Revista Arqueologia Pública 1, 2006 Arqueologia Pública

September 5, 2017 | Autor: P. Funari | Categoria: Arqueologia, Arqueologia Pública, Arqueologia Da Repressão
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Revista Arqueologia Pública

Publicação Anual no 1 2006

UNICAMP NEE / ARQUEOLOGIA PÚBLICA

São Paulo, Brasil

Revista Arqueologia Pública, São Paulo, nº 1, 2006.

Editores

Pedro Paulo Abreu Funari (NEE/UNICAMP) Erika Marion Robrahn-González (NEE/UNICAMP)

Comissão Editorial Lourdes Dominguez (Oficina del Historiador, Havana, Cuba) Andrés Zarankin (UFMG) Gilson Rambelli (NEE/UNICAMP) Nanci Vieira Oliveira (UERJ) Ana Pinon (Universidad Complutense de Madrid, Espanha) Pedro Paulo Abreu Funari (NEE/UNICAMP) Erika Marion Robrahn-González (NEE/UNICAMP) Charles Orser (Illinois State University, EUA)

Conselho Editorial Gilson Martins (UFMS) José Luiz de Morais (MAE/USP) Peter Ucko (Institute of Archaeology, UCL) Laurent Olivier (Université de Paris) Sian Jones (University of Manchester) Martin Hall (Cape Town University, South Africa) Bernd Fahmel Bayer (Universidad Nacional Autónoma de México)

Projeto gráfico José Luiz de Magalhães Castro Neto

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Revista Arqueologia Pública, São Paulo, nº 1, 2006.

EDITORIAL Arqueologia Pública é um conceito de recente desenvolvimento, resultado das transformações no âmbito das sociedades e das ciências, nas últimas décadas. Desde o fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), as diversas sociedades passaram por transformações profundas, em particular com a emergência social de grupos como as minorias étnicas e as mulheres. Os movimentos pelos direitos civis e pela emancipação feminina intensificaram essas tendências e foram seguidos por múltiplos outros, tais como a luta contra o belicismo, pela liberdade de opção sexual, pela liberdade política e social, em diferentes países. A década de 1980 viria a consolidar essas novas realidades, com o questionamento da homogeneidade social e com a luta pelo respeito e valorização da diversidade ambiental e cultural. As ciências não deixaram de ser afetadas. A neutralidade da ciência foi questionada, assim como a objetividade, herdada do positivismo, da pesquisa científica. Os modelos normativos de interpretação da sociedade foram postos em cheque e a distância da ciência em relação à sociedade foi criticada. Como resultado, as ciências passaram a interagir, de forma programática e consciente, com os grupos sociais, visando a políticas públicas. No campo da Arqueologia, estas mudanças levaram à constituição do Congresso Mundial de Arqueologia, em 1986, e à interação entre arqueólogos e indígenas e membros das comunidades em geral. No Brasil, a expressão Arqueologia Pública, surgida em âmbito anglo-saxão, ainda é nova e pode levar a confusão. De fato, público, em sua origem inglesa, significa “voltada para o público, para o povo” e nada tem a ver, stricto sensu, com o sentido vernáculo de público como sinônimo de “estatal”. Ao contrário, o aspecto público da Arqueologia refere-se à atuação com as pessoas, sejam membros de comunidades indígenas, quilombolas ou locais, sejam estudantes ou professores do ensino fundamental ou médio. A ação do Estado dá-se, de maneira necessária, por meio da legislação de proteção ambiental e cultural que leva empreendedores – empresas privadas ou públicas – a custearem estudos de impacto ambiental e cultural. Nem sempre tais estudos visam à ação pública, no sentido mencionado acima, de interação com as pessoas. Do nosso ponto de vista – e esta revista serve a este propósito – a ciência não deve alhear-se da sociedade, sob o manto diáfano do empirismo. A Arqueologia Pública, entendida como ação com o povo, para usarmos uma expressão de Paulo Freire, permite que tenhamos uma ciência aplicada em benefício das comunidades e segmentos sociais. A nova publicação está aberta a todos.

Pedro Paulo A. Funari Erika M. Robrahn-González

A publicação deste volume foi possível graças ao apoio da Companhia de Cimento Ribeirão Grande (CCRG) que vem realizando um programa de pesquisa em arqueologia publica do Programa de Ampliação da Mina Limeira, município de Ribeirão Grande / SP. Ficam aqui nossos agradecimentos especiais ao engenheiro Luiz Carlos Busato, que prontamente acatou a idéia de tornar público os resultados alcançados pelo trabalho. 3

Revista Arqueologia Pública, São Paulo, nº 1, 2006.

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Revista Arqueologia Pública, São Paulo, nº 1, 2006.

Sumário

Artigos 7

A divulgação do patrimônio arqueológico em Castilla y Leon (Espanha): o desafio dos espaços divulgativos

Ana Maria Mansilla Castaño 19

Arqueologia, publico e comodificação da herança cultural: o caso da cultura Marajoara

Denise Pahl Schaan 31

Para saber o que o público pensa sobre arqueologia...

Marília Xavier Cury 49

O que é isso? Para que serve? Quem são vocês? O que fazem? Uma experiência de Arqueologia Pública em Paranã – TO

Leilane P. Lima Gilberto da Silva Francisco 63

Arqueologia e sociedade no município de Ribeirão Grande, sul de São Paulo: ações em arqueologia pública ligadas ao Projeto de Ampliação da Mina Calcária Limeira.

Erika Marion Robrahn-González

Resenhas 123

Envisioning the past. Archaeology and the image.

Ana Maria Mansilla Castaño 125

Appropiated pasts. Indigenous peoples and the colonial culture of Archaeology.

Ana Maria Mansilla Castaño

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Revista Arqueologia Pública, São Paulo, nº 1, 2006, pgs. 7-18.

A DIVULGAÇÃO DO PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO EM CASTILLA Y LEÓN (ESPANHA):O DESAFIO DOS ESPAÇOS DIVULGATIVOS Ana Maria Mansilla Castaño*

Resumo: O interesse pelo patrimônio e particularmente pela sua divulgação é um fenômeno global. Na Espanha isto acontece nas últimas décadas. Neste artigo se analisa o caso de uma Comunidade Autônoma, Castilla y Leon, caracterizada pela riqueza e diversidade do seu patrimônio. O principal objetivo deste texto é a dimensão discursiva dos diferentes espaços divulgativos, museus, sítios arqueológicos e centros de interpretação, visando a avaliação de suas características e inter-relações. Enfatiza os pontos fracos e as alternativas teóricas e práticas.

Palavras chave: patrimônio arqueológico – divulgação – Espanha – Castilla y León

Justificativa e contextualização da pesquisa Sob o ponto de vista disciplinar e social é cada vez mais evidente o crescente protagonismo da divulgação arqueológica (Ballart 1997, Ballart e Juan 2001), o que se vem concretizando no maior número de artigos dedicados ao tema nas revistas especializadas, na presença em congressos e cursos de todo tipo, e claro, no significativo número de projetos de pesquisa arqueológica que incluem, de uma forma ou outra, um apartado específico sobre este tema, embora não tenha atingido ainda esse protagonismo na formação universitária. Mas este contexto não tem vindo acompanhado de uma pesquisa no mesmo nível. Isto é, na Espanha em geral a divulgação se tem man-

(*) Escola Oficina de Restauro de Salvador [email protected]

tido como um campo marcado pela ação mais do que pela reflexão crítica. Esta proposta centra-se numa Comunidade Autónoma, Castilla y León, especialmente atrativa por diversas razões: em primeiro lugar, por o significativo número de sítios arqueológicos visitáveis, de caráter marcante, alguns deles Patrimônio da Humanidade como Atapuerca (Burgos) ou Las Médulas (León); em segundo lugar, pela ativa política de divulgação arqueológica que se vem realizando nela e, em terceiro lugar, por não ser nenhuma das comunidades históricas, como são Cataluña ou Galicia, cuja dinâmica neste âmbito tem sido bastante diferente, com uma maior projeção e tradição, em alguns casos. A Comunidade de Castilla y León pode ser considerada paradigmática do papel que tem o patrimônio na sociedade atual, pois são coincidentes nela muitos dos problemas e potencialidades que afetam o patrimônio em sua relação como o turismo, a econo7

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mia, as políticas, o mercado de trabalho, a pesquisa e os pesquisadores. Apenas recentemente o patrimônio arqueológico começa a mergulhar nesta densa rede de relações e conflitos de interesses. Em resumo, é agora que começa a adquirir uma maior visibilidade. A Comunidade Autónoma de Castilla y León está formada por nove províncias, Ávila, Burgos, León, Palencia, Salamanca, Segovia, Soria, Valladolid e Zamora, desde a aprovação do Estatuto de Autonomia, em 1981 (Figura 1).

Fig. 1 - Mapa de Castilla y León e seu referente Europeu.

Uma das principais características de Castilla y León é sua grande extensão geográfica, quase 95.000 Km2 sendo uma das regiões mais grandes não somente da Espanha, mas da Europa. Isto em claro contraste com sua escasa população, apenas 2.500.000 habitantes (Valdeón 1996: 36-38). A isto se acrescenta um forte envelhecimento da população. Embora, haja uma tendência ao equilíbrio frente a décadas anteriores, pois a população não tem descendido de forma marcante, por causa dos baixos índices de mortalidade e a menor incidência da emigração. A isto se acrescentam os efeitos da imigração que acontecem nesta comunidade, como também no resto do país. Sob o ponto de vista econômico, a relevância da agricultura tradicional está diminuindo frente às pequenas empresas e ao setor serviços. O turismo, principalmente o 8

turismo cultural, tem um papel protagonista desde meados da década dos 90. A incorporação de Espanha à Comunidade Européia tem tido uma grande influência na economia castellano-leonesa, especialmente no âmbito do patrimônio, através de programas de financiamento europeu, entre cujos objetivos encontra-se o desenvolvimento de zonas rurais oferecendo ajudas a iniciativas que contribuam ao aprimoramento social e econômico de zonas desfavorecidas, criando emprego e promovendo a fixação da população nas ditas áreas. Levando em consideração a riqueza e variedade de sítios de Castilla y León, era possível ter realizado um estudo mais detalhado de algum exemplo significativo. No entanto, o objetivo era poder oferecer tanto uma visão de conjunto, quanto a posibilidade de comparação com outros casos, mais que incidir na singularidade, no caráter de unicum de algum destes sítios. Neste sentido, a proposta de análise dos discuros não é um análise de conteúdo stricto sensu, entendido como o estudo detalhado quantitativo e qualitativo das mensagens a partir do discurso divulgativo concreto de todos e cada um dos espaços divulgativos que integram a amostra, ou de algum deles, também não é uma “receita pronta” de projeto de divulgação do patrimônio arqueológico. O objetivo não era esse, não se pretendia conhecer como se divulga um determinado tema, às vezes recorrente, mas aprofundar o conhecimento sobre as práticas divulgativas aqui e agora, atendendo ao que se diz, o que se faz e o que deveria ser feito. Toma-se para isso os discursos como objeto de estudo, tratados no seu sentido mais amplo, como concepção sobre um campo concreto, neste caso a divulgação, que articula tanto textos quanto espaços e ações. Dado que a disciplina arqueológica amplia suas áreas de atuação e neste sentido a divulgação é uma parte fundamental, também precisa ser objeto de pesquisa como os outros temas até agora prioritários, o que justifica uma pesquisa deste tipo.

A divulgação do patrimônio arqueológico em Castilla y Leon (Espanha): O desafio dos espaços divulgativos Ana Maria Mansilla Castaño

Ante a falta de um quadro de referência único se recorreu a elementos procedentes de diferentes disciplinas. Com efeito, é problemático definir como museológica, arqueológica, turística, sociológica ou antropológica esta pesquisa, mesmo que pela temática, pelos aspetos que são tratados, pelas experiências prévias inspiradoras e pela metodologia, responda, de alguma maneira, a todas elas, embora não seja de forma pura. Optou-se pela permeabilidade disciplinar que se considerou mais operativa que o bloqueio ante a falta de uma etiquete adequada. Mesmo arriscando não reunir stricto sensu as características mais ortodoxas dos estudos-tipo de tais disciplinas. Era esta a alternativa para poder realizar uma pesquisa que desse resposta às perguntas feitas: Como se divulga na prática? Houve uma transformação nos discursos, ou são apenas mudanças formais conforme a uma política favorável à divulgação? Esta pesquisa procurava contribuir ao avanço do conhecimento na disciplina arqueológica tomando como objeto de reflexão um âmbito, o da divulgação, o qual no momento atual não tem atingido o patamar de debate e o grau de amadurecimento alcançado já em outros âmbitos. Finalmente, colocar os discursos como centro de atenção deslocando ao patrimônio arqueológico propriamente, supunha a introdução de um novo olhar, no qual a comunicação tem uma grande relevância. Entra aqui em jogo a dimensão pessoal, subjetiva e qualitativa. Algumas considerações metodológicas prévias

teórico-

Sob o ponto de vista teórico, embora seja difícil uma adscripção definitiva, esta pesquisa não pode se desligar das teorias pos-processuais, inclusive do que autores como Hodder (1999: 5) chamam de pos-posprocessuais. Não se pretendia um seguimento estrito de suas idéias. Também não se pretendia realizar uma pesquisa de profun-

da carga teórica, nem atacar os alicerces da prática arqueológica processual. Embora, é claro, que o tipo de temas dos quais se trata, os discursos e a ênfase em determinados aspectos, como a dimensão social da disciplina enquadram-se nesta linha de pensamento das ciências sociais, não apenas arqueológica. Nela a subjetividade, a relevância da eleição pessoal e o pluralismo têm um claro protagonismo. Neste sentido, as experiências tanto do âmbito anglo-saxão (Colley 2000, McManamom e Hatton 2000) quanto da América do Sul (Funari, Neves e Podgorny 1999) têm sido influências marcantes. Um tema como este e tratado sob este olhar somente era possível neste quadro teórico de referência. No que diz respeito à metodologia, a opção pela etnografia tem sido uma decisão de caráter operativo. Embora possa se considerar uma aplicação heterodoxa, assumiuse o olhar antropológico (Jociles 1999a: 8) e as técnicas de pesquisa próprias da etnografia. No entanto a aplicação destas técnicas, a análise do discurso (Jociles 2000), as entrevistas (Sanmartín 2000) e a observação participante (Jociles 1999b) são uma versão mais leve a respeito ao ideal proposto. No caso concreto dos espaços divulgativos, a coleta de informação in situ foi completada com a aplicação das outras técnicas de pesquisa na abordagem de alguns aspectos da pesquisa que não são o objeto deste artigo. Como são os discursos dos agentes da divulgação, entre eles os diretores de museus, empresas de arqueologia, servidores públicos da área de arqueologia e pesquisadores, assim como a analise dos discursos de diferentes tipos de materiais divulgativos, guias arqueológicos, folders e outros (Mansilla 2005) e dos discursos do público que visita esses espaços divulgativos. É, pois, uma metodologia imperfeita, suscetível de aprimoramento que poderá ser concretizada em próximas pesquisas. Embora não seja a metodologia ótima, tem sido operativa, partindo de experiências diversas, de clara orientação antropológica, que permitiram realizar a análise

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dos conjuntos discursivos e atingir conclusões válidas. ANALISE Segue-se a análise dos discursos dos espaços divulgativos, museus, sítios arqueológicos e aulas arqueológicas. É este o tipo de discurso que têm uma maior incidência no público ou uma maior visibilidade. O que se denominou discurso dos lugares é um conjunto amplo e complexo, formado por uma amostra que se considerou suficientemente representativa. Tanto sob o ponto de vista quantitativo (10 museus, entre os quais estão inclusos aqueles que têm seções de arqueologia e os estritamente arqueológicos, 36 sítios arqueológicos e 23 aulas arqueológicas), quanto qualtitativo, ao incluir na amostra os exemplos mais significativos das diferentes províncias. No entanto, levando em consideração o caráter dinâmico da divulgação, no momento de fechar a pesquisa abriram-se e, com efeito, continuam a ser abertos ao público novos espaços divulgativos que não foram

possíveis incluir na análise. No momento atual há mais de trinta aulas abertas (Val e Escribano 2004). São estes os espaços divulgativos mais novos, ubicadas perto dos sítios arqueológicos, em prédios de arquitetura rural ou prédios da comunidade atualmente fora de uso, sendo seus principais objetivos: 1) complementar, embora não substituir, os museus, 2) servir de explicação, preparar e provocar a visita aos sítios e 3) obter rentabilidade social e cultural nos lugares onde a Administração já tinha investido previamente. As aulas arqueológicas se caracterizam por seu pequeno tamanho, o protagonismo dos elementos visuais, auditivos e tácteis e a ausência de um acervo próprio, de serviços associados de conservação, documentação e pesquisa de materiais originais. Optou-se pela limitação do número das variáveis, mesmo que o potencial de análise fosse muito maior, de forma que fosse possível a comparação entre os diferentes espaços. Assim mesmo, isto obrigava a inclusão de algumas variáveis quantitativas. Cada espaço introduz algumas nuances, mas as variáveis analisadas foram oito. (Figura 2).

Fig. 2 -Variáveis analisadas nos discursos dos lugares.

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A divulgação do patrimônio arqueológico em Castilla y Leon (Espanha): O desafio dos espaços divulgativos Ana Maria Mansilla Castaño

A relação de alguma destas variáveis com o discurso divulgativo pode resultar pouco evidente, como é no caso da acessibilidade (Espinosa 2002a, 2002b) ou das infra-estruturas, que podem nos fazer pensar mais numa simples descrição de que elementos apresentam os diferentes espaços e quais faltam. No entanto, entendendo o término discurso no sensu lato, não estritamente linguístico, tais variáveis são significativas pois estão mostrando uma forma de entender a divulgação, da qual desprende-se uma determinada valorização da experiência e da relação com o público, neste contexto concreto, ambas pouco valorizadas. Da análise dos discursos dos museus, desprendem-se quatro conclusões: 1. As instalações museográficamente recentes, como as dos Museus de Zamora e Palencia, supuseram uma mudança formal

com um maior protagonismo do discurso visual, mas sem que tenha acontecido uma verdadeira transformação do discurso clássico. Este se articula basicamente no entorno de cartazes, vitrines e objetos individualizados. (Figura 3). 2. Sob o ponto de vista das atividades divulgativas, os museus são mais dinâmicos do que erroneamente se pensa. Com efeito, é no Museu de Ávila onde se têm realizado algumas das mais interessantes experiências. Ao mesmo tempo, têm um grande potencial neste sentido pelas suas infraestruturas e acessibilidade, apesar das limitações de pessoal. 3. A falta de estudos de público é uma das grandes carências ainda hoje, tanto nas exposições temporais quanto nas permanentes, indo além dos comentários emotivos e das referências numéricas que

Fig. 3 - Tipos de discursos expositivos.

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são tomados como marcadores do sucesso das exposições (Asensio 1996, Asensio y Pol 2002a, 2002b, 2003, Asensio, Pol, Calderia y Alteria 1999). Neste sentido, o público tem um papel secundário. 4. Faltam, assim mesmo, estudos sobre as relações entre as exposições temporais e a exposição permanente, e seu efeito no público (Kelly 2000), que incidam nas influências que podem ter sobre elas os fatores externos. Principalmente naquelas de maior sucesso como foi o caso de Celtas y Vettones em Ávila (VV.AA. 2001) ou Atapuerca un millón de años em Burgos (Bermúdez de Castro, Arsuaga, Carbonell e Rodríguez 1999). Em relação ao discurso dos sítios arqueológicos, até agora se tem atuado no nível macro, atendendo ao acondicionamento dos sítios, sua conservação e sinalização, no entanto, falta ainda o desenvolvimento do nível micro, isto é, dos detalhes e da articulação entre os diferentes elementos para atingir uma divulgaçao efetiva, integrando a sinalização, a informação in situ e os materiais complementares. Tem-se incidido principalmente nos cartazes. No entanto, isto não é suficiente, daí que uma boa divulgação nestes espaços passe por: 1. Uma boa informação em todos os âmbitos, frente a situações como a vila romana de Navatejera em León, desconhecida para a maioria dos turistas, apesar de sua proximidade à cidade. 2. Uma oferta adequada aos tipos de público reais, cientes e explicitando que nem todo o público pode ter acesso a determinados sítios. Isto acontece com Ulaca em Ávila, onde as própias condições físicas do sítio numa altura elevada e de difícil acesso restringem as visitas. 3. Uma boa comunicação com o público, através de recursos acessíveis física e inteletualmente. Levando em consideração que a visita in situ em geral atende a diferentes aspectos como o conhecimento, as experiências e as atitudes, bem como favorece 12

uma melhor aproximação ao patrimônio arqueologico, são quatro os elementos chave que necessitariam ser repensadas e melhor articuladas visando o acondicionamento dos sítios: 1) 2) 3) 4)

A paisagem Os restos arqueológicos A própria experiência da visita Os materiais complementares

As aulas arqueológicas, o espaço divulgativo mais novo, embora sua diferente denominação responde de fato à mesma problemática comum aos centros de interpretação. Seu crescimento como instrumento de geração de renda e emprego, bem como de dinamização turística, são objetivos nem sempre atingidos (Mansilla 2004 e e.p., Mateos 2003). 1. Observa-se uma certa uniformidade no que diz respeito ao tipo de discurso textual, embora com algumas diferenças na extensão das unidades textuais, no estilo, no tom e no léxico. Nos diferentes elementos divulgativos das aulas, acontecem as mesmas fraquezas, inclusive na aula soriana de Antiqua Osma, a única que oferece uma visita audio-guiada. De maneira que algumas das características que se observam nos discursos textuais dos cartezes e painéis, encontram-se também nos vídeos. Há unanimidade quanto à importância de reduzir a extensão dos textos e evitar o excesso de termos muito específicos. No entanto, não se pode falar propriamente de um estilo típico da interpretação do patrimônio, mais direto, que chegue aos diferentes tipos de público, que apele aos conhecimentos ou experiências prévios dos visitantes, que provoque o interesse, que suscite câmbios de atitude principalmente nas questões relativas à valorização e proteção do patrimônio arqueológico. Não há mensagens diretas deste tipo. 2. No que diz respeito aos conteúdos, as aulas parecem procurar um equilíbrio entre a introdução de novidades formais próprias de um discurso expositivo contemporâneo (Figura 4) e a autoproclamada objetividade baseada nos dados, na pesquisa etc. Não são

A divulgação do patrimônio arqueológico em Castilla y Leon (Espanha): O desafio dos espaços divulgativos Ana Maria Mansilla Castaño

Fig. 4 - Recreação de ambiente romano. Aula Arqueológica Aguilafuente (Segovia)

apresentadas narrativas que resultem significativas para os diferentes públicos. Isto implica um discurso que é muito historicista em alguns casos, no seu sentido mais tradicional e distante, muitas datas e dados, governantes e um mundo masculino de batalhas, detalhe arquitetónico, tático e técnico, que se conecta pouco com a experiência quotidiana do visitante, como se aprecia principalmente nas aulas da rota das fortificações de fronteira em Salamanca, as quais se afastam das atuais linhas de pesquisa da arqueologia histórica de autores como Lydon (1999) ou Funari (1998, 1999) nos seus diferentes contextos. No que diz respeito às expectativas, na maioria dos casos nos quais o visitante não tem uma idéia muito precisa do que vai ver, o grau de satisfação é elevado. Pelo contrário, se aprecia uma certa decepção quando as expectativas são maiores, como acontecia na aula dedicada a Atapuerca.

3. A Imagem das aulas nao é homogênea, nem sequer nas que formam parte das rotas arqueológicas como a dos Valles de Zamora, e sua articulação com outros espaços divulgativos do patrimônio arqueológico não está muito definida. 4. Falta uma adequada avaliação dos elementos expositivos, fundamentalmente das aportações reais dos elementos mais novedosos frente aos mais tradidionais. Aqui entraria o tão discutido tema da interatividade.(Ramos 2003). Levando em consideração as características gerais dos discursos nos diferentes espaços, aprecia-se que são mais os elementos partilhados do que as divergências: (Figura 5). 1. Observa-se uma semelhança estrutural entre os diferentes espaços. 2. Existe uma desconexão entre o discurso sobre o patrimônio e o papel do pró13

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Fig. 5 - Discurso dos lugares.

prio patrimônio, o significado do passado na sociedade contemporânea. 3. Não tem havido uma transformação do discurso divulgativo, que continua sendo demorado no seu estilo e no seu ritmo, carente de hierarquização, com um léxico pouco adequado aos contextos e suportes. Tem-se produzido mudanças formais, com a diversificação dos espaços divulgativos e a introdução de elementos expositivos contemporâneos. 4. Nao se incide no significado nem no sentido dos discursos para os diferentes tipos de público. 5. Transmite-se uma imagem da arqueologia como provedora de restos materiais, no entanto, seus praticantes estão ausentes. Nao há uma mensagem patrimonial explícita. 6. O passado se identifica com os restos materiais, colocando num segundo plano as sociedades. 7. A falta de avaliação e o desconhecimento do público são as duas carências mais destacadas.

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CONCLUSÕES E PERSPETIVAS Chegados a este ponto, são mais as questões que tem ficado pouco definidas, e também as linhas de pesquisa que ficam abertas com este trabalho, do que as respostas definitivas. Assim, em primeiro lugar, não se estabeleceu uma tipologia clara de discursos divulgativos, o que tem sido mais uma reflexão voltada para os aspectos práticos. Em segundo lugar, não se estabeleceram as representações sociais (Ibáñez 1988) nem relativas ao patrimônio arqueológico, nem à sua divulgação. De fato, não se definiram quais são as imagens do patrimônio que estão sendo transmitidas ao público. Talvez por serem estas duas questões diferentes, uma o que é o patrimônio e como é trasmitido, e uma outra, como é visto e entendido pelo público. No entanto, uma primeira aproximação a este aspecto foi feita através do estudo piloto sobre o público. As linhas de pesquisa abertas são multiplas, tanto aprofundando na dimensão horizontal que permita a comparação

A divulgação do patrimônio arqueológico em Castilla y Leon (Espanha): O desafio dos espaços divulgativos Ana Maria Mansilla Castaño

entre diferentes âmbitos geográficos, como na vertical, aprofundando em diversos aspectos quase não tratados. Fundamentalmente na ênfase dos aspectos que mais incidem no fortalecimento das imagens populares sobre o patrimônio arqueológico, as atividades e materiais complementares, os produtos à venda etc. e os mecanismos que intervêm no dito processo. Em definitivo, trata-se de colocar o público em primeiro lugar, assumindo que o processo divulgativo não finaliza na transmissão de determinados conhecimentos. Pelo contrário, estes são re-elaborados ou rejeitados pelo imaginário popular que, ao mesmo tempo, está incidindo na valorização social do patrimônio num sentido ou noutro. Com respeito à pergunta chave feita inicialmente, até que ponto se tem produzido uma transformação dos discursos divulgativos, ou apenas uma maquialhem formal dos mesmos, as respostas são múltiplas: 1) As mudanças além dos aspetos formais não são tão radicais. 2) Ainda não houve o passo para um discurso propriamente divulgativo. 3) A divulgação do patrimônio arqueológico ainda é um âmbito da arqueologia um pouco difuso. 4) Não se conhecem os diferentes tipos de público. No entanto, são também numerosas as vias de atuação que se abrem para aprimorar a divulgação, tanto sob o ponto de vista teórico quanto prático. Entre o que se pode considerarcomo propostas teóricas, destacase: 1. A análise dos discursos divulgativos em outros soportes, Internet, CDs, o que permitiria contrastar até que ponto, em alguns casos, se mantêm algumas das caraterísticas que se encontram em suportes mais tradicionais como são os cartazes, os folders ou as guias. 2. A autocrítica entre os especialistas em divulgação: a responsabilidade neste âmbito não corresponde apenas a quem fica fora da disciplina.

3. A aproximação ao olhar de outros coletivos, principalmente profissionais da educação, da mídia e do turismo. 4. A análise das imagens patrimoniais populares, para poder estabelecer uma melhor comunicação com o público visando a modificação de idéias erradas e a introdução de outras novas.

Entre as propostas práticas podem ser destacadas: 1. A reorientação da formação, tanto no âmbito formal, universitário, onde com efeito se estão incorporando cursos principalmente de pós-graduação, quanto no campo não formal, através de uma formação continuada com oficinas de tipo prático destinadas às pessoas que estão em contato direto com o público. Isto como uma forma, ao mesmo tempo, de compartilhar experiências e melhorar a qualidade do serviço que oferecem aos visitantes.1 2. A potenciação da dimensão pessoal. Sucesso ou fracaso nas experiências dependem muito mais das pessoas do que da dotação de infra-estruturas, como se pode apreciar no caso dos sítios arqueológicos de Numancia (Soria) (Jimeno, Sanz, Benito e Torre 2004) ou Pintia (Valladolid) (Sanz et alii 2003) nos quais, graças ao entusiasmo e perseverância das equipes, conseguem-se resultados muito bons. Neste sentido, é preciso, de uma parte, considerar a divulgação num âmbito no qual os estudantes precisam se formar, e de outro lado, é preciso ampliar o contexto local na incorporação de novos profissionais da divulgação, pois nem sempre é fácil poder contar com esses perfis nas populações pequenas. 3. A imagem que tenho apresentado da situação atual da divulgação do patrimônio arqueológico em Castilla y León, partindo da

(1) É importante destacar o papel da Asociación para la Interpretación del Patrimonio no sentido de aprimorar a qualidade, a formação e a prática da interpretação do Patrimônio.

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analise dos discursos divulgativos, não é uma imagem definitiva. Com certeza nos diferentes aspectos críticos aos que se fez referência, se atenuarão e irão se corrigindo como resultado da própria prática divulgativa. Alguns dos casos analisados se renovarão ou serão completamente substituídos com a introdução de novidades que não foram indicadas. Também não é a imagem de uma situação única, se considera que tanto as fraque-

zas quanto as alternativas propostas não surgem da singularidade das próprias características e da história particular de cada um dos espaços divulgativos. Trata-se mais do resultado da aplicação de uma metodologia de análise que poderia ser extrapolada a outros contextos, com rumos bastante diferentes. Isto permitiria, assim mesmo, melhorar a definição e o ajuste da mesma para superar as carências que se têm apresentado neste caso concreto.

Abstract: The interest in archaeological heritage and particularly in its popularisation is a global phenomenon. In Spain it is in the last decades when this occurs. This paper analyses the case of one Autonomous Community, Castilla y León, which is characterized by the richness and diversity of its heritage. The main focus of this paper is the discursive dimension of the different popularisation places, museums, archaeological sites and interpretation centres, in order to evaluate their characteristics and their inter-relations. Emphasizing the week points and theoretical and practical alternatives.

Key words: archaeological heritage –popularization – Spain – Castilla y León

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ARQUEOLOGIA, PÚBLICO E COMODIFICAÇÃO DA HERANÇA CULTURAL: O CASO DA CULTURA MARAJOARA Denise Pahl Schaan*

Resumo: Este artigo centra-se na análise da apropriação pública da herança cultural arqueológica marajoara, cuja reavivação, em um contexto capitalista, assume novos significados. O texto chama a atenção para as expectativas do público sobre o passado e os entendimentos incorretos causados pela difusão do jargão arqueológico. Propõe-se que é necessário refletir sobre o papel do arqueólogo, historiador e educador na criação de tradições culturais, assim como de nossas próprias construções epistemológicas sobre o “outro” (o passado), entendendo os contextos sociais, políticos e econômicos nos quais essa atividade acontece.

Palavras-chave: Arqueologia pública – cultura Marajoara – tradições culturais – divulgação científica

“O termo ‘herança’ [cultural] é perigoso: é um daqueles que a maioria das pessoas pensam que entendem, mas raramente se dão ao trabalho de definir” (Carman 2005: 96).

INTRODUÇÃO “Cultura Marajoara” é um termo que vêm sendo utilizado para denominar indistintamente três tipos de fenômenos: 1) uma cultura pré-colonial descoberta e estudada por arqueólogos; 2) um estilo estético de inspiração arqueológica, representado em produtos artesanais, principalmente cerâ-

(*) Museu Paraense Emílio Goeldi [email protected]

mica, e na arquitetura paraense; 3) a cultura do caboclo e vaqueiro habitantes da Ilha de Marajó. Em um sentido mais amplo, “marajoara” refere-se simplesmente àquilo que vem da Ilha de Marajó e a seus moradores. Os três níveis de entendimento sobre o que vem a ser a cultura marajoara sobrepõem-se e confundem-se de diversas maneiras. O discurso científico produzido sobre a cultura arqueológica evoluiu e transformou-se no decorrer de mais de cem anos de pesquisas, atingindo o público de maneiras diversas conforme a época e o tipo de informação veiculada. Ao mesmo tempo, a audiência filtrou e selecionou informações que julgou serem verdadeiras e/ou apropriadas; muitas destas informações eram simplesmente hipóteses que foram mais tarde descartadas e desprovadas pelos cientistas, sem terem, no entanto, tido igual repercus19

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são popular. As “histórias” resultantes, então, sobre a ocupação pré-colonial são recriações realizadas com base na tradução popular de argumentos científicos, na transfiguração de hipóteses em fatos objetivos e na imaginação popular. Os entendimentos populares sobre o que vem a ser a cultura marajoara são veiculados oralmente, principalmente nos contextos de produção, venda e circulação de mercadorias artesanais cujos estilos estéticos, bastante diversos entre si, são reconhecidos como “marajoara”. Nos últimos anos, a produção, venda e circulação crescente desses produtos, impulsionada por órgãos governamentais, não-governamentais, associações de classe e a mídia tem estado associada a uma valorização do exótico, do antigo e do regional, o que se poderia chamar de uma busca das “raízes” ou da “origem” da cultura. Essa identidade remota conferida ao produto contemporâneo vem dessa maneira “agregar valor” ao objeto comercial, dentro da lógica capitalista. Dado o lapso de tempo decorrido desde o desaparecimento da cultura arqueológica relacionada a uma sociedade préestatal baseada em relações sociais de parentesco e sua apropriação por uma sociedade capitalista que a reinvindica como “passado”, pode-se dizer que se trata da “invenção de uma tradição”, nos termos do que vem sendo proposto por Hobsbawm (1983) e outros. Esse artigo pretende discutir essa tradição inventada, procurando dissecá-la em suas motivações, manifestações práticas, construções simbólicas e nas relações sociais que a partir dela são estabelecidas. Dada a participação do poder público e da comunidade de intelectuais na recriação da cultura marajoara, pretende-se também questionar as motivações políticas e econômicas que possam estar em sua base, assim como discutir o papel do arqueólogo, antropólogo e educador na produção e veiculação do conhecimento produzido pela pesquisa arqueológica. 20

AS PESQUISAS CIENTÍFICAS E SUA REPERCUSSÃO JUNTO AO PÚBLICO A história da pesquisa científica na Ilha de Marajó surge com as primeiras expedições de cientistas na região amazônica durante o século XIX e confunde-se com a própria história do desenvolvimento da arqueologia, da antropologia e da museologia no Brasil (Barreto & Machado 2001, Barreto 1992). Ao final do século XIX, cientistas identificados com as teorias antropológicas evolucionistas e difusionistas (Derby 1879, Ferreira Penna 1877, 1885, Marajó 1895, Netto 1885) identificaram e escavaram alguns sítios arqueológicos na Ilha de Marajó – os chamados “tesos” ou aterros (mounds, em inglês), preocupados em recolher evidências da existência de uma antiga civilização avançada nas terras baixas tropicais. Vem desta época a denominação de “cultura marajoara” para um conjunto de traços culturais considerados “avançados” por seu contraste com as sociedades indígenas amazônicas então conhecidas e descritas etnograficamente. Estes traços culturais foram descritos como: a) a construção de enormes colinas de terra (1 a 3 hectares em área e 10 a 12 metros de altura) sobre a área de campos alagáveis da ilha; b) a produção e uso de objetos de cerâmica de formas e decoração complexas, tais como urnas funerárias, estatuetas, tangas, bancos, cachimbos, e diversos tipos de pratos, vasos e tigelas; c) o enterro secundário diferenciado em urnas, indicando culto aos antepassados e sugerindo estratificação social; d) a presença de objetos líticos que indicavam contato e trocas com regiões distantes; e) o uso de símbolos gráficos na cerâmica que pareciam indicar, segundo alguns autores, o uso de uma escrita rudimentar (Netto 1885); f) a abundância de representações femininas na cerâmica, que foi por vezes interpretada como prova de descendência matrilinear ou da existência de um matriarcado. A maior parte da literatura científica deste período foi publicada em periódicos no Brasil em português, disponíveis em bibliotecas durante o

ARQUEOLOGIA, PÚBLICO E COMODIFICAÇÃO DA HERANÇA CULTURAL: O CASO DA CULTURA MARAJOARA Denise Pahl Schaan

século XX, sendo, portanto, material acessível para pesquisa e divulgação. Durante a primeira metade do século XX, a arqueologia da Ilha de Marajó atraiu a atenção de estrangeiros: antropólogos, jornalistas e museólogos americanos e europeus vieram conferir de perto as notícias sobre a civilização marajoara e obter objetos exóticos para seus museus. A literatura produzida neste período (Farabee 1921, Lage 1944, Lange 1914, Mordini 1936, 1947, Nordenskiöld 1930, Palmatary 1950, Torres 1940) – quase toda ela em língua estrangeira - limitou-se a confirmar o que já havia sido escrito a respeito da cultura marajoara e consistiu principalmente na descrição das escavações e da cerâmica. Aumentou o número de sítios conhecidos e a gama de objetos encontrados nos mesmos. Este afluxo de estrangeiros despertou o interesse local sobre a riqueza arqueológica. Até então, os fazendeiros criadores de gado ainda não tinham dado importância às descobertas e permitiam a entrada em suas propriedades assim como as escavações por parte de curiosos e estudiosos, fossem elas feitas por arqueólogos ou não. A partir da metade do século XX, então, estabeleceu-se de forma informal e esporádica um comércio de peças arqueológicas que acabou levando, ironicamente, tanto à destruição de vários dos sítios assim como à projeção internacional da cerâmica e cultura marajoaras. Ao final da década de 1940, dois antropólogos americanos, Betty Meggers e Clifford Evans, identificados com o nascente neoevolucionismo de James Steward realizaram uma extensa pesquisa no arquipélago de Marajó (Ilhas de Marajó, Caviana e Mexiana), assim como no então território do Amapá, identificando diversas “culturas cerâmicas” e estabelecendo uma cronologia do desenvolvimento cultural na foz do rio Amazonas (Meggers & Evans 1957). A escola histórico-cultural ou da ecologia-cultural como ficou conhecida, trouxe consigo toda uma metologia destinada a mapear o passado arqueológico brasileiro, formando ao longo de 20 anos profissionais com ela identifica-

dos em vários Estados brasileiros (Meggers 1985, Simões 1977). A pesquisa de Meggers e Evans baseavase no pressuposto teórico de que havia uma estreita relação de dependência entre desenvolvimento cultural e ecologia. De acordo com a tipologia construída por Steward com base na etnografia e dados históricos do continente, o grau máximo de evolução cultural possível no ambiente tropical era o de “tribo” (Steward 1948b). As tribos da floresta tropical, descritas por Lowie na introdução do volume 3, bulletin 143 do Handobook of South American Indians foram consideradas como o protótipo da sociedade tropical. Uma vez que o ambiente tropical limitava o desenvolvimento cultural, restava à arqueologia a tarefa de mapear e identificar as culturas e propor hipóteses sobre movimentos populacionais destas sociedades semi-sedentárias. Diversas destas culturas de floresta tropical foram identificadas na Amazônia por Meggers, Evans e seus sucessores. Essas culturas eram descritas principalmente em termos de sua produção cerâmica. A cada conjunto de traços cerâmicos distintos foi dado o nome de “fase arqueológica”. As fases que apresentavam traços semelhantes foram agrupadas dentro de categorias maiores chamadas de “tradições arqueológicas”. Uma destas fases, no entanto, chamada de “fase Marajoara” (a mesma cultura marajoara que vinha sendo pesquisada desde o século XIX) não se encaixava dentro da descrição de “tribo da floresta tropical”. Devido às suas características complexas, assemelhava-se mais àquelas chefaturas Circum-Caribenhas também descritas no Handbook (Steward 1948a). Uma vez que não havia espaço no modelo para o desenvolvimento autóctone de complexidade nos trópicos, sugeriu-se que esta sociedade teria vindo das terras altas da América do Sul. Ao estabelecer-se no pobre ambiente tropical teria degenerado até o nível de tribo. Essa “degeneração” era supostamente sustentada pela evidência empírica da existência de cerâmicas menos complexas nos níveis superiores dos aterros, assim como por mu21

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danças nas práticas funerárias, que teriam passado de enterro secundário à cremação, com o uso de urnas menores. A reconstrução da ocupação pré-colonial da Ilha de Marajó oferecida por Meggers e Evans teve boa aceitação dentro da comunidade acadêmica e junto ao público, o que se pode perceber pela popularização de alguns termos e classificações tipológicas que se tornaram correntes, sendo utilizados na descrição de objetos arqueológicos em museus, catálogos e literatura menos especializada em geral. A enorme monografia de doutorado produzida por Meggers e publicada pelo Instituto Smithsonian em inglês teve algumas partes digeridas em português em uma publicação do então Instituto de Antropologia e Etnologia do Pará (Meggers & Evans 1954) além de ser constantemente citada em publicações de outros arqueólogos brasileiros e em catálogos, maneira pela qual alcançou o público. O jargão arqueológico – fases Ananatuba, Mangueiras, Formiga, Aruã, Tradição Policrômica, tipos cerâmicos, Joanes Pintado, Pacoval Inciso, etc – foi absorvido sem critério e com novos significados. O uso do termo “fase” para identificar um conjunto de traços cerâmicos passou a ser usado como sinônimo para “etnia” ou “tribo”. Os tipos construídos para a classificação de fragmentos cerâmicos, com vistas à construção de cronologias relativas, adquiriram vida própria, passando a serem usados também para denominar as peças completas em acervos e, o que é pior, em exposições museológicas. Neste processo, a prática de utilizar arbitrariamente um topônimo para designar um tipo cerâmico foi entendida de maneira equivocada pelo público, que passou a entender a denominação do tipo cerâmico como indicando a origem da peça. Por exemplo, os tipos “Joanes Pintado” e “Pacoval Inciso”, usados para designar respectivamente a cerâmica policrômica e a cerâmica decorada com incisões sobre engobo branco foram tomados como indicando a procedência da peça – Joanes pintado seria a peça achada na vila de Joanes e Pacoval inciso a peça achada no aterro do Pacoval, junto ao lago Arari. 22

A escola histórico-cultural e seu determinismo geográfico passaram a ser questionados quase que imediatamente nos Estados Unidos por Robert Carneiro, Donald Lathrap e posteriormente por seus alunos (Carneiro 1961, Lathrap 1970). No entanto, o domínio teórico-metodológico exercido por Meggers, Evans e seus colegas brasileiros impediu a produção de dados empíricos por meio de pesquisas de campo que os pudessem contestar (Roosevelt 1995). Além disso, as monografias e artigos que questionavam o modelo ecológico eram herméticas e publicadas em inglês, passando desapercebidas pelo público brasileiro não-especializado. A situação principiou a mudar somente no final da década de 1980, com as pesquisas de Anna Roosevelt - aluna de Lathrap - no rio Orinoco, no baixo Amazonas e na Ilha de Marajó (Roosevelt 1980, 1987, 1991; Roosevelt, et al. 1991). A partir daí a escola processual americana e a ecologia histórica adentram o cenário. Esta última, principalmente através do trabalho de geógrafos, etnógrafos e etnoecólogos veio a oferecer um novo paradigma para a interpretação do desenvolvimento cultural na Amazônia, que levaria em conta o papel ativo dos seres humanos na interação com o ambiente tropical, modificando a paisagem e criando uma ecologia antropogênica (Balée 1993, Posey 1985, Smith 1980). Pode-se dizer que o trabalho de Roosevelt teve uma maior repercussão no meio acadêmico e na mídia nacional e internacional especializada, mas teve pouca penetração junto ao público leigo. Isso porque a maior parte de sua produção bibliográfica está em inglês. Além disso, houve pouca interação entre sua equipe de pesquisa e as comunidades nas quais as investigações arqueológicas se realizaram. Roosevelt propôs que a cultura marajoara esteve relacionada a uma sociedade complexa cuja origem poderia ser buscada no próprio baixo Amazonas. Estabeleceu a duração da cultura marajoara em 900 anos – de 400 a 1300 depois de Cristo – e afirmou que o “cacicado” marajoara estaria entre as mais importantes civilizações pré-históricas das Américas.

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As pesquisas realizadas por nós desde 1994, inicialmente investigando a iconografia da cerâmica (Schaan 1996, 1997, 1999) e depois aspectos da organização social através de pesquisas de campo em diversos sítios da Ilha (Schaan 2004, 2005) têm tido uma repercussão e aceitação pública maior do que as anteriores. Isso se deve tanto pela disponibilidade de textos em português (em revistas especializadas, livros e na internet, no site www.marajoara.com), como pelo contato com o público através de palestras, cursos, curadoria de exposições museológicas e entrevistas dadas aos meios de comunicação. Nossa abordagem (que poderia ser classificada processual-cognitiva e em certa medida pós-estruturalista) diferiu das pesquisas anteriores em vários aspectos: a) Propôs uma leitura iconográfica estruturalista dos grafismos na cerâmica, identificando-a como uma linguagem iconográfica com objetivos mnemônicos; b) Propôs um modelo diferente do de Roosevelt para explicar a emergência de complexidade social. Enquanto Roosevelt preconizava o desenvolvimento de uma agricultura intensiva, oferecemos um modelo baseado na intensificação da produção de recursos aquáticos, com modificações da paisagem como meio para incrementar a produção de alimentos e possibilitar crescimento demográfico e especialização; c) Identificou a existência de várias chefaturas ou sociedades regionais ao invés de apenas uma como sugerido por Roosevelt; d) Apresentou uma periodização do desenvolvimento cultural dentro da fase marajoara; e) Propôs hipótese sobre a continuidade da cultura marajoara durante o período histórico com base em pesquisa realizada em sítios contemporâneos ao contato. Todas estas idéias foram veiculadas em artigos científicos e de divulgação de alcance público. Temos percebido, no entanto, que, ao mesmo tempo em que o público reconhece a legitimidade da pesquisa e a autoridade científica dos pesquisadores, os conteúdos são decodificados dentro de uma lógica particular. Ou seja, inconscientemente ou não, o público absorve e veicula a infor-

mação científica de acordo com suas necessidades e expectativas. Na medida em que a cultura descrita pelos cientistas é considerada como o passado regional, o público apodera-se da reconstituição deste passado agregando sua própria interpretação. No decorrer deste artigo, vamos ver como isso se dá em situações concretas. A REINVENÇÃO DA TRADIÇÃO Na década de 1970, o distrito de Icoaraci, localizado a 20 km de Belém, capital do Estado do Pará, abrigava diversas olarias, que retiravam sua matéria-prima junto ao rio Guamá e seus afluentes. A produção era predominantemente de tijolos e telhas, mas produziam-se também panelas e gamelas de barro. Morador de Icoaraci, Raimundo Saraiva Cardoso, então com cerca de 40 anos, esteve nesta época visitando uma exposição de arqueologia no Museu Paraense Emílio Goeldi, em Belém – mal sabia ele que aquela visita iria mudar sua vida e de toda uma comunidade - e conta que ficou fascinado com os vasos, urnas funerárias, estatuetas, enfim, a cerâmica arqueológica da Amazônia, que não conhecia.1 De imediato associou aquela com a cerâmica que sua mãe fazia de maneira artesanal, à moda indígena, quando ele ainda era criança. Um pensamento cruzou sua mente: se os índios puderam produzir algo tão exuberante apenas com o barro e as matérias-primas existentes na mata, ele também poderia! Começou aí sua história de mais de 30 anos de pesquisas sobre a cerâmica arqueológica marajoara e tapajônica, tempo durante o qual leu todos os livros, artigos e matérias de revistas que pudesse obter. Mesmo sem o curso primário completo, garimpou bibliotecas e entrevistou arqueólogos, buscando aprender sobre os pro-

(1) As informações constantes deste texto foram obtidas em entrevista com Mestre Cardoso em sua casa em Icoaraci em dezembro de 2005.

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cessos indígenas de produção da cerâmica, entender seus contextos de uso e, de modo geral, conhecer a história dos povos que a produziram. Valendo-se de um parente que trabalhava no Museu Goeldi, conseguiu uma entrevista com o arqueólogo Mário Simões e lhe falou sobre sua idéia de reproduzir réplicas da cerâmica arqueológica. Com a oportunidade que se abriu de examinar as peças originais e produzir as réplicas dentro do próprio museu, Raimundo Cardoso conseguiu as condições necessárias para desenvolver sua arte e depois disseminá-la em sua comunidade. De lá para cá, Mestre Cardoso, como é chamado, tornou-se um ícone da produção cerâmica no Estado do Pará, com trabalhos seus vendidos inclusive para museus no exterior. Juntamente com sua mulher e filho, produzem ainda réplicas perfeitas de peças arqueológicas e é capaz de falar sobre a arqueologia da Ilha de Marajó com a propriedade de um pesquisador. Discute os dados arqueológicos e hipóteses com o cuidado de um estudioso e tornou-se uma referência para o artesanato regional. A partir da produção de Mestre Cardoso e dezenas de ceramistas que o seguiram, estabeleceu-se um pólo de produção cerâmica no Distrito de Icoaraci, que hoje exporta todo o tipo de peças cerâmicas para o Brasil e o exterior. Surgiram outros pólos de produção também em Santarém, no Amapá e na Ilha de Marajó. A produção e venda de cerâmica “arqueológica” torna possível hoje o sustento de centenas de pessoas, sendo essa economia estimulada por órgãos públicos, privados, associações de classe e a mídia. Isso permitiu a divulgação da “cultura marajoara” principalmente (objetos de outras culturas arqueológicas são também reproduzidos, mas em menor escala), ainda que a maior parte das peças produzidas – mais de 90% - não sejam réplicas das peças arqueológicas, mas obras de livre inspiração nos grafismos, formas e decoração arqueológicos. Mesmo as técnicas de fabricação, que Mestre Cardoso teve o cuidado de reproduzir da maneira indigena, são hoje mo24

dernizadas tendo em vista o caráter quase industrial da produção: os ceramistas usam tornos e tintas industrializadas, vernizes e instrumentos que eram desconhecidos aos índígenas. Poucos são os que têm consciência, no entanto – produtores e consumidores – sobre as diferenças entre a cerâmica arqueológica e a contemporânea, especialmente porque ambas se chamam “marajoara”. Tenho ouvido as pessoas se referirem à cerâmica tapajônica (a arqueológica é encontrada na cidade de Santarém), por exemplo, como “Tapajoara”, e ainda não é claro para mim se se trata de um estilo híbrido ou se é somente um nome novo que estão dando para a cerâmica inspirada nos objetos da fase Santarém. A maior parte dos ceramistas não teve a oportunidade - diferentemente de Mestre Cardoso e outros - de produzir réplicas dentro do Museu Goeldi a partir de peças originais; por esse motivo buscam inspiração em fotos e desenhos encontrados em livros e catálogos. Se, por um lado, a produção artesanal veio a divulgar e chamar a atenção para a cultura arqueológica, por outro o faz de maneira equivocada. A cerâmica produzida em Icoaraci possui hoje diversos estilos, incorporando inclusive grafismos da arte rupestre, especialmente após a publicação do livro “Arte da Terra”, pelo SEBRAE em 1999, que contém textos direcionados ao público leigo, produzidos por três arqueólogas e uma antropóloga. Ao produzir artesanato de inspiração arqueológica, o produtor/vendedor se vale da relação com o bem cultural resgatado do passado para agregar um valor cultural, simbólico ao seu objeto, o que vem a elevar seu valor como mercadoria. Dentro da dinâmica do mercado, é visível que a produção vem tendendo a se moldar às exigências e demandas do consumidor. Nesse sentido, as inovações passam pelo crivo do mercado e passam a ser incorporadas ou não ao estilo dependendo da possibilidade de aumento de vendas. Quanto ao valor simbólico, ao ser indagado pelo com-

ARQUEOLOGIA, PÚBLICO E COMODIFICAÇÃO DA HERANÇA CULTURAL: O CASO DA CULTURA MARAJOARA Denise Pahl Schaan

prador sobre os significados dos grafismos e a relação com a cultura arqueológica, grande parte dos artesãos, com raras exceções, não se dá ao trabalho de ir às fontes, como fez Mestre Cardoso. Eles simplesmente inventam. Ao fazer reviver a cerâmica arqueológica, Mestre Cardoso acabou inventando uma tradição. AS REPRESENTAÇÕES POPULARES Através de minha convivência com o público e artesãos através de cursos, entrevistas, conversas, internet e observação da relação vendedor - cliente em lojas de venda de artesanato, entre outros, tenho observado que existe uma grande curiosidade sobre a cultura marajoara, que se manifesta particularmente com relação aos seguintes temas: 1) A antigüidade da cultura marajoara. O público demonstra um interesse muito grande pelo antigo, particularmente pelo “mais” antigo. Quando são informados que a maior parte dos artefatos de cerâmica produzidos pelas sociedades marajoara tem apenas mil anos de idade, ficam claramente decepcionados. Recentemente, em um fórum de debates, mencionei em minha palestra que, enquanto a ocupação da ilha de Marajó remontava há 3.500 anos, a sociedade marajoara emergiu enquanto tal há 1.500 anos atrás. Os dois profissionais que me seguiram nas apresentações fizeram menção à cultura marajoara afirmando respectivamente que “urnas marajoara tem milhões de anos” e “aprendemos hoje que a cultura marajoara tem 3.500 anos”. Esse exemplo, vindo de profissionais de nível superior, que têm dificuldade de reproduzir corretamente o que acabaram de ouvir e de aceitar a pouca antigüidade da cultura marajoara, é bastante ilustrativo do comportamento do público leigo em geral. 2) A origem da sociedade marajoara. Uma pergunta que sempre me fazem em entrevistas e conversas informais diz respeito à origem das populações marajoaras. As

pessoas ficam bastante decepcionadas quando informo que as evidências apontam para um desenvolvimento local da cultura marajoara, o que é plenamente aceito hoje pela maioria dos especialistas trabalhando na Amazônia. No entanto, as hipóteses lançadas pelos evolucionistas do século XIX e aqueles profissionais ligados à ecologia cultural da metade do século XX, de que a sociedade marajoara havia se originado em algum local fora da floresta tropical são mais bem aceitas e continuam sendo reproduzidas tanto na mídia quanto em trabalhos universitários. 3) O significado das representações na cerâmica. As pessoas têm necessidade de receberam respostas completas e imediatas sobre o significado das representações na cerâmica e não questionam a fonte da informação. É comum que vendedores de cerâmica contem estórias fantasiosas e claramente produzidas no calor do momento a clientes ávidos por significados para aqueles objetos exóticos. Por exemplo, um turista americano esteve recentemente em uma loja de artesanato em Soure, na Ilha do Marajó, e comprou uma caneca de cerâmica onde havia a representação de um sapo. O turista havia comentado com o vendedor que seu irmão iria-se casar. O vendedor então contou uma lenda sobre a origem daquela vasilha, que teria sido utilizada em cerimônias de casamento. Os noivos deveriam beber juntos ritualmente da mesma vasilha para demonstrar seu amor e fidelidade. O turista se encantou pela estória e levou a vasilha. Depois resolveu procurar saber mais sobre aquele ritual amazônico antigo, pesquisando na internet. Foi quando entrou em contato comigo, relatando o acontecido. Informei então que a tal vasilha não era uma réplica de um objeto arqueológico e que a lenda como tal também não era conhecida. Apesar de decepcionado, o turista achou a estória engraçada. No entanto, não sabia agora se contaria a verdade aos noivos ou se manteria a estória do vendedor que, segundo ele, era mais interessante. 25

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TRADIÇÕES INVENTADAS Recentemente, antropólogos e historiadores têm-se tornado cientes de que diversas práticas que são consideradas tradicionais são na verdade invenções recentes, freqüentemente utilizadas para servir a fins ideológicos específicos. Estas construções se dão na forma de tradições simbólicas ou cerimônias de grande alcance popular, cujas origens são tidas como distantes no tempo, apesar de poderem ter sido inventadas em um curto espaço de tempo ou mesmo em um só evento. Antropólogos e arqueólogos têm alertado para o fato de que as preocupações com o antigo, a busca do passado, é sempre feita dentro das expectativas e com propósitos políticos desenhados no presente (Carman 1995; Moore 1995). Desta forma, a recuperação de uma memória pretérita pode vir a servir a fins ideológicos, políticos ou econômicos. Eric Hobsbawm define as “tradições inventadas” como um conjunto de práticas, normalmente governadas por regras aceitas aberta ou tacitamente, de natureza simbólica ou ritual, que buscam inculcar certos valores e normas de comportamento pela repetição, que automaticamente implica continuidade com o passado. De fato, onde é possível, normalmente tenta-se estabelecer uma continuidade com um passado histórico adequado... Entretanto, ainda que exista tal referência ao passado histórico, a peculiaridade das tradições ‘inventadas’ é que a continuidade com ele é largamente fictícia. Em resumo, existem respostas a novas situações que tomam a forma de referência a velhas situações ou que estabelecem seu próprio passado por uma repetição quase obrigatória” (Hobsbawm 1983: 1). Hobsbawm (op.cit.: 4) considera que existem tradições inventadas em diversas partes do mundo e que conjunturas de rápida transformação social são mais propícias para a criação de novas tradições, uma vez quie as velhas podem estar desaparecendo. Mas não somente novas práticas podem ser entendidas como tradições inventadas, mas 26

também fenômenos mais sutis podem ser considerados. Segundo a mesma perspectiva, como por exemplo, o uso de tradições antigas para novos propósitos ou também o re-uso de elementos antigos em novos contextos. Especialmente tradições “extintas podem tornar-se tradições reinventadas” (op. cit. :5-8) quando aparecem. Neste sentido, Hobsbawm (op. cit.: 9) distingue entre três tipos de tradições inventadas, cada uma com uma função distinta: a) aquelas estabelecendo ou simbolizando coesão social e identidades coletivas; b) aquelas estabelecendo ou legitimando instituições e hierarquias sociais; e c) aquelas socializando pessoas em contextos sociais particulares. O primeiro tipo freqüentemente se refere ou implica as duas seguintes também. As tradições inventadas, ainda segundo Hobsbawm (op. cit. 12), usam as referências ao passado não apenas para trabalhar coesão social, mas também para legitimar suas ações. Logo, historiadores e antropólogos devem estar cientes do uso político que suas reconstruções do passado podem ter na esfera pública. Depreende-se daí que especialmente o trabalho de arqueólogos, que se dedicam ao estudo do passado distante, tornar-se crucial em contextos políticos modernos em que se pretende negociar identidades nacionais e étnicas. “Inventar” tradições com objetivos políticos não é tema novo na história e pode ser demonstrado em sociedades arqueológicas da pré-história recente. O uso de enterramento secundário e construção de estruturas megalíticas é interpretado por arqueólogos como maneiras de reverenciar os antepassados ou o próprio passado heróico de um povo, sendo usado para legitimar o poder e sistemas de valor, assim como reforçar estruturas hierárquicas na sociedade, perpetuando uma determinada ordem social (Holtorf 1998). A representação do “outro” no passado (Carman 1995) é prática cotidiana dos arqueólogos, que nem sempre se questionam sobre a legitimidade de sua construção, ao

ARQUEOLOGIA, PÚBLICO E COMODIFICAÇÃO DA HERANÇA CULTURAL: O CASO DA CULTURA MARAJOARA Denise Pahl Schaan

não se preocupar com os contextos sociais e políticos nos quais seu texto é produzido. A representação do “outro” no passado deveria então ser um ponto de reflexão dentro de projetos que colocam frente a frente cientistas sociais e comunidade. CONCLUSÕES A cultura marajoara vem sendo trabalhada na mídia e nas representações populares como um estilo estético antigo que remonta às origens das populações que habitam o Estado do Pará. Nesse processo de recuperação de uma estética antiga, novos significados lhe são atribuídos, mediados pelo discurso arqueológico, pela história oral e pela imaginação popular. Esse processo, sempre em construção, parece seguir uma lógica capitalista onde a produção e venda de objetos decorativos se potencializa graças ao acoplamento de um valor cultural. Na medida em que os significados são negociados com base em interesses econômicos, entretanto, a lógica do lucro impõe os limites e possibilidades da reconstrução histórica, chegando-se a um resultado bastante diferente daquele mediado pelo conhecimento científico. A cultura marajoara enquanto “tradição inventada” possui muito pouco da referência original ao passado e há uma tendência crescente de diferenciação das duas coisas (passado e presente) sem que essa diferenciação seja explícita. Isso se dá de duas maneiras: a) através da modificação crescente de estilos e formas dentro do processo de produção de objetos cerâmicos contemporâneos atendendo às expectativas do mercado; e, b) através da transmissão oral do conhecimento produzido por arqueólogos. A representação do passado, mediada pela arqueologia, possui uma dinâmica própria que foge do controle dos cientistas e cuja lógica pode ser encontrada nas expectativas dos indivíduos sobre a construção de um “outro” que está no passado distante.

A produção de conhecimento científico não se esgota com a pesquisa e a publicação de um trabalho, pois o pesquisador não pode se furtar à responsabilidade pelas conseqüências e desdobramentos – na maioria das vezes inevitáveis, é claro –da difusão do conhecimento, que dizem respeito à relação que se estabelece entre cientistas sociais e público. No exemplo que mostramos sobre o uso popular do jargão científico da escola histórico-cultural fica claro que, se o pesquisador se furta em traduzir para o público a história do passado de uma maneira inteligível, esse mesmo público irá buscá-la dentro dos museus e bibliotecas. Seguidamente me perguntam sobre os Ananatuba (fase Ananatuba, a mais antiga do Marajó segundo Meggers & Evans 1957), sobre como eles viviam e como desapareceram. Como explicar que Ananatuba é simplesmente uma fase cerâmica sem um necessário correspondente étnico? Que aqueles povos somente desapareceram no imaginário dos arqueólogos que os criaram? Em uma outra ocasião, um repórter que estava fazendo uma matéria sobre uma cópia de dois metros de altura de uma urna feita por um ceramista em Icoaraci me procurou para que eu falasse sobre a importância da urna que, segundo ele, havia sido encontrada em Joanes, na Ilha de Marajó. Ora, eu sabia que dificilmente a urna teria sido encontrada em Joanes e suspeitei que a urna que estava sendo reproduzida era uma urna do tipo “Joanes Pintado”, que de Joanes só tinha o nome infeliz, dado por arqueólogos na década de 1950 e reproduzido à exaustão em catálogos e exposições museológicas. A cultura marajoara que é reivindicada no Estado do Pará como parte da história local não é, parafraseando Hobsbawm (2002: 13), aquela que “foi preservada na memória popular, mas a que foi selecionada, escrita, retratada, popularizada e institucionalizada por aqueles que tem a função de fazê-lo”. O interesse do público pelo passado é o que nos mantém trabalhando, que justifica nossos salários, bolsas de pesquisa e financiamentos, portanto não é de se estranhar que 27

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queiram acesso à história que produzimos. Mas assim como os arqueólogos desejam alguma segurança em suas reconstruções o público leigo busca a história completa, o quadro acabado. Isso porque existe um apelo em prover esta história com um fio de continuidade (fictício) que a liga ao presente, legitimando as produções contemporâneas. Talvez, como Hobsbawm (2002: 2) coloca, sejam as incertezas e as constantes mudanças de nossa era que fazem com que os seres humanos tentem “estruturar pelo menos algumas partes da vida social como imutáveis e invariantes”. Não pretendemos com este trabalho esgotar uma discussão, mas chamar a atenção para a existência de contextos sociais, políticos e econômicos nos quais se dá a utilização do conhecimento produzido sobre o passado, uma vez que estes tendem a passarem despercebidos. Os programas de educação patrimonial muitas vezes colaboram na invenção de tradições, especialmente na Amazônia, onde têm estimulado a produção de ce-

râmica inspirada em artefatos arqueológicos, direcionando a participação das comunidades nesse sentido, em um processo não completamente consciente por parte dos educadores. O uso do passado para promover coesão grupal e identidade social não é uma estratégia nova dos programas de educação patrimonial, mas foi usada por toda a história da humanidade com os objetivos mais diversos, dos mais nobres aos mais espúrios. Por isso a necessidade de que a re-significação de objetos e práticas antigas dentro de contextos novos venha acompanhada pela consciência dos processos históricos nos quais se insere e aos quais contribui, maneira pela qual esta práxis pode vir a somar verdadeiramente para a construção de cidadania e identidade. O passado é sempre construído a partir do presente e em função do presente. Como disse Moore (1995: 51): “nossas representações criativas do passado são moldadas não pelo que sabemos ser verdadeiro sobre o passado, mas o que acreditamos ser verdadeiro sobre o presente”.

Abstract: This article analyses the public appropriation of Marajoara cultural heritage, which revival, in a capitalist context, produces new meanings. The text call attention to the expectations of the audience onto the past, as well as the mistaken understandings caused by the diffusion of archaeological jargon. It is proposed that it is necessary to reflect on the role played by the archaeologist, historian, and educator in the creation of cultural traditions, as well as to question our own epistemological reconstructions of the “other” (the past), being aware of the social, economic, and political contexts in which this activity takes place.

Key words: Public archaeology –Marajoara culture – cultural traditions – scientific diffusion

Referências Citadas BALÉE, W. 1993 Biodiversidade e os Índios Amazônicos. In: Amazônia: Etnologia e História Indígena,

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Revista Arqueologia Pública, São Paulo, nº 1, 2006. pgs. 31-48.

PARA SABER O QUE O PÚBLICO PENSA SOBRE ARQUEOLOGIA... Marília Xavier Cury*

Resumo: O presente estudo se desenvolveu entre 2003 e 2005 no Museu Água Vermelha de arqueologia regional, em Ouroeste, estado de São Paulo, Brasil. Consistiu na tese de doutorado intitulada Comunicação Museológica – Uma Perspectiva Teórica e Metodológica de Recepção, defendida na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo.1 Neste texto, apresentamos para discussão alguns aportes da pesquisa de maneira sintética e parcial. A pesquisa se sustentou teórica e metodológicamente nas áreas de museologia, comunicação e recepção. Quanto à museologia, foram focadas essencialmente a expologia, expografia e educação patrimonial.

Palavras-chave: Comunicação da arqueologia – Comunicação museológica – Exposição arqueológica. Educação patrimonial – Avaliação museológica.

Introdução – A descoberta arqueológica No ano de 1997, às margens do rio Grande e junto à Usina Hidrelétrica Água Vermelha – município de Ouroeste, Estado de São Paulo – foram achados vários sepultamentos humanos, posteriormente identificados como pré-coloniais 2 A descoberta gerou duas campanhas arqueológicas entre 1997 e 19983 e a pesquisa de-

(*) Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo - [email protected] (1) Sob a orientação da Profa. Dra. Maria Immacolata Vassallo de Lopes. (2) A identificação foi feita pela arqueóloga Maria Lucia Pardi. (3)O início dos trabalhos deu-se a partir do contrato firmado entre a CESP e o MAE/USP (Contrato MMA/ CESP – MAE/USP – 001/97) e da autorização do IPHAN concedida na Portaria 43, publicada no Diário Oficial da União em 24/9/1997.

senvolvida por uma equipe interdisciplinar – antropólogos físicos, zooarqueólogos, geoarqueólogos, arqueólogos especialistas em grupos ceramistas e caçadores-coletores4 – revelou uma situação arqueológica complexa e inédita, o que deveria ser devidamente explorado. Em 2002, sob a mediação do Ministério Público Federal, foi firmado o TAC-Termo de Ajustamento de Conduta pelo prefeito municipal de Ouroeste e por representantes do IPHAN-Instituto do Patrimônio Histórico e Ar-

(4) São eles: Profs. Drs.: Erika Marion RobrahnGonzález, coordenadora e especialista em grupos ceramistas; Marisa Coutinho Afonso, geoarqueóloga; Paulo Antonio Dantas De Blasis, especialista em grupos caçadores-coletores; Levy Figuti, zooarqueólogo; Eduardo Goes Neves, especialista em grupos ceramistas; e Sabine Eggers, antropóloga física.

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Revista Arqueologia Pública, São Paulo, nº 1, 2006.

tístico Nacional, Ministério da Cultura,5 e da A. E. S. Tietê S. A.6 De acordo com o TAC, várias ações deveriam ser tomadas quanto à preservação e comunicação do acervo arqueológico. Em síntese, promover o salvamento e monitoramento arqueológico, criar um museu de arqueologia regional, criar projeto de lei para uma Política Municipal de Preservação do Patrimônio Arqueológico. O Museu de Arqueologia e Etnologia da USP foi, então, convidado para o desenvolvimento do salvamento arqueológico7 e para a concepção e implantação daquele que passou a ser chamado de Museu Água Vermelha. 8 Após a assinatura do TAC foi realizada mais uma etapa de escavação e a análise arqueológica em laboratório. Em paralelo, deu-se início aos trabalhos museológicos para a plena instalação do museu. No dia 2 de setembro de 2003 foi inaugurado o Museu Água Vermelha e a exposição de longa duração Ouroeste: 9 Mil Anos de História. Apresentação – Da arqueologia à museologia A pesquisa arqueológica nos sítios Água Vermelha transcorreu em alguns anos – entre as etapas de escavação, a análise laboratorial e a redação de relatórios cientí-

(5) A arqueóloga Maria Lucia Pardi. (6) The AES Corporation adquiriu o controle acionário da CESP em 27/10/1999 em função do Programa Estadual de Desestatização. A Usina Hidrelétrica Água Vermelha é uma das 10 que compõem a AES Tietê S. A., uma das empresas geradoras do grupo AES Corporation. (7) Os arqueólogos responsáveis foram os Profs. Drs.: Paulo Antônio Dantas De Blasis e Erika Marion Robrahn-González. O primeiro é pesquisador do MAE/ USP e a segunda é colaboradora da empresa Documento Antropologia e Arqueologia. (8) O projeto museológico foi coordenado pela Profa. Dra. Marilia Xavier Cury, museóloga do MAE/USP.

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ficos. Esses anos de trabalho, sem dúvida, resultaram em uma base científica consistente para a aplicação museológica e, em decorrência disto, a criação de um museu comprometido com a população regional. Como conseqüência – e porque não poderia ser de outra forma – buscamos apoio às bases concernentes ao nível de profissionalização que uma instituição museológica contemporânea exige. Independentemente do porte físico do Museu Água Vermelha – 250 m2 – a equipe de museologia9 buscou o aporte museológico condizente com a relevância arqueológica e com a responsabilidade social que o museu passaria a ter na região. As ações museológicas foram estruturadas a partir da operação do processo curatorial – (a) aquisição do acervo; (b) pesquisa, conservação, documentação museológica; (c) comunicação (exposição e educação)10 – e compreenderam diversos aspectos e um cronograma: (1) elaboração da estimativa orçamentária – novembro de 2000; (2) realização e discussão do programa arquitetônico11 – março de 2001; (3) conclusão do projeto museológico-institucional12 – abril de 2001; (4) elaboração dos sub-projetos para reserva técnica e para documentação museológica e da história institucional – maio de 2002 a março de 2003; (5) avaliação técnica do edifício em construção – setembro de 2002; (6) instalação da reserva técnica e implantação do sistema de documentação – março de 2003; (7) treinamento

(9) Formamos a Equipe de Gestão Museológica composta por Ana Carla Alonso, Aureli Alves de Alcântara e Joana Montero Ortiz. (10) A aquisição/coleta do acervo e a pesquisa ficaram a cargo da equipe de arqueologia, ao passo que as ações de conservação preventiva, documentação, exposição e educação ficaram sob a responsabilidade da equipe de museologia. (11) A autora do projeto arquitetônico é Cássia Magaldi. (12) As responsabilidades pelo projeto museológico e programa arquitetônico foram divididas com a Profa. Dra. Erika Robrahn-González, arqueóloga.

Para saber o que o público pensa sobre arqueologia... Marília Xavier Cury

de conservação preventiva e documentação13 – março de 2003; (8) elaboração dos subprojetos expositivo e educativo – maio a setembro de 2003; (9) avaliação conceitual ou pré-avaliação – março de 2003; (10) montagem da exposição e implantação do projeto educativo – maio a setembro de 2003; (11) treinamento sobre expografia e educação – junho e setembro de 2003;14 (12)inauguração da exposição Ouroeste – 9 Mil Anos de História – 2 de setembro de 2003; (13) início do atendimento escolar – 3 de setembro de 2003; (14) avaliação da exposição – setembro a novembro de 2003; (15) conclusão da pesquisa de recepção da exposição15 – maio de 2005. A comunicação museológica no Museu Água Vermelha A exposição para um museu é a sua parte mais visível. É, também, o que torna uma instituição preservacionista um museu, isto porque um museu preserva e comunica. Não é possível, para um museu, prescindir de um acervo, mas o acervo não o torna museu, o que somente é possível com a comunicação e, especialmente, com a exposição. Não é possível, para uma exposição, prescindir do acervo, pois corre o risco de perder o seu status privilegiado de linguagem museológica. Nenhuma outra linguagem alcança ser aquilo que a exposição museológica é. A dinâmica de um museu opera a partir do processo museológico e este não é linear. Ao contrário, é cíclico e, além disto, uma ação intervém na outra. Sendo um sistema, valeria a pena pensar este processo em sua di-

(13) A partir de 2003 a Prefeitura de Ouroeste indicou três funcionários para cuidar do museu. Eles foram treinados pela equipe de museologia do MAE. (14) Todas as ações foram desenvolvidas pela Equipe Gestão Museológica. (15) A pesquisa de recepção faz parte de CURY, Marília X. Comunicação museológica – Uma perspectiva teórica e metodológica de recepção, tese defendida em maio de 2005.

mensão sinérgica, quando cada uma de suas ações age simultaneamente sobre as outras. O processo curatorial é a cadeia operatória cíclica que compreende a formação do acervo, pesquisa, salvaguarda (conservação e documentação) e comunicação (exposição e educação). O ciclo se fecha, sem nunca se completar, com a comunicação, sendo que esta não é a última etapa do processo, ou seja, na sinergia a comunicação atua igualmente e simultaneamente e não como etapa posterior que se desdobra das outras. Comunicação museológica – na contramão dos ideais que a hegemonia faz questão de manter – não consiste na absorção pelo público de um conhecimento transmitido a ele pelo museu, como um indivíduo submisso ao impacto da mensagem museológica, ora passivo, ora reativo. Entretanto, a comunicação museológica não se encerra no museu – o meio – e sim no cotidiano das pessoas. A moderna teoria da comunicação fez deslocar as discussões dos “meios para as mediações” culturais que ocorrem no cotidiano das pessoas (Martín-Barbero 1997). Com isto, entende-se que o cotidiano do público é o mediador da sua participação interpretativa, ou seja, o público em museus interpreta a partir da sua experiência vivencial. Indo além, entende-se que o público é participante do processo museológico porque ele traz para o museu a sua interpretação. Interpretar, para os esclarecimentos devidos, é uma ação associada de forma indissociável à “leitura” e a “(re)significação”: não há leitura sem interpretação, do contrário não houve leitura de fato, pois ninguém lê exatamente igual ao outro. Ler não é simples decodificação de “palavras”. Por outro lado, não há interpretação sem leitura (que é o que permite a interpretação) e a interpretação é, em si, recriação de significados, ou ressignificação. Neste sentido, a comunicação museológica é comunicação dos sentidos patrimoniais e as mensagens implícitas e explicitas em uma exposição são proposições de significados que serão (des)construídos, reelaborados, negociados, trocados, pelo visitante em atitude dialógica com o museu. 33

Revista Arqueologia Pública, São Paulo, nº 1, 2006.

O projeto de comunicação do Museu Água Vermelha – que engloba a exposição e a ação educação vinculada a ela – partiu destes pressupostos. Inicialmente, e entendendo que a recepção é um processo que antecede e sucede a visita a um museu e a uma exposição, foi realizado um estudo com um dos públicos prioritários do museu: estudantes dos ensinos fundamental e médio.16 Para a museologia, esta é uma das formas de avaliação museológica,17 que se enquadra nos chamados estudos de público, o que denominaremos de pesquisa de recepção. Assim, dentro da perspectiva da pesquisa de recepção, foi desenvolvida uma avaliação conceitual, preliminarmente à elaboração da exposição, com estudantes. Partimos da constatação que a comunicação institucionalizada da arqueologia está na mão da escola e do museu. Sabemos, no entanto, que há um descompasso entre a (pouca) quantidade de museus arqueológicos e a amplitude e complexidade dos conhecimentos sobre arqueologia brasileira. Sabemos, também, que, na escola o professor, sem suportes outros, apóia-se no livro didático como instrumento para ministrar os conteúdos arqueológicos. Recente estudo analisou “A abordagem do período pré-colonial brasileiro nos livros didáticos do ensino fundamental” (Vasconcellos et al. 2000) e nos apontou algumas vertentes a partir de um conjunto de 12 livros de 10 autores, selecionados ou por critérios mercadológicos (os mais vendidos) ou pelo oficial (aqueles indicados para a escolha pelos professores da Rede Pública de Ensino para posterior distribuição gratuita aos alunos). Os autores, na análise que fizeram, apresentaram diversas

(16) A pesquisa de recepção desenvolvida no Museu Água Vermelha compreendeu duas etapas: a preliminar à exposição e a pós montagem. Este texto apresenta a etapa preliminar e como esta se vinculou à concepção da exposição. (17) Quanto às formas de comunicação museológica, vide Cury 2006.

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questões: a postura evolucionista de alguns, periodização européia como referência em outros, e – quando há um enfoque brasileiro – o texto é de autoria de historiador desvinculado da produção em arqueologia. Os autores concluíram o estudo com a triste constatação de que é do professor a incumbência de desconstruir e reconstruir com seus alunos o conhecimento sobre esse passado, recorrendo, para tanto, ao museu de arqueologia como espaço de produção e comunicação arqueológica (Vasconcellos et al. 2000: 237). Voltamos ao ponto de partida: são poucos os museus; o professor recorre ao livro didático, cuja mensagem precisa ser (des)construída por ele com base nas informações comunicadas pelos museus de arqueologia! Em síntese, não sabemos o que os brasileiros pensam sobre arqueologia. O que sabemos (ou temos como hipóteses) é que os brasileiros recebem informações superficiais e desconexas ou descontextualizadas; às vezes preconceituosas, importadas e, outras vezes, fantasiosas. Em Ouroeste, os estudantes que participaram da pesquisa conviveram nas ruas com arqueólogos, receberam alguma informação sobre o que estava acontecendo e estavam bastante curiosos com o “cemitério de índio” em um dos sítios arqueológicos junto à Usina Água Vermelha. Pesquisa de recepção: a avaliação conceitual A pesquisa foi realizada em março de 2003, e antes de iniciar a concepção da exposição Ouroeste: 9 Mil Anos de História, por meio da aplicação de um questionário em estudantes da 7a e 8ª séries do ensino fundamental e de 1º, 2º e 3º anos do ensino médio da E. E. Sansara Singh Filho. O objetivo foi aferir o conhecimento que esses estudantes tinham sobre arqueologia e sobre o passado pré-colonial brasileiro. 298 estudantes participaram dessa etapa da pesquisa de recepção.

Para saber o que o público pensa sobre arqueologia... Marília Xavier Cury

Considerando que esta etapa da pesquisa tem interesse central na relação dos estudantes com a questão indígena, e nos conhecimentos que eles possuem sobre arqueologia, organizamos as perguntas do questionário para averiguação dessas questões. No entanto, não fizemos distinção entre etnologia e arqueologia e índio dos períodos pré-colonial e contemporâneo, até porque não há a presença indígena na região atualmente ou num passado próximo. A presença indígena existe nos nomes de algumas cidades, na referência do rio Grande e no imaginário sobre a cachoeira dos Índios (destruída para a construção da usina). Essa “mistura” de entendimento por parte do público e os discursos que ela gera são construções, enunciações elaboradas e assimiladas. Não pretendemos levantar e analisar esses discursos - adentrar em suas camadas e buscar suas raízes e estrutura de funcionamento -, o que seria muito frutífero para a comunicação da arqueologia, mas seria um estudo de profundidade – e de extrema necessidade – que a pesquisa em questão não comportou. Por outro lado, não consideramos, na pesquisa, que a arqueologia seja um campo vasto que envolve a construção de conhecimento por meio de vestígios da cultura material, do passado pré-colonial ou colonial, e mesmo do presente. Consideramos, sem entrar no mérito com os estudantes, a arqueologia pré-histórica. O questionário contou com questões com múltiplas escolhas, com espaços para justificativas ou esclarecimentos por meio de respostas abertas. Os dados sofreram uma análise quantitativa e tornaram-se fundamentais para a concepção da exposição.

tem apenas 52 anos de existência e 818 de emancipação de Guarani D‘Oeste, da qual era distrito. De acordo com o censo de 2002, o município possui 6290 habitantes – sendo 3159 homens e 3131 mulheres – e 5387 eleitores (87% da população). Em 2004 ocorreram 1073 matrículas no ensino fundamental e 419 no ensino médio. O município possui três escolas de ensino fundamental, duas de ensino médio e duas de educação infantil. Destas apenas uma é particular. Os dados coletados com os estudantes revelaram que apenas 13 (4,4%) nasceram em Ouroeste e nenhum em cidades limítrofes (Fernandópolis, Indiaporã, Guarani D’Oeste e Paranapuã). 10,1% deles nasceram na região (aproximadamente 150 km ao redor de Ouroeste), ou seja, apenas estes dois percentuais (na soma, 14,5%) têm vínculos com a história regional e com a memória do território, e os demais (81,1%) precisam construir vínculos territoriais. 24,8% dos estudantes vivem há até 5 anos na cidade, 14,4% vivem entre 6 e 10 e 49,3% vivem 11 anos ou mais. Desses 298 estudantes, 144 (48,3%) são do ensino fundamental e 154 (51,7%) do ensino médio. A idade desses estudantes varia entre 12 e 18 anos. No ensino fundamental temos um grande número de adolescentes entre 13 (47,9%) e 14 anos (25,7%). No ensino médio temos uma concentração maior entre 15 (40,9%) e 16 anos (37%). Os dados de idade não surpreendem, principalmente porque são estudantes dos períodos da manhã e da tarde. A relação dos estudantes com a arqueologia

A primeira fala dos receptores

Diversas questões foram feitas para levantar o nível de conhecimento dos estudantes sobre arqueologia. Uma delas foi se eles já estudaram, e quando, a pré-história bra-

Esta etapa do estudo revelou aspectos importantes sobre a população jovem da cidade. Ouroeste é uma cidade jovem, pois

(18) Dados referentes ao ano de 2005, quando a pesquisa, quando a pesquisa foi concluída.

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sileira. Dos que responderam sim (32,9%), a maioria aprendeu na escola em várias séries entre a 4a. do ensino fundamental e o 3o. ano do ensino médio, e alguns (1,3%) aprenderam pela TV ou com o pai. 6,4% deles não se lembram em que séries aprenderam. 18,1% dos estudantes responderam que não estudaram, 47,3% não se lembram e 1,7% não respondeu à questão. Nesta questão usamos o termo pré-história por ser o mais familiar nos livros didáticos. Procuramos, então, levantar o que eles sabem sobre pré-história por meio de uma questão direta. Pedimos a eles respostas diretas também, deixando-os à vontade para ser sinceros, pois não estavam sendo testados. As respostas foram diretas: 52,3% dos 298 estudantes responderam “não sei nada” ou “não me lembro de nada”, sendo que 63,9% dos 144 alunos do ensino médio tiveram esta resposta, bem como 41,6% dos 154 dos alunos do ensino fundamental. Apenas 19,1% relacionaram a pré-história à existência de índios no passado (13,8%), a homens que viviam em cavernas (1,3%), ou com um modo de vida diferente do nosso, precisando fazer fogo (1%), e que a pré-história foi antes da nossa colonização ou na Grécia (3%). Alguns consideram que sabem pouco (13,4%), e outros (2,3%) afirmaram que sabem muito ou tudo. Nos dois casos os respondentes não discriminam o “pouco” ou o “muito” que conhecem. 9,1% deles não responderam. As respostas relacionando pré-história a dinossauros não foram muitas, como se poderia supor: apenas 6,4% da amostra. Quanto à questão: “O que é arqueologia para você?”, uma parcela grande da amostra (34,6%) não sabe e 6% dela não respondeu. Para os demais, (1) a arqueologia estuda civilizações, ou povos antigos, ou seres pré-históricos, ou os índios brasileiros (23,1%); (2) a arqueologia estuda coisas, objetos antigos/do passado, estuda ossos (19,4%); (3) a arqueologia estuda ossos de animais, como os dinossauros ou fósseis (9,1%); (4) a arqueologia faz descobrimentos em vários países e é um trabalho bonito, uma coisa incrível (7,8%). 36

E “Você acha arqueologia importante?” 64,8% acham que sim, 25,2% não sabem, 7,7% acham que tem uma importância relativa e 2% não acham a arqueologia importante. Dos comentários que fizeram, para 27,8 % da amostra de 298 que responderam sim, da justificativa é que: a arqueologia é importante para que possamos descobrir/ saber como viviam os antepassados (24,8%), ou para desvendar a nossa evolução e as origens da humanidade (3%). 7,4% acham a arqueologia importante porque ela descobre coisas antigas. Para 13,1% da amostra, a arqueologia é uma forma de aprender fatos novos e diferentes, e para 4,7%, toda profissão é importante. Apenas 2% dos respondentes acham a arqueologia importante para se saber mais sobre a história da região e do País. Apesar de considerarem a arqueologia importante, 9,7% dos estudantes não se justificaram. Aqueles que relativizaram a importância da arqueologia ou não a consideram importante, não manifestaram interesse especial, acham-na chata ou desconhecem o suficiente para manifestar opinião. Com relação ao interesse dos estudantes com a disciplina arqueologia, 61,4% se consideram interessados, 31,5% não se consideram, 5,7% não sabem e 1,4%, mais ou menos ou não respondeu. Indagados sobre os motivos do interesse pela arqueologia, um terço aproximadamente da amostra manifestou ser uma pessoa curiosa por descobertas arqueológicas (5,4%), gostar de ampliar seus conhecimentos (16,8%), sobretudo com estudos interessantes e importantes (12,8%). Muitos vêem na arqueologia uma possibilidade para saber sobre povos antigos (17,1%) e sobre os antepassados (5,7%). 2,7% da amostragem acha a arqueologia legal e quer ser arqueólogo(a). 3,7% acham a arqueologia interessante, mas não justificaram por quê. Os motivos pelo desinteresse ou pouco interesse pela arqueologia, diríamos, está relacionado à desinformação. Podemos supor que eles (31,5% da amostra) não têm interesse porque não conhecem ou não sa-

Para saber o que o público pensa sobre arqueologia... Marília Xavier Cury

bem do que se trata (12,4%), não têm vontade (6,4%), não gostam de procurar ossos ou coisas antigas (1%), não gostam de terra (0,3%), não sabem o porquê do desinteresse (3%), ou não responderam (8,1%). Aqueles que têm um interesse relativo (0,6%) relacionam o não-interesse à falta de oportunidade ou à forma sem atratividade como a arqueologia é apresentada. Como já mencionamos, em 1997 houve a descoberta do sítio-cemitério, e entre 1997 e 1998, e depois em 2002 foram realizadas escavações arqueológicas. Isso teve alguma repercussão na cidade, pois a presença das equipes de arqueologia foi notada e comentada. Além disso, a descoberta do cemitério indígena foi amplamente noticiada e os arqueólogos fizeram um trabalho de extensão universitária com a escola estadual entre 1997 e 1998.19 Com base nisso, procuramos averiguar se os estudantes correlacionavam esses fatos a uma descoberta arqueológica. A pergunta feita foi: “Recentemente você soube de alguma descoberta arqueológica?” 74,5% da amostra respondeu não, 22,8% respondeu sim, e 2,7% não respondeu. Dos que responderam sim, apenas 12,4%, considerando a amostra total, relacionaram os ossos dos índios e a machadinha achados na represa (Usina Água Vermelha) com uma descoberta arqueológica. 4,7% se lembraram de descobertas em caverna no Ceará ou de outras no Oriente Médio, e 2,7% se lembraram de descobertas paleontológicas de dinossauros. 1% não se lembra e 2,7% não responderam. Dando continuidade ao levantamento do que sabiam sobre a disciplina, perguntamos se para eles a arqueologia brasileira era tão avançada quanto em outros lugares. 54,3% da amostra não soube responder, 18,8% acha que é relativamente avançada com relação a outras localidades, 18,1% acha que não, e 8,7% acha que sim.

(19) Tendo ocorrido há 5 ou 6 anos, os estudantes da pesquisa não foram, muito provavelmente, espectadores desse trabalho de extensão arqueológica.

Quanto aos comentários daqueles que acham que é relativamente avançada, 8,7% da amostra não comentou, 4,7% relacionoua com a situação econômica do Brasil, e/ou à falta de recursos ou apoio governamental, 3,7% acha que há desinteresse interno e que as maiores descobertas são em outros países, 1,7% acha que a arqueologia no Brasil está avançando da mesma forma que em outros países. Daqueles que responderam que a arqueologia brasileira não é tão avançada quanto outras, 5,4% da amostra não justificou a sua opinião. Vários estudantes procuraram justificativas externas ao Brasil: a tecnologia externa é mais avançada (5,4%), a maioria das descobertas é de fora (1,7%), os outros têm mais condições financeiras (0,7%), os arqueólogos internacionais são mais competentes (0,7%). 5,4% procuraram justificativas internas: a arqueologia no Brasil está se iniciando agora (1,7%), mal se houve falar nela e poucos a conhecem (1,7%), falta interesse em geral (1,3%), e incentivo do governo (0,7%). Dos que responderam sim, 3,4% não justificaram, 2,3% acham que aqui já ocorreram descobertas e ainda há muito material a ser encontrado, 1,7% equipara o desenvolvimento da arqueologia no Brasil a outras profissões, 1,4% entende que a arqueologia é uma coisa só no mundo e que o Brasil tem capacidade de descobrir. 56% da amostra não teria interesse em fazer algum tipo de pergunta a um arqueólogo, 19,5% gostaria de fazer alguma pergunta, mas não soube elabora-la no momento do preenchimento do questionário. As perguntas que gostariam de fazer foram categorizadas. A primeira categoria versa sobre a arqueologia e tivemos 8,6% de dúvidas. As perguntas eram sobre: O que a arqueologia estuda? Como e quando surgiu a arqueologia? Há quanto tempo há arqueologia no Brasil? Como se descobre alguma coisa? Como se sabe a idade de alguma coisa? Como se descobre como eram os seres a partir dos restos mortais? Na segunda categoria temos perguntas mais relacionadas à 37

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profissão ou ao desempenho do arqueólogo (4,6%) como: Por que você se interessa por arqueologia? Como eu poderia me tornar um arqueólogo? Posso participar de uma escavação com você? O que você mais gosta de pesquisar? É difícil exercer essa profissão? Numa terceira categoria temos curiosidades (4,1%) como: Qual a sua descoberta mais interessante? Qual foi o objeto mais antigo que você descobriu? Você já achou algum osso estranho de alguma coisa desconhecida? Perguntaria sobre o peixe na caverna, se existiu múmia no Brasil e quando e quantas ossadas já descobriu, qual foi a surpresa quando soube do cemitério [junto à Usina Água Vermelha]. Na quarta categoria as questões são sobre as culturas descobertas pela arqueologia (2,3%): Há quantos anos os índios vivem no Brasil? Gostaria de saber mais sobre os povos de antigamente? Quais foram os primeiros povos que habitaram a região? Como era a vida dos índios? A quinta categoria agrupa questões sobre dinossauros e sobre fósseis (3,4%): Já foram encontrados outras espécies sem ser de dinossauros? Já achou algum dinossauro? Você assiste ao “Mundo do dinossauro”? Na região teve alguma espécie de dinossauro? Como descobriram os ossos de dinossauros? Qual foi o primeiro fóssil descoberto? Uma pessoa queria saber qual seria o nome do museu. De outras experiências de atendimento a público escolar, sabemos que é (ou era) comum os estudantes relacionarem o profissional arqueólogo ao personagem fictício do cinema Indiana Jones. Também correlacionam a arqueologia à busca de tesouros, contribuição negativa do cinema à ciência e à legislação e preservação patrimoniais. Assim, elaboramos algumas perguntas para constatação disso. Indagados se eram verdadeiras ou falsas as afirmações de que: - “Os arqueólogos procuram tesouros de outros povos” 59,7% a consideraram falsa, 33,9% verdadeira, e 6,4% não responderam; - “Os arqueólogos procuram conhecer o modo de vida de povos antigos por meio de 38

objetos deixados por eles e que foram soterrados”, 90,6% consideraram a afirmativa verdadeira, 4,7% a consideraram falsa, e 4,7% não responderaram; - para a afirmação de que “os arqueólogos são grandes aventureiros”, 77,9% acharam que sim, 15,4% acharam que não, e 6,7% não responderam. - para 44% da amostra, “um dos arqueólogos mais conhecidos é Indiana Jones”, para 42,3% ele não é um dos mais conhecidos, e 13,8% não responderam. Por outro lado, muitas pessoas levadas pela falta de conhecimento sobre o passado pré-colonial do Brasil compararam o nosso passado ao de outros locais depreciando o índio brasileiro. Assim, declararam que: - “No Brasil não viveram civilizações importantes como maia, asteca e inca”, para 56,4% essas idéias eram falsas; para 36,6%, eram verdadeiras, e 7% não responderam. Todas essas questões de “verdade ou mentira”, “acredito ou não acredito”, “concordo ou não concordo”, nos dão uma primeira informação que mereceria ser aprofundada. Ao indagar sobre esses pontos, apenas tiramos uma primeira camada de muitas outras que constituem o modelo que o brasileiro tem sobre o passado précolonial, e em certa medida, sobre o próprio brasileiro. A relação dos estudantes com o índio brasileiro Essa abordagem - o índio brasileiro - é muito ampla e complexa e não tivemos a intenção nesta pesquisa de conhecê-la a fundo, ou de esgotá-la. Interessou-nos, no entanto, sentir um pouco do que os estudantes pensam e sabem para levantar pontos de aproximação e/ou de distanciamento, considerando que a história da região cruza com as ocupações indígenas pré-coloniais. Como já afirmado anteriormente, não levamos em consideração a distinção entre arqueologia e etnologia porque o público também não a faz.

Para saber o que o público pensa sobre arqueologia... Marília Xavier Cury

Para começar, foi feita a afirmação: “Antes da chegada de Pedro Álvares Cabral em 1500, o Brasil já era todo ocupado por índios”, e pedimos aos adolescentes que dissessem se para eles era verdadeira ou falsa. Para 51,7% a afirmação é verdadeira, para 32,2% é relativa, e para 12,4% é falsa. Solicitei que comentassem a resposta. Dos que consideram a afirmativa verdadeira, 31,9% não comentaram e os outros (19,8%) consideram que os índios eram os primeiros habitantes e donos do Brasil, que havia muitos deles, que travavam guerras entre si e foram assassinados ou foram sumindo após o descobrimento. Os estudantes têm provas disso: o cemitério junto à usina é uma evidência; a história e os professores comprovam também. Dos que acham que é uma verdade relativa, 17,8% não comentaram e 14,4% acham que só uma parte do Brasil era ocupada ou quase todo e não tudo, só no litoral, as matas e florestas. Dos que acharam a afirmativa falsa, 6% não comentaram e 6,4% acham que é falsa porque só uma parte era ocupada e não havia só índios aqui. Outra afirmativa, agora para eles dizerem se acreditam ou não: “Viviam no Brasil mais de 5 milhões de índios na época do descobrimento.” Da amostra, 37,9 % acreditam, 44% dizem que acreditam mais ou menos, 13,1% não acreditam e 5% não responderam. Vejamos o que eles comentaram. Para aqueles de respostas afirmativas, 21% não comentaram a sua concordância, e para os outros 16,9%, havia muitos índios em todo o extenso território, eles se reproduziam e as gerações aumentavam, os livros falam sobre isso. Para aqueles que concordam com ressalvas, 32,9% não comentaram. Os comentários que temos (11,1%) são que não sabem o número exato e pode ser isso, mas deve ser um pouco menos, pois o território é grande. Daqueles que não concordam, 10,4% não comentaram e os demais 2,7% acham o número muito grande e nunca ouviram falar na quantidade.

Quando indagados sobre: “O que você sabe sobre os índios que moraram na região de Ouroeste?” 80,9% responderam que não sabem ou não se lembram de nada. Quanto aos demais da amostra, 8,4% disseram que a região foi habitada por índios há muitos anos; para 2,3% eles moravam na cachoeira dos Índios; na opinião de 1,7%, eram índios comuns que caçavam e pescavam, eram trabalhadores; e no entender de 0,3%, os índios moravam em cabanas ou em (0,3%) casas simples de pau-a-pique e palha, em grandes aldeias; para 0,3%, dominavam o fogo; para 0,3%, faziam sepultamentos. Eram os tupi-guaranis (0,7%). Alguns estudantes conhecem evidências de índios na região, como os ossos achados recentemente (3,4%), o avô que falava que eles escreviam em pedras (0,3), e porque algumas cidades têm nomes indígenas (1,3%). Um aluno acha que eles foram embora quando explodiram a cachoeira dos Índios, um outro viu um índio e ele parecia ser bom e um terceiro acha que o fato da região ter sido habitada por índios é bom, para a história da cidade. Perguntamos, então, o que eles gostariam de saber sobre os índios que moraram na região. 4,3% não sabiam o que perguntar ou não responderam; 9,1% não gostariam de saber nada; 1,3% quer saber só o necessário; 39,6% querem saber tudo, o máximo possível; 34,9% dos estudantes querem saber sobre o modo de vida, hábitos e sobre a cultura em geral; 6,4% sobre comida e obtenção de alimentos; 3,4% querem saber sobre a origem dos índios, como e por onde vieram para a região; 3%, a época em que chegaram; 1%, como era a região na época; 2,3%, onde viviam; 2%, qual era o nome da tribo; 2%, como era a convivência entre eles; 1,7%, qual era a religião deles e se acreditavam em vários deuses ou em um só; 1,3%, como se vestiam e se se vestiam; 1%, como eram as casas; 1%, quantos índios eram; 0,7%, porque enterravam os mortos naquele lugar; 0,3%, se eram alegres; 0,3%, se viviam bem; 0,3%, como faziam remédios; 0,3%, como se pintavam; 0,3%, como eram as armas de guerra; 0,7%, por 39

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que eles foram embora; 0,7% gostaria de vê-los, e 0,3% gostaria de saber se há a possibilidade de os índios se juntarem a eles; 0,3% gostaria de ver peças dos índios no museu. Apoiados em um comentário corriqueiro de que “o índio brasileiro é preguiçoso”, solicitamos aos estudantes que dissessem se essa idéia era falsa ou verdadeira, mesmo nos arriscando a reforçar uma idéia negativa sobre o índio. Bem, 83,9% acharam que a afirmação é falsa; 12,1%, verdadeira, e 4% não responderam. Gostaríamos também de verificar o conhecimento dos estudantes quanto à diversidade cultural entre os índios brasileiros. Pedimos para comentarem se falsa ou verdadeira a afirmativa de que “os índios eram todos iguais”. Para 71,1% da amostra, era falsa; para 25,2%, era verdadeira, e 3,7% deles não responderam. A última questão que queremos comentar é: “O que você sabe sobre o cemitério encontrado perto da represa?” Quase dois terços dos alunos (63,8%) responderam que não sabem nada ou não se lembram. As respostas não elucidam muita coisa. 20,8% disseram que era um cemitério de índios; 7% sabem onde fica e já foram lá; 3% sabem que junto aos ossos foram achados objetos e uma machadinha, 2,7% sabem quem são os pescadores que encontraram o cemitério; 1,7% sabe que eles acharam muitos ossos e fósseis de índios; para 0,7%, o fato ocorreu após a “caída” de uma árvore; para 1%, o local está fechado para estudo; para 0,7%, encontra-se com um portão com cadeado; para 1,7% o local é sagrado, patrimônio da humanidade e, assim, resolveram fazer um museu para guardar o que foi achado. A exposição e a ação educativa Ouroeste: 9 Mil Anos de História A exposição e a ação educativa são manifestações da política de um museu e, para o público, é o que define a instituição. Há uma 40

verdade nisto, pois são os usos que o público faz dos museus que lhes dão forma social. Neste sentido, e a partir da pesquisa conceitual realizada com os estudantes, uma equipe interdisciplinar20 conceituou a exposição de longa duração do Museu Água Vermelha, Ouroeste: 9 Mil Anos de História. Coube a essa equipe a construção do método e estratégias de trabalho e, sobretudo, a estruturação da linguagem expositiva. Quanto à linguagem, inicialmente buscamos a interação entre “saberes” – arqueológico, museológico e do público. A preocupação foi criar uma exposição inteligível, com fundamentação arqueológica e sustentação museológico-comunicacional. Sendo assim, os conteúdos inerentes a estes saberes, dialogando entre si de forma interdiscursiva, propiciaram a construção de um mapa cognitivo, conforme tabela 1. Para que fique clara a nossa opção, a lógica da exposição respeitou os campos envolvidos, tendo como referencial o público interprete, o que não significa que a arqueologia – a área a ser comunicada – não tenha sido respeitada e valorizada, da mesma forma que os arqueólogos21

(20) Ficha técnica da exposição Ouroeste - 9 Mil Anos de História: Projeto Museológico e Coordenação: Marília Xavier Cury. Projeto Expográfico: Marília Xavier Cury, Mauro de Vasconcelos Coelho, Ana Carla Alonso, Aureli Alves de Alcântara, Joana Montero Ortiz. Coordenação Científica: Erika Robrahn-González, Paulo A. D. De Blasis. Consultoria Científica: Levy S. Figuti , Sabine Eggers. Apoio Administrativo: Emília Paula Vieira. Programação Visual: Cristiane Y. Sato, Raquel M. Yoshizawa, Mariana A. Iwanaga. Adereçagem: Gil Verx. Cerâmica: Shoichi Yamada. Fotografia: Erika Robrahn-González, José Roberto Pellini, Wagner Souza e Silva. Ilustração: Chico Bela. Maquetes: Kenji Maquetes. Apoio Técnico: Cintia Bendazolli Simões, Daria Elânia Fernandes Barreto, José Paulo Jacob, Fernando Victor Aguiar Ribeiro, Juliana de Souza Batista. Agradecimento: Adelino Francisco do Nascimento, Osterno Machado, Danilo Chagas Assunção, Daniela Magri Amaral, Gerson Levy da Silva Mendes, Manoel Mateus Bueno Gonzalez, Paulo Zanettini, Silvana Viana Cruz de Macedo. Projeto Executivo, Produção e Montagem: Cinestand Serralheria e Cia. (21) Quanto à metodologia adotada e à participação dos arqueólogos e demais membros da equipe, vide Cury 2005.

Para saber o que o público pensa sobre arqueologia... Marília Xavier Cury

Tabela 1 Mapa Cognitivo da exposição e ação educativa Discurso Arqueológico

Discurso Expositivo

Discurso Educativo

Conhecimento metodológico, científico e técnico. Conhecimento das especialidades dentro da arqueologia. Conhecer as áreas auxiliares à arqueologia

Quadras, trincheiras, estratigrafia, vestígios, registro, técnicas, equipamentos e materiais. Organização do laboratório. Registro de dados. Análise e interpretação

Raciocínio lógico e abstrato. Inferência.Presente

Origem e expansão dos grupos que se assentaram na região. Períodos de ocupação. Formas de ocupação. Reconhecimento das tradições arqueológicas. Tecnologia. Intercâmbio entre grupos. Sistema arqueológico regional. Modelos de expansão.

Ocupação Origem Datação Densidade demográfica Diversidade Obtenção de alimento Território Aldeia Organização social Sepultamento Cemitério Ritual Tecnologia Passado

Antiguidade Antepassado Dieta alimentar como cultura Gosto alimentar Memória territorial História territorial Vida Estilo de vida Instrumentos Utensílios Casa e lar Família Morte e perda Ente querido Cerimônia Religião ”Medicina tropical” Igualitarismo Solidariedade Cooperação Tolerância Êxito cultural Tradição Continuidade Presente

Assumindo este compromisso conosco e com o público, fugimos dos modelos “estetizantes” de exposição, aqueles que não querendo recair num didatismo à semelhança do livro escolar, limitam-se a apresentar objetos com poucas informações – basicamente em etiquetas e textos – em situações técnicas (iluminação, vitrinas, etc.) favoráveis ao objeto. Esta é uma forma de

fetichizar os objetos museológicos e distanciar o público deles. Entendemos que o enfrentamento da linguagem expositiva seria o caminho para transpor o falso dilema didatismo X valorização do objeto. Assim, a partir do mapa cognitivo definimos os objetivos da experiência do público (tabela 2), considerando que esta se daria com a sobreposição entre exposição e ação educativa. 41

Revista Arqueologia Pública, São Paulo, nº 1, 2006.

Tabela 2 Objetivos Exposição

Ação educativa

Fazer conhecer a pesquisa arqueológica e as áreas científicas parceiras. Apresentar a lógica do espaço. Conhecer o método. Estabelecer relação entre espaço horizontal e vertical, espaço de ocupação e antiguidade. Conhecer a lógica de um laboratório. Entender as formas de análise de vestígios. Distinguir entre material lítico, cerâmico, faunístico e humano. Conhecer a lógica da análise e interpretação. Conhecer o método de datação Carbono 14.

Refletir sobre o espaço. Ler estratigrafia. Pensar arqueologicamente. Imaginar.Criar hipóteses.

Conhecer os grupos que ocuparam a região. Refletir sobre a diversidade cultural no passado pré-colonial da região. Apresentar as formas de interação entre o grupo e o território. Conhecer as soluções sociais e culturais.

Exercitar a tolerância. Trabalhar para uma consciência de alteridade. Discutir (re)tradicionalização. Discutir (des)(re)territorialização. Estabelecer vínculos entre culturas. Refletir sobre a história do território. Desenvolver uma memória territorial. Desenvolver “gourmets” culturais - cidadãos habilitados para criar pontos de compreensão entre culturas diferentes.

Partimos, então, para a construção do “jogo de equilíbrio” entre temática, objetos, espaço e tempo – os elementos estruturadores de uma exposição – e recursos de apoio. Construímos, então, uma ambiência expositiva (espaço significado) para oportunizar que o público pudesse interagir com a arqueologia e com o patrimônio arqueológico. Em um espaço de 90 m2, com pé-direito duplo, estruturamos uma retórica narrativa em dois eixos principais: - Histórico das descobertas arqueológicas - Eixo 1- A construção do conhecimento na arqueologia - A etapa de escavação - A análise e interpretação em laboratório - A exploração e prospecção regional - O método Carbono 14 e a antigüidade do homem na região

- Eixo 2- As descobertas – As quatro ocupações no tempo - Os primeiros povoadores de 9 mil anos atrás - Os caçadores especializados de 5 mil anos atrás - A era das grandes aldeias de 1500 anos atrás - As sociedades complexas de 500 anos atrás. - Encerramento: Arqueologia de Ouroeste A narrativa foi organizada no espaço em forma de U, pois a sala possui duas entradas. Apesar da estrutura narrativa, o público foi estimulado a explorar a exposição episodicamente, ou seja, ele mesmo fazer o seu circuito e, assim, a suas reelaborações. Para tanto, há uma ligação entre as pernas do U e a altura dupla da sala foi apropriada para a construção de possibilidades de apre-

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Para saber o que o público pensa sobre arqueologia... Marília Xavier Cury

ciação por uma vista superior (por meio de um mezanino). De fato, são, ao menos, duas exposições com múltiplas possibilidades de recortes. A definição dos dois eixos ocorreu para a argumentação e persuasão de que o conhecimento arqueológico construído em Ouroeste teve bases científicas, isto porque, como vimos, os estudantes (e provavelmente seus

pais e irmãos) pouco sabem sobre arqueologia. Para não apresentar os resultados arqueológicos sem que os mesmos fossem fundamentados, apresentamos as armações de referência – a pesquisa em arqueologia – como armações interpretativas. A própria exposição é um conjunto de armações interpretativas, fruto das intenções dos seus idealizadores, com as quais o público interage.

Foto 1 – Montagem da cenografia para A Etapa da Escavação

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Seguindo este princípio, e recorrendo sempre aos dados coletados com a avaliação conceitual, o Eixo 2 –”As descobertas”, foi detalhado de forma padrão nos quatro submódulo: “Primeiros Povoadores”, “Caçadores-Coletores Especializados”, “A Era das Grandes Aldeias” e “Sociedades Complexas”. A padronização foi: origem, datação, densidade demográfica, obtenção de alimento por caça, pesca, coleta e/ou agricultura; a preparação dos alimentos; o território de ocupação e de circulação; aldeia; organização do espaço; organização social, as formas de sepultamento, a tecnologia, uso dos artefatos. Neste eixo, a narrativa foi estruturada a partir de questões do cotidiano dos grupos pré-coloniais em paralelo ao cotidiano do público-visitante. Assim, dentre as informa-

Foto 2 – Os Primeiros Povoadores

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ções arqueológicas destacaram-se aquelas que poderiam estabelecer formas de reconhecimento e de vínculos entre passado e presente, como: constituição da família e do grupo, alimentação, relação com o território, a casa na aldeia, a morte e os rituais de sepultamento, cooperação social – o que posteriormente demonstrou eficácia devido à forma como estes aspectos foram apropriados pelo público. A ação educativa, o subtexto invisível porque atua essencialmente no plano subliminar, não foi pensada como reforço ou apoio à exposição (minimizando os problemas de linguagem da mesma). Ela vai além dela sem contradizê-la. Com a ação educativa conceitos como êxito cultural, alteridade e identidade, diferença e diversidade cultural, cooperação e organização

Para saber o que o público pensa sobre arqueologia... Marília Xavier Cury

Foto 3 – A Era das Grandes Aldeias

social, (des)(re)territorialização podem ser discutido com o público, ao mesmo tempo em que se exercita a tolerância e a dialógica. Com esse arsenal conceitual o educador pode trabalhar-se e trabalhar com o público na perspectiva de tornarem-se “gourmets” culturais (García Canclini 1999: 2), pessoas habilitadas a transitar entre culturas distintas, viajando pelos repertórios simbólicos alheios, saboreando as diferenças e criando pontos de compreensão entre culturas. E por quê não? O partido expográfico 22 escolhido para a exposição foi um “tradicional-modernizado”. Tradicional porque apresenta o con-

(22) Quanto à descrição da expografia, vide Cury 2005 e Cury 2005b.

teúdo linearmente e as coleções contextualizadamente, utilizando-se de vitrinas e linguagem de apoio convencionais. Há uma relação hierárquica entre artefatos arqueológicos e recursos expográficos. Modernizada porque usa materiais modernos e contrastantes entre si (metal das vitrinas com a mangueira das divisórias) e porque recorre à cenografia como solução expográfica para a escavação (até nas quadras delimitadas pela escavação há vitrinas) e elementos de cenografia para c o n t e x t u a l i z a r, c o m o r e c o n s t i t u i ç õ e s tridimensionais de cerâmicas, em argila e em escala real, e alimentos como milho, mandioca, angus, beiju, coquinhos; ou outros elementos como pele de animal, peças de madeira, algodão, etc. O partido também orientou para uma exposição ao mesmo tempo sintética e cheia 45

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Foto 4 – Maquete da Grande Aldeia Circular de 1500 anos atrás

de detalhes. À primeira vista ela é sintética, com poucos tópicos conceituais, sem acúmulo de objetos, textos, etiquetas. Em um segundo momento os detalhes aparecem, e o que era sintético torna-se detalhado. Após a inauguração do museu, os mesmos estudantes que participaram da avaliação conceitual foram convidados para visitar a exposição e, em seguida, para avaliá-la. Nesta etapa de pesquisa de recepção os dados foram coletados por observação, técnicas de discussão em grupo e por meio de registros escritos. Os resultados são significativos para nós profissionais de museus, seja para os museólogos, seja para os arqueólogos, pois nos permitem rever todo o processo a partir de um ângulo diferente: o público. Certamente que este ponto privilegiado elucida algo mais sobre a nossa práxis, pois nos faz avaliar as nossas posições e 46

reformulá-las. Mas o essencial é que esses resultados nos fazem entender que nos fazemos sujeitos com outros sujeitos. Considerações finais A pesquisa conceitual desenvolvida no contexto do Museu Água Vermelha foi aqui apresentada visando à ampliação da consciência dos profissionais do campo museológico quanto à importância das pesquisas empíricas com o público. O estudo em questão trouxe à luz aspectos que precisariam ser aprofundados por meio de pesquisas mais amplas e com planejamento interdisciplinar para que os interesses – arqueológicos e museológicos – sejam contemplados a contento para a definição de políticas de ação. Apesar disto, os resultados obtidos foram relevantes para a concepção da

Para saber o que o público pensa sobre arqueologia... Marília Xavier Cury

Foto 5 – As Sociedades Complexas

Foto 6 – Maquete das Sociedades Complexas de 500 anos atrás

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exposição Ouroeste: 9 Mil Anos de História e para o exercício de linguagem, o que é fundamental para os museus. Cabe salientar que a avaliação conceitual é uma face de uma realidade empírica e que associada à avaliação posterior nos permitem conhecer a experiência integral do visitante e a ter uma visão sinérgica dos elementos que compõem a exposição e sua

eficácia comunicacional. Ainda, revelam o público como sujeito dos processos museológicos. Antes de tudo, a pesquisa conceitual nos revelou que há um universo fora dos museus e de nós mesmos que precisa ser explorado, e que este universo é constitutivo da responsabilidade social reservada aos museus e a seus profissionais.

Abstract: The study presented herein was carried out in 2003 and 2005 at the Água Vermelha Museum of Regional Archeology in Ouroeste, a municipality located in the State of São Paulo, Brazil. The study was the foundation for a doctoral dissertatin entitled Museological Communication – A Theoretic and Methodological View of Reception defended at the School of Communication and Arts of the University of São Paulo.23 In this paper we will present certain research findings for discussion. These are partial findings presented in a succinct manner. The research was theoretically and methodologically based on the areas of museology, communication, and reception. Museology focused mainly expology, expography, and education.

Keywords: Archaeological communication. Museological communication. Archaeological exhibition. Heritage education. Museological evaluation.

Bibliografia CURY, M. X. 2006 Exposição – Concepção, montagem e avaliação. São Paulo: Annablume. CURY, M. X. 2005 Comunicação museológica – Uma perspectiva teórica e metodológica de recepção. Tese (Doutorado em Ciências da Comunicação) – Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, São Paulo. CURY, M. X. 2005b O Museu Água Vermelha. In: Anais. XIII Congresso da SAB: arqueologia, patrimônio e turismo. Campo Grande, MS: Ed. Oeste, 2005. GARCÍA CANCLINI, N. 2003 A globalização imaginada. Tradução Sérgio Molina. São Paulo: Iluminuras.

GARCÍA CANCLINI, NESTOR. 1999 Gourmets multiculturales. La Jornada Semanal, México, 5 dec. 1999. Disponível em: . Acesso: em: 23 nov. 2002. MARTÍN-BARBERO, J. 1997 Dos meios às mediações: comunicação, cultura e hegemonia. Tradução de Ronald Polito e Sergio Alcides. Rio de Janeiro: Editora UFRJ. VASCONCELLOS, C. DE M.; ALONSO, A. C. & LUSTOSA, P. R. 2000 A abordagem do período pré-colonial brasileiro nos livros didáticos do ensino fundamental. In: Revista do MAE, São Paulo: USP, 10: 231-238.

(23) Supervised by Counselor Dr. Maria Immacolata Vassallo de Lopes

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Revista Arqueologia Pública, São Paulo, nº 1, 2006, pgs. 49-62.

O QUE É ISSO? PARA QUE SERVE? QUEM SÃO VOCÊS? O QUE FAZEM? UMA EXPERIÊNCIA DE ARQUEOLOGIA PÚBLICA EM PARANÃ – TO* Leilane P. Lima** Gilberto da Silva Francisco*** Resumo: O objetivo deste artigo é comentar a noção de parceria no debate sobre a Arqueologia Pública, especificamente na dinâmica escolar. A compreensão do papel da Arqueologia nesse contexto terá como ponto de partida a experiência dos autores como professores-arqueólogos na Semana de Arqueologia, realizada no município de Paranã – estado do Tocantins, evento relacionado a atividade de pesquisas arqueológicas numa região de impacto ambiental, dada a construção de um empreendimento hidrelétrico no médio vale do rio Tocantins.

Palavras-chave: Identidade, Arqueologia Pública, Educação Patrimonial, Patrimônio, Parceria.

“(...) Fiquei pensando, e comecei a descrever Tudo, tudo de valor que o Brasil me deu O céu azul, um Pão-de-açúcar sem farelo Um pano verde e amarelo, tudo isso é meu! Tem feriado que pra mim vale fortuna, A Retirada de Laguna, vale um cabedal Tem Pernambuco, tem São Paulo, tem Bahia Um conjunto de harmonia que não tem rival.” (Trecho da música Recenseamento , de Assis Valente)

(*) Este trabalho foi desenvolvido como parte integrante do “Programa de Pesquisa e Resgate do Patrimônio Arqueológico, Histórico e Cultural do AHE Peixe-Angical, estado do Tocantins”, desenvolvido desde 1998 pela empresa DOCUMENTO Antropologia e Arqueologia. A coordenação do Programa é dos Profs. Drs. Erika M. Robrahn-González e Paulo De Blasis, contando com o apoio institucional do Núcleo

Por conta do recenseamento de 1940, conta Carmem Miranda (a intérprete da música de Assis Valente), que um censor bastante autoritário bate à porta de um lar humilde e começa a esmiuçar a vida de uma brasileira, que, em desconforto, prefere lembrar das coisas “de valor que o [seu] Brasil [lhe] deu”. Assim, frente à pergunta: - quem é você? (bastante peculiar dos objetivos de um censo), além de falar de si mesma, como indivíduo, também responde a partir de sua inserção num grupo, numa generalidade, na sua nação. O cadinho de referências é varia-

de Estudos Estratégicos/ UNICAMP e da Fundação Cultural de Jacarey. A obra é de responsabilidade da empresa ENERPEIXE S/A. (**) Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo [email protected] (***) Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo [email protected]

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do: riquezas naturais, símbolos nacionais, feriados (a memória de alguns eventos históricos selecionados), e a própria idéia de harmonia interestadual (clara idealização: é só lembrarmos que pouco antes de 1940, a presença do pernambucano João Alberto como interventor de São Paulo (1930-1931), nomeado por Getúlio Vargas, causou imenso desconforto na elite paulista, havendo inclusive um surto preconceituoso contra nordestinos). Apesar de ser uma música datada (por exemplo, o IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística] procura não empreender um censo tão autoritário), algumas das referências peculiares desse “samba exaltação” poderiam vir à mente de qualquer um, quando perguntado “- o que o define como brasileiro?”. Assim, quais são as coisas que consideramos realmente importantes, aquelas que caracterizam parte do que somos, e nossa inserção em certo grupo? É certo que essas referências são inúmeras, e que a constituição desse grupo de coisas “que consideramos nossas” não tem uma constituição natural; ou seja, existem processos (por vezes de longa duração, retomando termos braudelianos (Braudel, 1986), ou então de recentíssima criação, “tradições inventadas”, conforme Eric Hobsbawn, 1997) constituídos a partir de interesses múltiplos (determinados anseios de grupos sociais, autoconsciência grupal, extensão do projeto de um grupo a outro, através de práticas de dominação etc.). Ainda, essa sensibilidade quase “natural” das pessoas frente a um símbolo, ação etc. com que se identifica, forjase, geralmente, num processo longo de educação, que está também ligado à ação escolar (ensino público ou privado), mas não somente a ele: a educação é um processo bastante amplo, sendo agregado em situações familiares, acesso às informações através de mídias diversas, dentre outros. Nesse quadro, qual o papel da Arqueologia? É importante saber, de início, que a idéia que se tem sobre a Arqueologia, no senso comum, caminha entre um desconhecimento quase absoluto da disciplina (do que trata a Arqueologia? Nunca ouvi falar!...) e uma vi50

são idealizada do arqueólogo (Indiana Jones, Tomb Raider etc.), bem como do objeto arqueológico (algo como uma relíquia, valioso materialmente e por suas características históricas). Tratar de Arqueologia fora de alguns centros especializados geralmente parte de uma situação de amplo desconhecimento do público leigo, entretanto, há um certo interesse. Por ocasião da comemoração dos 500 anos do Brasil, a grande exposição no Ibirapuera (Mostra do Redescobrimento. Brasil+500) apresentava, no conjunto das inúmeras peças, a famosa carta de Pero Vaz de Caminha, e a procura por tal documento era especialmente grande. O acesso ao seu conteúdo é simples (qualquer busca na Internet, por exemplo, satisfaria tal necessidade);1 mas era imperativo para muitos ver com os próprios olhos, mesmo que a grafia de tal carta não fosse legível para a maioria (ver figura 1), sendo necessário competência para leitura paleográfica, o que a maioria dos visitantes não possuía. O que mais interessava era ver a carta em si, a carta-objeto; e, para sanar o problema de conteúdo, a organização da exposição criou uma cabine com recitação da carta feita pelo ator Paulo Autran. Esse pequeno exemplo indica a importância do fetiche que pode incidir sobre o objeto material. Os materiais arqueológicos apresentam uma certa eloqüência, que contribui grandemente para um interesse inicial. Ou seja, parece, ao olho leigo, que o objeto material é auto-explicativo; assim, se os problemas de interpretação no seio da Arqueologia são complexos e variados, a dimensão física do objeto convida o leigo, e esse interesse pode tornar-se uma posterior reflexão mais aprofundada (as múltiplas ações relaciona-

(1) Em uma rápida busca na Internet, no site www.google.com.br (em fevereiro de 2006), a entrada “Carta” e “Caminha” proporcionou a indicação de 342.000 páginas disponíveis na Web, 321.000 em português e 198.000 páginas brasileiras. Levandose em conta que nem todas apresentam o texto parcial ou integralmente, o número, mesmo com isso, é bastante expressivo. Quanto à busca de imagens visuais, no mesmo site, disponibilizavam-se 175 páginas

O que é isso? Para que serve? Quem são vocês? O que fazem? Uma experiência de Arqueologia Pública em Paranã – TO Leilane P. Lima / Gilberto da Silva Francisco

1. Arqueologia Pública e patrimônio: alguns pressupostos teóricos Entre as inúmeras transformações que ocorreram relacionadas à Arqueologia praticada no Brasil, especialmente nas últimas décadas, podemos citar um maior engajamento político por parte dos arqueólogos. Nas palavras de Funari (2005: 5) (...) os aspectos públicos, de interação e ação conjunta com as comunidades, tanto locais, como regionais, nacionais e transnacionais, passaram a representar parcela crescente e cada vez mais significativa da prática e teoria arqueológica. Somado a esse engajamento político, a aprovação das leis brasileiras de proteção do patrimônio arqueológico,2 no âmbito federal, estadual e municipal,3 contribuiu para a multiplicação dos trabalhos de campo ligados a licenciamentos ambientais (Funari, 2005: 6); sendo seguidas essas atividades, em alguns casos, por ações de cunho público. A Arqueo-

Fig. 1. Detalhe da Carta de Pero Vaz de Caminha, 1500. Torre do Tombo, Portugal.

das à Arqueologia Pública são essenciais nesse sentido, pois podem contribuir para um abandono da fetichização...). Como visto, contra um desconhecimento grande sobre a Arqueologia (a disciplina e a prática), há uma atenção preliminar do público leigo, interesse de que o arqueólogo voltado às práticas públicas deve lançar mão. Porém, esse é apenas um primeiro passo, e não se deve converter esse interesse em toda idéia de Arqueologia Pública; já que muitas vezes esse cenário estrutura-se em torno de uma Arqueologia fantástica, o que destoa freqüentemente das propostas e materiais apresentados: quando as expectativas residem em materiais de metais preciosos, monumentais, e se apresentam apenas poucos fragmentos de cerâmica, ou líticos pouco trabalhados.

(2) As publicações sobre o tema Arqueologia Pública e relacionadas utilizam o termo patrimônio com conotações variadas, o que deve ser brevemente esclarecido. Há, então, a utilização de termos como “patrimônio público”, “patrimônio cultural” e “patrimônio arqueológico”, ou mesmo o termo patrimônio isolado. Os complementos público e cultural, por vezes guardam certa equivalência, mas o primeiro é mais abrangente; ou seja, o patrimônio público não se restringe ao patrimônio cultural, é mais amplo. O mais específico deles é o termo “patrimônio arqueológico”, que se insere nos outros. Assim, o patrimônio arqueológico é também patrimônio cultural e público. (3) Destacam-se, nesse sentido: 1) A Lei nº 3.924, de 26/07/1961, que proíbe a destruição ou mutilação para qualquer fim, da totalidade ou parte das jazidas arqueológicas, o que é considerado crime contra o patrimônio nacional; 2) A Constituição Federal de 1988 (artigo 225, parágrafo IV), que considera os sítios arqueológicos como patrimônio cultural brasileiro, garantindo sua guarda e proteção, de acordo com o que estabelce o artigo 216; 3) A Portaria SPHAN/MinC 07, de 01/12/1988,que normatiza e legaliza as ações de intervenção junto ao patrimônio arqueológico nacional; 4) Portaria IPHAN/MinC nº 230, de 17/12/2002, que define o escopo dos estudos arqueológicos a serem desenvolvidos nas diferentes fases de licenceamento ambiental (Fonte: Material oferecido por Documento Antropologia e Arqueologia).

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logia Pública, segundo Ascherson (1999, Apud Funari, Oliveira & Tamanini, 2005: 106), é compreendida (...) como todos os aspectos públicos da Arqueologia, incluindo tópicos como políticas arqueológicas, educação, política, religião, etnicidade, envolvimento público em Arqueologia. A Arqueologia Pública tende, geralmente, a estabelecer diálogos com áreas paralelas como a Museologia, de onde surgem questões estritamente ligadas ao patrimônio e conscientização do leigo. Podemos definir patrimônio como o conjunto dos bens identificados pelo homem, a partir de suas relações com outros homens e com o meio ambiente e a própria interpretação que ele faz dessas relações (Bruno, 2002: 89, Apud Bessegato, 2004: 33). Além disso, conforme Oosterbeek (2005: 97), o conceito de patrimônio cultural nos remete ao de propriedade, algo a que atribuímos um valor e estabelecemos uma relação de apropriação. Os bens culturais, num sentido amplo, são os testemunhos da cultura humana e do meio no qual construímos nossa identidade individual e (ou) coletiva através da memória. Caldeira (2006: s. p.) revela que desde os tempos mais remotos existe a preocupação em preservar os bens culturais. Especialmente no período pós 2ª Guerra Mundial, vários setores das sociedades ocidentais passaram a enfatizar a importância dos bens culturais e a sua proteção tornou-se um direito e um dever de todos (Idem). Assim, várias associações foram criadas visando discutir políticas de defesa e conservação preventiva de bens culturais. Elas promoveram a criação regulamentar de diversas estratégias de restauro, conservação e proteção do patrimônio cultural.4

(4) Destacam-se, dessa forma, esforços como a Carta de Atenas (1931), Carta de Veneza (1964) e Carta Italiana (1987), que visavam um debate e organização internacional de um corpus regulamentar para a área de conservação e restauro (ver Caldeira, op. cit.).

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Essa correspondência entre a idéia de patrimônio (seleção) e conservação (permanência) é presente inclusive na acepção de dicionário: segundo o Dicionário Houaiss da língua portuguesa, patrimônio define-se, também, como bem ou conjunto de bens naturais ou culturais de importância reconhecida num determinado lugar, região, país ou mesmo para a humanidade, que passa(m) por um processo de tombamento para que seja(m) protegido(s) e preservado(s). O ato de identificar e selecionar o que é relevante para a memória de uma comunidade local, de um estado ou de um país gera problemas. Por exemplo, a instituição museu, enquanto lugar de preservação e gestão de vários desses bens culturais, muitas vezes está exposto ao jogo de interesses políticos. Assim, Devemos considerar a existência de uma intenção inicial que se traduz em “razão para preservar”, a qual muitas vezes se configura na criação de um espaço-museu. (...) Quando o Museu é idealizado de acordo com interesses ideológicos pela classe que ocupa o poder e nele procura manter-se, a instituição fatalmente funcionará como símbolo de força. (Almeida, 2005: 91) E é nesse contexto que a Arqueologia Pública pode exercer um papel importante nos processos de resgate da memória, reconhecimento e valorização do patrimônio, pois a cultura material, ou seja, o que poderá tornar-se patrimônio arqueológico de uma determinada comunidade, pode ser tomada como elemento de memória que permite a contribuição na construção de uma identidade local/regional. Nas palavras de Bruno (1996, Apud Almeida 2005: 67), “os indicadores/vestígios das sociedades que correspondem ao interesse de estudo da Cultura Material são, também, elementos da herança patrimonial, tratados e comunicados pela Museologia”.

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A Arqueologia busca compreender as sociedades humanas através da cultura material, e é a partir do resgate desses objetos pretéritos para o presente que o Museu recebe a atribuição de preservá-los dando-lhes um novo significado (Almeida, 2005: 95). Em outras palavras, cabe à Arqueologia e à Museologia a transmissão do valor público do patrimônio arqueológico. Entretanto, vale dizer, uma Arqueologia e Museologia como vocações públicas; ou seja, buscando intensos diálogos (numa acepção ampla do termo) com as comunidades envolvidas nos processos liderados por essas áreas. Neste ponto, reforça-se a importância da educação patrimonial, por exemplo, no seio escolar. Isso, dado o papel agregador, socialmente falando, que as escolas têm: são espaços de ampla e variada circulação (alunos, professores e outros funcionários, pais, palestrantes etc.), havendo também a organização e experiência de alguns grupos como grêmios estudantis, associação de pais e mestres, entre outros. As atividades relacionadas à ação de Arqueologia Pública no espaço escolar são geralmente resultado de projetos de implantação de grandes construções, e, dado o grande impacto ambiental, é, nessas regiões que ocorrem eventos educativos ligados à conscientização quanto ao patrimônio arqueológico. Segundo Bessegato (2004: 34) (...) cabe à Educação Patrimonial ser uma atividade paralela, mas, ao mesmo tempo autônoma e interligada aos Projetos de Salvamento Arqueológico, efetuados na região atingida pelo empreendimento destas Empresas ou Companhia de energia hidrelétrica. Mas, especialmente quando tratamos da relação entre Arqueologia e educação, deparamo-nos com algumas questões peculiares: por ser um tema que não é tratado diretamente em sala de aula (quando muito, um livro didático apresenta a pré-história do Brasil, ou monumentos gregos e romanos,

de forma ilustrativa e sem reflexões propostas a partir deles).5 Nesse contexto, torna-se bastante importante a interação entre Arqueologia, educação patrimonial e musealização. Segundo Bessegato e Milder (2005: 85), “a temática do patrimônio é hoje uma das mais prolíferas e profícuas da nossa contemporaneidade, e por isso mesmo, essencial para levarmos o patrimônio para as salas de aula”. Na mesma medida, a Museologia ganha força, sendo o museu deixado de ser tratado apenas como guardião móvel, para ser visto como meio de transmissão do patrimônio. Nas palavras de Almeida (2005: 40) Se a comunidade que vive num espaço/território tem oportunidade de reconhecer seu passado enquanto herança e vislumbrar sua vivência social e histórica nas transformações infringidas ao meio ambiente, seja ele rural ou urbano, a questão da eleição sobre o que seria significativo ou não, em termos de preservação da memória e patrimônio, ou seja, a escolha daquilo que se pretende deixar para as novas gerações, penetra automaticamente no campo das ciências dos museus. Não se pode falar de identidade sem tratar dos processos de musealização. Essas ações educativas não devem apenas oferecer um discurso pronto aos alu-

(5) As escolas brasileiras têm como obrigação criar planos pedagógicos que seguem orientações gerais, mas também respondem às realidades locais do público aprendizando, conforme algumas tendências mais ou menos recentes sobre pedagogia. A questão é que as matérias clássicas como História, Matemática, Geografia, Português, entre outras, são discutidas nos vários níveis (municipal, estadual e federal), e existe já uma experiência grande (teórica e prática) na execução das ações curriculares com relação a elas. No caso da Arqueologia na escola, a situação é bastante diferente. Como visto, a ampliação de um interesse de comunicação entre especialistas e público leigo é relativamente recente, e as práticas pedagógicas com relação ao ensino sobre Arqueologia ainda estão sendo discutidas, em estágio inicial.

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nos, faz-se necessário que os professoresarqueólogos, na senda de uma “pedagogia arqueológica”, 6 tenham em vista também a experiência do aprendizando. Assim, o papel do professor-arqueólogo é o de facilitador. Nas palavras de Bessegatto (2004: 30), “o professor tem a função de ajudar o aluno a se organizar, sensibilizando-o de forma que seus sentimentos possam ser e x p r e s s o s ”. Assim, a conscientização sobre o patrimônio arqueológico é, muitas vezes, tarefa de grande dificuldade; mas não apenas por causa desse conhecimento frágil e fragmentário, 7 mas também, em vário casos, por um descompasso de linguagem entre o professor-arqueólogo e o público leigo. Para sanar tal problema não é necessário tornarse simplista nas explicações e propostas, mas trazer o outro, inseri-lo nas questões arqueológicas, às vezes abrindo mão de termos complicados: a saída pode ser lidar com conteúdos com os quais eles já têm alguma experiência.

As pesquisas arqueológicas na região de Paranã 8 inserem-se num quadro regional mais amplo (AHE [Aproveitamento Hidrelétrico] Peixe Angical), relacionadas às atividades de salvamento arqueológico, precedente à obra de construção de um gran-

de reservatório hidráulico, em parte do curso do Rio Tocantins e do Rio Paranã (ver fig. 2). Além de Paranã, os municípios de Peixe, São Salvador e Palmeirópolis estão inseridos na zona de intervenção (e, portanto, de pesquisas arqueológicas precedentes). Nestes municípios haviam sido igualmente ministradas “Semanas de Arqueologia”, sendo em Paraná, tratada no presente artigo, a última delas. Essa Semana de Arqueologia ocorreu de 07 a 12 de novembro de 2005, e a maior parte dos eventos (palestras e atividades relacionadas) circunscreveu-se às quatro escolas públicas existentes na cidade: E. M. Floracy Bonfim Pereira de Araújo; E. E. Euclides Bezerra Gerais; C. E. Des. Virgílio de Melo Franco; E. M. Soldadinho de Jesus. As atividades envolveram mais de 5.000 alunos inscritos nas escolas. O público era bastante variado, composto por alunos desde o ensino fundamental até adultos em situação de alfabetização; e de diferentes grupos sociais. Dessa forma, não poderia haver, por parte do palestrante, uma entonação única, mecânica, dada a variedade dos interlocutores. O conteúdo das aulas era bastante amplo: uma introdução à Arqueologia, suas divisões (Arqueologia histórica e pré-histórica), suas fontes etc.; temas apresentados tanto de forma generalista, como específica (retomando as pesquisas arque-

(6) O termo “pedagogia arqueológica” pode parecer estranho e mesmo equivocado. Entretanto, existem esforços, ainda bastante iniciais, que indicam para uma proposta com fins educativos, baseando-se, inclusive, em literatura peculiar da discussão pedagógica. Não se trata, assim, de um corpus sistemático ou organizado de procedimentos, mas de algo que é perceptível, projeta-se em discussões recentes (Ver Bessegato, 2004 e Bessegato & Milder, 2005). (7) Um dos autores deste artigo, por exemplo, ao comentar com pessoas de níveis de escolaridade di-

ferentes (ensino básico e pós-graduação) que estuda Arqueologia, foi questionado da seguinte forma: “- você estuda para cavar chão?”, e também, “-vocÊ ganha para fazer isso?”. (8) Alguns dados sobre a população de Paraná, segundo o IBGE, a partir do site www.ibge.gov.br e também a seção IBGE – Cidade@: A população estimada é de 10.071 pessoas (número de 01.07.2005). As matrículas executadas no ano de 2004 foram as seguintes: Ensino fundamental, 2.595 pessoas e Ensino médio, 224 pessoas.

2. Uma Semana de Arqueologia em Paranã – Tocantins

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São Valério da Natividade Peixe

AHE Peixe Angical

Retiro

Paranã

São Salvador do Tocantins

Fig. 2. Mapa o reservatório do AHE Peixe Angical.

ológicas da própria região). A estrutura básica do conteúdo ministrado era o seguinte:

- Primeiro dia – Introdução: O que é Arqueologia?; Arqueologia pré-histórica; A arte rupestre; ZooArqueologia;

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Arqueologia da morte; Arqueologia histórica. - Segundo dia – O trabalho do arqueólogo: As escavações; Estudos de laboratório; Quando foi? (as datações); Arqueologia Pública. - Terceiro dia – O patrimônio arqueológico do AHE Peixe Angical. Objetivos do projeto e dados gerais: Como se dá a pesquisa arqueológica na região; Um pouco da pré-história do Tocantins; A Era da diversificação: grupos caçadores-coletores mais recentes (9000 a 3000 anos); Sociedades cultivadoras (3000 a 1500 anos); Agricultores de grandes aldeias (1300 anos até a época atual). - Quarto dia – História: Patrimônio histórico e cultural. Como se dá a pesquisa; A história do Tocantins... Nossa História (séc. XVIII-XX). - Quinto dia – Patrimônio histórico edificado: Técnicas construtivas; Construções rurais; Construções urbanas; Conjuntos arquitetônicos. Freqüentemente, o reconhecimento imediato acontecia quando tratadas as referências de Arqueologia histórica, sobretudo no tocante à arquitetura da cidade. Ao comentarmos aspectos da arquitetura local, mos-

trando a imagem da Igreja da Matriz (ver fig. 3), tal situação era amplamente observada. Ainda, não era difícil encontrar quem reconhecesse a própria casa, de parentes ou vizinhos dentre as imagens apresentadas. Nesse sentido, havia intensas trocas de informações, por exemplo, muitos dos aprendizandos conheciam bem algumas das técnicas construtivas tratadas, como as casas de palha de Buriti, de adobe etc. Numa dessas aulas, um aluno chegou a explicar com detalhes, a todos, como se construía uma casa de pau a pique. Entretanto, essa identificação não se restringiu apenas às referências de Arqueologia histórica. Por exemplo, comentar algumas técnicas da produção ceramista de populações indígenas antigas também ensejava lapsos de comunicação entre tempos bastante remotos (técnicas bastante antigas e ainda utilizadas recentemente). Tal conteúdo, previamente estipulado, não era extremamente fixo, e o retorno do público aprendizando poderia propor diferentes encaminhamentos. Por exemplo, a algumas questões muito específicas da Arqueologia, como a estratigrafia, abriu-se um diálogo sobre o passar do tempo, as intempéries, a ação do homem e sua interferência sobre o solo. Ainda, contra um juízo simplista sobre a indústria lítica, a própria variedade de formas e usos do talhes que qualquer um

Fig. 3. Vista panorâmica da Igreja da Matriz, Paranã.

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tinha em casa, serviu como parâmetro comparativo. A duração das aulas introdutórias era de aproximadamente quarenta e cinco minutos, dependendo da interação entre os professores-arqueólogos e público escolar (incluindo professores e outros funcionários da escola, que também participavam); e, após isso, eram empreendidas outras atividades que visavam compreender qual o impacto do que foi discutido antes. Claramente, dadas as variações etárias, as atividades eram pensadas levando em conta esses recortes: os mais jovens poderiam criar desenhos baseados na sua experiência (ver fig. 4), e, aos maiores, era proposta a criação de redações, poesias, repentes etc. Nesse caso específico, interessante foi o fato do distanciamento na questão da temporalidade, pois, numa dessas atividades, quando deveriam preencher a frase “para mim, a Arqueologia é...”, as lacunas foram completadas repetitivamente com termos como passado, velho, antigo/antiguidade, antepassado, pré-história/história (numa acepção passadista), ruínas, mortos/ morte. Entretanto, a interação passado-presente (que está no cerne da questão patrimonial) e que buscávamos em vários momentos resgatar, também foi notada; é certo, por uma parte menos expressiva dos aprendizandos. Uma das atividades recebeu atenção especial das crianças, jovens e, ao

Fig. 4. Alunos da 1ª a 3ª série do Ensino Fundamental da escola Floracy Bonfim Pereira de Araújo; em pintura mural, uma das atividades posteriores às aulas de arqueologia.

contrário das nossas expectativas, de adultos: era uma simulação de escavação (previamente montada pela equipe de professores arqueólogos) – ver fig. 5. A Semana de Arqueologia não se restringiu ao espaço das escolas, havendo, nos últimos dias, algumas apresentações de grupos de seresta, mostra de trabalho dos alunos, a outras apresentações da comunidade como as danças tradicionais da Pastorinha, Suscia, oração do Imperador e Folia. Tais eventos paralelos no seio da Semana de Arqueologia, se parecem destoar do conteúdo arqueologicamente orientado, no que tange à idéia de conscientização patrimonial, fo-

Fig. 5. “Tivemos nosso dia de arqueólogos!” (Lamyara Macedo – 6ª A, Escola Virgílio de Melo Franco). A experiência da escavação: uma das atividades mais apreciadas pelos alunos.

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ram bastante positivo. Destaca-se, nesse sentido, o grande evento que findava a Semana de Arqueologia na cidade, sediado num local de grande agregação social: trata-se da Feira Coberta de Paranã, local onde ocorrem vários eventos da cidade, e há, ao seu lado, um pequeno comércio bastante freqüentado. Ali, foram expostas as atividades produzidas durante a semana pelos alunos, num evento que conclamava toda a cidade. Foi nesse local, de reconhecimento fácil e grande circulação, entre as manifestações culturais que todos bem conheciam, instalou-se a reflexão produzida sobre a cidade no tocante à arqueologia e ao patrimônio. Foi, no seio de manifestações tradicionais mescladas àquele conhecimento recentemente adquirido, que se encerrou a Semana de Arqueologia de Paranã. 3. A idéia de parceria na Arqueologia Pública Há dois atores que devemos caracterizar nessa idéia de parceria, atores bem diferentes, cabe dizer, mas cuja união pode ser bastante fecunda, se efetivamente dialética, quando inseridos no quadro da Arqueologia Pública, sobretudo na dinâmica de uma pedagogia arqueológica. Os atores são os seguintes: de um lado o profissional (o arqueólogo) e do outro o que se denomina geralmente como “leigo”. Há que se saber que, diferente de qualquer acepção pejorativa do termo, o leigo pode estar no plano do interlocutor altamente intelectualizado, inclusive na tradição acadêmica, ou aquele completamente distante dela: o leigo é apenas aquele que não conhece bem a Arqueologia, seus processos científicos, jargões específicos etc. A aparente apresentação opositiva não é casual. Acreditamos que haja mesmo um distanciamento que deve ser sanado, através de uma aproximação que não seja baseada em práticas unidirecionais (o que só confirmaria tal oposição). Nesse sentido, a Arqueologia, apresentada no seio escolar, ou 58

seja, em contornos pedagógicos, é bastante viável, e é neste ponto que a experiência em Paranã, como professores-arqueólogos, deve ser retomada. É importante lembrar que os dois atores encontraram novidades: um, pois lhe será apresentado algo novo, que conhece pouco ou desconhece completamente; e ao outro, pois a escola elementar é um espaço diferente, com dinâmicas novas, a que o pesquisador tem que se adaptar em parte. O público é diverso daquele com que ele está acostumado a dialogar, e os objetivos de tal comunicação também são diversos. O dito professor-arqueólogo não é aquele que se relaciona cotidianamente com essa dinâmica e s c o l a r, e l e a p a r e c e e m s i t u a ç õ e s freqüentemente de exceção, ao contrário dos professores de História, Português, Matemática etc., matérias cujos docentes não são necessariamente pesquisadores, e mesmo que sejam, eles devem seguir, pelo menos em parte, um projeto, um plano de ensino (pedagógico), discutido no seio da escola, conselho tutelar, comunidade etc. O professor-arqueólogo chega no contexto escolar com algo definido por ele e (ou) por uma equipe que integra, o conteúdo não é discutido no seio escolar e comunitário. Em Paranã, o caráter de exceção característico dessa inserção do arqueólogo no seio escolar foi amplamente observado. Em primeiro lugar, a chegada de um grupo de estranhos provocou certa ansiedade na cidade, e questões como as do título deste artigo surgiam. Iniciadas as atividades, as aulas apresentadas contavam com aparelhagem de reprojeção digital e microfones - ver fig. 6; o que era bastante diferente dos recursos que as escolas possuíam. Ainda, houve certa reestruturação das salas, e em alguns casos até a remoção para outro espaço (a Feira Coberta de Paranã), que acolhia melhor a aparelhagem e as grandes turmas de alunos. Toda essa reorganização promovia a inserção de um pessoal (os professores-arqueólogos) e conteúdos novos nas escolas. Mas, dadas as condições climáticas (a cidade é

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Fig. 6. Paulinho e Leilane ensinando arqueologia.

bastante quente em novembro), episodicamente a aparelhagem falhou, e uma comunicação mais próxima da dinâmica cotidiana da escola restabeleceu-se (na falta de aparelhos, restavam as lousas e gizes). Tal esforço servia, claramente, a uma conscientização (em alguns casos até primária) sobre o patrimônio arqueológico. Entretanto, como romper as barreiras da conscientização primária (essa passo fundamental, mas inicial) e alcançar a participação no processo seletivo, muitas vezes restrito aos profissionais relacionados à Arqueologia e ao museu? As decisões do arqueólogo, a partir de pressupostos científicos, freqüentemente propõem seleções de artefatos, construções arquiteturais etc., cuja conservação será feita.9 Há, dessa forma, uma intervenção grande no quadro das referências das coisas a serem guardadas, conservadas e lembradas. São comuns as permanências de objetos arqueológicos dentro de instituições acadêmicas como museus universitários, ou mesmo em outros casos, em museus históricos e de arte.

(9) A noção de preservação, numa discussão sobre a Arqueologia Pública que se pretenda realmente ampla, é variada. Vai desde a preservação material, até tudo o que ela implica ideologicamente. Preservar, nesse sentido, significa dar destaque a alguns elementos, visando sua continuidade (talvez perenidade); uma sobrevivência física, mas também no campo da memória.

O estatuto do objeto no museu é diverso daquele no contexto que foi criado e utilizado de forma primária, e mesmo do “abandono”, sanado pela ação arqueológica. Distante da dinâmica do museu universitário, a própria discussão artística do século XX indicava para um debate do papel de determinados objetos num museu, e da variação de seu estatuto em contextos diferentes. Lembremos aqui da pilha de caixas de suco de tomate Campbell, criada por Andy Warhol (1969), e do miquitório (intitulado La Fontaine) assinado por Mutt (1917), heterônimo de Marcel Duchamp (ver figs. 7 e 8). Ora, seriam os mesmos se estivessem no seu local de origem (a prateleira de um supermercado ou num banheiro público qualquer?). A resposta passa, efetivamente, pela compreensão do estatuto, da constituição de uma “aura” do que está encerrado nas dependências de qualquer museu. Escolher esses objetos “auráticos”, passa, em parte, pela ação arqueológica desde seus primórdios, ou seja, já na sua entonação antiquarista, que se caracterizava, em muitos casos, por uma forte aproxi-

Fig. 7. A Fonte, Marcel Duchamp, 1917.

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Fig. 8. Suco de tomate Campbell, Andy Warhol, 1969.

mação com o Estado, quando, desde a época moderna, este toma a empresa de preservação patrimonial para si. Tal situação deu-se freqüentemente contígua a um uso no campo da propaganda institucional estatal, como no caso da Escandinávia, Suécia, Dinamarca, desde o século XVI. Clark (1985: 57) conta algo sobre a criação de um Museu Nacional dinamarquês, que Incorporando coleções provenientes da Kunstkammer real, e a nomeação de uma comissão régia para salvaguardar monumentos nacionais estabeleceram um firme vínculo entre o sentimento de identidade nacional e as relíquias do passado dinamarquês. Assim, foi no seio da ação acadêmica, freqüentemente endossada pela estatal, que se escolheram e preservaram as coisas que devem ser rememoradas. A idéia de parceria, numa acepção mais ampla; ou seja, desobjetivando o outro (no caso, o público leigo) parece propor uma mudança nessa situação. Uma pedagogia arqueológica serviria para algo muito além de ensinar o que é importante arqueologicamente falando (o passo inicial), mas de munir o leigo para uma participação efetiva nessas escolhas. A ação conscientizadora não se deve pautar numa situação iluminista de fluxo

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unidirecional de conhecimento; mas ela pode ser bastante importante quando se pensa em integrar o público leigo nas escolhas finais do processo de preservação patrimonial. Nesse sentido, as práticas de Arqueologia Pública, sobretudo as de entonação pedagógica, têm papel essencial na formação (e não condicionamento) do público leigo. O reconhecimento dos materiais, da função do arqueólogo, e do estatuto que esses devem ocupar no seio de sua comunidade devem ser escolhidos, discutidos e construídos no seio de um diálogo. Diálogo, no sentido mais amplo da palavra, ou seja, uma relação dialética, onde há certas interdependências. Os papéis são claramente diferentes, mas relativos. A prática arqueológica propõe diálogos com populações locais, antes mesmo de qualquer proposta de Arqueologia Pública. Destaca-se, nesse quadro, uma linha que vê no outro, no leigo, um parceiro relativamente importante na pesquisa arqueológica. Alguns manuais de Arqueologia indicam a importância do diálogo com populações locais, que geralmente guardam na memória histórias, e mesmo objetos materiais encontrados ao longo de sua existência. Conversar com eles, então, mostra-se em alguns casos indispensável.10 Entretanto, essa prática está longe de uma ação arqueológica pública, dado que o relato do outro é usado de forma quase puramente instrumental, e não é previsto algum retorno posterior. Por fim, é devido dizer que uma Arqueologia que proponha um verdadeiro diálogo com o outro lado dos muros da academia, quando inserida nos processos educativos, mesmo em caráter de exceção, deve estar atenta às questões feitas pelo outro, se visa

(10) “A informação oral torna-se muito útil, em geral, nos casos em que o arqueólogo está estudando um sítio que foi ocupado em tempos ainda presentes na memória de testemunhas, ou nos casos em que o arqueólogo deseja conhecer a história do sítio após seu uso pelo povo que originalmente o construiu”. (Orser Jr, 1992: 45)

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tê-lo como parceiro. As perguntas do título aparentemente apresentam respostas simples, as quais o arqueólogo tem bastante desenvoltura para responder. Porém, visando reconhecer o outro como parceiro, essas questões devem sempre ser pensadas de forma relativa, e não com uma objetividade peculiar do discurso cientificamente baseado. O arqueólogo, suas interpretações, os materiais com que trabalha, tudo isso está inserido num universo amplo de significados, por mais que durante muito tempo tenha-se optado por ações restritivas. A Arqueologia é uma área que lida freqüentemente com questões sobre o passado, e o debate patrimonial insere ações sobre o presente.11 É necessário deixar claro que não é apenas a discussão patrimonial que aproxima a Arqueologia das questões do nosso presente. A reflexão teórica sobre a disciplina e sobre sua própria história indica que a reflexão arqueológica sobre a cultura material produzida no passado são interpretadas a partir de abordagens teóricas e problemas freqüentemente relacionados ao universo do pesquisador.

AGRADECIMENTOS Agradecemos ao professor doutor Pedro P. A. Funari, pelo interesse, gentil convite para publicação e sugestões bastante apropriadas; bem como à professora doutora Erika M. Robrahn-González, pela disposição e interesse sobre nossas atividades, desde a Semana de Arqueologia em Paranã, até a disponibilização de informações importantes para a confecção deste artigo. Agradecemos também as empresas e instituições envolvidas na organização e execução da Semana de Arqueologia em Paranã (Documento Antropologia e Arqueologia Ltda., Enerpeixe, Núcleo de Estudos Estratégicos – Arqueologia Pública/Unicamp e Fundação Cultural de Jacarehy); e todos os integrantes da equipe de professores-arqueólogos (Wagner, Paulinho, Vinícius, Kelly, Silvana e Patrícia). Por fim, cabem agradecimentos ao CNPq, cujo incentivo financeiro é responsável pela permanência das atividades acadêmicas de um dos autores deste artigo. As idéias aqui expostas são de inteira responsabilidade dos autores.

(11) É necessário deixar claro que não é apenas a discussão patrimonial que aproxima a Arqueologia das questões do nosso presente. A reflexão teórica sobre a disciplina e sobre sua própria história indica que a reflexão arqueológica sobre a cultura material produzida no passado são interpretadas a partir de abordagens teóricas e problemas freqüentemente relacionados ao universo do pesquisador.

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Abstract: The aim of this article is to comment about the partnership notion into the Public Archaeology debate, specifically in the classroom dynamic. The comprehension about the archaeology role in this context will be based on the authors’ experience as archaeology teachers during the Semana de Arqueologia de Paranã - TO (Paranã Archaeology Week TO), a hands-on related to archaeological research activities in an environmental impact zone, where a dam is about to be built.

Keywords: Identity, Public Archaeology, Heritage Education, Heritage, Partnership

Bibliografia ALMEIDA, P. A. 2005 Arqueologia em Conceição dos Ouros – MG. Pouso Alegre: Gráfica e Editora Amaral. BESSEGATO, M. L. 2004 O patrimônio em sala de aula: fragmentos de aços educativos. 2ª edição, Porto Alegre: Evangraf. BESSEGATO, M. L. & MILDER, S. E. S. 2005 OH! A sala de aula como um local de interjeição as questões patrimoniais. CRUZ, A. R. & OOSTERBEEK, L. Arkeos. Perspectivas em diálogo. n. 15. 2005: 81-94. BRAUDEL, F. 1986 A longa duração. In: História e ciências sociais. Editorial Presença, 5ª ed., : 7-39. CALDEIRA, C. C. 2006 Conservação preventiva: histórico. Revista CPC, v. 1, n. 1. (consultado no site http://www.usp.br/cpc/v1/php/ wf07_revista_capa.php, em 20 de janeiro de 2006). CLARK, G. 1985 Identidade do homem. Uma exploração arqueológica. Trad. Álvaro Cabral. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor.

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Revista Arqueologia Pública, São Paulo, nº 1, 2006, pgs. 63-120.

ARQUEOLOGIA E SOCIEDADE NO MUNICÍPIO DE RIBEIRÃO GRANDE, SUL DE SÃO PAULO: AÇÕES EM ARQUEOLOGIA PÚBLICA LIGADAS AO PROJETO DE AMPLIAÇÃO DA MINA CALCÁRIA LIMEIRA. Erika Marion Robrahn-González*

Resumo: O presente artigo visa analisar o desenvolvimento da Arqueologia Pública enquanto prática e conceituação científica, e apresentar uma iniciativa de aplicação que vem sendo desenvolvida junto à comunidade do município de Ribeirão Grande, localizado na região sul do Estado de São Paulo, com apoio da Companhia de Cimento Ribeirão Grande.

Palavras-chave: Arqueologia Pública, Ribeirão Grande, Arqueologia de São Paulo

Introdução Todo ser humano é, em algum ponto de sua essência, um arqueólogo. Isto significa dizer que a Arqueologia existe, em primeiro lugar, da necessidade do ser humano em registrar sua própria história, seja através dos documentos escritos, das narrativas orais ou dos diferentes marcos deixados no mundo que o rodeia, como a construção de templos, o registro de cenas pintadas em paredes rochosas, a implantação de sinais que delimitem os territórios ocupados, e assim por diante. Esses marcos, em especial, são produzidos pelas sociedades humanas para que sejam reconhecidos tanto pelos próprios membros de sua sociedade, como também por outras sociedades, definindo seu universo político, econômico, social e cultu-

(*) Núcleo de Estudos Estratégicos / UNICAMP [email protected]

ral. Nos dias de hoje, não mais nos limitamos a deixar registros em nosso próprio planeta, mas lançamos artefatos ao espaço (como a placa metálica enviada pelos EUA contendo a figura humana desenhada por Leonardo da Vinci e fórmulas matemáticas). Estamos preparando, portanto, vestígios arqueológicos para que nossa história possa ser lida por cientistas de muito mais além. Por outro lado, todo ser humano tem necessidade de conhecer sua história, construindo, a partir dela, suas referências de vida. A experiência acumulada pelo homem fornece a sustentação necessária para olhar o futuro: seja perpetuando antigas formas de vida, seja negando estas formas e construindo novas alternativas de desenvolvimento. O ser humano necessita, por fim, compreender formas de vida muito diferentes das suas, como foram, por exemplo, as sociedades da América para os colonizadores europeus quando alcançaram nosso continente, no século XV. 63

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A Arqueologia é, em essência, a busca desta história de experiências humanas. Milênios antes da Arqueologia se firmar como disciplina no ocidente membros de diferentes sociedades procuravam explicar o passado das mais variadas formas, onde se incluem desde os mitos de criação do universo apresentados por grupos indígenas, até escritos gregos datados em 800 anos a.C. que fazem referência à primeira divisão do passado humano em eras culturais (Idade do Ouro, Idade da Prata, Idade do Bronze, Idade Heróica e Idade do Ferro). Estes foram, sem dúvida, os arqueólogos de seu tempo. De fato, a História da Arqueologia é, antes de mais nada, uma história de idéias e de descobertas, de formas de olhar o passado. E cada olhar constitui um reflexo ou produto de seu próprio tempo. Se no início podemos chamar, com certa liberdade poética, de “arqueólogo” aquele que registrava cenas de sua cultura em paredes de pedra, hoje chamamos de arqueólogo aquele que se vale de modernos conceitos teóricos, técnicas sofisticadas e grandes organizações de trabalho para explicar, segundo os atuais preceitos da Ciência, o mesmo velho tema: a história humana. Enquanto arqueólogos deste início do século XXI, trazemos no currículo pelo menos cinco séculos de experiência, contados desde os primórdios da disciplina no continente europeu, ainda durante o século XV. Se fôssemos capazes de contabilizar o investimento intelectual e o volume de estudos realizados, certamente nos surpreenderíamos com o resultado: milhares (ou milhões) de trabalhos de campo, de acervos pesquisados, de datações adquiridas, de publicações, apresentações em reuniões e congressos, debates científicos, exposições e muitos itens mais. Dos colecionadores de peças exóticas da Antiguidade aos dias atuais, a Arqueologia não foi apenas capaz de acumular um conhecimento respeitável sobre o passado humano; discutiu incansavelmente, também, sua responsabilidade ética sobre este pas64

sado, à medida em que apontava novas e mais abrangentes perspectivas de abordar o desenvolvimento das sociedades ao longo do tempo. Como conseqüência e continuidade desta dinâmica, mais uma vez a Arqueologia se encontra no divã. Todavia, enquanto ao longo de sua história os agentes motivadores de mudança foram, principalmente, membros de dentro de sua própria comunidade científica, desta vez eles vêm de fora e podem ser sintetizados em uma única palavra: sociedade. Este movimento vem sendo internacionalmente denominado “Arqueologia Pública”, voltada ao relacionamento entre a pesquisa e o manejo de bens culturais com os grupos sociais interessados, de forma a promover a participação da sociedade na gestão de seu patrimônio arqueológico e histórico. Essa abordagem prescinde, todavia, de uma profunda mudança de postura com respeito ao nosso “objeto de estudo” e procedimentos de trabalho. Hoje entendemos não ser mais possível que a Arqueologia continue voltada ao desenvolvimento de um ser abstrato chamado “Ciência”, colecionador insaciável de novas teorias, novas descobertas, novas abordagens, novas discussões. Valendo-me de uma imagem da nossa velha conhecida Teoria de Sistemas, o turning point da Arqueologia pode ser sintetizado em uma única palavra: sociedade. Temos, assim, uma mudança essencial de foco, onde a Arqueologia deixa de ser uma ciência com olhar voltado ao passado para assumir sua responsabilidade na compreensão do presente e na promoção do futuro. O presente trabalho visa apresentar uma reflexão sobre o tema, apoiado em uma discussão teórica e conceitual e apresentando uma síntese dos resultados até o momento abtidos pela pesquisa que vem sendo desenvolvida em parceria com a empresa Companhia de Cimento Ribeirão Grande (CCRG) por conta do licenciamento ambiental do Projeto de Ampliação da Mina Limeira, localizada na região sul de São Paulo, município de Ribeirão Grande.

Arqueologia e sociedade no município de Ribeirão Grande, sul de São Paulo: ações em arqueologia pública ligadas ao Projeto de Ampliação da Mina Calcária Limeira. Erika Marion Robrahn-González

Conceituação A busca em compreender o passado humano se deu, inicialmente, através de manifestações oriundas da própria sociedade, como nos exemplificam os mitos de criação do mundo, ou mesmo a atividade quase instintiva de colecionar objetos que remetessem e materializassem a própria existência deste passado. À medida que a Arqueologia foi se firmando enquanto disciplina (especialmente a partir do século XIX), o estudo e interpretação da história humana constitui domínio e atribuição de profissionais cientistas, em busca de um “passado objetivo real”. A própria terminologia cada vez mais técnica da Arqueologia, em boa parte adquirida através da New Archaeology, já no século XX, perpetua a mistificação da disciplina, e sua prática pressupõe uma crescente alienação junto ao público, fazendo crer que pouco há para ser aprendido com a participação da sociedade nas pesquisas. Esse distanciamento do arqueólogo junto ao público pode ser bem ilustrado por uma situação apresentada em artigo de Shackel (2002:13), em que relata escavações realizadas no Parque Nacional Harpers Ferry/EUA, na década de 1970. Na chegada ao local de trabalho possíveis visitantes eram recepcionados por uma placa contendo os seguintes dizeres:

Yes – we are archaeologists. Yes – we are doing archaeology. Please do not disturb us. Os primeiros arqueólogos a atravessar a fronteira entre a audiência científica e a audiência pública foram duramente criticados, incluindo um certo questionamento sobre a própria sustentação científica de seus trabalhos. Essa iniciativa se deveu à Arqueologia Pós-processualista que, a partir do início da década de 1980, alertava sobre os cuidados

e responsabilidades referentes ao conteúdo das mensagens transmitidas sobre o passado, considerando as dimensões sociais e políticas envolvidas. Isto se aplicava tanto à divulgação científica quanto à divulgação voltada ao público em geral (para uma revisão do tema vide Moser 2001). Observou-se assim uma crescente preocupação, no cenário internacional, com os aspectos públicos da Arqueologia, entendidos como as questões de planejamento econômico, ações sociais e políticas envolvidas na prática da disciplina. Com a fundação da WAC (World Archaeological Congress) em 1986, a Arqueologia tem tratado de forma mais sistemática o relacionamento entre a pesquisa e manejo de bens culturais e os grupos sociais interessados. O surgimento da primeira publicação periódica sobre o tema, Public Archaeology (Londres, James & James), em 2000, assinala o amadurecimento das discussões estratégicas sobre o caráter público da disciplina e sua importância social. Em vários outros países do mundo, incluindo o Brasil, a Arqueologia deixou por muito tempo para uma equipe de não-arqueólogos (incluindo caçadores de tesouros, amadores, saqueadores e romancistas) a missão de propagar suas descobertas e interpretações, não raro de modo distorcido. Nos últimos anos, todavia, os arqueólogos começaram a introduzir em sua rotina de trabalho diferentes ações referentes à agenda em Arqueologia Pública, como educação, integração com a comunidade e proteção/ preservação de sítios arqueológicos. Inicialmente as ações em Arqueologia Pública estiveram mais voltadas à proteção e preservação do patrimônio arqueológico, haja visto que os profissionais se depararam com um ritmo cada vez mais acelerado de degradação e destruição deste patrimônio. A perda de patrimônio cultural é comparável à extinção de espécies vegetais ou animais: é para sempre. A manutenção dos vestígios do passado (sejam eles artefatos, sítios arqueológicos, paisagens ou qualquer tipo de estrutura) constitui elemento fundamental 65

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para continuar havendo uma ligação tangível com o passado, elemento crítico de toda vida social. Assim sendo, independente de como o passado é estruturado, compreendêlo e proteger seus símbolos constitui parte integrante da experiência coletiva humana – e da classe arqueológica em particular (Smith & Ehrenhard 2002:121). Mas rapidamente os arqueólogos perceberam que necessitavam reconhecer não somente sua responsabilidade sobre os vestígios arqueológicos, mas igualmente sobre as pessoas cuja herança histórica e cultural se relacionava a estes vestígios (Little 2002:10). Um dos benefícios públicos da Arqueologia está justamente em contribuir para o fortalecimento dos vínculos existentes entre a comunidade e seu passado, ampliando o interesse da sociedade sobre o patrimônio e criando, assim, a sustentação necessária às medidas de preservação. Nessa empreitada devemos explorar o grande interesse e fascínio que a Arqueologia desperta nas pessoas, por conta de seu perfil de descobertas e da busca pelo passado. De fato, a Arqueologia parece constituir a segunda profissão de mais da metade da população. Freqüentemente nos deparamos com frases como “se eu não fosse engenheiro (ou médico, ou professor, ou qualquer outra profissão), seria arqueólogo”. A relação que a Arqueologia estabelece com as diferentes áreas de conhecimento uma vez que é uma ciência verdadeiramente interdisciplinar, fruto da somatória de cada disciplina científica e humanista – é mais um dos fatores que faz com que muitas pessoas se sintam próximas a ela. Isto se aplica, por exemplo, ao caso da estabilidade e mudança ambiental: através do conhecimento da sucessão de experiências humanas ocorridas sobre um ecossistema, é possível refletir sobre alternativas de gestão e manejo, trazendo uma visão mais global e tangível ao tema (Little 2002: 9; De Vries 2003). Podemos citar ainda como fator de aproximação entre a Arqueologia e o público em geral o crescente interesse e uso de tecnologia no mundo moderno. A Arqueolo66

gia não só utiliza uma série de tecnologias nas pesquisas, onde se incluem as datações radiocarbônicas, sensoriamento remoto, análises químicas, entre outros (McManamon 2000:13), assuntos que despertam grande interesse do público em geral, e do estudantil em particular – como por intermédio de seus estudos é possível conhecer o desenvolvimento tecnológico desde a pré-história até os dias atuais e outros aspectos do desenvolvimento humano, como a agricultura e a metalurgia. Fatores como os acima mencionados levam muitas pessoas a considerar a Arqueologia importante, estando, na maior parte das vezes, interessadas em aprender sobre ela. Acreditam que seu estudo traz ferramentas importantes também para entender o mundo moderno, ressaltando seu valor educativo, artístico, estético e até espiritual. A Arqueologia pode, assim, desenvolver elos entre presente e passado, fortalecendo-os mutuamente e trazendo ensinamentos sobre a experiência humana como um todo (Little 2002:16). Se expandirmos nossa visão para reconhecer os sucessos e insucessos das sociedades ao longo dos tempos, nossa tolerância social deverá ser expandida. Hoje os estudantes necessitam compreender a história do mundo e de pessoas de diferentes culturas e contextos que desenvolveram idéias, instituições e formas de vida diferentes da sua. Nesse sentido, o conhecimento de diferentes formas de vida, experiências e perspectivas da humanidade no passado podem contribuir em criar cidadãos mais pacientes e respeitosos, especialmente com grupos excluídos ou minorias étnicas, em nossa sociedade crescentemente pluralista (Shiva 2003; National Center for History in the Schools 1996:1, citado por Little 2002:12). Hoje temos necessidade de sermos competentes num mundo multicultural, e a Arqueologia pode proporcionar ferramentas que auxiliem a viver nesta sociedade crescentemente complexa, ensinando as pessoas sobre outras culturas e tempos, fornecendo-lhes ferramentas para melhor com-

Arqueologia e sociedade no município de Ribeirão Grande, sul de São Paulo: ações em arqueologia pública ligadas ao Projeto de Ampliação da Mina Calcária Limeira. Erika Marion Robrahn-González

preender a diversidade humana, ao expandir suas visões de mundo (Little 2002:13). Essa compreensão da diversidade leva à tolerância, que permite a inserção de diversos segmentos da sociedade, tornando todos os indivíduos sujeitos plenos de direitos e deveres: cidadãos. Assim, um dos benefícios públicos da Arqueologia é o mesmo que oferece a história e a ciência: a educação da cidadania. Do mesmo modo que o multiculturalismo pode ser representado tanto pela existência de uma multiplicidade de culturas do mundo, como pela co-existência de culturas diversas no espaço de um mesmo Estado-nação e as interinfluências que ocorrem tanto dentro como além do Estadonação (Santos 2003), o conceito de cidadania não presume limites estritos: pode-se, ao mesmo tempo, ser cidadão de um município, de um país, ou cidadão do mundo (Ribeiro 2000), e a Arqueologia transita entre estes diferentes níveis o tempo todo. Assim, como bem coloca McManamon (1991, 1994, citado por Smith & Ehrenhard 123), não temos apenas um público a considerar, mas vários. Devemos refletir sobre a maneirar como nossa sociedade se posiciona com relação ao seu passado: Qual o passado que merece ser resgatado? Quais os mecanismos que a sociedade utiliza para registrar e perpetuar sua própria história? Em oposição às ciências naturais, a ciência social necessita ser, particularmente nestes tempos pós-modernos, pluralista em essência. A admissão de diferenças não põe em cheque a autoridade da disciplina. Ao contrário: o reconhecimento de que as idéias e interpretações são produto de condições históricas específicas amplia o debate e sua contribuição. Segundo define Molyneaux (1994:6), se desejamos obter uma compreensão do passado que abranja a complexidade e diversidade de suas mensagens possíveis, então precisamos reconhecer a existência de um público igualmente diverso, e aprender a lidar com ele. Para assim proceder mostra-se necessário reconhecer e respeitar todos os valores atribuídos à herança arqueológica, incluindo a científica.

É preciso, assim, reconhecer a pluralidade de interesses e graus de percepção do passado, bem como as necessidades políticas do presente. Para tanto, os programas de pesquisa devem envolver aspectos culturais e identitários da comunidade envolvida, elementos que exigem novas posturas e abordagens, trazendo alterações essenciais aos estudos arqueológicos (Gosden 2001; Fagan 2002). A Arqueologia pode construir elos entre a comunidade no presente, assim como no passado, no momento em que sua herança cultural é valorizada, preservando histórias e tradições. Por essa razão o conteúdo da mensagem a ser transmitida ao público deve estar, antes de mais nada, atrelado à história local, de forma a construir um elo de percepção junto ao público, partindo daí para contextos mais gerais. Isso pode incluir objetos identificados no local, sítios ou vestígios mais conhecidos, dados sobre como os grupos humanos do passado viveram naquele mesmo espaço geográfico, entre tantos outros (McManamon 2000:13; Lerner 1991, citado por McManamon 2000:14). Por outro lado a mensagem deve também conter dados sobre a importância deste patrimônio, o fato dele ser único e não renovável, e também o esforço e detalhamento da pesquisa científica necessária para construir o conhecimento, visando sensibilizar o público sobre sua valorização e necessidade de preservação. No caso brasileiro, onde a sociedade nacional foi formada através de uma ruptura entre as ocupações indígenas que aqui se encontravam e o elemento europeu, mais tarde acrescido pela cultura africana, é freqüente a comunidade atual não reconhecer vínculos com o contexto arqueológico, embora tenha interesse pelo seu sentido exótico. Isso se agrava pelo fato de que até mesmo a construção da História do Brasil tenha sido tradicionalmente feita a partir de sua classe intelectual dominante, resultando em um baixo ou nulo reconhecimento da população em geral como sendo esta a “sua história”. O próprio currículo escolar não inclui uma efetiva história das minorias, apesar de 67

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sua participação fundamental na formação e desenvolvimento da sociedade nacional. Contexto muito próximo ocorre em pesquisas no sul da África, onde os vestígios arqueológicos e a herança patrimonial foram, durante todo o longo período colonial, tratados a partir dos interesses da aristocracia e não a partir das aspirações das comunidades locais. Assim, como parte do processo político e da própria perspectiva da pesquisa arqueológica realizada, parte do legado colonial foi justamente causar a alienação das comunidades locais com sua herança cultural (Ndoro & Pwiti 2001:21). Nesse sentido os vestígios arqueológicos, enquanto elementos materiais tangíveis, proporcionam uma experiência que auxilia no reconhecimento de que existe um passado, constituindo uma ponte concreta entre o antes e o agora e proporcionando, como define Lowenthal (1985:XXIII, citado por McManamon 2002:32), uma metáfora que ilumina o processo da história e da memória. No caminho ressurge uma das questões fundamentais da Arqueologia: quem controla e a quem pertence o passado (ou, nos termos acadêmicos, a quem concerne sua propriedade intelectual?). Certamente os arqueólogos não são os únicos a poder contar histórias, nem tampouco exercem o poder absoluto sobre o passado das comunidades vivas, como ocorre com aquelas que não têm mais voz. Não podemos impor nossa versão do passado ao mundo, ignorando histórias tradicionais e outras perspectivas que a comunidade nos traz. A ciência não é onipotente ou exclusiva: todos nós controlamos e a todos nós pertence o passado, incluindo povos dos quatro cantos da terra. Temos apenas perspectivas diferentes sobre ele, valores culturais específicos e expectativas diversas sobre as lições que pode nos ensinar. Assim, um dos instrumentos mais valiosos da Arqueologia Pública é trazer tolerância e compreensão das diversidades culturais e das diversidades sobre o passado (para uma discussão sobre o tema, vide Thomas 2000, citado por Little 2002:6; Kuwanwisiwma 2002). 68

De modo análogo os arqueólogos necessitam considerar as diferenças fundamentais entre os grupos humanos no que se refere à própria compreensão da dimensão do tempo. A noção ocidental sobre a passagem do tempo é geralmente adotada como real e natural, mas existem vários exemplos antropológicos e etnográficos contrários. Os grupos Inuit do noroeste do Canadá concebem sua realidade vivendo apenas no presente, sem reconhecer sequenciamentos cronológicos onde organizem seus eventos: o passado é compreendido como parte do presente (Smith & Ehrenhard 2002:122-3; Crist 2002). Considerando esse conjunto de aspectos, mostra-se essencial que a pesquisa arqueológica seja realizada em conjunto com os descendentes vivos da sociedade que criou ou herdou os vestígios estudados. Assim será possível conduzir os trabalhos a partir de uma perspectiva de “arqueologia democrática”, como define Faulkner (2000), que compreende a realização de trabalhos com base na comunidade, de forma não excludente e não hierárquica, e dedicados a um desenho de pesquisa que pressuponha interação entre os vestígios materiais, a metodologia de trabalho e a interpretação. Dentre outros exemplos frutíferos de pesquisas arqueológicas realizadas contando com a participação de membros da comunidade podemos citar o realizado por Field (Field et al 2000) entre os aborígines Australianos e o de Faulkner (2000) com a sociedade inglesa contemporânea. Contudo, segundo Fabian (1983), o reconhecimento da mudança não nega aspectos de continuidade mas aponta a necessidade de tratar tanto a mudança como a continuidade como questões empíricas. As culturas não correspondem a entidades estáticas que existem à margem da História (Wolf 1984) e a Arqueologia deve analisar as sociedades contemporâneas a partir desta perspectiva. Nesse contexto a Arqueologia é capaz de trazer o poder do passado para a legitimação das comunidades e seu fortalecimento no presente.

Arqueologia e sociedade no município de Ribeirão Grande, sul de São Paulo: ações em arqueologia pública ligadas ao Projeto de Ampliação da Mina Calcária Limeira. Erika Marion Robrahn-González

Nas últimas décadas muitos estudos têm se dedicado, por exemplo, a definir de forma mais clara e precisa a natureza e resultado das mudanças geradas pelo processo de colonização, especialmente em sociedades da América e da África (Atkinson 1989; Campbell 1988; Lamphear 1988; Handler 1968; Huffman 1982, 1986; Schmidt 1990; Stahl 1994; Upham 1987; Whitehead 1990, entre outros). Os benefícios públicos que a Arqueologia poderá trazer, junto a comunidades indígenas ou a comunidades de qualquer natureza, porém, dependem fortemente da solidez e credibilidade científica das pesquisas. Sem isso, o interesse da comunidade será diminuído e sua atenção deverá recair, fatalmente, ao aspecto exótico e fantasioso da disciplina (Lipe 2000:20 in Little). O desafio do arqueólogo está, entre outros, em estabelecer um significado científico e histórico às “coisas do passado”, ou seja, aos objetos retirados das escavações, que devem ser utilizados como ponte entre a experiência do público e um mundo passado reconstruído a partir de inúmeras outras evidências (onde se incluem a história oral, os mitos e os conhecimentos tradicionais). Nessa tarefa o arqueólogo necessita, mais do que nunca, de uma equipe interdisciplinar que possa transitar em todos os campos de conhecimento e esferas sociais de atuação. Cabe a ele não apenas fornecer os dados de pesquisa que possui, necessários à evolução do trabalho, mas principalmente fornecer seu olhar sobre o passado, para que profissionais nas áreas de antropologia, sociologia, história, educação, publicidade, marketing, turismo e tantas outras, possam trabalhar de forma séria e criativa. A tudo isto podemos denominar “Ciência Aplicada”, correspondendo ao amplo leque de contribuições que a Arqueologia pode oferecer no fortalecimento e valorização das comunidades atuais. No Brasil este momento apresenta uma cor especial. Isto se dá especialmente por conta da conjuntura social e política que atravessa, na qualidade de país em desenvolvimento rumo à era da globalização. À Ar-

queologia abrem-se preciosas oportunidades de ocupar espaços ainda vazios, voltados a uma abordagem mais abrangente e pluralista de nossa herança cultural. E é dentro desta abordagem e conceituação que o texto que se segue visa demonstrar uma experiência de trabalho desenvolvido em Arqueologia Pública em uma area da região sul do estado de São Paulo, abrangendo os campos da educação, divulgação, valorização cultural e preservação, com o objetivo de expandir as reflexões aqui apresentadas. O Programa Arqueológico Mina Limeira O Projeto de Ampliação da Mina Limeira, de responsabilidade da empresa Companhia de Cimento Ribeirão Grande (CCRG), vem sendo desenvolvido desde 2002 englobando as diferentes fases de licenciamento ambiental da obra. Abrange terras dos municípios de Capão Bonito e Ribeirão Grande, localizados na região sudeste do estado de São Paulo. A área integra o que se define como “região do alto Paranapanema”, mais precisamente em seu limite meridional, próximo à crista dos divisores de águas com a bacia do rio Ribeira de Iguape. A área-foco da pesquisa é banhada por pequenos córregos que deságuam no rio das Almas que, por sua vez, é um dos formadores do rio Paranapanema, em seu alto curso (Figura 1). O vale do alto Paranapanema oferece interessantes questões científicas à Arqueologia. Em primeiro lugar, corresponde a uma zona de transição ambiental entre a região florestada da serra da Paranapiacaba (fisicamente integrada à porção do médio/alto vale da bacia do Ribeira de Iguape), e o planalto paulista. Esta condição geográfica teria, ao menos em parte, influenciado no assentamento dos grupos indígenas pré-coloniais que ali se desenvolveram, fazendo com que aparentem características específicas, e distintas de suas áreas de origem, o planalto central brasileiro (De Blasis 1996, RobrahnGonzález & De Blasis 1998). 69

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Figura 1 – Região sudeste do Estado de São Paulo, com a Serra do Paranapiacaba definindo os limites entre o vale do Paranapanema (a noroeste) e o vale do rio Ribeira de Iguape (ao sul). Localização regional da área do empreendimento, no vale do rio Almas, um dos formadores do Paranapanema.

Em segundo lugar, o vale do Paranapanema é recorrentemente apontado pela bibliografia arqueológica como possível área de fronteira cultural, delimitando o território de ocupação de grupos indígenas tradicionalmente ligados à região sul brasileira (cujos sítios são genericamente relacionados às denominadas tradições Umbu e Itararé) e grupos indígenas ligados à região sudeste (com sítios relacionados às tradições Tupi-guarani e Humaitá, embora esta última esteja sendo hoje re-avaliada) (De Blasis 1988, 1996; Mello Araújo 2001; Robrahn 1989; Barros Barreto 1988; Hoeltz 1997; Dias 1994; Schimtz 1981, 1987; Kern 1982; RobrahnGonzález & De Blasis 1998). No que se refere à delimitação da área de pesquisa, trata-se de um projeto de am-

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pliação, considerando que a Mina Limeira teve sua exploração iniciada há décadas, sem contudo ter sido, efetivamente, posta em operação. O objeto do atual licenciamento implica tanto na área projetada para ampliar e iniciar a exploração calcária da Mina, como também as obras de apoio que lhe serão relacionadas, a saber: • o depósito de estéril Leiteria (D.E. Leiteria, também já há décadas em operação); • o depósito de estéril Barro Branco (D.E. Barro Branco) • via de acesso a ser aberta entre o D.E. Barro Branco e a fábrica da CCRG. Estas correspondem às áreas diretamente afetadas pelo empreendimento

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(ADA), e que foram objeto de estudos sistemáticos intensivos. Todavia, visando obter um contexto científico de referência aos vestígios identificados no interior da ADA, os trabalhos de campo e os levantamentos documentais se estenderam pelo que se definiu como área de influência indireta do empreendimento (AII), aqui considerado como abrangendo todo o vale do rio das Almas e os municípios afetados. Por outro lado, muitas das discussões científicas apresentadas pelo texto exigiram a abrangência de um espaço geográfico maior, podendo alcançar todo o planalto meridional brasileiro no que se refere a questões como migrações, territórios de ocupação, contatos extra-culturais, entre outros. Os trabalhos de campo tiveram início através de prospecções na ADA, buscando reconhecer o patrimônio arqueológico envolvido. De início foram realizados levantamentos extensivos, consistindo em uma primeira abordagem de reconhecimento da área e de seus vestígios (procedimento especialmente empregado durante os estudos de diagnóstico da área). Em seguida deuse início às prospecções sistemáticas (tipo varredura), implicando na observação dos terrenos tanto em superfície como em profundidade. Durante estas prospecções sistemáticas as equipes percorreram cada uma das áreas que compõem a ADA caminhando em alinhamentos paralelos distantes entre si de 20 em 20 metros, com realização de poços-teste a cada 20 m percorridos. Os poços-teste apresentaram dimensões de 0,4m de diâmetro e 1,0m de profundidade (podendo variar a profundidade de acordo com a espessura de solo presente, podendo alcançar até 2,5m). Este tática de cobertura por alinhamentos paralelos com distribuição de poços-testes de forma regular permitiu obter dados necessários ao estudo dos padrões de distribuição dos sítios arqueológicos na paisagem. A pesquisa foi responsável pela identificação de 50 sítios arqueológicos, dos quais 17 foram, posteriormente, escavados sistematicamen-

te ( Figura 2 ). Dos 50 sítios, 34 são do tipo lítico (ou 68%), 4 cerâmicos (ou 8%), 9 sítios ligados ao período histórico (ou 18%) e 2 sítios multicomponenciais (ou seja, sítios que apresentam vestígios relacionados a mais de uma ocupação humana – 4%) (vide Tabela 1 ). O presente artigo não objetiva detalhar aspectos referentes a estes sítios arqueológicos, às suas indústrias e às filiações arqueológicas regionais, uma vez que estes assuntos estão sendo tratados e serão apresentados na dissertação de Mestrado de Gerson Levi da Silva Mendes (MAE-USP). A utilização dos dados da pesquisa para trabalhos acadêmicos constitui, aliás, outra iniciativa incentivada pelo Programa, proporcionando o detalhamento de análises científicas sobre os temas tratados e resultando em contribuições científicas adicionais e de maior detalhe em focos específicos. Desta forma apresenta-se, abaixo, uma síntese dos principais horizontes de ocupação humana identificados pelas pesquisas. Estes horizontes partem do contexto mais antigo (paleo-índio), até alcançar a ocupação atual de Ribeirão Grande, buscando incorporar seus diversos passados, por assim dizer: o passado pré-colonial, formado por diferentes grupos indígenas que se desenvolveram na região há pelo menos 5.500 anos atrás, e o passado histórico, que embora na memória da atual comunidade que ali vive recue apenas até a época da mineração (a partir do século XVII), incorpora traços marcantes de tradição indígena em diversas práticas do cotidiano. Neste contexto, o objetivo maior do presente artigo é incorporar a comunidade atual na história regional, através das diferentes nuances materiais e materiais que constituem a continuidade e herança deste passado milenar. Assim, na apresentação dos chamados “horizontes de ocupação humana”, será dada maior ênfase e detalhamento em seus aspectos uma vez que, conforme já mencionado acima, os contextos de ocupação pré-colonial estarão sendo apresentados em trabalho acadêmico. 71

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Sítios cerâmicos Sítios históricos Sítios líticos Sítios multicomponenciais

Figura 2 - Localização dos sítios arqueológicosura

Tabela 1 Sítios arqueológicos identificados pelo programa Nome do sítio Sitio Sitio Sitio Sitio Sitio Sitio

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Arqueologia e sociedade no município de Ribeirão Grande, sul de São Paulo: ações em arqueologia pública ligadas ao Projeto de Ampliação da Mina Calcária Limeira. Erika Marion Robrahn-González

Tabela 1 (cont.) Sítios arqueológicos identificados pelo programa Nome do sítio Sitio Sitio Sitio Sitio Sitio Sitio Sitio Sitio Sitio Sitio Sitio Sítio Sítio Sítio Sitio Sítio Sítio Sitio Sitio Sítio Sitio Sítio Sítio Sítio Sitio Sitio Sitio Sitio Sitio Sítio Sitio Sítio Sítio Sítio Sítio Sítio Sítio Sítio Sítio Sítio Sítio Sítio Sítio Sítio

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Coordenada UTM 22 J 764969/7326112 22 J 764676/7326260 22 J 764882/7326032 22 J 765287/7326459 22 J 765041/7325898 22 J 765251/7325885 22 J 765786/7327045 22 J 765909/732695 22 J 765931/7326680 22 J 766085/7326777 22 J 765940/7326541 22 J 764666/7324030 22 J 765254/7324635 22 J 764730/7324045 22 J 772711/7324330 22 J 772504/7324412 22 J 771445/7324530 22 J 768420/7322684 22 J 768281/7322814 22 J 768421/7322479 22 J 768628/7322818 22 J 767659/7323182 22 J 767549/7323294 22 J 769211/ 7321987 22 J 768731/7323195 22 J 768587/7323278 22 J 768406/7322369 22 J 768129/7322675 22 J 768476/732323 22 J 767696/7322292 22 J 768299/7322661 22 J 768526/7322502 22 J 768558/7322723 22 J 768562/7322784 22 J 768562/7323033 22 J 768590/7322370 22 J 768600/7322256 22 J 768551/7322197 22 J 768368/7322982 22 J 768108/7322235 22 J 769247/7324679 22 J 768461/7324017 22 J 768549/7323965 22 J 767636/7323221

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• Horizonte paleoíndio, com poucos artefatos e lascas encontrados de transienct settlers, com presença de pontas projéteis rabo de peixe planas lascadas por pressão, e pontas de lança com até 20cm de comprimento, encontradas em profundidade superior a 150cm, sempre associados ao entorno de antigas lagunas, hoje banhados de fundos de vale altos. Esses sítios têm uma área potencial entre os bairros dos Caetanos, Caetanos Velhos e dos Cândidos, onde uma ponta de lança foi encontrada a 2,5m de profundidade por habitante local. Estes sítios devem ser mais raros e profundos e estudos ulteriores de reconstrução ambiental para as paleolagoas da área apontarão para zonas potenciais de ocorrência. Em outros municípios pontas de lança também foram encontradas, sobretudo em Iporanga

e em Guapiara, conforme informações de arqueólogos e colecionistas. Foi denominado “horizonte 1”. • Horizonte caçador-coletor antigo, caracterizado pela presença de pontas-projéteis e lascas de acabamento, predominantemente de sílex de boa qualidade, além da presença de artefatos de quartzo hialino, em profundidades superiores a 50cm chegando aos 80cm, situados sempre em topos de colinas e alinhados com outros sítios em situações de implantação muito similares, apontando para uma provável integração em um mesmo período (Foto). Foi denominado “horizonte 2”. As indústrias destes horizontes (2 e 3) não apresentam mudanças significativas se estudadas tecnotipologicamente ou mesmo em sua va-

Horizonte 2: vestígios líticos do sítio Barro Branco 21, (Foto: Gérson Levi Méndes).

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riabilidade isocréstica (como apontado por Schmidt Dias 2003 para as indústrias Umbu do extremo nordeste do Rio Grande do Sul, que indica uma continuidade da organização social tecnológica irreal entre os conjuntos artefatuais). Contudo, as mudanças são percebidas quando estudadas num contexto regional amplo de sistema de povoamento e percebidas articuladamente em vales e microbacias hidrográficas (Moraes 2000), pois apontam para as diversas respostas que um mesmo sistema de eventos e povoamento utilizou-se para responder às necessidades econômicas e sociais locais, criandose um diálogo permanente com seu território móvel (Politis & Cárdenas 2000). Delineiam-se, assim, as escolhas de implantação dos assentamentos para paisagens com fisionomias geomorfoclimáticas diversas e que tendem a se particularizar de

vale para vale, cada qual, atualmente, com microclimas e ocorrências de espécies endêmicas próprias, apontando para um mosaico vegetacional complexo e alternado, como indicam as manchas de cerrado em áreas próximas, a presença de araucárias em fundo de vale onde o lençol freático está mais alto e a recente formação da floresta tropical úmida, a Mata Atlântica. Para este horizonte tem-se a data de 5.030 +- 50 BP (calibradas em 5.920 a 5.660 BP, Laboratório Beta Analytic Inc, amostra 207853). • Horizonte caçador-coletor recente, caracterizado pela presença de pontas projéteis e lascas de acabamento, predominantemente de quartzo e calcário silicificado (Foto). A maior parte dos sítios arqueológicos desse projeto está associada a esse horizonte. Em todos os

Horizonte 3: Vestígios do Barro Branco 14, camada 1, (Foto: Gérson Levi Méndes).

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seus sítios as pontas projéteis apresentam sinais de reavivamento intenso de matérias-primas como o sílex, apontando para a provável escassez ou esgotamento dessa matéria-prima. Os sítios estão distribuídos por toda a área entre o bairro rural do Assentamento, quase nos divisores de água entre as bacias do Paranapanema e do Ribeira de Iguape, e se estende até as proximidades dos bairros Lagoa de Cima, Cristal, Pêssego e Capoeira Alta, bem como nas imediações de Ribeirão Grande, podendo constar no planalto de Capão Bonito. Formam um território nucleiforme caçador-coletor diferente daquele encontrado no vale do Ribeira de Iguape. Estão situados entre 15 a 40cm de profundidade, de acordo com as diversas condições geomorfológicas locais. Foi denominado “horizonte 3”. Para este horizonte tem-se a data de 1.010 +- 50 BP (calibradas em 950 a 750 BP, Laboratório Beta Analytic Inc, amostra 207852). • Horizonte de grupos ceramistas cultivadores, caracterizado pela presença de sítios arqueológicos implantados nas porções mais abertas dos vales, concentrando-se, sobretudo, entre os bairros rurais Barreiro Cabral e Pereira em direção aos terrenos suaves próximos à atual cidade de Ribeirão Grande e nos bairros Alto Rodrigues e Mata-a-Dentro, Nunes e Ferreiras, em direção ao limite com o município de Capão Bonito, a oeste. A presença destes grupos nos vales do Barro Branco e Ouro Fino é mais tardia e ocorre após o abandono dos sítios pelos antigos habitantes caçadores-coletores, como indicam os estudos de todos os perfis estratigráficos de sítios escavados. Foi denominado “horizonte 4”. Os vestígios cerâmicos encontrados no vale do Barro Branco, de longe o mais conservado e com condições ideais para escavação, apresentam um intervalo de 10 a 20cm com o horizonte caçador-coletor. Assim, antes de haver uma continuidade entre esses horizontes 3 e 4, há um silencio de 15 a

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20cm de solo que sugere a existência de um período de abandono da região, seja porque os grupos caçadores-coletores entraram em contato com populações agricultoras e, assim, mantiveram relações com os mesmos de tal forma que se sedentarizaram no planalto ou no vale do Ribeira de Iguape, seja porque deveriam estar em confronto com esses grupos agricultores que já habitavam o vale do Ribeira de Iguape e o planalto paulista nas cercanias de Capão Bonito e Alto dos Rodrigues em Ribeirão Grande, e que se restringiam cada vez mais para um recuo de seu território nuclear. Os sítios mais recentes dos grupos caçadores-coletores devem corresponder àqueles mais próximos aos divisores d’água da Serra dos Agudos e entre os Parques Carlos Botelho e Intervales. De qualquer forma, entre esses dois períodos estamos tratando do final da presença de caçadores-coletores nesta região em data posterior àquela detectada pelo projeto Gasbol (De Blasis 2000), ou seja, uma possibilidade muito grande da presença de sítios mais recentes de 800 anos AP. De fato, para este horizonte tem-se a data de 150 +- 40 BP (calibradas em 280 a 0 BP, ou ainda, de 1670 a 1950 A.D., Laboratório Beta Analytic Inc, amostra 207850). • Horizonte histórico, correspondente ao ciclo da mineração do ouro de aluvião que deslocou habitantes dos arraiais dos médio e alto curso dos afluentes do Ribeira de Iguape em direção às nascentes e à bacia do alto Paranapanema. Ocorreu a partir da segunda metade do século XVII e se prolongou até o terceiro quartel do século XIX. Foi denominado “horizonte 5”. No que se refere aos registros arqueológicos, os sítios Cristal 3, 5 e Anacletos 3 e 4 apontam para uma provável relação entre a antiga população ceramista indígena e estes primeiros colonos que aí se estabeleceram por volta do século XVII (uma pederneira de produção local foi encontrada associada

Arqueologia e sociedade no município de Ribeirão Grande, sul de São Paulo: ações em arqueologia pública ligadas ao Projeto de Ampliação da Mina Calcária Limeira. Erika Marion Robrahn-González

A participação da comunidade do Barro Branco, bairro rural localizado no município

de Ribeirão Grande, nas pesquisas de levantamento arqueológico criou um vínculo que, inicialmente tímido frente à reclusão das famílias em suas casas e atividades agrícolas e pastoris, foram dando lugar, devido ao longo período de campo, assim como estratégias selecionadas para acessar essa ‘cultura reclusa’, a uma relação de curiosidade e descobertas tanto da parte dos pesquisadores quanto dos moradores: o que estávamos fazendo atrás de ‘lugares dos antigos’ (da parte deles) e como podiam manter uma série de tradições frente à expansão da cultura introduzida recentemente pela mídia nas casas de pau-a-pique do Barro Branco? (de nossa parte). As lendas, as histórias das famílias, os segredos do sertão, das árvores e plantas, dos diversos animais, os ‘causos’ e o registro material da presença dos antigos, índios e jesuítas e os “encanados”2 foram passando de geração em geração. O estudo da paisagem e das relações que os antigos habitantes mantinham com seu espaço podem ser acessadas de uma maneira extraordinariamente rica através do estudo dos diversos níveis de relações que as comunidades tradicionais locais mantêm com o espaço atual. Herdeiras de um espaço, com o qual interagem constantemente, a população do Barro Branco mantém as relações que seus antepassados mantinham com a Freguesia-Velha (uma das mais antigas comunidades do Alto Paranapanema) e com os vales intermontanos entre a Serra dos Maciéis e a Serra do Ouro Fino. Para perceber quais são as diversas intensidades das continuidades indígenas ou coloniais nas relações atuais com o meio e com o simbólico em que vivem os tradicionais moradores do Barro Branco, pesquisas de etnobotânica, cultura imaterial, do universo feminino, infantil e das técnicas construtivas foram postas em prática, tendo, como

(1) Capítulo de relatório originalmente redigido por Cintia Bendazzoli.

(2) Estrutura histórica relacionada à exploração aurífera em cursos fluviais.

a fragmentos de cerâmica arqueológica). Trata-se, nesse caso, de colonos associados aos prováveis arraiais dos Campos de Guapiara ou de Apiaí-mirim, frutos de uma situação colonial de mescla entre portugueses e índios Kaingang do vale do Ribeira de Iguape, pressupondo a relação etnográfica com estes grupos (Robrahn 1989). Contudo, com a origem da Freguesia-Velha pouco dessa ocupação mais esparsa foi aglutinada nos pequenos povoados intermontanos e uma reconstrução documental que os relacione ao período de construção das estruturas minerarárias conhecidas como “’encanados” e às diversas cavas de prospecção mineral presentes na area, ainda depende de estudo histórico mais detalhado e é discutido mais adiante. • Horizonte contemporâneo, correspondente à ocupação rural dos vales do Barro Branco, Cristal e Limeira. No primeiro vale a ocupação cabocla é relativamente recente, resultante da migração de tradicionais habitantes da Freguesia-Velha ainda na década de 1970, provenientes, em boa parte, do bairro rural dos Caetanos Velhos e outros bairros mais interiorizados. O povoado da Freguesia Velha é o berço do povoamento das áreas entre Ribeirão Grande e Capão Bonito, e seus antepassados eram provenientes do vale do Ribeira de Iguape, sobretudo dos arraiais encontrados no terceiro campo de Guapiara, do Apiaí-mirim e dos arraiais nas proximidades da Serra da Samambaia, Guapiara. Foi denominado “horizonte 6”. Hoje e antes: a herança cultural da comunidade de Barro Branco 1

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objetivo último, o resgate cultural, a valorização das identidades e a preservação de seus marcos ancestrais. As pesquisas revelam elementos de continuidade da cultura indígena (técnicas de trançado na produção de cestos, áreas de captação de argila e espécies vegetais, técnicas construtivas, técnica de preparo do campo para o roçado) que encontram analogias em modelos indígenas antigos e atuais de apropriação do espaço, assim como elementos de ruptura e de conformidade com os costumes coloniais (festas religiosas, brincadeiras entre as crianças, etc.). Este conjunto de fatores acabou por definir a própria missão do Programa Arqueológico Mina Limeira: reconstituir o passado através de sua articulação com o presente, permitindo contribuir para a educação, coesão da comunidade, lazer e desenvolvimento econômico regional, de acordo com o moderno conceito de sustentabilidade social. E isto ocorreu de diferentes maneiras: no reconhecimento e inclusão de suas formas de viver no que se define como “patrimônio arquitetônico” da região; na inclusão de seus depoimentos e opiniões sobre o que considerar patrimônio, o que preservar, o que é significativo; e na busca de vestígios do elemento africano em uma atividade tradicionalmente relacionada ao colonizador branco europeu: a mineração. Assim, não se buscou registrar apenas os vestígios físicos da história regional comemorados e consagrados pela história oficial, mas trazer a representação dos cidadãos comuns na formação e transformação desta história. Desta maneira, buscou-se mapear os bens tangíveis e intangíveis, materiais e imateriais, que constituíssem elos de ligação da comunidade com o passado, reconhecidos enquanto partes de sua herança histórica e cultural. O texto que se segue traz alguns exemplos deste trabalho, onde a comunidade desenvolveu papel central no “resgate” de seus elementos identitários, de seus registros históricos e tradicionais que, somados àqueles tão

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mais antigos (as “vestígios de bugre”), completam o ciclo de experiências humanas desenvolvidas em um mesmo espaço geográfico compartilhado, resultando na atual paisagem cultural do Barro Branco. Buscando fornecer uma visão da abordagem do presente Programa, selecionou-se um item de pesquisa para cada tipo de patrimônio: técnicas contrutivas para o patrimônio material, e histórias do bairro Barro Branco, contadas pela própria comunidade, no que se refere ao patrimônio imaterial, conforme texto que se segue.

Técnicas construtivas Fazem parte do patrimônio histórico cultural da comunidade do Barro Branco as unidades típicas de moradia e os padrões de construção das mesmas. Não são poucas as edificações existentes que ainda seguem os modos e padrões utilizados há muitos anos. As casas de barro, ou de pau-a-pique, ainda são maioria no bairro. Entretanto, já é possível encontrar alguns outros tipos de construções em alvenaria ou madeira. As residências são simples, com poucos e pequenos cômodos, a rede elétrica não é presente em boa parte das residências. Sem exceção pode-se afirmar que quando há a construção de banheiros, estes são feitos fora da casa, e não foi encontrado em nenhuma delas a presença de chuveiros, pois os banhos são feitos nos rios, córregos ou açudes. Algumas ainda apresentam uma separação entre os cômodos de estar e a cozinha com forno à lenha. Nas maiores e mais tradicionais propriedades são erguidos paióis para o armazenamento da produção e/ou de bens e utensílios para a prática agrícola. É praticamente comum em todas as moradias a construção de galinheiros, que em geral se assemelham a poleiros erguidos a aproximadamente 1 metro do solo onde grandes cestos são colocados de forma tombada, com a abertura voltada para frente, de modo que as aves possam entrar e sair. Em algumas propriedades, mas em menor número, é presente também a construção de currais para porcos, denominados

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localmente de “mangueiras”. Nos últimos 15 anos as propriedades começaram a abrir um maior número de açudes, objetivando a criação de peixes para consumo próprio. Esta prática se deu principalmente com o auxílio de tratores da Prefeitura de Ribeirão Grande. São quatro os monjolos existentes, sendo um deles de uso comum, localizado na propriedade do senhor Braz Batista Mendes. Dos outros três, um está sem uso, pertencente ao senhor Caetano Mendes de Oliveira, e os outros dois pertencem a proprietários que não residem na comunidade e fazem pouquíssimo ou quase nenhum uso deles. Nas propriedades onde a atividade agrícola de subsistência ainda é preponderante, junto às casas existem os terreiros, áreas abertas onde o feijão colhido passa pelo período de secagem e é batido. A localização das casas é sempre próxima às bicas ou a algum dos córregos ou riachos que cortam o bairro. Geograficamente, o bairro do Barro Branco merece destaque por ser um grande manancial de água, e há uma grande facilidade de obtenção da mesma por parte dos moradores. Junto às casas é comum ver-se pequenos canteiros onde desenvolvem plantios de ervas medicinais. Nas maiores e mais tradicionais propriedades, precisamente na da senhora Maria Francisca do Nascimento e do senhor Caetano Mendes de Oliveira, a disposição das casas segue modelos antigos, formando verdadeiros “arraiais de famílias” dentro do bairro. Nos dois casos, os mais velhos têm as casas como centros gravitacionais, onde perifericamente os filhos ergueram suas moradias. Em ambos os casos, o da matriarca Maria Francisca do Nascimento e do patriarca Caetano Mendes de Oliveira, os filhos se estabeleceram no entorno, sendo que algumas edificações de uso comum ficam juntas à casa destes centros gravitacionais. O maior terreiro, o maior paiol e plantações de ervas medicinais ficam juntos à casa dos mais velhos. Este exemplo está presente na família da senhora Maria Francisca e do senhor Caetano Mendes, sendo que este ainda possui o monjolo usado por todos os membros da família.

Consideram-se aqui como propriedades tradicionais aquelas formadas pelas famílias mais antigas nos bairros que, como pode-se constatar nos diferentes resultados e relatórios obtidos nos trabalhos de campo, ainda asseguram alguns elementos culturais ainda não eliminados ou reinterpretados. Essas unidades mais tradicionais são as formadas pelos pioneiros na formação do bairro ou seus descendentes diretos. O conceito de maiores propriedades foi adotado a partir das áreas em hectares das propriedades, e não por acaso, as unidades mais tradicionais também constituem algumas das maiores propriedades. No que se refere aos tipos de construção, o Barro Branco é um bairro que ainda hoje preserva alguns traços culturais antigos, entretanto, a comunidade adquiriu informações e elementos externos que lhe propiciaram uma reinterpretação cultural em diversos elementos, dentre eles os métodos construtivos e os tipos de edificações presentes. Em linhas gerais, temos três tipos de construções no bairro. São eles: • Casas de barro: é o modelo mais antigo de construção. Praticamente todos os moradores já habitaram neste tipo de residência. Ainda hoje estas casas são maioria no bairro. Comparadas com casas de barro de outros bairros, são as únicas que apresentam reboco feito com barro branco (o mesmo barro que deu nome ao bairro, Barro Branco). • Casas de madeira: em geral o uso exclusivo de madeira é para paióis, currais e abrigos para monjolo, sendo que algumas poucas casas são feitas deste material. • Casas de alvenaria: são casas recentes que se diferenciam apenas pelo material construtivo, pois quanto à forma seguem ainda os padrões de edificação das casas de barro. • Outros tipos de construções: há algumas pouquíssimas casas feitas com os mais diferentes materiais que não se encaixam a um padrão único de edificação. São construções precárias que empregam o uso de 79

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“Arraial familiar” da senhora Maria Francisca do Nascimento

“Arraial familiar” do senhor Caetano Mendes de Oliveira

Casas das famílias Casa do patriarca ou matriarca (centros “gravitacionais”) Edificações de uso comum Áreas de uso comum intenso (terreiros, jardins e outros) Áreas de ocupação e/ou “influências” dos arraias Sentido e grau de integração no “arraial” Sentido e grau de repulsão no “arraial”

Esquema de círculos representativos dos “arraiais familiares”. As posições das casas estão de acordo com a localização geográfica encontrada durante as pesquisas em campo. Entretanto, se fosse criado uma figura representando a posição das mesmas unidades familiares considerando a dependência destas unidades em relação aos centros gravitacionais, teríamos outras dimensões e localizações. As áreas de “influências” referem-se as áreas de usos comum e individuais que formam os “arraiais familiares”

lonas, tapetes, restos de madeira e construções. Pertencem exclusivamente a proprietários que não moram no bairro. Os banheiros entram neste grupo por se apresentarem em vários tipos diferentes de propriedade em propriedade. O texto que se segue traz detalhes referentes às edificações de barro e de madeira, constituindo as mais tradicionais da região. As costruções de barro são quase totalmente restritas apenas às residências, ha80

vendo pouquíssimos celeiros e banheiros com paredes de barro. As casas podem ser divididas em dois modelos: as de um ou dois cômodos e as de três ou mais cômodos. Esta divisão se dá porque as de um ou dois cômodos são ocupadas por pessoas que moram sozinhas, sejam elas viúvas, solteiras ou separadas. No caso das moradias de um único cômodo, quarto e cozinha estão no mesmo espaço; nas de dois cômodos há a divisão entre o espaço de cozinha e o de dormir. Nas famílias constituídas há pelo

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menos três cômodos, o quarto dos pais, o quarto dos filhos e uma sala/cozinha, variando de caso para caso. Em geral os cômodos são pequenos, com um espaço para deslocamento restrito e poucos móveis. As paredes de divisão chegam a uma altura média 1,90m , no máximo 2m e nunca alcançam o forro ou telhado. Não há portas internas e cortinas são utilizadas como forma de separação dos cômodos. As portas de entrada não possuem trincos e são fechadas por fora com o uso de correntes e cadeados e, por dentro, com tramelas. São casas pouco iluminadas em virtude das pequenas janelas que recebem, sempre de formato quadrado com no máximo 50 centímetros de lado, sendo que, em alguns casos, os quartos não têm janelas. Os telhados podem ser de telhas de amianto, zinco ou de cerâmica. Foi encontrada apenas uma casa com cobertura de palha. Há indícios de que esta técnica tinha maior freqüência antigamente. O piso é de terra batida, sem nenhuma cobertura. A cozinha pode ou não ser junto à casa. Algumas casas têm cozinhas com fogões à lenha no interior, outras com fogões a gás. As cozinhas externas são sempre as de fogões à lenha. Ali, sobre os fogões à lenha são colocadas carnes para defumarem, conservando assim o alimento. Nestes casos também, podemos atribuir a baixa luminosidade ou o escurecimento das casas devido à ação da fumaça dos fogões, que pretejam telhados e paredes. As casas de barro são também feitas em dois tipos, as de barro branco para reboco e as sem barro branco para reboco. O uso do barro branco, na verdade uma composição de solo de granulometria grosseira mais próxima do silte e de cor esbranquiçada presente na área, serve apenas para o reboco das casas, interna e externamente (Fotos). Pode-se atribuir que estas são casas típicas da comunidade, não encontradas até o momento em outros lugares. O tal barro branco, por sua granulometria mais grosseira, não se desfaz com facilidade ao longo do tempo através das intempéries climáticas como chuva, sol ou vento. Atribui-se a isso o fato de

que, quando seco, esse material de granulometria grosseira fica como poros, antes ocupados pela água, maiores que os de barro marrom, dando espaços para as dilatações e contrações resultantes de variações termais com maior facilidade, não ocorrendo, assim, fissuras nas paredes. O barro marrom, por ter uma granulometria mais fina, principalmente de argilas, não apresenta estes espaços porosos internos, sendo mais compactos e desta forma não permitindo os movimentos de dilatação e contração, e que quando exposto aos fatores climáticos criam rachaduras com maior facilidade. Foi diagnosticado que anteriormente eram feitas vasilhas cerâmicas com o barro branco, entretanto não se pode afirmar o motivo da escolha desse material para a confecção das mesmas, o que se sabe é que esta já foi uma prática comum e que há tempos está em desuso. De forma geral, a construção de uma casa de barro branco típica se dá da seguinte forma: escolhido o local a ser construída a casa, aplaina-se o terreno de acordo com as dimensões desejadas. Nas fundações, onde são erguidas as paredes, troncos de madeira, chamados de cernes, são cortados em forma retangular cúbica e colocados na base, praticamente enterrados entre 20 a 25 centímetros no solo com apenas a face superior exposta. Estes são os esteios, que podem ser feitos com trocos de nataleiros, canelas, guatambus ou, se forem encontradas, outras madeiras grossas e que resistam ao tempo tanto quanto as citadas. São os “cernes direitos”, assim chamados por possuírem um tronco comprido, reto, grosso e resistente ao tempo. Junto aos esteios, nas quinas e extremidades de paredes, são fixadas no solo de forma perpendicular às colunas ou travas de cerne direito. As travas ou colunas também são grossas, podendo ser cortados de forma retangular ou colocados como troncos brutos, sem tratamento. O diâmetro destas peças varia de 30 a 50 centímetros e podem ser de árvores como a cajarana, o sassafrás, o guatambu, nataleiro ou canela. A altura das colunas ou travas varia 81

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Técnicas construtivas: A casa de barro branco: este famoso barro, que dá nome ao bairro, é uma argila fina captada localmente nas barrancas, próxima de grotas e córregos. O barro é aplicado na estrutura quadriculada de madeiras e preenchem-nas dando formas às casas, assim como aos fornos tradicionais do alto Paranapanema.

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de acordo com a posição em que se encontram, as que estão nas quinas das casas medem menos de 2 metros, e as que chegam ao meio da casa, medem a altura máxima do telhado, no máximo, 2,50 metros. Com as colunas já prontas são feitos os madeiramentos das paredes sobre os esteios. São as travessas e barrotes, uma verdadeira malha vazada construída predominantemente com madeiras taquara e guapeva, amarrados entre si com o uso de cipó d’alho. A área vazada, que pode ser retangular ou quadrada, varia de dimensão, mas é nela que se aplica a camada estrutural de barro marrom, retirado de algum barranco próximo ou do próprio local em que se ergue a casa. O barro umedecido e pisoteado é colocado entre os buracos vazados e recobre toda o madeiramento da parede. Após esta etapa, com a parede já seca, é aplicada a camada de reboco feito com o barro branco, também umedecido e pisoteado. Ainda com relação às travessas, que nas paredes são dispostas em linha horizontal, pelo menos três delas são mais grossas e firmes que as demais, em geral de guatambu e guapeva. Duas delas na parte coberta por barro na parede, e uma acima, no limite superior da mesma. Sobre esta travessa superior da parede é que são passados os caibros para a colocação do telhado. A estrutura do telhado é toda feita com caibros e travessas de guatambu ou guapeva, e sobre elas é que são colocadas as telhas de

Cozinha com fogão à lenha

Quarto

Sala

Quarto

1

amianto (brasilite), cerâmica ou palha. Os moradores atribuem às casas de barro uma característica de vantagem na superação do frio. Segundo eles, as paredes e o piso de terra batida contribuem para uma manutenção do calor gerado pelos fogões à lenha, propiciando uma melhor sensação termal. Das casas de barro branco, com 3 cômodos ou mais, podemos destacar as propriedades da senhora Maria Francisca do Nascimento, e dos senhores Braz Batista Mendes e Antônio Mendes de Oliveira. As casas que não recebem o tratamento com o barro branco precisam ser “retocadas” por barro em tempos mais curtos, pois as paredes ressacam e o barro se quebra, deixando exposto o madeiramento e os buracos antes ocupados pelo barro. São casas típicas de barro sem revestimento de barro branco, de um ou dois cômodos a da senhora Tereza Clarinda Vaz, e dos senhores Antônio Jacinto Vaz e Waldomiro José dos Santos, sendo que a deste último é a única encontrada que ainda possui telhado feito com palha. Apesar de ser mais comum a construção de casas de barro, o senhor Braz Batista Mendes ergueu um paiol com paredes de barro. Os banheiros feitos de barro também são feitos da mesma forma, com acréscimo de piso de madeira, uma vez que estão sobre buraco de fossa. O tempo médio para construção da casa de barro, descartado o tempo de corte da

Cozinha com fogão à lenha

Quarto

Quarto Cozinha

Quarto

2

Sala

Quarto Quarto

Quarto

3

Croquis sem escala, apenas para referência de casas de barro branco habitadas por unidades familiares. Respectivamente das famílias do senhor Braz Batista Mendes (1), da senhora Maria Francisca do Nascimento (2) e do senhor Antônio Mendes de Oliveira (3).

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Quarto e cozinha

Bar Balcão Quarto Quarto e cozinha

Cobertura conjugada ao bar para uso dos frequentadores

1

2

Cozinha com fogão à lenha 3

Croquis sem escala, apenas para referência de moradias de barro habitadas por um único morador e que não têm reboco de barro branco. Respectivamente da senhora Tereza Clarinda Vaz (1), Antônio Jacinto Vaz (2) e Waldomiro José dos Santos (3).

madeira, é entre quinze a vinte dias, desde que não ocorra nenhum imprevisto climático ou humano que atrapalhe a obra. Ainda hoje as casas de barro são levantadas com auxílio do “puxirão”, termo utilizado para designar as atividades realizadas em mutirões de moradores. Durante o “puxirão” para a construção das casas, homens e mulheres realizam os mesmo trabalhos, sendo que as crianças ficam apenas nas etapas de transporte e de amassar o barro com os pés. Em média, uma casa de barro é habitada por aproximadamente 20 anos, mesmo com todos os reparos e manutenções feitas durante esse período. Passado esse tempo, as casas já apresentam diversos problemas e costumam serem abandonadas para a construção de novas. As casas de barro mais antigas são as da senhora Maria Francisca do Nascimento, com aproximadamente vinte anos e a do senhor Braz Batista Mendes, com dezoito anos, sendo que as colunas e esteios são de datas mais antigas pois eram pertencentes à casa de seu pai. Já as edificações feitas unicamente de madeira são em maior parte paióis, currais, abrigos para monjolos e alguns banheiros. 84

Poucas são as casas feitas exclusivamente de madeira. Os paióis de madeira são feitos da mesma forma que as casas de barro e com o mesmo material, distinguindo-se pelo fato de que os paióis não têm janelas, divisões internas ou paredes barro. No caso dos paióis as paredes são todas vazadas, faltando exatamente o barro para revestir as mesmas. Os abrigos de monjolos geralmente se assemelham aos paióis ( Figuras 3 e 4, fotos ). Considerando todas as construções, trata-se de obras mais modestas que não visam a moradia, e sim para o uso conjugado à atividade na lavoura. O senhor Jaime Olívio de Macedo, proprietário que vai esporadicamente ao bairro do Barro Branco, possui dois exemplos de casa. A residência oficial é feita com diferentes materiais, e uma segunda moradia, não habitada, construída somente com tábuas e pedaços de troncos de nataleiros, guatambus e canela. O senhor Maximiliano Wilson Godói, que veio para o bairro nos últimos dez anos, possui a única casa de madeira habitada e que junto à mesma possui um bar. No caso do senhor Maximiliano sua propriedade possui um açude e também uma construção de madeira

Figura 3 - Implantação do sítio Barro Branco 1 (croqui esquemático sem escala). 1 - Estrada vicinal que conduz ao córrego Embramado, abandonada; 2 - Camada húmica com vestígios líticos e cerâmicos; 3 - Camada argilo-arenosa bruno-escura, arqueológica; 4 - Embasamento c/ cascalhos de quartzo e filito associados; 5 -Vale com concentração de camada húmica mais extensa e fértil; 6 - Afloramentos de quartzo leitoso, utilizados no “site catchment”; 7 - Covas de bananeira expandem a camada húmica; 8 - Segunda elevação com presença de vestígios; 9 - Córrego do Embramado; 10 - Casa do Sr. Firmino; 11 - Estrada em direção à Freguesia Velha; 12 - Fogueira arqueológica; 13 - Plantação de feijão; 14 - Plantação de abóbora; 15 - Bananeiras; 16 - Pinheiros; 17 - Localização da ocorrência de cerâmica Kaingang no sítio em superfície; v - Algumas das unidades escavadas no sítio; C1 - Corte 1, sítio cortado p/ construção de casa; F1 - Área de maior freqüência de vestígios líticos lascados de quartzo leitoso; F2 - Área de maior freqüência de vestígios líticos lascados de sílex.

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Figura 4 - Croqui do Monjolo Coletivo da Comunidade Barro Branco. 1 - Esteios de sustenção, ripas e varetas da parede da estrutura coberta do monjolo; 2 - Entrada/ porta do interior da estrutura coberta do monjolo; 3 - Telhas, tijolos, fragmentos de blocos rochosos, terra e outros materiais utilizados na sustenção da parede da estrutura coberta; 4 - Resto de suporte danificado de monjolo; 5 - Prato de ágata sobre o suporte danificado de monjolo; 6 - Forno/assador de farinha de milho; 7 - Assador de ferro encostado na parede da estrutura coberta do monjolo; 8 Madeira usada para manter aberta a porta da estrutura coberta do monjolo; 9 - Pilão tampado com um assador de ferro, uma tábua e um socador de monjolo, com a concavidade do pilão e o suporte do monjolo representado pelos tracejados; 10 - Suporte do monjolo; 11 - Chão de terra batida; 12 - Bica d´água que movimenta o monjolo; 13 - Galão branco de plástico; 14 - Trilhas (caminhos) em torno do monjolo; 15 - Limites da poça e canal de drenagem artificial cujas águas movimentam o monjolo; 16 - Barrancos nos limites da área escavada e terraplanada na encosta em que construiu-se o monjolo; 17 - Vegetação de pequeno porte (gramíneas, samambaias, etc) em torno do monjolo; 18 - Cerca de arame farpado.

para seus filhos, muito semelhante a uma palafita, sem paredes, próximo ao açude. Estas casas de madeira possuem fachadas uniformes, com portas e janelas do mesmo material. Suas divisões internas seguem os mesmos padrões existentes em outros tipos de construções habitacionais do bairro. O emprego delas é restrito por não permiti86

rem a construção de fogões à lenha no interior da casa, devido ao riso de incêndio. As Tabelas 2 e 3, abaixo, mostram as edificação cadastrados no bairro do Barro Branco (unidades, tipos, sub-tipos e características marcantes), trazendo o conhecimento construtivo e os padrões de ocupação das comunidades atuais ali residentes.

Casas exclusivamente presentes no Bairro do Barro Branco. O uso desse tipo de barro no reboco impede as rachaduras nas paredes por influências climáticas Em geral habitam estas casas indivíduos que vivem sozinhos, sejam solteiros, separados ou viúvos.

Branco 1 ou 2 cômodos

Em geral são de novos proprietários de terra que não habitam a comunidade. São construídas com os mais diversos materiais (lonas, tapetes, madeiras, restos de construção e outros). O tipo mais comum, seu método de construção é semelhante ao das casas de barro.

Materiais diversos

Madeira

Açudes

Igreja de Santo Antônio, ainda inacabada.

Alvenaria

Outros

Abrigo para alimentação de animais ou de monjolo.

Possuem revestimento das paredes de lona, papelões, tapetes ou esteiras de taquara, ou então de qualquer outra material que não seja barro, madeira ou tijolo.

Construídos próximos às casas de madeira e em algumas casas de barro.

São os tipos mais comuns construídos no bairro.

São denominados de “mangueiras”. Nem todas as propriedades possuem currais.

Madeira

Materiais diversos

Madeira

Barro

Madeira

Foi identificado apenas um paiol com revestimento de barro nas paredes. Seu uso não é comum no bairro.

São poucas as casas de madeira no bairro em virtude dos riscos de incêndios que podem ocorrer com o uso de fogões à lenha.

Madeira

Barro

Seguem os padrões de divisões internas e semelhantes aos das casas de barro, diferenciam por não possuírem cozinhas com fogões à lenha no seu interior.

3 ou mais cômodos Habitados por unidades familiares constituídas por pais e filhos ainda jovens.

Casas com maior incidência de rachaduras nas paredes internas e externas.

CARACTERÍSTICA MARCANTE

Marrom

SUBTIPO

Alvenaria

Barro

TIPO

OBS: Com relação às casas de barro, sua classificação se dá em dois subtipos, envolvendo o tipo de barro utilizado e o número de cômodos existentes.

Outros

Banheiro

Curral

Paiol

Casa

UNIDADE

Tabela 2 Unidades construtivas no bairro do Barro Branco

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Tabela 3 Proprietários e construções no bairro do Barro Branco Proprietário

Ano de contrução [estimado] (confirmado)

Características e/ou observações

Adão Clarindo Vaz

[posterior a 1995]

Casa de alvenaria, tida como a primeira a obter rede elétrica e antena parabólica.

Alsendino Louzada Melo

[ sem data certa pois o Casa feita com restos de materiais consproprietário não reside trutivos, que não objetivava residência fixa. no local, provavelmente erguida após 1992]

Ana Maria de Oliveira Ferreira

[1998]

Antônio Favaro

[sem data certa, provavelmente erguida após 1992]

Antônio Jacinto Vaz

(1998)

Dois cômodos, um deles quarto e cozinha e outro como bar.

Antônio Mendes de Oliveira

(1999)

É a única de barro branco dos membros da família do senhor Caetano Mendes de Oliveira.

Antônio Souto de Assunção

Casa de alvenaria. Casa de barro marrom.

[sem data certa pois o Casa de alvenaria. proprietário não reside no local, provavelmente erguida após 1992]

Braz Batista Mendes

(1986) (2003)

São duas residências, a casa de barro branco, mais antiga, e a casa de alvenaria, mais recente.

Braz Franco da Silva

[sem data certa pois o proprietário não reside no local]

Casa de barro marrom, supõe-se que tida como abandonada.

Caetano Mendes de Oliveira

(1997)

Foi a primeira casa de alvenaria feita por alguém da família de Caetano Mendes de Oliveira, está situada onde hoje se sabe da existência de um sítio arqueológico.

Celina Mendes de Oliveira Cruz

(1998)

Casa de alvenaria

Eduardo Clarindo Vaz

——

Eliseu Ursulino de Moura

sem data certa pois o proprietário não reside no local]

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Segundo o relatório sócio-econômico há a existência de tal residência, porém ela não foi encontrada. Casa de barro marrom

Arqueologia e sociedade no município de Ribeirão Grande, sul de São Paulo: ações em arqueologia pública ligadas ao Projeto de Ampliação da Mina Calcária Limeira. Erika Marion Robrahn-González

Tabela 3 (cont.) Proprietários e construções no bairro do Barro Branco Proprietário

Ano de contrução [estimado] (confirmado)

Características e/ou observações

Gilmar Favaro

——

Segundo o relatório sócio-econômico há a existência de tal residência, porém ela não foi encontrada.

Gumercindo Gonçalves Ribeiro

(2003)

Obra de alvenaria inacabada, com muito a se fazer, porém, abandonada.

Jaci Raimundo da Silva

(2003)

Casa de barro marrom, com algumas partes cobertas por lonas.

Jacinto Martiniano da Costa

[sem data certa pois o proprietário não reside no local]

Jaime Olívio de Macedo

Casa de barro marrom.

[sem data certa pois o Casas de madeira ou de restos de maproprietário não reside térias construtivos. no local, provavelmente erguida após 1992]

João Francisco Mendes

——

Segundo o relatório sócio-econômico há a existência de tal residência, porém ela não foi encontrada. Sabe-se que ele possui algumas poucas tarefas no bairro e uma propriedade maior, com casa, no bairro de Ouro Fino.

João Rodrigues do Nascimento

[sem data certa]

Casa de barro com banheiro revestido com material de cestarias.

Luiz Mendes de Oliveira

(1999)

Casa de alvenaria

Maria Aparecida Vaz de Oliveira

(1999)

Casa de alvenaria

Maria Assunção

——

Não foi possível obter nenhuma informação a respeito.

Maria dos Santos Ferreira

——

Não foi possível obter nenhuma informação a respeito.

Maria Francisca do Nascimento

[1990]

É uma das casas de barro mais antigas do bairro, porém as datas divergem sobre a construção, e as informações são mais próximas do ano de 1990.

Maximiliano Wilson de Godói

[sem data certa, provavelmente erguida após 1995]

Casa de madeira que também funciona como estabelecimento comercial.

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Revista Arqueologia Pública, São Paulo, nº 1, 2006.

Tabela 3 (cont.) Proprietários e construções no bairro do Barro Branco Proprietário

Ano de contrução [estimado] (confirmado)

Características e/ou observações

Miguel Vaz de Andrade

[1992]

Casa de barro marrom, uma das primeiras a ser erguida pelos novos moradores do bairro.

Milton César Vaz

——

Segundo o relatório sócio-econômico há a existência de tal residência, porém ela não foi encontrada.

Milton Souto da Silva

——

Segundo o relatório sócio-econômico há a existência de tal residência, porém ela não foi encontrada.

Moisés Messias da Silva

[1992]

Casa de barro marrom Segundo o relatório sócio-econômico há a existência de tal residência, porém ela não foi encontrada.

Octacílio dos Santos

Orlando Fávero

——

Segundo o relatório sócio-econômico há a existência de tal residência, porém ela não foi encontrada.

Tereza Clarinda Vaz

(2003)

Casa de barro marrom, a última a ser erguida no bairro, no primeiro bimestre de 2003.

Vírgilio Marcos da Cruz

[sem data certa pois o proprietário não reside no local]

Waldomiro José dos Santos

(2000)

Casa de barro marrom.

É a única de barro marrom que ainda utiliza cobertura de palhas sobre a casa, uma das paredes caiu durante as fortes chuvas que ocorreram no início de janeiro de 2004

OBS: A tabela acima foi elaborada com dados obtidos nas pesquisas de campo, na consulta do relatório sócio-econômico e dos mapas elaborados e fornecidos pela Companhia de Cimento Ribeirão Grande. Das 44 famílias registradas pelos relatórios sócio-econômicos, 9 deles não possuem casas, das 35 restantes, 24 delas foram identificadas de forma preliminar durante as etapas de campo, sendo que destas, 18 tiveram uma abordagem mais aprofundada. Há um total de 11 unidades familiares que pelos relatórios sócio-econômicos possuem residências, entretanto, as informações obtidas em campo, confrontadas com os dados dos relatórios, são insuficientes para afirmar a existência ou não das residências, exceto por dois únicos casos identificados através dos mapas.

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É latente a percepção de que os indivíduos que possuem propriedades no bairro e não o habitam tendem a construir residências que fogem aos padrões culturais locais. As casas feitas com restos de obras e materiais diversos sinalizam mais para uma ocupação descompromissada com o local e seus hábitos culturais do que unicamente um fator de pobreza. São casas que não representam o patrimônio local e que descaracterizam o bairro.

História de Barro Branco A comunidade do Barro Branco é composta por cinco núcleos de uma mesma raiz familiar, havendo, no entanto, dois núcleos principais, cujos membros tem uma relação de parentesco muito próxima e convivem numa mesma área, com pouca distância entre uma residência e outra. Mas como teve inicio esse arraial? Soubemos que os primeiros a se instalarem naquela região foram os pais das duas senhoras mais velhas da comunidade. Não foi precisada a data, mas provavelmente por volta da década de 1930 havia uma fazenda exatamente naquelas terras que empregava mão de obra para trabalhar nas lavouras. Os moradores mais antigos costumam se referir à fazenda de “um japonês” que era o proprietário. Foi então que vieram Antonio Rodrigo do Nascimento, nascido em Bairro Maciel, e Pedra Paulina do Nascimento, nascida em Ouro Fino. 3 Eles se casaram e os filhos começaram a nascer. Moravam em Sumidouro e apenas trabalhavam na fazenda nessa época, segundo informação de uma das filhas ainda viva. Com o tempo, a fazenda foi desativada e o casal foi convidado a tomar conta das terras tendo permissão para plantar e morar na propriedade. Segundo informação de Dna Lourdes, uma das filhas do

(3) Informação oral obtida através de entrevista com Dna Lourdes e Dona Maria.

casal, eles ganharam a terra como doação dos proprietários da fazenda e passaram a viver de subsistência. Plantavam para comer e o que sobrava era vendido nas comunidades vizinhas. Possuíam também criação de galinhas, porcos e algum gado para abastecer a casa de leite e eventualmente de carne. Os filhos desse casal nasceram em parte no Sumidouro e em parte no Barro Branco, sendo ao todo cinco: Celestino, Maria, Lourdes, Ana e Ervelina, e é parte deles e de seus descendentes que hoje nos contam a sua história. Dos cinco filhos de Antonio e Pedra Paulina duas filhas estão vivas e cada uma é a matriz de um núcleo de organização familiar, ou seja, em torno delas criou-se uma relação estreita de laços de parentesco, formando dois núcleos principais dentro do Barro Branco. Aquela comunidade se organizou em família, porém não há um núcleo só, como talvez tenha havido quando o patriarca ou a matriarca da família estavam vivos. Hoje em dia a comunidade se divide tênuamente entre dois núcleos familiares, um deles centralizado na figura de Dona Maria e outro na de Dona Lourdes. Para facilitar a compreensão da teia de relações que abrange esta comunidade, trataremos de um núcleo de cada vez, mas deve ser ressaltado que essa separação é exclusivamente metodológica e não um reflexo da realidade dessas pessoas.

Núcleo Dona Lourdes A Dona Lourdes é uma senhora de 63 anos de idade casada com Seu Caetano e mãe de sete filhos Antonio, Senhorinha, Roque, Luis, Ana, Celina e Dirceu. Como alguns dos filhos e seus descendentes não moram mais em Barro Branco, concentramos o trabalho no perfil feminino e infantil dos moradores que ainda residem lá. Dos filhos de Dona Lourdes, Senhorinha, Roque e Luis se mudaram e hoje vivem com as famílias em outros bairros próximos. Dirceu morreu com um ano de

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idade de tosse comprida. Portanto, o trabalho se concentrou nas famílias de Antonio, Ana e Celina. Mas primeiramente trataremos da figura ao redor da qual todas as demais pessoas vivem, que é a Dona Lourdes. Dona Lourdes acha que nasceu no Sumidouro, não sabe ao certo ( Foto ). Desde pequena, por volta dos 10 anos de idade, começou a ajudar o pai na lavoura, assim como todos os outros irmãos, e quando tinha 13 anos mudou-se com a família para o Barro Branco. Aos 15 anos se casou e teve seis filhos, hoje tem 24 netos e 4 bisnetos. Mesmo depois de casada Dona Lourdes continuou a trabalhar na roça, e possuía criação de animais. Hoje em dia ela não trabalha mais, se diz doente e sem condições, por isso o neto Roque mora com ela e cuida de criação de galinhas e suínos, além de ajudar o avô, Seu Caetano, na lavoura. A nora de Dona Lourdes, Zilda, é quem lava a roupa e faz o serviço de casa mais pesado. Ela não

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soube dizer ao certo que doença tem, mas “sofre dos pulmões” e já foi desenganada pelos médicos, que receitam apenas remédio para dor. Frente à perspectiva de morte dona Lourdes se mostra conformada e justifica que é a vontade de Deus. Mesmo assim não larga o cigarro de palha que fuma desde menina, pois aprendeu com o pai fumando um pouquinho com ele todos os dias. Dona Lourdes é o centro deste núcleo familiar e é chamada de Madrinha por todos os netos, noras e genros. Todos se dirigem pela manhã à casa dela e, unindo as palmas das mãos em frente ao peito, pedem a benção. Ela mora em uma casa de alvenaria construída recentemente como substituta da antiga casa de pau a pique, da qual só restou a antiga cozinha e o fogão à lenha. Ela se diz religiosa e as paredes da sua sala são cobertas de imagem de santos com São Jorge, Cosme e Damião e Nossa Senhora do Bom Parto, que dividem o espaço em meio a brinquedos ganhos nas

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festas e quermesses da região.4 Diz que reza todos os dias em um pequenino altar no canto da sala e que quando tem missa ela vai, em média uma vez por mês. Dona Lourdes foi durante muitos anos a parteira da comunidade e responsável pela maior parte dos nascimentos dos parentes. Dizem que ela e a irmã Ervelina aprenderam sozinhas o ofício, e que Dona Lourdes fez seus próprios partos, sozinha e sem ajuda. A irmã Ervelina já faleceu e Dona Lourdes encerrou as suas atividades há treze anos atrás, quando fez o último parto do nascimento de sua neta Jimerilda. Ela afirma que só o fez porque não deu tempo da mãe chegar ao hospital, porque naquela época já era

(4) Os brinquedos ganhos nas quermesses podem ser encontrados em várias casas do Barro Branco, pendurados nas paredes como se fora um enfeite ou um objeto de ostentação. Mesmo as crianças mantêm os brinquedos dentro das caixas, porque, segundo Josieli “a gente tem dó de usar”.

proibido. Ao ser indagado o porque da proibição, Dona Lourdes afirma que começaram a dizer que não podia ser feito sem licença, e que ela não tinha formação para realizar aquilo. Então ela deixou de ser parteira, mesmo tendo realizado vários partos, todos bem suscedidos. Hoje em dia, todas as mães do Barro Branco vão para a cidade e têm os seus filhos no hospital de Ribeirão Grande. Dona Lourdes mostra os trabalhos manuais que aprendeu a fazer com a mãe e que representam uma das poucas atividades que ela ainda realiza. São bordados, colchas de retalhos e forros de estofados que ela coloca nas poltronas e cadeiras da sala (Foto). Os bordados são simples e ela os faz com o aviamento que tiver em casa, fazendo bordas e desenhos em retalhos de panos que se transformam em toalhinhas de sala e cozinha. As colchas de retalhos são feitas com partes de roupas que se estragaram ou que não se usam mais, costurados os retalhos um a um na mão até formarem uma colcha. Já os estofados são feitos com 93

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muitos pequenos retalhinhos de panos coloridos que são costurados um a um numa base de pano maior, ou entrelaçados na base formando um trançado no avesso de modo a ficarem presos à base sem que se precise usar linha para costurá-lo. Aparentemente esse é o único tipo de atividade artesanal que ela produz, enquanto que o marido, Seu Caetano, faz pilões entalhados na madeira e cestaria em taquara. Ele e um sobrinho, Adão, são os únicos homens que produzem cestaria no Barro Branco. Essa atividade local é masculina e, ao que parece, eles foram os únicos que aprenderam com Seu Jacinto, falecido esposo de Dona Maria e cunhado de Seu Caetano. Nenhum outro homem ou jovem da comunidade sabe como fazer os balaios. Tendo a taquara em mãos, seu Caetano manufatura um cesto em 25 minutos e permitiu filmar e fotografar todas as etapas de seu trabalho (Foto).

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Os cestos são usados para transportar as frutas e legumes da lavoura, para armazenar alimentos em casa, para guardar coisas pessoais, para abrigo das galinhas no galinheiro. Vai produzir muitos mais quando se mudar para a nova casa que está em fase de construção. Dona Lourdes é uma das maiores conhecedoras das plantas da região e das ervas, raízes e outras plantas que podem ser utilizadas como medicamento. Ela foi responsável pelo ditado de parte da lista de plantas medicinais, suas funções e modo de preparo que consta em anexo. Ela diz que aprendeu sobre as ervas com a mãe e passou os ensinamentos para as filhas e netas, mas ressalta que alguns homens também são conhecedores das plantas. Ao que parece esse conhecimento é mais difundido dentro de um universo feminino, no entanto este saber é de certa forma mais geral, dependendo da inclinação e interesse de cada um no conhecimento desta prática medicinal. Em entrevista, Dona Lourdes conta que antigamente não havia médico na região, então eles costumavam levar os doentes na curandeira, e usavam os remédios caseiros. Ela própria diz que já foi muito na curandeira quando era nova, mas não se lembra quais os procedimentos médicos e nem que tipo de problema a levou a procurar essa ajuda. Ela conta que antigamente, quando alguém da comunidade morria, era levado na rede pelo antigo peabirú (trilha) para um cemitério. Dona Lourdes conta que hoje em dia os mortos são enterrados no cemitério da cidade. Antigamente os velórios aconteciam nas casas e muita gente ia e passava a noite inteira velando o morto até que amanhecesse. Os parentes ofereciam almoço e janta para todos. Quando ia se comprar o tecido para fazer a roupa para vestir o defunto, já se comprava pano para vestir o resto da família que estaria em luto. Caso a morte fosse de pai ou mãe, o luto deveria durar um ano, caso fosse marido ou esposa, seis meses, e se não fosse um membro da família a falecer não era obrigado vestir preto. Dona Lourdes conta que se lembra que

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os pais sempre visitavam os mortos, levavam flor e cantavam orações. Hoje em dia no Dia das Almas,5 todos levam flor para os mortos, mas estes estão enterrados em Ribeirão Grande.

Núcleo Dona Maria O núcleo de Dona Maria é composto por ela, seus filhos e netos. Ela tem 65 anos, é irmã de Dona Lourdes e mora no arraial em casa de pau a pique com a filha solteira chamada Pedra. Dona Maria é cega dos dois olhos e não sabe o que resultou nesta cegueira ( Foto). Ela explica dizendo que a menininha dos olhos está tampada. Quando indagada a respeito dessa menininha ela diz que um dia sentiu muita dor num olho e depois no outro, e que depois da dor a menininha dos olhos dela ficou tampada e que agora ela está com problema. (5) Dia de Finados

Dona Maria nasceu em Ouro Fino, morou no Sumidouro e viveu quase a vida toda no Barro Branco. Nunca foi para a escola porque não tinha nenhuma no bairro, “a única escola que tinha era a roça” afirma ela, que ajudava diariamente o pai na lavoura. Não lembra quantos anos tinha quando começou a trabalhar, mas sabe que o pai levava todos os filhos bem pequenos, pois ele era muito pobre e trabalhava com os filhos carpindo o terreno dos outros. A mãe ficava em casa cuidando das coisas e dos irmãos menores. Dona Maria ajudava o pai a plantar milho, feijão, arroz, tudo para comer em casa e o que sobrava era vendido na cidade, e diz que foi do mesmo modo que os filhos dela se criaram. No entanto, os filhos mais novos de Dona Maria puderam estudar um pouquinho no Mobral. Dona Maria não se lembra com que idade casou, mas sabe que era nova. O marido, Seu Jacinto, era de Ouro Fino e eles se conheceram quando ela ainda morava com a família no Sumidouro. Os fi-

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lhos todos nasceram e se criaram no Barro Branco, ajudando Seu Jacinto no roçado. Dona Maria, depois de casada, ia menos à roça, mas o marido continuava trabalhando na plantação, além de lidar com couro e fazer cestaria. Pelo que foi informado, Seu Jacinto foi o pioneiro naquele lugar a trabalhar com cestaria e foi responsável por passar seus conhecimentos ao cunhado Seu Caetano e ao filho Adão, os únicos que preservaram essa atividade. Seu Jacinto faleceu há seis anos, ninguém soube explicar a causa. Os filhos de Dona Maria nasceram todos em casa e foi a irmã Dona Lourdes quem fez os partos. Mas os netos foram e vão quase todos para o hospital na hora do nascimento. Segundo Dona Maria, o parto em casa era sem remédio nem curativo nessa hora “só Deus que iluminava e os Santos”. O único remédio que se usava era salmoura para evitar infecção e bebia-se pinga com arruda para recaída. Dona Maria se diz religiosa e conta que sempre foi com os pais para a igreja no Barro Branco, Ouro Fino e Ribeirão. Foi batizada e crismada “graças a Deus”. Ela fez um altarzinho para Nossa Senhora dentro de casa, com São José e outros santinhos pequenos e fala que quando ela mudar o santinho vai junto. Conta que quando era nova era comum a igreja fazer festas em Ribeirão Grande e em Ouro Fino, como festas de Nossa Senhora, do Bom Jesus, e um monte de outros santos, e que ela e sua família iam a todas. Diz que nestas festas tinha uma procissão para o santo, vinha um padre rezar a missa. Depois era feito um leilão para arrecadar dinheiro para a igreja e que normalmente a comida servida era café com pão, mas que isso já não existe há muitos anos porque os mais velhos se foram e tudo ficou abandonado. Contou também que a festa de Santo Antonio e de São João era muito bonita em Barro Branco, com procissão e missa, e que faziam bolo para vender e assavam carne, mas que tudo isso também foi largado. Segundo ela, antigamente 96

havia batizado e casamento na igreja da comunidade com dança e música de tocador de viola e cantor. Dona Maria diz que hoje em dia não vai mais em festas, e que ninguém mais vai. Aprendeu a cozinhar com a mãe tudo o que sabe, aprendeu também com a mãe a costurar e fazia colchas de retalho quando ainda tinha visão. Não sabe fazer tricô nem crochê. Ela também ajudou a barrear a casa com a ajuda de toda a família, conta ela. A casa foi feita há 16 anos, antes era outra casa de pau a pique no mesmo lugar, estragava uma, colocava outra. Por fora ela é revestida de barro branco para dar um melhor acabamento. O fogão foi a Candinha que fez, mas Dona Maria também sabe fazer e sempre fazia, foi a mãe que ensinou. Na cozinha de Dona Maria há sobre o fogão um tacho de cobre que era muito utilizado para torrar a farinha de milho do monjolo e para fazer biju. Ela conta que até há pouco tempo atrás a filha Pedra ainda fazia porque ela prefere a farinha do monjolo que a comprada. Tem também um tacho de melado de cana que utilizaram muito para fazer rapadura. Dona Maria conta que foi ela quem ensinou as filhas a cozinharem de tudo. Diz que quando o marido era vivo e tinha muita criação, eles salgavam a carne de porco e penduravam para secar num gancho sobre o fogão a lenha. Até hoje é possível ver o gancho pendurado lá. Dona Maria tem também em casa um antigo plantador de grãos que o marido e os filhos utilizavam na roça para semear principalmente o feijão. Na parede presa ao lado do semeador há ferragens e estribos de cavalos confeccionados pelo falecido marido, e atrás da porta sua filha Tereza mostra antigas esteiras de palha nas quais, até não muito tempo atrás, todos dormiam, porque não se usava cama em Barro Branco. Hoje em dia dona Maria passa a maior parte de seu tempo dentro da cozinha na companhia das filhas. Apesar de ser uma

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pessoa idosa e cega, recebeu muito bem a equipe e, lúcida, assim como a irmã dona Lourdes, rememorou muitos fatos e acontecimentos de seu passado e da história de Barro Branco. Arqueologia Pública e turismo: os encanados de Ribeirão Grande Os sítios arqueológicos / históricos conhecidos localmente como “encanados” correspondem a estruturas construtivas associadas ao ciclo da mineração que se desenvolveu, na região do alto Paranapanema e vale do Ribeira de Iguape, entre os séculos XVI e XVIII. Atribuídos em parte aos jesuítas espanhóis que chegaram ao vale do Paranapanema utilizando-se de itinerários indígenas, em parte aos bandeirantes em constante incursão nas áreas de aldeamento já estabelecidas, os “encanados” serviam na lavra do ouro de aluvião, livre das taxações metropolitanas até 1702, quando o Regimento das Minas estabelecia lei que obrigava a comunicação da descoberta e da exploração da lavra às autoridades portuguesas. Partindo de vários pontos do litoral paulista, exploradores portugueses buscavam ouro subindo o curso do Ribeira. Data de 1576 expedição de Garcia Rodrigues Paes que fundou o Garimpo Santo Antônio nas proximidades da atual Iporanga, estabelecendo um dos núcleos que serviriam de base para a partida de explorações do alto curso do Ribeira e, posteriormente, do alto Paranapanema. Acredita-se, no entanto, que embora inexistam documentos escritos sobre a exploração do ouro de aluvião do alto Ribeira e do Paranapanema antes da primeira metade do século XVI, ela já tivesse ocorrido antes em pequenas incursões e que tenham se consolidado na segunda metade do século XVI, quando as populações autóctones já haviam se integrado aos aldeamentos ou eram transformados em mão-de-obra escrava dos bandeirantes. Neste cenário em processo de conquista e de expansão territorial colonial, as cons-

truções de balos de mineração que arrimavam as barrancas de rios e córregos com muros de pedras sotopostas sem argamassa, assim como no leito dos mesmos, agilizavam a vazão da água, aumentando a velocidade de captação de ouro nas bateias. Estas estruturas de pedra, semelhantes a muros edificados que canalizam consideráveis extensões dos rios e córregos da região, correspondem aos “encanados”. O ouro do Ribeira e do alto Paranapanema foi sendo substituído pelo ouro das Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso, fazendo com a atividade mineradora na área ficasse por conta de alguns sertanistas, como Francisco Xavier da Rocha que, transferindo-se com todos seus escravos das Minas Gerais para o Paranapanema, fundou em 1728 a Freguesia de Santo Antonio das Minas e, mais tarde, o arraial da Rocinha, hoje cidade de Apiaí. Com a decadência do ciclo do ouro no vale do Ribeira e do alto Paranapanema, o tropeirismo tornou-se predominante e constituiu-se como novo ciclo econômico e social nesta área, que se passagem das rotas dos tropeiros para as Minas Gerais e para ramais para o interior paulista. Neste período os encanados já não são mais construídos e a mineração se torna menos sistemática. Permanece então apenas a exploração das barrancas dos rios de maior porte, como o Almas, que apresenta poços globulares de onde se retirou ouro acumulado em seus sedimentos aluviais. Testemunho desta atividade são os sítios encanados Barro Branco V e Barro Branco VI, identificados e cadastrados pela presente pesquisa,. No município de Ribeirão Grande, situado junto ao divisor de águas das bacias do Ribeira de Iguape e do Paranapanema, tais construções são encontradas em bom estado de conservação e indicam um rico legado histórico nacional. Prospecções realizadas dentro do escopo do presente Programa Arqueológico Mina Limeira resultaram no cadastro de 5 novos sítios “encanados”, contando-se ainda com outros 2 anteriormente conhecidos. A Tabela 4, abaixo, traz o nome, coordenadas e fonte de pesquisa destes sítios: 97

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Tabela 4 Sítios encanados de Ribeirão Grande Nome do Sítio

Coordenadas

Fonte

Encanado I

Rio das Almas

Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos / IPHAN

Encanado II

Rio das Conchas

Cadastro Nacional de Sítios Arqueológicos / IPHAN

Barro Branco VII

22J 769211/7321987

Programa Arqueológico Mina Limeira

Barro Branco XIII Rio das Almas

Programa Arqueológico Mina Limeira

Cachoeira III

22J 768461/7324017

Programa Arqueológico Mina Limeira

Ribeirão Velho

22J 767636/7323221

Programa Arqueológico Mina Limeira

Limeira III

Mina Limeira

Programa Arqueológico Mina Limeira

Destes “encanados”, 3 se encontram na área de implantação direta do Projeto Mina Limeira (sítios Limeira III, Barro Branco VII e XIII). Neles foram realizadas ações de registro e resgate, e estão sendo foco, ainda, de análises alternativas de tratamento e valoração, considerando seu potencial de visibilidade em ações museológicas e de turismo patrimonial. Por outro lado, certamente existem ainda vários outros “encanados” na região, considerando a abrangência das atividades de mineração desenvolvidas ao longo dos séculos. A partir dos dados acima coletados, e considerando o atrativo destes sítios integrarem programas turísticos municipais (alguns inclusive já em curso, mas compreendendo iniciativas isoladas e sem enfoque de preservação), foi realizada uma primeira análise sobre o potencial turístico dos sítios “encanados”, com base nos seguintes critérios de avaliação: • Significado histórico-cultural • Visibilidade para o público • Estado de conservação • Condições de acesso e segurança ao visitante • Alternativas regionais de lazer no entorno do sítio • Propriedade do bem (pública / particular) 98

Fazem parte desta avaliação os 5 “encanados” identificados através da presente pesquisa, para os quais contou-se com os dados necessários de análise. A partir desta avaliação preliminar é possível destacar que, dos 3 sítios localizados na área de intervenção direta do Projeto Mina Limeira, 2 correspondem a estruturas simples ou de baixa preservação/visibilidade (Mina Limeira III e Barro Branco VII). O outro sítio (Barro Branco XIII) apresenta grandes dimensões e bom estado de conservação, devendo receber medidas de aproveitamento museológico. Considerações finais O Brasil é um país formado não apenas por uma enorme diversidade de histórias locais e contextos culturais, mas também por uma estrutura social estratificada onde grande parte da população não tem acesso a recursos críticos, incluindo educação. Por conta disso, a recente prática da Arqueologia Pública no país constitui desafio estimulante, uma vez que oferece oportunidade de criar uma outra visão do passado humano, mais diversificada e tolerante, menos rígida e, principalmente, mais próxima dos legítimos herdeiros desta história. Aproximamo-nos cada vez mais, afinal, à essência de uma ciência social.

Arqueologia e sociedade no município de Ribeirão Grande, sul de São Paulo: ações em arqueologia pública ligadas ao Projeto de Ampliação da Mina Calcária Limeira. Erika Marion Robrahn-González

Tabela 5 Avaliação turistia preliminar – Sítios “Encanados” Sítio Barro Branco VII

Pontos fortes

Pontos de atenção

Estrutura de baixa visibilidade, fácil Atualmente assoreadoPequenas acesso, seguro. Poderia ser integra- dimensõesPropriedade particular do à visita da Capela do Ouro Fino e da Caverna do Cherol. Significado histórico-cultural: médio

Barro Branco XIII

Estrutura composta de grandes di- Difícil acessoTurismo pode prejudimensões no rio das Almas, boa vi- car mata ciliar e qualidade da água, sibilidade, em excelente estado de além das próprias estruturas de preservação. mineraçãoBem público Conjunto paisagístico preservado com presença de queda d’água formando tanque e mata ciliar. Poderia ser integrado em trilhas que seguem o rio das Almas curso acima, com pontos bons em mirantes próximos e/ou roteiros mistos no Ouro Fino. Significado histórico-cultural: alto

Cachoeira III

Estrutura simples em ilha fluvial ge- Propriedade Particular rada pela atividade de mineração no rio das Almas; bem preservada, excelente visibilidade e fácil acesso. Poderia ser integrado aos roteiros de turismo ao Ouro fino Significado histórico-cultural: médio

Ribeirão Velho

Estrutura complexa de grande di- Difícil acessoPróximo à EE Xitué. mensão (150 metros) no Ribeirão Turismo pode prejudicar mata atlânVelho; excelente estado de preser- tica desenvolvida. vação. Significado histórico-cultural: alto

Limeira III

Estrutura simples de pequena dimen- Baixa visibilidade são fronteiriça à Mina Limeira; esta- Difícil acesso do de preservação comprometido. Baixa integração aos roteiros turísticos potenciais da região Significado histórico-cultural: médio

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Revista Arqueologia Pública, São Paulo, nº 1, 2006.

O desenvolvimento econômico que o Brasil atravessa, nesta virada de século, traz grande impacto ao seu patrimônio arqueológico, considerando os usos e desusos que são feitos de seu território. Pela primeira vez na história da disciplina, creio eu, nos deparamos com uma ameaça que há poucos anos atrás não nos afligia: a de que nosso database é finito. Assim hoje a Arqueologia necessita incorporar um outro perfil, lado a lado com a comunidade que cria, destrói e preserva seus recursos. Não lhe basta ser multidisciplinar: necessita ser também multicultural, na medida em que incorpora os muitos passados possíveis. Quais as mudanças necessárias à Arqueologia tradicional, acadêmica e enquanto profissão emergente, para este século XXI? Quem estará à frente desta mudança, desenvolvendo novos programas de treinamento e currículos acadêmicos necessários para o futuro? O desenvolvimento sistemático de ações em Arqueologia Pública está em grande parte ligado a pesquisas junto a processos de licenciamento ambiental, onde cada vez mais os estudos têm como objetivo definir procedimentos e estratégias de sustentabilidade sócio-ambiental em um contexto capitalista. Apesar da questão “O que deve ser sustentado?” nunca terá um paradigma unificado, há consenso sobre a efetiva participação da comunidade na pesquisa arqueológica, com base em uma estrutura não hierárquica em que métodos de trabalho e interpretação necessitam interagir. Desde a Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento ocorrido no Rio de Janeiro, em 1992, “desenvolvimento sustentável” se tornou palavra-chave de um discurso político internacional voltado à qualidade de vida, conservação dos recursos naturais e responsabilidade para gerações futuras. Apesar das discussões terem sido inicialmente voltadas às ciências naturais e análises de crescimento populacional, relaciona-se a uma discussão baseada na definição social, histórica e cultural do pro100

blema: a viabilidade de serem mantidas relações socialmente definidas entre a natureza e a comunidade durante longos períodos de tempo. Desta forma, o discurso sobre sustentabilidade é basicamente público e estreitamente vinculado a problemas como justiça social e regulamentação política. Sustentabilidade ou não sustentabilidade corresponde a uma qualidade de condições e processos dentro de um continuum de condições e processos possíveis. Neste sentido, não se pode considerar a sustentabilidade ambiental e a sustentabilidade social de forma isolada. Ao contrário, o foco deve recair na interação entre elas, buscando a viabilidade de suas relações durante longos períodos de tempo. Por outro lado, considerando a rápida transformação por que as sociedades passam atualmente, a sustentabilidade necessita ser concebida dentro de uma perspectiva dinâmica, e não baseada em estruturas estáticas. Nós, arqueólogos, precisamos nos perguntar: Qual a conexão entre nosso campo de conhecimento e sustentabilidade social? Como podemos contribuir dentro desta perspectiva? Quais novos tópicos devemos incorporar à nossa área de atuação? Dentre as respostas possíveis, destacase o estímulo à coesão social através do estabelecimento de pontes entre o presente e o passado, preservando histórias e tradições e valorizando a herança cultural. Observase assim, portanto, uma grande mudança de perspectiva na prática da profissão: hoje a Arqueologia parte de um profundo conhecimento do presente para dar significado ao passado e perspectivas de futuro, especialmente em países em desenvolvimento como o Brasil. O processo pós-colonial e as informações tecnológicas disponíveis criaram um novo contexto no qual a Arqueologia deve atuar. Como conseqüência deste conjunto de ações, esperamos, virá a tolerância e a possibilidade de cooperação voltada à construção de uma sociedade mais democrática. Nossa perspectiva é que o trabalho desenvolvido (e ainda em andamento) na pequena

Arqueologia e sociedade no município de Ribeirão Grande, sul de São Paulo: ações em arqueologia pública ligadas ao Projeto de Ampliação da Mina Calcária Limeira. Erika Marion Robrahn-González

comunidade de Barro Branco possa ter contribuido neste caminho. O trabalho de cadastramento de sítios históricos do tipo “encanados” na área se insere, portanto, dentro de uma iniciativa de valorização e preservação patrimonial, constituindo uma segunda alternativa de aplicação da Arqueologia Pública no Programa Arqueológico que vem sendo desenvolvido. Agradecimentos Venho inicialmente agradecer a comunidade de Barro Branco pela sua paciência, generosidade e compromisso com a presente pesquisa. Sem eles nosso esforço seria em vão. Agradeço ainda à Companhia de Cimento Ribeirão Grande (CCRG) e, em especial, a Luiz Carlos Busato, Antonio Mauro Mendonça Barbosa e Paulo Ricardo Silva Gobbo, incansáveis estimuladores e defensores dos programas socio-ambientais que

a empresa desenvolve; devo a eles, em grande parte, a oportunidade de desenvolver os estudos e contribuições que o presente artigo busca trazer. Agradeço às instituições que apoiaram as pesquisas, a saber, o Núcleo de Estudos Estratégicos/ Arqueologia Pública da UNICAMP e a Fundação Cultural de Jacarey, no centro das quais ocorreu grande parte das discussões conceituais trazidas por este artigo. Agradeço igualmente aos inúmeros arqueólogos, historiadores, geógrafos e cientistas sociais que, comigo, partilharam destas pesquisas, onde destaco os amigos Dr. Paulo De Blasis, Dr. Andrés Zarankin e Ms. Wagner Gomes Bornal. Agradeço especialmente o enorme empenho e compromisso de Gerson Levi da Silva Mendes em todas as etapas da pesquisa, bem como de Cintia Bendazolli pelo belíssimo trabalho junto ao universo feminino e infantil da comunidade de Barro Branco. A todos eles e aqueles que, por falta de espaço, não pude citar, meus sinceros agradecimentos.

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Sam Smiles y Stephanie Moser (eds.): Envisioning the past. Archaeology and the image. Blackwell Publishing. Malden. Oxford y Carthon. 246 páginas. ISBN. 1-4051-1150-X

Ana Maria Mansilla Castaño*

Este livro, co-editado por uma das pioneiras dos estudos das imagens na arqueologia, oferece uma interessante coletânea de trabalhos sobre a análise do discurso visual em arqueologia. Envisioning the Past foi também a primeira Conferência Internacional sobre o tema na Southampton University (2000). Não foram publicadas as atas daquela conferência, o que atualiza e valoriza ainda mais a temática com esta nova publicação. A articulação do livro em doze breves capítulos permite ter uma boa panorâmica dos principais objetos de estudo neste novo campo de pesquisa arqueológica. Analisa-se o papel das imagens na construção do conhecimento arqueológico: as imagens sobre as origens da humanidade, o papel do imaginário pré-histórico na construção das iden-

tidades, as diferentes fontes do repertório iconográfico arqueológico, o destaque das imagens na arqueologia contemporânea tanto no trabalho de campo quanto na divulgação popular ou formal, sem esquecer as nuances que a introdução das novas tecnologias implica. No entanto, visando uma melhor aproximação a este tipo de estudos, a ordenação temática dos diferentes capítulos teria sido uma opção adequada. Assim mesmo, a própria brevidade dificulta o passo entre a proposta teórica e a amostra analisada. Mesmo sendo as imagens o fio condutor do livro, os diferentes capítulos sugerem outras interessantes linhas de pesquisa no âmbito da antropologia do patrimônio, da divulgação arqueológica e da construção da comunidade e a cultura arqueológica.

(*) Escola Oficina de Restauro de Salvador [email protected]

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Ian J. Mcniven e Lynette Russell (2005): Appropiated pasts. Indigenous peoples and the colonial culture of Archaeology. Walnut Creek. Altamira Press. 317 Páginas. 8 Ilustrações. ISBN 0-7591-0906-9

Ana Maria Mansilla Castaño*

Os títulos dos capítulos identificam já as differentes teorias que, sob o ponto de vista teórico, têm apoiado o colonialismo no discurso arqueológico. Sincronicamente são analisados os discursos desde as primeiras teorias que configuraram a própria disciplina até hoje. O segundo objetivo do livro, depois da análise de como o discurso arqueológico, juntamente com outros, tem contribuido e contribui ao colonialismo, que é oferecer alternativas para uma prática arqueológica descolonizada, se resolve rapido demais, uma vez que têm sido apresentadas questões terminológicas e conceituais de grande interesse, como a proposta de desconstrução do termo “PréHistória”. Isto porque, o sentido de tempo

anterior à história resulta ofensivo para as populações indígenas que entendem que nenhum povo é povo sem história. Perante os termos de “community archaeology” e “shared history”, que enfatizam as relações entre os arqueólogos e as comunidades locais, os autores sugerem sua sustituição pelo termo de “partnership research”. Aborda-se o caso australiano, mas nas frequentes referências a outras colonias de povoamento sente-se a falta de algumas experiências no contexto da America Latina e não apenas o olhar anglo-saxâo. O que não retira valor à sugestiva e exaustiva análise crítica das conflitivas relações entre a arqueologia e a sociedade contemporânea.

(*) Escola Oficina de Restauro de Salvador [email protected]

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REVISTA “ARQUEOLOGIA PÚBLICA”

A revista “Arqueologia Pública” é uma iniciativa do Núcleo de Estudos Estratégicos em Arqueologia Pública/UNICAMP. Com periodicidade anual, objetiva constituir um fórum de debate sobre o caráter público da disciplina e sua importância social na atuação e manejo do patrimônio cultural. Tem como prioridade a publicação de trabalhos inéditos e originais, embora poderão ser aceitos, excepcionalmente, trabalhos para republicação em português. Os autores da revista têm o prazer de convidá-lo(a) a participar desta empreitada, encaminhando trabalhos e fornecendo comentários/ sugestões que permitam aprimorar a publicação.

Instruções aos colaboradores

1. Forma de apresentação Os autores devem encaminhar à redação uma cópia impressa do trabalho completo, acompanhada por disquete ou CD. O disquete ou CD deve estar identificado com o nome do autor principal e com o nome do programa processador de texto, que deve ser compatível com softwares tipo MSWord, sistema IBM PC. Deverá trazer indicação do tipo de contribuição a que se refere (artigo, nota, resumo de tese etc.). Depois de recebido o aceite do Conselho Editorial e do(s) parecerista(s), o autor será solicitado a enviar à redação os originais das ilustrações, em meio digital. Os autores devem manter em seu poder cópias dos trabalhos e ilustrações, pois o material não será devolvido. Todos os trabalhos serão apreciados por pelo menos um membro do Conselho Editorial. Antes de serem aceitos para publicação passarão ainda pela análise de pelo menos um parecerista. Os no-

mes dos pareceristas serão mantidos em sigilo, assim como dos autores dos trabalhos que estiverem sendo avaliados.

2. Idioma Os trabalhos devem ser escritos em português, espanhol ou inglês. No caso de contribuições em português ou espanhol, a segunda língua utilizada no título, palavras-chave e resumo deverá ser o inglês. No caso de contribuições em inglês, a segunda língua utilizada no título, palavras-chave e resumo deverá ser o português.

3. Tipos de contribuição Artigos: Resultados de Programas em Arqueologia Pública, reflexões teóricometodológicas, análises científicas, revisões críticas (máximo total 30 páginas com ilustrações, bibliografia, notas de rodapé e outros). Deverá conter 5 palavras-chave e resumo de no máximo 100 palavras. 127

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Notas: Resultados parciais ou preliminares de pesquisas em andamento (máximo total 10 páginas com ilustrações, bibliografia, notas de rodapé e outros). Deverá conter 5 palavras-chave e resumo de no máximo 100 palavras. Resumos de teses: Resumos de teses e dissertações com abordagem em Arqueologia Pública, defendidas nos últimos dois anos (máximo total 5 páginas com ilustrações, bibliografia, notas de rodapé e outros). Deverá conter 5 palavras-chave e resumo de no máximo 100 palavras. Resenhas: Resumo crítico de livros que permitam atualização na área de Arqueologia Pública (máximo total 1 página).

4. Preparação dos originais Configuração: Os trabalhos deverão ter o número máximo de páginas especificado para cada tipo de contribuição, de tamanho A4, fonte Arial, corpo 12, espaço duplo. A margem inferior e a superior devem ser de 2,5 cm, esquerda e direita de 3,0 cm, não justificada. Paginação: as páginas devem ser numeradas consecutivamente e não deve haver anexo. Primeira página: deve conter o título do trabalho, o(s) nome(s) do(s) autor(es) sem qualificações ou títulos, mas com afiliação e, se houver interesse, endereço eletrônico, sendo necessário escrever claramente se deseja que seu endereço eletrônico seja publicado. Deve ainda ser incluído um endereço postal completo, número de telefone (e/ou fax) e endereço eletrônico do autor para quem a correspondência deva ser enviada. Segunda página: deve conter 5 palavras-chave e um resumo de no máximo 100 palavras, onde devem estar claramen-

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te indicadas as linhas gerais e conclusões do trabalho. O resumo deverá estar em duas línguas, de acordo com as normas especificadas no item 2 (Idioma). Tabelas e gráficos: devem ser apresentados em folha separada no final do trabalho, com identificação e nome do autor principal. Notas de rodapé: devem ser numeradas automaticamente em algarismos arábicos e aparecer ao final do texto. Ilustrações: devem ser apresentadas em folha separada no final do trabalho e identificadas como Fig. 1, Fig. 2 etc., seqüencialmente de acordo com a ordem em que aparecem no texto, e devem estar prontas para reprodução. Se precisar, deve-se deixar clara a orientação da ilustração. Certifique-se de que as ilustrações ainda serão legíveis após uma redução de 50%. Se tiverem sido feitas em computador, deve-se também enviá-las em disquete ou CD, devidamente identificados com o nome do autor principal e o programa utilizado. As fotografias devem ser em preto e branco. Referências bibliográficas: a) no texto: (Baldus 1944), (Prous 2003: 44), (Baldus 1944, Prous 2003), (Kneip et al. 1995) e (Neves & Blum 1998). b) na lista de referências: só deve ser listada a bibliografia citada. Ela deve estar em ordem alfabética pelo sobrenome do autor citado em primeiro lugar. ROOSEVELT, A.C. 1991 Moundbuilders of the amazon. Geophysical archaeology on Marajo Island, Brazil. New York: Academic Press Inc. Binford, L. 1962 Archaeology as Anthropology. In: American Antiquity, 28 (2): 217-225. FUNARI, P.P.A. 1991 Archaeology in Brazil: Politics and Scholarship at a Crossroads. In: World Archaeological Bulletin, 5: 123-132.

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5. Exemplares do autor Será enviado ao autor principal 5 exemplares do número em que sua contribuição estiver publicada.

6. Direitos de propriedade A simples remessa de originais à revista implica a autorização para sua publicação. Não serão pagos direitos autorais. É de inteira responsabilidade do(s) autor(es) de cada trabalho coletar as permissões e agradecimentos necessários para sua publicação. Os conceitos emitidos nos textos publicados serão de responsabilidade exclusiva dos au-

tores, não refletindo obrigatoriamente a opinião da Comissão Editorial.

7. Endereço Os trabalhos devem ser enviados para: [email protected]

8. Cronograma A publicação do primeiro número da Revista Arqueologia Pública está prevista para julho/06. Para tanto, os trabalhos devem ser encaminhados até no máximo 31.01.06. Aqueles que chegarem depois disto deverão ser reservados para o próximo número.

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