Revelando o acervo fotográfico de Lenio Braga

May 22, 2017 | Autor: Marcelo Brazil | Categoria: Cultural Memory, Fotografia, Cine, musica, artes visuales, Artes Visuais, Lenio Braga
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Revelando o acervo fotográfico de Lenio Braga212 Revelando la colección fotográfica de Lenio Braga Marcelo Brazil Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB)

Essa comunicação propõe uma reflexão sobre o processo de digitalização de negativos que está sendo realizado como parte da pesquisa em andamento na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia – UFRB intitulada Entre sereias e poetas: a multiplicidade da obra de Lenio Braga. A investigação busca resgatar e catalogar a obra desse artista paranaense que viveu em Salvador, Bahia, de meados da década de 1950 ao final da década seguinte, período coincidente com a efervescência cultural que se instalou na cidade motivada pela criação dos cursos superiores de Música, Teatro e Dança na Universidade Federal da Bahia - UFBA. O escritor Antônio Risério destaca o papel de Edgard Santos, reitor na época, como promotor do que ele denomina Avante-Guarde na Bahia, título de seu trabalho de mestrado que originou o livro de mesmo nome lançado em 1995. Ao lado do maestro alemão Joachim Koeullreutter, da dançarina polonesa Yanka Rudska e do diretor teatral Martim Gonçalves, Edgar Santos trouxe também para Salvador o filósofo português Agostinho da Silva com o intuito de criar o Centro de Estudos AfroOrientais (CEAO), inaugurado em 1959. É exatamente nesse ponto que se dá a entrada de Lenio Braga nesse movimento, atuando como desenhista e fotógrafo oficial do CEAO, além de continuar desenvolvendo sua carreira em outras linguagens artísticas como pintura e design. A primeira fase da pesquisa em andamento está direcionada para a digitalização e catalogação da obra fotográfica de Lenio Braga que inclui registros de candomblés, personalidades da época, exposições no antigo Museu de Arte Moderna da Bahia - MAMB (atual Museu de Arte Moderna - MAM), parte do processo de 212



Trabalho apresentado ao GT 6 - Diálogos interdisciplinares: memória, espaço e culturas. 444

reforma do Solar do Unhão que foi realizada sob a responsabilidade da arquiteta Lina Bo Bardi, além de registros do cotidiano baiano. Por enquanto, o trabalho está concentrado no arquivo familiar do artista que conta com cerca de 1000 negativos, em sua maioria nos formatos 60X60mm e 24X36mm, em preto e branco. O processo de digitalização em alta definição será realizado com o auxílio de um scanner específico para tal finalidade, onde será importante o auxílio da equipe da Fundação Pierre Verger que, recentemente, realizou a digitalização e catalogação do acervo do fotógrafo francês. Tal processo foi registrado no livro Memórias de Pierre Verger, publicado em 2015, que servirá de referência para essa fase da pesquisa. Para a catalogação inicial do material está sendo realizada uma captação das imagens através de uma camera fotográfica sobre uma mesa de luz e é exatamente esse processo de fotografar o negativo que gera essa reflexão, considerando que ele se aproxima, em alguns aspectos, do processo tradicional de produção fotográfica que era utilizado antes do advento da fotografia digital. Desvendar, com um processo atual, o que se esconde naquelas películas de cores invertidas pode ser comparado ao trabalho dos fotógrafos que revelam (ou revelavam) e ampliam (ou ampliavam) seus registros em casa, caso de Lenio Braga. Para fotografar um negativo é necessário pensar em enquadramento, foco, abertura, velocidade da mesma forma que em um registro original. Após isso, é preciso revelar e ampliar, checar o equilíbrio de cores, nitidez, ou seja, é quase como se deslocar para uma câmara escura para fotografias em película. A principal diferença está na imagem que traz consigo um momento da memória passada que ficou guardado ali. O passado está registrado naquele instante e não existe a possibilidade de pensar em outro posicionamento da câmara, não se pode buscar outro ângulo ou uma luz mais apropriada para o registro original, muito menos se fotografar dezenas de vezes o mesmo objeto ou paisagem, prática comum com os recursos digitais atuais. É um registro único e ali estão guardadas, além da imagem, todas as escolhas do fotógrafo naquele instante. Além de perguntas iniciais como “Que lugar é esse?” ou “Quem aparece nessa fotografia?” é interessante ir um pouco mais adiante e tentar refletir sobre o que levou o fotógrafo a escolher esse ângulo ou, ainda, o que o motivou a captar essa imagem. Diante das deficiências de alguma imagem registrada, parece necessário também pensar nos recursos técnicos que foram utilizados e também quais eram os disponíveis na época. De uma forma geral, parte das deficiências da fotografia



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original ficarão mantidas e isso preserva, de certa forma, a originalidade e a memória daquele momento registrado. Também parece possível, durante o processo de rever os registros fotográficos do artista através de uma camera, se aproximar das escolhas estéticas que foram feitas em cada série de fotografias sobre um mesmo tema ou mesmo naquelas que parecem ter sido realizadas fora de uma temática central ou que simplesmente se misturaram ao longo do tempo. Apesar dessas semelhanças percebidas na comparação do processo de fotografar os negativos com a captação inicial da imagem, algo do registro inicial jamais poderá ser recuperado: aquilo que Lenio viu pela lente de sua camera em suas cores originais. Muito distante disso, a nova fotografia registra uma imagem de cores invertidas que só se revela identificável após um processo de edição digital. No processo original, o fotógrafo busca o acabamento final da imagem na etapa de ampliação tendo como referência a imagem real, aquela que o levou a realizar a fotografia. Mesmo que altere as cores e o contraste, estará dialogando com a imagem real o tempo todo e fará, naquele momento, suas escolhas técnicas e estéticas. A única forma de se aproximar um pouco dessas escolhas é analisar as fotos ampliadas pelo próprio fotógrafo, buscando compreender que caminhos o levaram decidir por um tipo específico de resultado. Realizar esse processo é, na verdade, dialogar com, pelo menos, dois tipos de memória: aquela cristalizada no negativo, ou seja, a imagem em si, e a das escolhas técnicas e estéticas do fotógrafo. Se por um lado é possível resgatar um registro histórico de um momento passado, por outro se pode ampliar a compreensão da obra do artista que pode, ainda, se refletir no estudo de sua produção nas outras linguagens em que trabalhou. Um primeiro resultado já transparece ao se perceber um gosto especial pelos registros da espontaneidade das pessoas simples em espaços populares como feiras, mercados, festas de rua ou até em uma exposição de Portinari no MAMB. Mesmo quando fotografa personalidades da época, Lenio busca registrar momentos naturais da vida dessas pessoas, como é o caso da série de fotos do artista plástico Carybé brincando no jardim com sua filha Solange. Nos aspectos técnicos é possível perceber sua predileção pelos fortes contrastes com uma predominância de tons escuros.



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Esse tipo de percepção e análise irá guiar todo o desenvolvimento do processo e poderá contribuir para o desenvolvimento de novos mecanismos de leitura das memórias históricas e artísticas.

Palavras-chave: Lenio Braga; fotografia; memória; artes visuais; Salvador Palabras claves: Lenio Braga; fotografía; memoria; artes visuales; Salvador



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