo coerente (THOMASSEN, 2006, p.6). A Gestão Documental, uma das principais abordagens da Arquivologia, encarrega-se de possibilitar a recuperação adequada das informações, acompanhando a produção, utilização e a destinação dos documentos de arquivo ativos em fases corrente e intermediária, garantindo, assim, sua finalidade, uso correto e destinação adequada, por meio de um conjunto de procedimentos e operações técnicas (BRASIL, 1991, art. 3º). Segundo Bellotto (2006) e Thomassen (2006), os documentos tratados na Gestão Documental são ativos e possuem valores primários, constando nos arquivos administrativos, são produzidos ou recebidos durante o exercício das funções nas unidades administrativas, influenciando ativamente os processos e decisões, interferindo até mesmo nas relações sociais. São guardados de forma orgânica e cumulativa, por meio de métodos que os classificam, organizam e determinam seu prazo de guarda (Plano de Classificação3 e a TTD - Tabela de Temporalidade de Documentos4, respectivamente). Estes mesmos documentos, após o cumprimento de suas funções, poderão ser consultados futuramente por pesquisadores com a finalidade de retratar o passado, ou por administradores que precisam de referências de resoluções decorridas para decidirem seu presente. Os documentos farão parte desta “herança cultural” após a avaliação de seus detentores ou custodiadores, que os identificarão como “representativos de sua história e identidade” (THOMASSEN, 2006), figurando em um valor secundário do documento, de guarda permanente. Os procedimentos de descrição de conteúdo documental são aplicados geralmente nestes documentos, sendo que nas fases corrente e intermediária a recuperação da informação acontece por meio dos códigos do plano de classificação, dos conjuntos gerais de composição dos fundos e do controle de vocabulário utilizado na indexação, objetos de tratamento da Gestão Documental. 3

Esquema de distribuição de documentos em classes, de acordo com métodos de arquivamento específicos, elaborado a partir do estudo das estruturas e funções do produtor de documentos. ARQUIVO NACIONAL, 2005, p. 132 4 Instrumento de destinação aprovado por autoridade competente, que determina prazos e condições de guarda de documentos tendo em vista a transferência, recolhimento, descarte ou eliminação de documentos. ARQUIVO NACIONAL, 2005, p. 159

Outro princípio fundamental da arquivística, importante para a compreensão do contexto de criação das normas para a descrição arquivística, é o conceito formulado por Natalis de Wailli, em 1841, que estabelece a noção de fundos de arquivo, garantindo ao usuário total confiabilidade dos documentos consultados, pois um “fundo preserva juntos todos os documentos solidários, guardados no estado e no contexto em que foram produzidos” (THOMASSEM, 2006). O fator da formação de um fundo é o princípio da proveniência ou princípio de respeito aos fundos – respect des fonds, no qual os documentos provenientes da mesma fonte geradora são mantidos reunidos e não misturados a outros de origem diversa, mantendo sua individualidade (Arquivo Nacional, 2005). No âmbito dos arquivos permanentes, os documentos passam pelo processo de arranjo, que consiste na ordenação dos documentos com base nas atividades ou na estrutura institucional que os produziu, sem desconsiderar o sistema de classificação realizado nas fases anteriores, mesmo após as baixas sofridas em decorrência da avaliação (BELLOTTO, 2006, p.29), sendo sua hierarquia constituída por Fundo; Seção; Subseção; Série; Subséries; Dossiês / processos e Itens documentais, conforme esquematizado na figura 1.

Figura 1 - Modelo dos níveis de arranjo de um fundo (CIA, 2000, p. 46)

Descrição Arquivística As atividades de descrição refletem o arranjo documental e Shellenberg (2004, p. 321) afirma que estas duas funções, o arranjo e a descrição, são inseparáveis, a ponto de confundirem-se; ao descrever os documentos, o profissional do arquivo o faz em relação a

unidades que foram definidas durante seu arranjo. Estas atividades devem ser executadas por profissionais da área de gestão da informação, com especialização em técnicas de arquivo e, obrigatoriamente, supervisionada por um bacharel em arquivologia5, pois a descrição arquivística é o processo em que o profissional explica o conteúdo do acervo a partir de representações expressadas em outros suportes, sendo visivelmente uma atividade que demanda competências específicas, como “interpretação de texto, conhecimento histórico acerca do produtor e de sua época, além da habilidade com a língua em que estão sendo produzidas as informações descritivas” (ANDRADE & SILVA, 2008, p.15), situando, desta forma, o pesquisador quanto ao contexto e os sistemas de arquivo que os gerou, garantindo sua localização, identificação e gestão. Sem a descrição, corre-se o risco de criar uma situação análoga à do analfabeto diante de um livro, que ele pode pegar e folhear, mas ao qual não pode ter acesso completo por não possuir meios que lhe permitam compreender a informação. A classificação arquivística, desprovida das atividades de descrição, somente é inteligível para as pessoas que organizaram o acervo. (LOPEZ, 2002, p. 12).

Por meio dos instrumentos de pesquisa, a Descrição Arquivística possibilita a a identificação e a utilização da informação a partir de elementos categóricos de conteúdo dos fundos e são definidos como “o termo mais amplo que abrange qualquer descrição ou meio de referência elaborado ou recebido por um serviço de arquivo, com vistas ao controle administrativo ou intelectual do acervo arquivístico” (CIA, 2000, p.15). Cada instrumento de pesquisa tem uma finalidade específica, de acordo com a abrangência e o nível de descrição. São passíveis de publicação impressa ou eletrônica, de forma a localizar, resumir ou transcrever arquivos, fundos, grupos, séries e peças documentais em diferentes dimensões (BELLOTTO & CAMARGO, 1996, apud TESSITORE, 2012). Os instrumentos de pesquisa trazem consigo muitos elementos oriundos dos documentos de arquivo que, segundo Bellotto (2006, p. 41) inclui:

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Unidade criadora do documento



Tipologia documental



Autoria / responsabilidade



Função a que se refere



Ação que o traduz

De acordo com a Lei 6.546, de 4 de julho de 1978, que dispõe sobre a regulamentação das profissões de Arquivista e de Técnico de Arquivo, e dá outras providências.



Datas (de criação, emissão e período).



Conteúdo (cabendo até mesmo a transcrição do todo ou partes do documento)



Notação de identificação e localização.

Constituindo, assim, diferentes tipos de instrumentos, dos mais abrangentes aos mais específicos, conforme demonstrado na tabela 1 a seguir.

Abrangentes

Tabela 1 – Tipos de Instrumentos de Pesquisa O mais abrangente e genérico possibilitando uma visão geral do acervo. Deve orientar o pesquisador quanto ao conteúdo básico e na utilização dos Guia fundos que integram o acervo, bem como informar a quantidade de fundos, seus históricos, datas, natureza e estrutura. Inventário

Catálogo

Específicos

Repertório ou catálogo seletivo

Índices

Tabela de equivalência ou concordância

Compreende uma descrição concisa dos fundos ou de suas partes refletindo seu arranjo, a fim de propiciar um instrumento preliminar de busca, trazendo uma descrição sumária. Os documentos pertencentes a um ou mais fundos são selecionados seguindo recortes temáticos, cronológicos, onomásticos ou geográficos. As unidades documentais são descritas singularmente, respeitando ou não a ordem de classificação. Os documentos, pertencentes de um ou mais fundos, são selecionados por critérios temático, cronológico, onomástico ou geográfico assim como em um catálogo. No entanto, prevalece um “juízo de valor” que determina a inclusão ou não de determinado documento, com a intenção de ressaltar documentos relevantes no acervo. As unidades documentais também são descritas individualmente. Decompõe os documentos em descritores que permitem a localização de cada documento. Complementam catálogos e inventários. Porém, para um melhor aproveitamento deste instrumento, é importante a cautela na seleção dos termos que farão parte dos índices, fazendo o uso de controle de vocabulário. Este instrumento configura-se como auxiliar no processo de recuperação da informação, esquematizando a equivalência de notações terminológicas dos arquivos, nos casos de alterações na estrutura do arranjo documental, remetem a nova linguagem à anterior.

Fonte: Lopez (2002), Paes (2004), Souza, et.al. (2005), Bellotto, (2006). Compilado e organizado pela autora

Dada a importância da Descrição Arquivística para a recuperação da informação e a complexidade dos instrumentos de pesquisa, não foram poucas as iniciativas para racionalizar e padronizar este processo. Para isso várias associações profissionais arquivistas, arquivos locais, regionais e nacionais do mundo todo uniram esforços na elaboração de normas para padronizar a Descrição Arquivística, a fim de facilitar o acesso aos documentos de arquivo, ajudar na conservação dos fundos, favorecer o controle por parte do arquivista, agilizar o trabalho do pesquisador com economia de tempo e trabalho e garantir a compreensão do acervo arquivístico. Estas ações estão refletidas em seus objetivos, que, de acordo com Lacerda (2007), contemplam em: 

Garantir a consistência à informação disponibilizada;



Representar consenso dos profissionais sobre as melhores práticas;



Incentivar a racionalização dos processos;



Permitir e potenciar a troca de informação;



Garantir a permanência da informação contra a obsolescência tecnológica.

O princípio norteador da Descrição Arquivística é composto pelo princípio de proveniência ou respeito aos fundos, coforme explicado anteriormente, e a descrição multinível preconizada pela ISAD(G) (2000. p.18-19), que é fundamentada em quatro regras que devem ser aplicadas para estabelecer a relação hierárquica entre as descrições da parte mais abrangente para a mais específica: •

Descrição do geral ao particular: as informações sobre o fundo como um todo é dada no primeiro nível, nos demais, são dadas informações sobre as partes. Desta forma, é apresentada uma relação hierárquica entre as partes e o todo seguindo do geral (todo/fundo) para o particular (partes).



Informação relevante para o nível de descrição: as informações fornecidas devem ser apropriadas para o nível que está sendo descrito, representando rigor com o contexto e o conteúdo.



Relação entre descrições: demonstra visivelmente a posição na hierarquia do material descrito, identificando seu nível de descrição.



Não repetição de informação: não repetir as informações em níveis diferentes de descrição, evitando a redundância de elementos (SOUZA, et.al., 2006, p. 43)

Portanto, os instrumentos de pesquisa gerados a partir da Descrição Arquivística correspondem a ligação entre a indagação e resposta: o pesquisador e o documento, sendo fundamentais ao acesso as informações contidas nos documentos de arquivo, com sua importância refletida tanto na gestão do acervo como em sua própria divulgação. Pesquisa e discussão dos resultados Para compor o universo a ser investigado, a cidade de São Paulo foi selecionada para ser o cenário da pesquisa, considerando não somente fatores físicos, logísticos e financeiros, mas também por não possuir o curso de bacharelado em Arquivologia, visto que a aplicação das normas para a descrição deve auxiliar e facilitar os trabalhos técnicos a fim de assegurar o cumprimento dos objetivos dos arquivos e unidades de informação no que diz respeito à autenticidade, acesso, confidencialidade, disponibilidade e integridade das informações6, por meio de instrumentos de pesquisa e gestão consistentes e apropriados, segundo a Lei 6

Estes elementos são as ações fundamentais de qualquer sistema de segurança de informação e comunicação, contudo, com base na literatura sobre Ciência da Informação, a autora considerou adequado utilizar estes mesmos conceitos para explicar os objetivos dos arquivos e unidades de informação. Fonte: BRASIL. Departamento de Segurança da Informação e Comunicações. Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República. Instrução Normativa GSI/PR nº 1/2008. Disponível em: . Acesso em: 16 out. 2013.

6.546, de 4 de julho de 1978, tal é o arquivista (graduado em Arquivologia) o responsável por estes processos. A população escolhida partiu do Cadastro Nacional de Entidades Custodiadoras de Acervos Arquivísticos do Arquivo Nacional, totalizando, desta forma, 16 (dezesseis) instituições públicas e privadas. Entre os meses de setembro e outubro de 2013, todas as instituições foram contatadas por telefone e/ou por e-mail, obtendo de retorno de dez instituições, sendo sete respostas positivas e três negativas. Seis empresas não participaram deste trabalho, ou por não terem retornado contato ou por respostas dadas fora do prazo. Todas as instituições participantes foram visitadas, onde aconteceram conversas informais com os técnicos responsáveis pelos arquivos e aplicação do roteiro da entrevista (figura 2). Universo da Pesquisa Entidades Custoriadoras de Arcervos Arquvísticos na Cidade de São Paulo

Respostas Positivas 44%

Sem resposta ou resposta fora do prazo 37%

Respostas Negativas 19%

Figura 2 - Universo da Pesquisa Qualitativa

Considerando os objetivos desta pesquisa, a entrevista foi a ferramenta utilizada para coletar dados quantitativos e qualitativos. Para tanto, um roteiro foi elaborado para estruturar as entrevistas e manter o foco durante as conversas. Desta forma, foi possível reunir logicamente dos dados obtidos a fim de facilitar a compreensão, o processo e a análise. Este roteiro foi dividido em oito módulos, a saber: 1. Identificação geral 2. Identificação do entrevistado 3. Identificação da unidade de arquivo 4. Recursos humanos 5. Recursos físicos 6. Atividades de arquivo 7. Descrição arquivística

8. Perspectivas, projetos e relações com o CONARQ Com esta análise, foi possível mensurar o nível de refinamento e sofisticação dos instrumentos de pesquisa, levantar o perfil do profissional que atua nas instituições arquivísticas paulistanas e, também, avaliar o relacionamento técnico e profissional com o CONARQ – Conselho Nacional de Arquivos. Módulo 1: Identificação Geral O primeiro módulo compreendeu a identificação geral da instituição, buscando informações quanto ao segmento de mercado, atribuições e localização geográfica. Das instituições que colaboraram com a pesquisa, 2 (duas) eram empresas públicas, 3 (três) empresas privadas e 2 (duas) organizações privadas sem fins lucrativos. As atribuições das unidades de arquivo destas instituições variam, porém, possuem em seu escopo principal a coleta, organização e difusão da documentação contida em seus acervos, caracterizando como arquivos permanentes e de acordo com o ramo de atuação da empresa e sua natureza. A atuação na educação na transmissão do conhecimento arquivístico e institucional é ponto marcante nestas unidades, onde são oferecidas oficinas, seminários e publicações, cujas ações serão detalhadas adiante. Para o cumprimento dos objetivos institucionais, notou-se que estas empresas possuem localização estratégica, de fácil acesso e próximas às estações do Metrô - Companhia do Metropolitano de São Paulo ou da CPTM - Companhia Paulista de Trens Metropolitanos. Todas as instituições aceitam visitas técnicas e realizam o atendimento presencial aos pesquisadores, preferencialmente com horário agendado. Módulo 2: Identificação do Entrevistado Os técnicos que receberam o pesquisador para proceder com este trabalho tiveram os seus perfis e de suas equipes levantados no segundo módulo, onde o nome7, o cargo, a formação acadêmica foram apurados. Todos eram os responsáveis técnicos do arquivo, fornecendo, assim, informações mais precisas sobre as atividades do arquivo. Seus cargos de liderança apresentaram uma uniformidade, com exceção apenas do cargo de Historiógrafo, que não condiz à sua atuação em arquivos, sendo:

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Um supervisor do acervo permanente



Dois documentalistas;



Um historiógrafo;



Dois coordenadores do centro de documentação e

Por questões éticas, os nomes dos entrevistados não foram divulgados.



Um gestor de acervo

Porém, nenhum deles é considerado Arquivista, tanto porque não possuem graduação em Arquivologia, conforme determina a legislação em vigor. O levantamento da formação acadêmica dos técnicos entrevistados apontou: 

Três técnicos possuem formação em História;



Um com primeira formação em Biblioteconomia e segunda formação em História;



Um

com

primeira formação

em

Sociologia,

com

segunda formação

em

Biblioteconomia; 

Um com primeira formação em Sociologia, com segunda formação em História;



Um com formação em Letras.

No entanto, todos possuem algum tipo de formação extracurricular na área de Arquivologia, sejam cursos de extensão, como o proporcionado pelo COGEAE/PUC - Coordenadoria Geral de Especialização, Aperfeiçoamento e Extensão da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo 8, pós-graduação em arquivologia do IEB/USP: Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo

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e participação em diversas palestras e cursos de curta e

média duração na área, promovidos pela ABER: Associação Brasileira de Encadernação e Restauro, ARQ-SP: Associação de Arquivistas de São Paulo e SESC: Serviço Social do Comércio. Módulo 3: Identificação da Unidade de Arquivo O terceiro módulo tratou da identificação da unidade do arquivo, com suas atribuições, perfis e posicionamento dentro da instituição. Algumas instituições apresentam os trabalhos de arquivo como atividade fim: tendo como principal objetivo o recolhimento, coleta, organização e difusão dos acervos vindos de uma organização maior, que recolhe a documentação administrativa ou coleta documentos de outras instituições, como os movimentos populares e sindicais. Um dos casos é muito peculiar, cujo propósito principal era recolher a documentação gerada e acumulada pela instituição, bem como ter representação na CADA: Comissão de Avaliação de Documentos de Arquivo, devido o número limitado de funcionários (que será tratado adiante), teve parte de suas atribuições, inclusive as ações educativas, cortadas. Os demais arquivos (quatro instituições) são 8

Curso de extensão “Introdução à Política e ao Tratamento dos Arquivos”. Mais detalhes em: http://www.pucsp.br/pos-graduacao/especializacao-e-mba/introducao-a-politica-e-ao-tratamento-dos-arquivos. Acesso em 25.mar.2014 . 9 Curso de Especialização em Organização de Arquivos, promovido pelo Instituto de Estudos Brasileiros (IEBUSP) e Escola de Comunicações e Artes (ECA-USP), com aulas ministradas regularmente entre os anos de 1986 e 2009. Atualmente o curso está inativo e sem previsão de novas turmas (fonte: contato pelo e-mail [email protected], em 30. out. 2013).

unidades dentro das organizações, que desempenham atividades meio, ou seja, os trabalhos de arquivo não correspondem aos produtos finais das instituições as quais as unidades de arquivo fazem parte. Em todas as instituições possuem algum tipo de atividade educativa frequente ou esporadica, contudo, notou-se que os arquivos, que atuam como subunidades dentro das instituições, prestam serviços diversificados com grande representatividade na educação corporativa e na disseminação do conhecimento em ciência da informação. Além disso, faz parte do quadro de serviços prestados o atendimento a pesquisas, exposições temáticas, oficinas de preservação, visitas técnicas e acadêmicas, benchmarking, elaboração e colaboração em publicações, avaliação de documentos para guarda permanente, formações internas e integração de novos colaboradores, além do serviço de processamento técnico, higienização e organização de documentos, tratado com mais detalhamento no módulo sétimo, sobre as atividades do arquivo. Módulo 4: Recursos Humanos O quadro de recursos humanos presentes nas organizações foi descrito como fator determinante para o sucesso dos trabalhos prestados pela unidade, levando em consideração a quantidade e a formação acadêmica dos funcionários. Esta constatação se deu no quarto módulo, que teve como objetivo levantar a quantidade e o perfil acadêmico dos funcionários que atuam na unidade arquivística. Apenas uma instituição alega que a quantidade de pessoas nas equipes é suficiente para atender as atividades culturais, demandas de atendimento e processamento técnico; em 5 (cinco) arquivos, a quantidade de pessoas nas equipes é totalmente insatisfatória, prejudicando, inclusive, a continuidade de serviços (sendo um dos casos mais graves, onde quatro voluntários atendem os pesquisadores sob agendamento e tratam de todo o processamento técnico em dias alternados). Em uma das instituições existe a alegação de que é relativa a relação da equipe entre a demanda de trabalho, pois dependem da aprovação de novos projetos, que, caso ocorram, a equipe atual será insuficiente, necessitando de contratos temporários. Assim como os coordenadores, praticamente todos os funcionários dos arquivos analisados possuem graduação em nível superior e formação complementar na área de arquivo, porém nenhum com graduação em arquivologia. Em três arquivos há mestres ou doutores em seu quadro. A quantidade de funcionários com formação de nível médio foi considerada insignificante, pois houve confusão entre "com formação de nível médio" e "contratados de nível médio", sendo que neste segundo caso, praticamente todos possuem curso superior, informação que não foi respondida com segurança pelos técnicos consultados. Atualmente,

uma empresa possui funcionários ativos de empresas terceirizadas atuando em projetos específicos. Três instituições possuem projetos de digitalização de acervo elaborados, aguardando aprovação e possível contratação. Apenas um arquivo não há perspectivas para futuras contratações pois não há técnicos em número suficiente para discutir e elaborar novos projetos. Não foi possível apurar a formação acadêmica destes funcionários terceirizados. Módulo 5: Recursos Físicos Durante a pesquisa, procurou-se conhecer a estruturas física e tecnológica dos arquivos, justamente para averiguar se estes fatores, aliados aos recursos humanos e financeiros, influenciam nos trabalhos técnicos de descrição e extroversão do acervo, sendo estes, os objetivos do quinto módulo. A conservação dos documentos está intimamente ligada ao tipo de mobiliário em todas as instituições, pois há a preocupação em manter os formatos documentais separados10, de acordo com suas capacidades. Os tipos de mobiliário não variam muito de local para local, sendo utilizadas estantes fixas e deslizantes; trainéis para arquivar emoldurados e quadros pendurados na vertical; armários de aço e madeira; mapotecas para documentos em grandes formatos; armários e gaveteiros de pastas suspensas. Em todas as instituições há computadores para os funcionários ativos e outros equipamentos como scanners ou impressoras estão presentes em todas as unidades entrevistadas. Tanto o mobiliário quanto os recursos tecnológicos satisfazem as necessidades rotineiras de quatro instituições, três alegaram que não são suficientes e a reclamação mais comum foi a falta de atualização tecnológica. Em um dos casos, o mobiliário é uma questão preocupante, pois recentemente um prédio foi reformado e anexado à unidade de arquivo, estendendo sua capacidade de armazenamento e reserva técnica, mas equipar este espaço novo e funcionários para o aumento da demanda serão dois grandes problemas que deverão enfrentados. O espaço físico (seja o excesso ou a falta) e suas condições climáticas representam o os maiores desafios para a preservação e a guarda dos documentos, pois nem todas as instituições possuem áreas para a reserva técnica ou ambiente com controle de umidade e temperatura, sendo que apenas duas instituições apresentam estas funcionalidades. Nas demais

instituições,

dependem

do

sistema

de

ar

condicionado

(central/local,

ligado/desligado) ou ventilação natural para manter a constância da temperatura, na medida do possível em seus arquivos. Em duas empresas está prevista a mudança do arquivo para

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Formato documental: "Conjunto das dimensões e características de um documento"; "suporte da informação" (CUNHA & CAVALCANTI, 2008. p. 173).

locais maiores e com a possibilidade, em uma delas, de se construir um laboratório de restauro, contudo, não souberam especificar se haverá controle de clima nas novas instalações. Uma das medidas em comum a praticamente todas as instituições (seis delas) é o monitoramento do acervo e a higienização preventiva, mesmo quando a demanda de trabalho sobrepõe a capacidade técnica da equipe, este trabalho é continuamente realizado. O déficit de recursos humanos em relação à preservação documental é mais sentido na instituição número 4, onde, apesar do grande significado de seu acervo, apresentam grave carência de suportes adequados; sala com ambiente totalmente desfavorável, sem climatização, ventilação e iluminação adequados e outros problemas estruturais, como vazamentos e piso deteriorado. Pelo quadro de funcionários diminuto há grande acúmulo de poeira e muitos documentos armazenados em sacos plásticos e caixas de papelão pelo chão, aguardando o processamento técnico. Mesmo com todas estas dificuldades, os voluntários buscam apoio das sociedades civil e acadêmica para a sobrevivência do arquivo. Módulo 6: Atividades de arquivo O objetivo do sexto módulo focou no detalhamento das atividades relacionadas ao tratamento arquivístico das instituições quanto ao desenvolvimento sistêmico de gestão de documentos em suas diferentes fases; existência e atuação da CADA; desenvolvimento e utilização das ferramentas de gestão documental (Plano de Classificação e TTD) e mecanismos de gestão e recuperação da informação. As unidades de arquivo das instituições entrevistadas figuram-se em arquivos permanentes, responsáveis pelo recolhimento e tratamento da documentação de valor histórico-cultural. Os critérios e as formas de recolhimento variam, uma vez que, as instituições não possuem metodologias ou políticas de gestão documental efetivas para tratamento da documentação nas fases corrente e intermediária. Verificou-se nas entrevistas que os setores das instituições, em sua maior parte, produzem e gerenciam a documentação localmente e com critérios próprios. Um dos arquivos possui como atribuição recolher e colecionar documentos de outros estabelecimentos e associações, não se interferindo nos processos de gestão documental. Em três das sete instituições há uma CADA constituída e TTD para avaliação da documentação, porém, não são efetivas ou não contam com a participação da unidade de arquivo. Constatou-se que a CADA destes lugares se reúnem esporadicamente, principalmente em situações em que há risco de perda ou é necessário deliberar sobre a destinação de grande massa documental. Da mesma forma, a TTD é aplicada precariamente, pois depende muito das coordenações dos setores da instituição.

Duas instituições possuem arquivos intermediários, mas somente em uma a TTD é aplicada antes do recolhimento, porém enfrentam a dificuldade de pessoal qualificado e em número reduzido, retardando a execução dos serviços. Nas demais, quando a documentação já não serve para a administração, os setores a encaminham para os arquivos onde é realizada uma avaliação para selecionar o que será guardado e o que será eliminado. Em duas instituições há plano de classificação, sendo que em uma não há o acompanhamento de sua aplicação e em outra será futuramente aplicada com a implantação de novo sistema informatizado, que prevê, inclusive, a geração de relatórios e instrumentos de pesquisa. Os arquivos apresentam sistemas de arranjo para organizar a documentação permanente11, com exceção de uma, que possui um instrumento denominado “dicionário de assuntos”, que serve para organizar e recuperar os documentos, pois são formadas coleções que são agrupadas por assunto e, conseguinte, por tipologia documental, representadas por códigos alfa-numéricos. De maneira geral, a ausência de uma gestão documental eficaz é atribuída pela falta de pessoal qualificado nos setores geradores de documentos; no desinteresse da alta administração ou na exclusão da coordenação do arquivo permanente no processo de gestão. Mesmo diante destas dificuldades, percebeu-se que em todas as instituições as unidades de arquivo já criaram projetos para a elaboração de políticas de gestão documental, que se efetivaram em partes, mas nunca como deveriam. Módulo 7: Descrição Arquivística Por meio do sétimo módulo, foi possível conhecer o grau de maturação do conhecimento acerca das normas internacionais e nacional de descrição arquivística, tanto na teoria como na prática. Também fez parte dos objetivos desde módulo descobrir se a unidade de arquivo ou a instituição possui sistema informatizado, instrumentos de pesquisa e como aconteceu o processo de normalização, além de se apurar se isto trouxe algum benefício para a gestão e divulgação do acervo. Todos os entrevistados declararam que conhecem a NOBRADE e a ISAD(G), um conhece a ISAAR(CPF) e mais um outro conhece a ISDIAH. Dois profissionais conhecem todas estas normas para a descrição, inclusive a ISDF. Afirmaram que tomaram conhecimento da existência das normas em cursos e palestras na ocasião da apresentação da ISAD(G) e da NOBRADE ou quando as aplicaram em seus acervos. O aprofundamento deste tema se deu praticamente por conta do próprio profissional. A NOBRADE é aplicada em todos os arquivos, no todo ou em parte dos acervos, cuja motivação se deu pela necessidade de gestão ou pela adesão ao projeto do Arquivo

11

Não foi levantado o tipo de arranjo documental – estrutural ou funcional

Nacional “Memórias Reveladas”12. O período de implantação ocorreu entre os anos de 2005 e 2010. Em quatro arquivos constatou-se o uso efetivo e real da NOBRADE em suas atividades de gestão do acervo permanente, servindo principalmente como estrutura no desenvolvimento de banco de dados. Em três arquivos, a norma é ignorada ou minimamente utilizada para explicar parte do acervo, pois o controle e a gestão são realizados a partir dos princípios arquivísticos13. Nos arquivos que realmente utilizam a NOBRADE, o procedimento mais comum para o acesso e controle do acervo antes da descrição arquivística eram listagens em editores de texto, como o MSWord e planilhas eletrônicas no MSExcel, além de combinações de banco de dados gratuitos ou em MSAccess, plantas com localização topográfica, fichas e listagens impressas. Duas instituições possuíam bancos de dados proprietários para controle do acervo, que foram abandonados ou melhorados com o decorrer do tempo. Atualmente uma instituição utiliza exclusivamente planilhas em MSExcel, pois perderam o banco de dados antigos em um incidente e estão com projeto que visa a contratação de empresa especializada para refazer o software, recuperar as informações do banco de dados e agregar os novos dados das planilhas. Outra utiliza o ICA - ATOM14, tanto para gestão como para a elaboração do tesauro e instrumentos de pesquisa. O processo de implantação da NOBRADE foi trabalhoso, segundo todas as declarações, pois a falta de pessoal especializado em normas para a descrição nas equipes internas, terceirizadas e de informática foi apontada como a maior dificuldade. Por isso, horas de estudos e discussões em cinco arquivos foram dedicadas para a aplicação, aprimoramento e ampliação destes trabalhos, contudo, uma das instituições não prosseguiu com os trabalhos de descrição por falta de pessoal ativo nas equipes (são apenas quatro voluntários que trabalham alternadamente) e utilizam os mesmos sistemas para controle e gestão do acervo. Os instrumentos de pesquisa existentes estão à disposição para usos interno e externo nos sites institucionais na internet sob a forma de tabelas de descrição (*.pdf), guias (*.pdf, *.htm, *.html), bases e bancos de dados, mapas topográficos, catálogos ou bibliografias. Nem todos os instrumentos são normalizados, mas dois arquivos possuem projetos de 12

“Memórias Reveladas” é o nome pelo qual é conhecido o Centro de Referência das Lutas Políticas no Brasil, criado pela Casa Civil da Presidência da República e estabelecido no Arquivo Nacional tem como principal objetivo reunir informações sobre a história política do País, colocando à disposição os arquivos e documentos sobre o período entre as décadas de 1960 e 1980 e das lutas de resistência à ditadura militar. Mais informações em: http://www.memoriasreveladas.gov.br/. Acesso em: 18. out. 2013 13 Não foram detalhadas as formas em que os princípios arquivísticos são aplicados e desenvolvidos nas atividades técnicas. 14 ICA-AtoM - International Council on Archives - Access to Memory (Conselho Internacional de Arquivos Acesso à Memória). É fundamentado em ambiente web, aplicativo de código aberto baseado em padrões para a descrição arquivística. Informações disponíveis em: https://www.ica-atom.org/doc/Main_Page/pt . Acesso em: 06. maio. 2014

elaboração e publicação dos instrumentos de pesquisa padronizados de acordo com a ISAD(G) e a NOBRADE. Além dos instrumentos de pesquisa, os arquivos das instituições utilizam outros meios para divulgar seus acervos, como a publicação de revistas, livros e cadernos; exposições e tradução do banco de dados em outros idiomas. Concluindo a análise deste módulo, os participantes foram questionados sobre a influência da aplicação das normas de descrição nos processos de trabalho e se houve alguma melhoria. Dois profissionais alegaram que o uso das normas foi indiferente e que continuam com seus procedimentos técnicos da mesma forma, utilizando a norma para a elaboração de guia ou explicar parte do acervo, ou seja, não sentiram nenhuma melhoria significativa. Contudo, um deles espera tirar mais proveito das normas em um novo banco de dados com mais recursos. As principais críticas apontadas pelos entrevistados foram: 

As normas não representam grandes avanços para a organização prática do acervo, pois é possível ter o acervo desorganizado e dispor de um guia que descreva superficialmente os fundos.



Não é direcionada aos centros de memória, que possuem acervos diversificados e coleções, como objetos museológicos, obras de arte e livros, entretanto, a norma é flexível e permite adaptações.



Linguagem muito técnica, pois é direcionada apenas aos especialistas e torna-se uma grande barreira para introdução de leigos na colaboração dos trabalhos técnicos (visto que a falta de pessoal especializado é um dos grandes problemas em todos os arquivos).



As normas são ótimas para serem aplicadas na documentação gerada e acumulada por órgãos públicos, mas de difícil aplicação em arquivos privados com coleções específicas, por isso, não é aplicada com rigor.



A NOBRADE deveria passar por uma profunda revisão, pois há equívocos na tradução e adaptação para o português em relação à ISAD(G) original em inglês.



Observa-se muita influência da biblioteconomia, que trata o item por assunto, destoando da arquivologia, que trata o contexto do documento.

Em contrapartida, muitas melhorias foram proporcionadas e apontadas em cinco instituições, sendo as principais mencionadas: 

Flexibilidade que possibilita adaptações.



Direcionamento dos trabalhos técnicos e elaboração de políticas de descrição, agilizando este processo no qual o técnico sabe quais informações deverá extrair dos documentos, atribuindo uniformidade e consistência dos dados registrados.



Possibilidade de integração a outros centros de documentação.



Atribuição de valores e métricas de avaliação de bancos de dados e instrumentos de pesquisa, fornecendo parâmetros para criação e melhoramento de sistemas informatizados, incluindo o layout, campos e terminologias.



Simplificação do trabalho técnico.



Melhoria do plano de classificação e aumento na eficiência dos instrumentos de pesquisa,

proporcionando-lhes

qualidade

e

sofisticação

que

superam

as

necessidades dos pesquisadores. Com a normalização há uma descrição mais completa, pois obriga o técnico a aprofundar a pesquisa para preencher todos os campos. 

Situam os documentos com os demais relacionamentos dentro do acervo, contextualizando-os.

Módulo 8: Perspectivas, projetos e relações com o CONARQ Uma das preocupações expressas neste oitavo módulo foi averiguar como as instituições investem em suas unidades de arquivo, se existem projetos de aprimoramento dos trabalhos e como é o relacionamento da unidade e seus profissionais com o CONARQ e vice-versa. Em todas as instituições, os entrevistados afirmaram que possuem algum tipo de projeto para seus arquivos, porém nenhuma detalhou qual a fase da implantação. Em dois arquivos há a pretensão de se utilizar as normas para a descrição arquivística em seus projetos, sendo que em uma prevê a publicação impressa e eletrônica do inventário dos fundos de acordo com a NOBRADE e em outra há a previsão de descrever os registros de autoridades utilizando a ISAAR(CPF), a descrição de funções utilizando a ISDF e a utilização do novo módulo do ICA-ATOM para gerenciamento bibliográfico. Ainda discorrendo sobre investimentos no arquivo, foi averiguada a existência de programas ou incentivos de educação continuada para as equipes dos arquivos por parte das instituições. Em cinco há o apoio na forma de convênios, bolsas de estudos e descontos em instituições de ensino; formações e faculdades corporativas; horários flexíveis para participação de cursos e palestras durante o período de expediente. Em uma das equipes a maior dificuldade é o número reduzido de técnicos que os impedem de participar de cursos com maior freqüência. Nas demais instituições, a busca por novos conhecimentos parte dos próprios funcionários que arcam com seus custos. A respeito do relacionamento com o CONARQ, o acompanhamento das resoluções, novidades e publicações acontece por meio do site da internet, conforme afirmaram três profissionais. Nos demais arquivos, dois declararam receber alguma comunicação via e-mail pelo menos uma vez ao ano, um no formato de mala direta e outro em decorrência da adesão ao programa “Memórias Reveladas”. Todos afirmaram que em pelo menos dois

momentos o contato do CONARQ era mais constante: na ocasião do lançamento da ISAD(G) e da NOBRADE, pois participaram, inclusive, das oficinas e palestras oferecidas e no período em que se registraram no Cadastro Nacional de Entidades Custodiadoras de Arquivos, para a solicitação do código, elemento obrigatório na descrição conforme a NOBRADE. Como foi afirmado no módulo 7, quatro dos sete arquivos entrevistados tomaram conhecimento das normas por iniciativa própria e apenas dois conhecem as mais recentes normas. De maneira geral, não há canais formais de comunicação estabelecidos, para recebimento de correspondência, alertas ou publicações por parte do CONARQ. CONSIDERAÇÕES FINAIS Em uma cidade com quase 12 milhões de habitantes, é inimaginável a imensa quantidade de informações que circulam diariamente; registrando a existência e as ações de organizações e pessoas a todo instante e em diversos suportes. Este quadro não é comum apenas em grandes cidades como São Paulo, mas no mundo inteiro, em que cada vez mais há dependência de informações seguras e conhecimentos atualizados, tornando indispensável o uso de sistemas, que regulem e padronizem seu acesso, e pessoal especialmente qualificado para desempenhar tais tarefas, conforme demonstram estudos na área da arquivologia e ciência da informação, como Shellemberg (2004), Bellotto (2006), Thomassen (2006) entre outros, que definem e discutem acerca dos princípios que norteiam os trabalhos técnicos arquivísticos, os quais se destinam a acompanhar e sistematizar a produção, utilização e destinação dos documentos de arquivo em suas diferentes fases. Nas fases correntes e intermediárias, a gestão documental incumbe-se de planejar, organizar e dar acesso aos documentos, cujo valor primário se dá devido seu uso administrativo imediato, por meio de ferramentas de gestão apropriadas, sendo uma delas o plano de classificação, que agrupa e acondiciona os documentos em classes estabelecidas a partir da análise das funções e atividades de seu produtor, com a finalidade de racionalizar sua produção e utilização, cujo tempo de validade jurídico é determinado por outra ferramenta de gestão documental: a Tabela de Temporalidade de Documentos, que determina a destinação dos documentos após sua avaliação quando os prazos legais expiram. Se houver a obrigatoriedade de guarda ou possua valor histórico, os documentos são recolhidos em arquivos permanentes, que consideram o valor secundário, tornando-se testemunho histórico e cultural de seu produtor, servindo como memória ou subsídio das decisões administrativas no futuro. Caso o documento tenha perdido seu valor legal, administrativo e não tenha serventia como marco histórico, é encaminhado para a destruição.

Nos arquivos permanentes, os documentos são ordenados em arranjos, tendo como base os princípios de respeito aos fundos, considerando a estrutura lógica ou funcional de seu produtor, sem deixar de lado o plano de classificação, anteriormente utilizado. Para propiciar o acesso à estes documentos, são elaborados os instrumentos de pesquisa, oriundos do processo de descrição arquivística, que representa ou transcreve os documentos com a finalidade de possibilitar seu acesso em diferentes níveis, do mais abrangente ( que descreve a entidade produtora de documentos, seus fundos, grupos e coleções) até a mais específica (onde são descritos séries, dossiês e itens documentais). A necessidade de padronização e acesso às informações documentais, frente a modernização dos meios de comunicação e registro, intensivou e estimulou a criação de mecanismos e diretrizes a fim de facilitar estes trabalhos: as normas de descrição arquivística. Para entender como aconteceu de fato a aplicação destas normas para descrição arquivística foi necessário conhecer a realidade das instituições arquivísticas, procurando, ainda, verificar a combinação de fatores físicos, tecnológicos, financeiros e acadêmicos no processo de normalização e impactos da elaboração de instrumentos de pesquisa, como também avaliar o relacionamento técnico profissional como o CONARQ. Por questões logísticas e financeiras, a cidade de São Paulo constituiu o cenário da pesquisa, sendo selecionadas as instituições listadas no cadastro Nacional de Entidades Custodiadoras de Acervos Arquivísticos para compor o universo, totalizando 16 (dezesseis) instituições, sendo que 7 (sete) aceitaram prontamente em participar do trabalho. Esta pesquisa foi beneficiada pela utilização da entrevista como método de coleta de informações particulares e valiosas. A compreensão dos dados obtidos foi facilitada pela presença do pesquisador no local de trabalho dos técnicos entrevistados, aumentando a empatia em ambas as partes, tornando o trabalho prazeroso e satisfatório, atingindo os resultados conforme esperado, de maneira direta e prática. Com isso, os objetivos deste trabalho foram alcançados, retratando uma amostra da realidade dos arquivos paulistanos. A respeito da aplicação das normas para descrição, foi possível aferir mudanças nas rotinas técnicas, das mais sutis, como a descrição a nível institucional, até as mais complexas, como a ampla utilização do ICA-Atom e publicação de instrumentos de pesquisa em vários formatos, gerando discussões internas e vários apontamentos, positivos e negativos, que justificam a utilização efetiva ou a subestimação das normas. Isto também levou os profissionais a buscarem conhecimentos específicos da arquivologia.

Em comum a todas as instituições. Percebe-se que existem profissionais de boa vontade, que gostam do que fazem e que procuram se qualificar para bem desempenhar seus papéis nos arquivos. Com a inexistência de cursos de bacharelado em arquivologia e a escassez de profissionais arquivistas, a busca por conhecimento em palestras, mini cursos, extensões e especializações torna-se rotina no aperfeiçoamento do profissional, porém, sem atender plenamente as necessidades de gestão, desfavorecendo o fortalecimento da arquivologia paulistana, a unidade entre pares, estudos na área e trabalhos colaborativos. Desta forma, a qualidade dos trabalhos técnicos e dos instrumentos de pesquisa é influenciada pelo quadro de funcionários não especializado e o problema é acentuado com o número reduzido de pessoal nas equipes, afetando todo processo de gestão, guarda e acesso aos documentos em todas as suas fases. O cenário de fragilidade dos arquivos paulistanos é agravado pela diminuta ação do CONARQ, que não estabelece canais de comunicação com as instituições, cujas informações constantes em seu site são consideradas desnecessárias e irrelevantes, desestimulando o amadurecimento das práticas arquivísticas internacionais e trabalhos colaborativos. Lamentavelmente, muitas oportunidades de transmissão e partilha de conhecimentos são desperdiçadas. A análise dos resultados obtidos trouxe muitas inquietações, como a respeito da necessidade do curso de graduação em Arquivologia na cidade de São Paulo, do reexame e possível ampliação da reserva de mercado para profissionais de áreas correlatas ou, ainda, uma profunda revisão nos cursos de graduação dentro da Ciência da Informação, para que atendam a demanda de trabalho de forma competente, além do fortalecimento da atuação de órgãos e associações de classe. Por fim, espera-se que esta pesquisa suscite novos trabalhos, a reflexão e o aprofundamento das questões relativas à Ciência da Informação no universo dos acervos bibliográficos, arquivísticos e também museológicos, em reflexo à sua complexidade e abrangência, os quais não podem ser tratados de formas isoladas e fragmentadas. REFERÊNCIAS ABNT: Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 9578: Arquivos. Rio de Janeiro: 1986. ANDRADE, R. S. ; SILVA, R. R. G. da. Aspectos teóricos e históricos da descrição arquivística e uma nova geração de instrumentos arquivísticos de referência. Ponto de Acesso. Salvador, v.2, n.3, p. 14 - 29, dez. 2008. Disponível em: . Acesso em: 20 ago. 2013 ARQUIVO NACIONAL (Brasil). Dicionário brasileiro de terminologia arquivística. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2005. (Publicações Técnicas; nº 51).

BELLOTTO, H. L.. Arquivos permanentes: tratamento documental. 4. ed. Rio de Janeiro: FGV, 2006. BRASIL. Lei Federal 8.159, de 8 de janeiro de 1991. Dispõe sobre a política nacional de arquivos públicos e privados e dá outras providências. Diário Oficial da União, 9.1.1991 e retificado em 28.1.1991. CIA: Conselho Internacional de Arquivos. ISAD (G): Norma geral internacional de descrição arquivística: 2.ed., rev., adotada pelo Comitê de Normas de Descrição, Estocolmo, Suécia, 19 - 22 de setembro de 1999, versão final aprovada pela CIA. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2000. 119p. _______. ISDF: norma internacional para descrição de funções. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2008. 76 p. (Publicações Técnicas; nº 52) _______. ISDIAH: Norma internacional para descrição de instituições com acervo arquivístico. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2009. 88 p. (Publicações Técnicas; n. 54). CONARQ: Conselho Nacional de Arquivos (Brasil). Cadastro Nacional de Entidades Custodiadoras de Acervos Arquivísticos: Cidade de São Paulo Disponível em: http://www.conarq.arquivonacional.gov.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm. Acesso em: ago.2013 _______. NOBRADE: Norma Brasileira de Descrição Arquivística. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 2006 CUNHA, M. B. da; CAVALCANTI, C. R. de O.. Dicionário de biblioteconomia e arquivologia. São Paulo: Briquet de Lemos, 2008 FONSECA, V.M. da. Normas de descrição arquivística: preocupações e tendências. In: III Seminário Internacional de Arquivos de Museus e Pesquisas: Humanidades e Interfaces Digitais. São Paulo, 17 e 18 de setembro de 2013 (palestra proferida). GODOY, A.S.. Introdução à pesquisa quantitativa e suas possibilidades. RAE: Revista de Administração de Empresas. São Paulo, FGV, v.35, n.2, p.57 - 63. Mar. - abr. 1995. IBGE: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Estimativas populacionais para os municípios brasileiros em 01.07.2013. Disponível em: . Acesso em: 10. Out. 2013 _______. Produto Interno Bruto dos Municípios 2010. Disponível em:. Acesso em: 10. Out. 2013 LACERDA, S..Workshop: descrição arquivística e arquivos de fotografia. CPF: Centro Português de Fotografia. Porto, Portugal. 2007. Disponível em: . Acesso em: 16 abr. 2011. LOPEZ, A. P. A.. Como descrever documentos de arquivo: elaboração de instrumentos de pesquisa. São Paulo: Arquivo do Estado e Imprensa Oficial do Estado, 2002. 57p. PAES, M. L.. Arquivo: teoria e prática. 3.ed. rev. ampl. Rio de Janeiro: FGV, 2004.

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