Sânscrito em sânscrito: panorama das referências à linguagem verbal nos textos sânscritos antigos

June 19, 2017 | Autor: J. Gonçalves | Categoria: Languages and Linguistics, Sanskrit language and literature, Tantra, Kashmir Shaivism
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LÍNGUAS ANTIGAS E LINGUÍSTICA HISTÓRICA - DL - FFLCH - USP (18 e 19 de novembro de 2015)

Sânscrito em sânscrito: panorama das referências à linguagem verbal nos textos sânscritos antigos Prof. Dr. João Carlos B. Gonçalves

A Índia parece ser, de fato, de todos os países do mundo, um dos - ou mesmo o - que melhor exemplifica uma tradição remota e contínua de especulações sobre a Palavra; de elaborações, e, portanto, experiências, de mitos em que a Palavra primordial, a Linguagem, exerce uma função vital; as especulações sobre a potência cosmogônica ou o papel mágico de certas formas da Palavra; de reflexões sobre o valor e a natureza da linguagem, junto com a elaboração, desde um passado longínquo, de fonética e gramática. Ela é a terra onde a gramática foi tão longe a ponto de ser considerada um dos darśanas - "visões" do mundo, os quais são ao mesmo tempo caminhos para a salvação - uma vez que ajudam a preservar e a compreender a revelação primeira que dá forma à Verdade plena e é posta sob a condição de fórmulas sagradas (mantras), prenhe de enigmas e correlações, os quais expressam - e por meio do qual ele se expressa - brahman, que é tanto a Realidade transcendente como a Palavra suprema. Por fim, a Índia é um país onde, por longa data, uma teologia linguística se desenvolveu, cujos elementos são rastreados, no curso de seu tempo, em grande parte dos sistemas de pensamento que lá surgiram. (PADOUX, André. Vāc: The Concept of the Word in Selected Hindu Tantras)

- Breve roteiro sânscrito da percepção da palavra/linguagem/som no contexto cosmológico Entre XII e IX a.C. Ó Bṛhaspati, tal foi a gênese da palavra: os sábios, olhando à volta, nomes deram [às coisas]. Por obra de sua devoção, revelaram-se, [das coisas,] o cerne, o mérito, o segredo. Os sábios, purificando [o pensamento], como à farinha, por meio do crivo, a palavra criaram, graças à inspiração - assim os amigos reconheceram da amizade a marca. Um sinal propício - esse o sinete do nome. Na vereda da palavra seguiram eles, por obra do rito, e entre os poetas descobriram seu refúgio. Tomando-a, estes por toda parte a semearam. Os cantores, sete, numa só voz, a exaltam. A palavra, nunca a viu o homem que tem olhos. A palavra, nunca a ouviu o homem que tem orelhas. Para estes, como fruta, ela o corpo abriu, qual esposa, de belo ornato para o marido (...). Ṛg-veda 10.71 (trad. Mário Ferreira, 2011, p. 29) yāvad brahma viṣṭhitaṃ tāvatī vāk | Ṛg-veda, 10.114-8 Por onde brahman (Absoluto) se estende, vāc (a Palavra) também se estende. iyaṃ yā parameṣṭhinī vāg devī brahma-saṃśitā | Atharva-veda 19.9-3 A suprema vāc, a deusa inspirada por brahman (...).

cerca de VIII a.C.: brahma vai vāk | Aitareya-brāhmaṇa, 4.21-1 Brahman é de fato a palavra. sarve svarā indrasyātmānaḥ sarva uṣmāṇaḥ prajāpater ātmānaḥ sarve sparśā mṛtyor ātmānaḥ (...) | Chāndogya-upaniṣad, 2.22-3 Todas as vogais são corpo de Indra, todas as sibilantes são corpo de Prajāpati e todas as oclusivas são corpo de Mṛtyu. V d.C.: anādinidhanam brahma śabdatattvaṃ yad akṣaram | vivartate 'rthabhāvena prakriyā jagato yataḥ || Vākya-padīya (Bhartṛhari) 1.1 O Brahman sem começo nem fim, essência da palavra, indelével, que se expande em sentido, a partir do qual a formação do universo. (trad. de Adriano Aprigliano). cerca de VIII d.C.: dhvani-rūpo yadā sphoṭas tv.adṛṣṭāc śiva-vigrahāt || prasaraty.ativegena dhvanināpūrayañ jagat | sa nādo deva-deveśaḥ proktaś caiva sadāśivaḥ || Netra-tantra, 21.61-63 Quando sphoṭa, sob a forma de som (dhvani), a partir de uma derivação invisível de Śiva, de forma imediata, difunde-se, preenchendo o mundo, por meio do som (dhvani), ele é tratado como o Som (nāda), deus de todos os deuses, o Śiva inato. X ou XI d.C.: sphuṭati abhivyajyate asmād viśvaḥ śabda-grāmaḥ iti sphoṭaḥ sabda-brahma, ata eva dhvani-rūpaḥ śabdana-svabhāvaḥ | comentário de Kṣemarāja ao NT 21.61 Sphoṭa é brahman sob a forma de śabda (som/palavra), pois sphuṭati, isto é, manifestar-se, é aparecer - por isso, diz-se que "o todo é composto de śabda (som/palavra)". Segue que "sob a forma de som (dhvani)" é ter por essência o ato sonoro (śabdana).

BIBLIOGRAFIA BHARTṚHARI. Da Palavra [Vākyapadīya] - livro I, Suma da tradição. São Paulo, Editora Unesp, 2014. (trad. Adriano Aprigliano). FERREIRA, Mário. A concepção da linguagem na poesia arcaica da Índia Antiga. João Pessoa, Editora Universitária UFPB, 2011. PADOUX, André. Vāc - The Concept of the Word In Selected Hindu Tantras. Delhi, Satguru Publications, 1992.

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