ROTEIROS ARQUEOLÓGICOS DE PENICHE-BERLENGAS: Proposta de um projecto

May 27, 2017 | Autor: Paulo Costa | Categoria: History, Shipwrecks, Underwater Cultural Heritage, Cultural Routes, Nautichal Archeology
Share Embed


Descrição do Produto

I CONGRESSO DE HISTÓRIA E PATRIMÓNIO DA ALTA ESTREMADURA ARQUEOLOGIA . HISTÓRIA . HISTÓRIA DA ARTE . PATRIMÓNIO NATURAL E CULTURAL

I C O N G R E S S O D E H I S T Ó R I A E PAT R I M Ó N I O D A A LTA E S T R E M A D U R A

ARQUEOLOGIA

1

FICHA TÉCNICA Título: 1.º Congresso de História e Património da Alta Estremadura Autores: - Painel de Arqueologia Anabela Joaquinito Ana Graça António S. Pereira Eurico de Sepúlveda Guilherme Cardoso Inês Ribeiro Isabel Inácio Jaqueline Pereira João Pedro Bernardes Jorge Russo Maria Luísa Marques Batalha Santos Nuno Ribeiro Paulo Costa Raquel Maria da Rosa Vilaça Severino Rodrigues Sofia Ferreira Vânia Carvalho

- Painel de História Carlos Fernandes Manuela Santos Silva Manuel Augusto Dias Margarida Herdade Lucas Maria da Luz Franco Monteiro Moreira Miguel Portela Ricardo Charters d’Azevedo Ricardo Pessa de Oliveira - Painel de História da Arte Ana Patrícia Rodrigues Alho José Francisco Ferreira Queiroz Luciano Coelho Cristino Marco Daniel Duarte Marisa Oliveira Milton Pedro Dias Pacheco Pedro Redol

I C O N G R E S S O D E H I S T Ó R I A E PAT R I M Ó N I O D A A LTA E S T R E M A D U R A

- Painel Património Cultural e Natural Acácio de Sousa Ana Margarida Louro Martinho António Maduro Carlos Ferreira Cláudia Neves Cristina Nobre Dóris Santos Gustavo Medeiros Hugo Mendes Hugo Neves João Fiandeiro Santos João Forte João Luís Jesus Fernandes Jorge Amador Jorge Martins Lucinda Silva Luís Mota Figueira Marise Silva Pedro Alves Raquel Janeirinho Rui Remígio Rui Venâncio Sérgio Medeiros

Edição: CEPAE | Centro do Património da Estremadura Concepção gráfica: Sónia Mendes

Praça/ Edifício Mouzinho de Albuquerque 2.º andar, Sala 1, Apartado 188 2440 - 901 Batalha Tel.: 244 766 199 www.cepae.pt Apoio Institucional: Câmara Municipal de Ourém

2

ÍNDICE

ARQUEOLOGIA Ana Graça; Ana Cruz; Davide Delfino .......................... 5 REMINISCÊNCIAS DE SOCIEDADES PRÉ-HISTÓRICAS NALGUMAS GRUTAS DO NORDESTE ESTREMENHO Nuno Ribeiro; Anabela Joaquinito; António S. Pereira ALGUNS DADOS INÉDITOS DA PRÉ-HISTÓRIA E PROTO-HISTÓRIA DOS CONCELHOS DE CASTANHEIRA DE PÊRA E FIGUEIRÓ DOS VINHOS, SUA CORRELAÇÃO COM A ARQUEOLOGIA DA SERRA DA LOUSÃ E SERRA DA ESTRELA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21 Guilherme Cardoso; Severino Rodrigues; Eurico de Sepúlveda; Inês Ribeiro OLARIA ROMANA DO MORRAÇAL DA AJUDA, PENICHE – UMA INDÚSTRIA DA LUSITÂNIA LITORAL . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45 Guilherme Cardoso; Eurico de Sepúlveda; Severino Rodrigues; Inês Ribeiro; Luísa Batalha . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59 A VILLA ROMANA DA COLUMBEIRA João Pedro Bernardes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79 DE INDÍGENAS A ROMANOS: O CASO DA FAMÍLIA DOS SULPÍCIOS DA REGIÃO DE LEIRIA Jorge Russo; Paulo Costa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 90 ROTEIROS ARQUEOLÓGICOS DE PENICHE-BERLENGAS, PROPOSTA DE UM PROJETO Maria Luisa Marques Batalha Santos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 99 “O ÚLTIMO PEZEIRO” - VIVÊNCIAS DE UMA ÉPOCA NA MATA DO URSO Raquel Vilaça A IDADE DO BRONZE NA ALTA ESTREMADURA: DEPÓSITOS METÁLICOS E SUA CONEXÃO COM O ESPAÇO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 112 Vânia Carvalho; Isabel Inácio O PROJETO DE INVESTIGAÇÃO ARQUEOLÓGICA DO NÚCLEO DO CASTELO DE LEIRIA: . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 137 ENQUADRAMENTO, OBJETIVOS E RESULTADOS Jaqueline Pereira; Sofia Ferreira . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 158 OURÉM: DE POVOADO A VILA VELHA

HISTÓRIA Carlos Fernandes EPIDEMIAS NA REGIÃO DE LEIRIA EM MEADOS DO SÉCULO XIX: IMPACTO SOCIAL, ECONÓMICO E DEMOGRÁFICO . . . . . . . . . . . . . . . . 175 Manuel Augusto Dias . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 196 A SANTA CASA DA MISERICÓRDIA DO ALVORGE NO SÉCULO XVIII Manuela Santos Silva . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 224 ÓBIDOS NA CASA DAS RAINHAS MEDIEVAIS DE PORTUGAL

I C O N G R E S S O D E H I S T Ó R I A E PAT R I M Ó N I O D A A LTA E S T R E M A D U R A

HISTÓRIA

3

ROTEIROS ARQUEOLÓGICOS DE PENICHE-BERLENGAS, PROPOSTA DE UM PROJETO Jorge Russo CINAV – Centro de Investigação Naval [email protected] Paulo Costa

I C O N G R E S S O D E H I S T Ó R I A E PAT R I M Ó N I O D A A LTA E S T R E M A D U R A

ARQUEOLOGIA

91

Peniche e o seu arquipélago das Berlengas, onde se incluem os Farilhões, hoje reserva da Biosfera, foram visitados desde a Antiguidade. Testemunhos claros disto são as ocupações romana de Peniche e das Berlengas, então ilhas, a primeira então ilha A diacronia do fundeadouro da Berlenga, isso atesta. Um simples olhar para a geografia da área faz-nos compreender de imediato porque embarcações teimam em ali se perder, desde a Antiguidade até ontem. Na Convenção sobre a proteção e gestão do património cultural subaquático da UNESCO, que Portugal ratificou, podemos ler que a sua preservação in situ deve ser uma prioridade, que deve ser encorajado o acesso público aos sítios, e que, entre outras medidas, uma adequada divulgação deve ser implementada. Neste quadro, pretende-se implementar um projeto de inventariação, identificação, estudo e salvaguarda de património cultural submerso, com a criação de roteiros e reservas arqueológicas, nas áreas de Peniche e arquipélago das Berlengas, aposta clara no conceito de que para se gerir é necessário conhecer. Os SS Primavera, SS Andrios e SS Dago, são exemplos paradigmáticos do potencial e do que se pretende implementar com este projeto.

Peniche and its archipelago of Berlengas, which includes Farilhões Islands, today a UNESCO Biosphere Reserve, have been visited since ancient times. Clear testimonies of this are the evidences of Roman occupation of Peniche and Berlengas, Peniche an island then. The diachrony of Berlenga’s anchorage, clearly attests it. One simple look at the geography of the area makes us immediately understand why ships are so easily lost there, since ancient times to today. In the UNESCO Convention on the Protection of the Underwater Cultural Heritage, which Portugal has ratified, we read that in situ conservation should be a priority, that public access to sites should be encouraged, and that, among other measures, adequate divulgation must be implemented. In this context, we intend to implement a project with the following main goals; inventory, identification, study and protection of underwater cultural heritage with the creation of itineraries and archaeological reserves, in the area of Peniche and Berlengas archipelago, a clear commitment to the concept that, to manage we need to study. SS Primavera, SS Andrios and SS Dago are paradigmatic examples of that potential and what we intend to implement in this project

INTRODUÇÃO A presente proposta de projeto é mesmo isso, ainda uma proposta, uma proposta do Instituto de Arqueologia e Paleociências das Universidades Nova de Lisboa e do Algarve. Esta proposta de projeto surge na sequência da Formação Teórico-Prática em Arqueologia Náutica e Subaquática, realizada pela ALT – Sociedade de História Natural, em Torres Vedras e Peniche, nos passados dias 9 de 10 de Julho do corrente, ministrada por Alexandre Monteiro, investigador daquele Instituto. Pretende ser uma visão para o património submerso local, extremamente diversificado na cronologia, na acessibilidade, no estado de conservação, no contexto, e nas pressões que sobre ele exerce a intensa indústria local de mergulho recreativo e técnico. Deste modo, entendemos que apenas um conhecimento profundo e alargado destas variáveis, permitirá desenhar um modelo, ou modelos, de gestão patrimonial, que congregue a proteção, valorização, mas também a fruição racional e sustentável deste património. A pressão provocada pelas visitas muito frequentes no património até aos -30m, menos frequentes em profundidades maiores, mas ainda assim, existente, será

I C O N G R E S S O D E H I S T Ó R I A E PAT R I M Ó N I O D A A LTA E S T R E M A D U R A

ARQUEOLOGIA

92

sempre uma realidade. Cabe pois à gestão do património assumi-la, compreende-la, contextualiza-la, mas torna-la uma mais-valia. Entendemos que, é na fruição e envolvimento ativo dos vetores de pressão sobre o património, que pode estar a chave para o sucesso de um modelo de gestão do património submerso.

O CONTEXTO GEOGRÁFICO A posição central de Peniche, as características únicas do arquipélago das Berlengas e dos ilhéus dos Farilhões, a existência de inúmeros destroços de navios de fácil acessibilidade, faz desta localidade um destino privilegiado para os amantes do mergulho recreativo de todo o país. Começam já a verificar-se igualmente, visitas frequentes de mergulhadores estrangeiros, nomeadamente provenientes do centro de Espanha1, fruto da melhoria significativa das vias de acesso rodoviário e aos esforços de promoção dos operadores locais perante aquele mercado. Isto implica, que o património cultural submerso local seja visitado com uma frequência muito significativa, por vários milhares de pessoas por cada ano. Na realidade, um olhar geral sobre a posição e especificidade geográfica da península de Peniche e suas ilhas adjacentes, permite facilmente compreender como este local possui um conjunto tão alargado de navios afundados, de todas as cronologias, desde a antiguidade até ao presente século XXI.

1 Possivelmente, Peniche é um dos locais para a prática do mergulho mais acessíveis para aqueles

Se Peniche constituiu sempre um sério obstáculo à navegação, a Ilha da Berlenga sempre constituiu um magnífico ancoradouro, ainda que, o seu arquipélago onde se incluem os Farilhões e as Estelas, tenham desde sempre contribuído para perda de inúmeros navios. A existência de obstáculos submersos, “Baixas” como o “Rinchão”, constituem autenticas armadilhas e potenciam a perigosidade do arquipélago. Exemplo paradigmático é a “Bailadeira”, uma zona a noroeste dos Farilhões, localmente designada de “cemitério dos navios” onde conhecemos pelo menos 16 navios ali afundados, estes que foram alvo da intensa atividade de salvados, que em Peniche se desenvolveu nomeadamente entre os anos 40 e 70 do século XX, por empresas do Algarve2.

2 Segundo o testemunho do Sr. João “Mergulhador”, um dos mergulhadores envolvidos naquelas atividades, residente em Peniche

I C O N G R E S S O D E H I S T Ó R I A E PAT R I M Ó N I O D A A LTA E S T R E M A D U R A

ARQUEOLOGIA

93

OS NÚMEROS Num simples e não exaustivo exercício de sistematização de informação, os autores e os arqueólogos náuticos Alexandre Monteiro e Sérgio Pinheiro, compilaram registos de cerca de 288 ocorrências3 na área de Peniche, entre os anos 1589 e 1985. Note-se que estes registos não resultaram de uma organizada e metodologicamente planeada investigação documental com este propósito. Este facto faz-nos acreditar que, quando isso for realizado, no quadro do futuro projeto de investigação cuja proposta esboçamos aqui, o número de ocorrências será muito incrementada. Destas 288 ocorrências: 2 referem-se ao século XVI; 13 ao século XVII; 28 ao século XVIII; 63 ao século XIX; 175 ao século XX, e apenas 7 de cronologia desconhecida. No que respeita aos locais, destas 288 ocorrências na área de Peniche: 150 são junto à localidade4; 71 na área da Berlenga5; e 67 em local desconhecido até ao momento.

CONCEITOS BASE Qualificar e Valorizar as condições de conhecimento do Património Cultural Subaquático Conhecer para consolidar a identidade, diversificar o turismo e cumprir as obrigações legais e internacionais - Para Gerir é necessário Conhecer; Salvaguardar o Património Cultural Subaquático Este, enquanto recurso finito, frágil e não renovável; 3 Não se incluíram os achados fortuitos, muito numerosos no que se refere ao fundeadouro da Berlenga, nem locais como os Cortiçais, a Sul da Península de Peniche 4 Aglomeraram-se as ocorrências cujo local foi indicado como sendo dentro dos limites do Concelho de Peniche), mas não nas Berlengas, Farilhões, Estelas, ou suas imediações

Promover o binómio Património/Educação Património como elemento formativo e como elemento privilegiado de diálogo com o meio;

5 Aglomeraram-se as ocorrências cujo local indicado se referia às Berlengas, Farilhões, Estelas, ou suas imediações

Estimular o envolvimento e a participação dos cidadãos na salvaguarda do Património Cultural Subaquático Fator de identidade e elevação da autoestima, de cidadania e de envolvimento

I C O N G R E S S O D E H I S T Ó R I A E PAT R I M Ó N I O D A A LTA E S T R E M A D U R A

ARQUEOLOGIA

94

no desenvolvimento sustentável dos territórios e das comunidades; criação de programas e de ações educativas e formativas - education & training; Incentivar as ações de valorização do Património Cultural Subaquático no âmbito de pequenos projetos de investigação académica Programas e ações de salvaguarda, conhecimento e valorização dos bens culturais de natureza arqueológica - Escola de Arqueologia Subaquática; Gerir a informação histórico-arqueológica relativa ao Património Cultural Subaquático, capitalizando os meios já existentes e os dados já recolhidos Programas e ações de investigação, registo, documentação - archiving & preserving; Elaborar itinerários turístico-culturais Promover a respetiva divulgação;

Note-se que, nos princípios base da presente proposta de projeto, que são também eles objetivos, mais não fizemos que elencar o predisposto na Convenção para a Proteção do Património Cultural Subaquático da UNESCO, que Portugal ratificou.

Três exemplos paradigmáticos de destroços em Peniche: SS Primavera Este navio foi o alvo da componente prática da Formação Teórico-Prática em Arqueologia Náutica e Subaquática anteriormente citada. A -22 m, está ao alcance de qualquer mergulhador recreativo com certificação avançada e é um dos destroços mais visitados do país. Navio construído em ferro no ano de 1878 em Glasgow, pela construtora naval Alexandre Stephen & Sons, foi lançado como SS Clan Fraser6, propriedade da então jovem companhia de navegação Cayzer, Irvine & Co. de Liverpool. 6 Middlemiss, N. L., Gathering of The Clans, página 52

I C O N G R E S S O D E H I S T Ó R I A E PAT R I M Ó N I O D A A LTA E S T R E M A D U R A

ARQUEOLOGIA

95

Partiu de Palermo com destino a Antuérpia e Roterdão no dia 17 de Outubro de 1902. Transportava carga diversa, entra a qual cânhamo, Almagre, asfalto, cortiça, chá, e cerca de 2.000 m3 de mármore. Quando se encontrava a cerca de 14 milhas a Norte da Berlenga, no dia 28, foi detetado fogo na carga e o comandante decidiu fundear naquela ilha para tentar controlar o incêndio. Não tendo sido possível apagar o fogo, o navio perdeu-se e ainda hoje se podem observar os grandes blocos do seu mármore, por entre os destroços muito incaracterísticos, facto a que não foi alheia a intensa atividade de salvados a que foi sujeito7. De muito reduzida sensibilidade arqueológica, é um caso singular de adequação à realização de ações de formação como aquela que referimos, e de ações futuras no âmbito das escolas de arqueologia subaquática, que julgamos fazerem todo o sentido ali. Ainda que seja um dos destroços do continente nacional mais visitados, a sua história apenas é conhecida superficialmente e nenhum levantamento arqueográfico foi, efetivamente, ali levado a cabo.

SS Andrios – O “Vapor do Trigo” Outro dos destroços mais visitados. Mais profundo, cerca de -25/-27 m, possui um conjunto imponente de três caldeiras do tipo Scotch Boiler e restos da sua estrutura. De pavilhão Grego quando naufragou em 20 de Novembro de 1926, foi lançado como SS Liddesdale em 19018.

7 Segundo o testemunho do Sr. João “Mergulhador”, um dos mergulhadores envolvidos naquelas atividades, residente em Peniche, e referências na monografia Berlengas: A História e as estórias, de Reiner, Francisco, et all 8 Lloyds Register of Shipping

Um outro exemplo de sensibilidade arqueológica muito reduzida, e, um belíssimo local para o desenvolvimento de problemáticas arqueográficas de profundidade, pois ainda que não muito profundo, no quadro do que se convenciona como profundo (mais de 30m), o limite não descompressivo, mesmo com a utilização9 de gases enriquecidos com oxigénio, possui contornos técnicos desafiantes, mas que, mais cedo ou mais tarde, terão que ser equacionados no quadro da prática da arqueologia subaquática nacional, de forma corrente, mais que pontual.

9 Carece de certificação específica

I C O N G R E S S O D E H I S T Ó R I A E PAT R I M Ó N I O D A A LTA E S T R E M A D U R A

ARQUEOLOGIA

96

SS Dago Provavelmente o destroço mais visitado no continente nacional no âmbito do mergulho técnico10. Tal como os anteriores, a sua história apenas é conhecida pela maioria, de forma muito superficial11. Construído em Dundee em 1902, foi propriedade daquela que se tornaria a maior companhia de navegação privada do mundo de então, a Wilson Line, posteriormente Ellerman Wilson Line. Constitui um interessante caso no quadro da II Grande Guerra e da política externa nacional, já que foi afundado por um bombardeiro de longo alcance Alemão12, um Focke-Wulf 200 Condor das bases de Merignac em França13, em 15 de Março de 1942. Por se encontrar a -50m de profundidade, é um caso paradigmático do emprego e ensaio de técnicas arqueográficas no âmbito do mergulho técnico, que a verificarem-se, constituem o caso mais profundo da arqueologia subaquática nacional.

CONCLUSÃO Peniche, não sendo caso único, é caso singular no que respeita à quantidade, qualidade e diversidade do seu património cultural submerso.

10 Por convenção e de acordo com a legislação nacional do mergulho recreativo, mergulho técnico é aquele realizado abaixo dos -30m de profundidade 11 Os autores, desenvolvem há vários anos, em colaboração com outros (ex. Xplorasub), uma intensa investigação historiográfica em torno deste navio e da sua perda, tendo realizado inúmeras ações de divulgação pública 12 Harrower, John, Wilson Line, 1998 13 Informação dada aos autores pelo historiador e escritor sobre assuntos da Luftwaffe, Chris Goss 14 São recorrentes os exemplos de mergulhadores que trazem consigo materiais dos destroços, em forma de lembrança

I C O N G R E S S O D E H I S T Ó R I A E PAT R I M Ó N I O D A A LTA E S T R E M A D U R A

Este património é visitado, de forma também ela singular, no panorama nacional, quer pela intensidade, quer pela proveniência diversificada dos seus visitantes. Esta intensa visita, fruição, como preferimos chamar-lhe, exerce naturalmente uma considerável pressão sobre este património submerso, em alguns casos com contornos pouco racionais e bastante destrutivos14. É por conseguinte, urgente e necessário inverter esta realidade. A título de mero exemplo, até hoje não foi possível congregar as diversas entidades implicadas neste tema: Operadores de mergulho, Edilidade, Reserva Natural; Marinha, etc., para a simples colocação de pontos de amarração fixos, que permitam fundear em segurança e não danificar os destroços, já que estas embarcações fixam as suas “âncoras”, precisamente nas estruturas dos destroços, o que a maioria das vezes os danifica. Não obstante a procura deste património, este está muito superficialmente estudado, sendo que, ao que sabemos, nenhum projeto com objetivo alargado de

ARQUEOLOGIA

97

inventariação, estudo, salvaguarda e fruição racional e sustentável, foi alguma vez iniciado ali. É também verdade que, um projeto desta natureza permite o lançamento de pequenos projetos de arqueologia subaquática, destinados a jovens investigadores, recém-licenciados e até a alunos, o que constitui uma oportunidade de contornos e implicações que se projetam no futuro de médio e longo prazo. A existência de uma unidade de ensino universitário e politécnico em Peniche, abre o horizonte à multidisciplinaridade, nomeadamente no quer se refere às ciências do mar e ao turismo. Por fim, note-se que a importância do património arqueológico é cabalmente reconhecido, no incentivo que a União Europeia faz à criação de projetos de turismo orientado para o património cultural, apenas para dar um exemplo, pois os programas de financiamento da EU, nesta temática, multiplicam-se. A EU considera que o património cultural pode ser a chave diferenciadora do Turismo Europeu e considera isso, a chave para o sucesso do futuro do Turismo, se não vejamos o seguinte excerto15: “Trans-national cooperation projects on European Cultural Routes16   (…)In order to maintain Europe’s leadership in the world tourism industry there is a need to modernize the European tourism policy and offer. Diversifying our tourism products, capitalizing on our common and rich heritage (natural, cultural, historical, etc.), is the first of the key priorities identified to boost the competitiveness of the European tourism industry (…) (…) cultural heritage represents a European competitive advantage and cultural tourism couldn‘t be other than the most appropriate starting point for differentiating our tourism offer.

15 Este programa Europeu pode ser consultado em ttp://ec.europa.eu/enterprise/ newsroom/cf/itemlongdetail.cfm?item_id=5339 16 O presente projeto faz parte de uma candidatura, a HERITUR-SUBARCH Innovative technologies for heritage interpretation, public management and sustainable tourism development in underwater and coastal archaeological sites, já pré-selecionado pela UE de um lote de 6 finalistas

I C O N G R E S S O D E H I S T Ó R I A E PAT R I M Ó N I O D A A LTA E S T R E M A D U R A

Deste modo, acreditamos que é urgente a materialização desta proposta de projeto, para que, por fim, se inventarie, estude e se adote medidas de salvaguarda, divulgação e fruição racional e sustentável, do conjunto do património cultural subaquático de Peniche.

ARQUEOLOGIA

98

BIBLIOGRAFIA

HARROWER, John, Wilson Line – The history and fleet of Thos. Wilson, Sons & Con. And Ellerman’s Wilson Line Ltd., The World Ship Society, Gravesend, Kent, GB, 1998 Lloyds Register of Shipping, 1901-1902, LIB-LIG, Lloyds, 1902 MIDDLEMISS, N. L., Gathering of The Clans – History of The Clan Line Steamers, Ltd., Shield Publications, Ltd., Newcastle Upon Tyne, GB, 1988 REINER, Francisco, et all, Berlengas: A História e as estórias, Intremezzo – Audiovisuais, Lisboa, 2002

I C O N G R E S S O D E H I S T Ó R I A E PAT R I M Ó N I O D A A LTA E S T R E M A D U R A

ARQUEOLOGIA

99

I C O N G R E S S O D E H I S T Ó R I A E PAT R I M Ó N I O D A A LTA E S T R E M A D U R A

PAT R I M Ó N I O N AT U R A L E C U LT U R A L

638

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.