São Paulo No Contexto Do Sistema Mundial De Cidades

June 2, 2017 | Autor: Eduardo Marques | Categoria: Global cities, São Paulo, Cidades globais
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SÃO PAULO NO CONTEXTO DO SISTEMA MUNDIAL DE CIDADES Eduardo Marques e Haroldo Torres

RESUMO

O artigo discute a recente transformação socioeconômica da cidade de São Paulo, dialogando com a literatura internacional sobre a reestruturação dos espaços urbanos e a concentração de atividades de comando da economia mundial nas chamadas "cidades globais". Sustenta que os processos vividos pela metrópole paulista ocorrem em paralelo aos verificados nas cidades mundiais, mas, pelo menos até recentemente, suas dinâmicas têm outra origem e aquele quadro conceitual nem sempre pode ser traduzido para São Paulo de modo direto. As transformações econômicas dos últimos anos, entretanto, podem ter começado a concentrar atividades de comando regionais mais amplas na metrópole paulista. Palavras-chave: cidade de São Paulo; metrópoles; cidades globais. SUMMARY

Establishing a dialogue with the international literature on the restructuring of urban spaces and the concentration of economic decisions in the so-called "global cities", this article discusses recent socioeconomic changes occurring in São Paulo. The authors hold that the processes experienced by this metropolis have taken place in a manner parallel to those affecting other cities in the world, but at least until recently, their dynamic derives from a different origin and, thus, the same conceptual framework cannot always be directly applied to São Paulo. Economic transformations taking place in recent years, however, may have contributed to the concentration of activities within São Paulo making it a center commanding over a broader region. Keywords: São Paulo; metropolitan areas; global cities.

D e a c o r d o c o m a Divisão d e P o p u l a ç ã o d a O N U , e m 1995 São P a u l o teria a l c a n ç a d o o s e g u n d o lugar e n t r e a s m a i o r e s c i d a d e s d o m u n d o e m termos p o p u l a c i o n a i s , c o m 16,4 m i l h õ e s de habitantes 1 . Esse c o n t i n g e n t e a colocava atrás a p e n a s de T ó q u i o (26,8 m i l h õ e s ) e na frente de N o v a Y o r k (16,3 m i l h õ e s ) e da C i d a d e do M é x i c o (15,6 m i l h õ e s ) (UNFPA, 1994). Essa p o p u l a ç ã o e r a s u p e r i o r à s d e p a í s e s inteiros, c o m o C u b a (11 m i l h õ e s ) , Chile (14,2 m i l h õ e s ) , Grécia (10,5 m i l h õ e s ) e Z i m b á b u e (11,3 m i l h õ e s ) . A p e s a r do seu p o r t e e i m p o r t â n c i a , p o r é m , p o u c a i n f o r m a ç ã o a r e s p e i t o da m e t r ó p o l e paulista p o d e ser e n c o n t r a d a n a literatura internacional d e e s t u d o s u r b a n o s , e s p e c i a l m e n t e e n t r e o s a u t o r e s q u e d i s c u t e m a s d i n â m i c a s socioespaciais recentes. Na literatura brasileira s o b r e e s p a ç o e c i d a d e , ao contrário, há g r a n d e q u a n t i d a d e d e i n f o r m a ç õ e s e análises d e q u a l i d a d e s o b r e São P a u l o , MARÇO DE 2000

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(1) Em 1996, de acordo com a Contagem Populacional do IBGE, São Paulo atingiu 16,6 milhões de habitantes.

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sem no entanto assegurar um diálogo direto e claro c o m essa literatura internacional, n ã o obstante os inúmeros trabalhos q u e utilizam conceitos produzidos pela literatura estrangeira, tais c o m o "reestruturação espacial", "pós-fordismo" e "cidades globais". Esta falta de informações (na literatura estrangeira) e de diálogo conceitual ( p o r parte da literatura nacional) acaba afetando a reflexão nacional e internacional acerca do papel de São Paulo no sistema mundial de cidades. De um lado, graças à sua participação na economia brasileira, alguns analistas t o m a m c o m o d a d o apriorístico a importância de São Paulo e lhe atribuem títulos ad hoc tais c o m o "centro global periférico" (Friedmann, 1986), e n q u a n t o outros simplesmente a ignoram, m e s m o q u a n d o buscam discutir o sistema de cidades da América Latina e do Caribe (Nijman, 1996). De outro lado, a rica literatura nacional sobre o e s p a ç o paulistano parece, c o m raras exceções, d e s c o n h e c e r o d e b a t e internacional, analisando os m e s m o s objetos empíricos sem mencionar a significativa produção internacional sobre globalização e sistema mundial de cidades (Santos, 1994), e n q u a n t o outros autores traçam paralelos entre as transformações brasileiras e as dinâmicas internacionais s e m considerar q u e conteúdos iguais p o d e m ser produzidos p o r processos inteiramente diferentes (Ribeiro, 1996; Preteceille e Ribeiro, 1999), em especial no p e r í o d o anterior à recente abertura da economia brasileira. T e n t a n d o reduzir essa lacuna, este artigo apresenta informações sobre a dinâmica socioeconômica recente da cidade de São Paulo, dialog a n d o c o m a literatura internacional. Longe de ser mera q u e s t ã o de nomenclatura ou utilização de conceitos exóticos, trata-se de buscar estabelecer as bases para um d e b a t e conceitualmente sólido e b e m fundamentado empiricamente a respeito dos novos c o n t e ú d o s da m e t r ó p o le paulista e do significado de suas ligações c o m a economia mundial. Vale dizer q u e esta tarefa é distinta dos estudos das transformações recentes n o s espaços metropolitanos c o m o os de Bógus e Taschner (1999) e Bógus e Ribeiro (1999), assim c o m o da análise, c o m objetivos normativos, do desenvolvimento de iniciativas de políticas do tipo "planejamento estratégico", c o m o defendido p o r Castells e Borja (1996) e criticado p o r C o m p a n s (1999), Sanchez (1999) e Vainer (1999). A discussão dessas dinâmicas é relevante, no primeiro caso, em face de transformações intra-urbanas q u e t e n d e m a alterar significativamente o tecido u r b a n o e, no s e g u n d o , em face de planos e projetos estratégicos em algumas cidades brasileiras, c o m o é o caso do projeto de r e n o v a ç ã o da avenida do Estado, desenvolvido pela prefeitura de Santo André, para n ã o citar Curitiba, paradigma do city marketing no país. Entretanto, os profundos processos de transformação na rede q u e liga as principais cidades do m u n d o são um f e n ô m e n o concreto, diverso dos seus possíveis rebatimentos espaciais e das posturas q u e possam ser assumidas pelas administrações locais, trazendo conseqüências importantes para as cidades envolvidas e suas p o p u l a ç õ e s . A sua c o m p r e e n s ã o e a p r o p r i a d o e n q u a d r a m e n t o conceitual representam a tarefa analítica para a qual o presente artigo p r e t e n d e contribuir.

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EDUARDO MARQUES E HAROLDO TORRES Iniciamos nossa discussão p o r u m a rápida apresentação da literatura internacional sobre as recentes transformações socioeconômicas das grandes cidades e pela análise do p a p e l atribuído pela literatura a cidades c o m o São Paulo n a q u e l e sistema. Em seguida, exploramos informações sobre as dinâmicas recentes observadas em São Paulo, c o m especial atenção aos processos ocorridos na s e g u n d a m e t a d e da década de 1990. Ao final, discutimos os processos e as perspectivas q u e a abertura da economia brasileira tem c o l o c a d o para a cidade, e até q u e p o n t o é de se esperar q u e esta concentre funções de c o m a n d o regionais ou mundiais mais amplas.

Globalização e cidades globais: o debate internacional

Desde o início d o s a n o s 1960 a economia e a sociedade mundiais têm sofrido transformações de g r a n d e magnitude. Em contextos muito diferentes, a palavra "globalização" tem sido usada em relação a u m a grande variedade de processos, d e s d e m u d a n ç a s culturais até transformações econômicas e políticas. Em q u a s e todas as dimensões da vida social essas mudanças trouxeram de volta a sensação da velocidade e da fluidez q u e caracterizara, no século XIX, a constituição de um n o v o m u n d o no qual, para retomar a célebre expressão de Marx e Engels, "tudo o q u e é sólido desmancha no ar". A "nova era" p a r e c e ser caracterizada p e l o fortalecimento de culturas locais e etnicidades na construção de um mosaico global. Ao m e s m o tempo, a cultura global é cada vez mais influente e hegemônica sobre aquelas formas de vida localizadas. Diferenciação e h o m o g e n e i z a ç ã o parecem ser faces diferentes das m e s m a s transformações culturais em curso, c o m o d e s t a c a d o p o r Featherstone (1990). A geografia de p o d e r estruturada durante a Guerra Fria t a m b é m se desmanchou no ar, n ã o a p e n a s m u d a n d o as relações entre países, mas também alargando o conjunto de alternativas presentes para regiões inteiras (Carnoy e outros, 1994). Com a q u e b r a do alinhamento automático das relações internacionais, as ciências sociais foram libertadas das estreitas posições ideológicas d o s a n o s 1970, s e n d o os anos 1980 marcados pelo diálogo e convergência entre paradigmas e disciplinas (Giddens, 1984; White, 1992). Ao m e s m o t e m p o , a geografia e a economia de cada lugar no planeta parecem estar mais atadas do q u e n u n c a aos fluxos internacionais de pessoas, dinheiro e mercadorias. Sob as revoluções dos c o m p u t a d o r e s e da informática, entre outras, o m u n d o das empresas t a m b é m m u d o u , redefinindo a organização do chão-da-fábrica, a c o m p o s i ç ã o da força de trabalho, os padrões de relação entre e intra empresas, assim c o m o as estratégias de marketing e localização. Esses processos são analisados p o r u m a vasta literatura (Reich, 1992; Piccioto, 1991; Leborgne e Lipietz, 1990; Graham e Simon, 1996).

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SÃO PAULO NO CONTEXTO DO SISTEMA MUNDIAL DE CIDADES Nesta realidade a i n d a e m construção, Estados nacionais p e r d e m parte de seu p o d e r c o m a crescente m o b i l i d a d e de e m p r e s a s , fábricas e especialm e n t e ativos financeiros. Entretanto, l o n g e de estar m o r r e n d o , os Estados se diversificam, p a r a utilizar a feliz e x p r e s s ã o c u n h a d a p o r M a n n (1993). N o v o s blocos regionais estão s o b construção, e ao m e n o s três deles estão consolid a d o s : a E u r o p a e sua r e c e n t e m e n t e p r o d u z i d a periferia do Leste, o Leste e Sudoeste da Ásia e a América do Norte. Na América do Sul, o Mercosul está s e n d o estruturado, a p e s a r da incerteza s o b r e o seu futuro. Esses p r o c e s s o s e t e n d ê n c i a s t ê m sido objeto de intenso e s t u d o pelas ciências sociais. D e s d e Wallerstein (1979) discute-se a idéia de q u e as diferentes e c o n o m i a s n a c i o n a i s e s t ã o s e c o n e c t a n d o c a d a vez mais, f o r m a n d o u m a e c o n o m i a - m u n d o . T r a b a l h o s c o m o o s d e Arrighi (1994), C h a s e - D u n n (1985), A b u - L u g h o d (1989) e Wallerstein (1995) t ê m a v a n ç a d o a a r g u m e n t a ç ã o , a n a l i s a n d o a e m e r g ê n c i a histórica d e s s a e c o n o m i a - m u n d o e enfatizando a c o n t i n u i d a d e e os a s p e c t o s de l o n g o c u r s o do p r o c e s s o de globalização. O u t r o s a u t o r e s , c o m o Castells (1989 e 1996) e Sassen (1991 e 1994), t ê m o b s e r v a d o o s p a d r õ e s r e c e n t e s d e m u d a n ç a , a s características d a n o v a s o c i e d a d e em f o r m a ç ã o e e s p e c i a l m e n t e os fluxos de i n f o r m a ç ã o nessa n o v a "ordem". E m b o r a a s s u m i n d o q u e esta n o v a s o c i e d a d e n a s c e d o interior da s o c i e d a d e capitalista d o s a n o s 1960 e 1970, essa c o r r e n t e t e m e n f o c a d o p r i n c i p a l m e n t e a r u p t u r a c o m os antigos p a d r õ e s de vida social e de atividade e c o n ô m i c a . Em um nível m e n o s sistêmico, extensa literatura t e m analisado as transformações n o s p a d r õ e s espaciais d e distribuição d e atividades e c o n ô micas e g r u p o s sociais t a n t o em â m b i t o nacional c o m o internacional ( B e n k o e Lipietz, 1992; Markusen, Hall e Glasmeier, 1986), d e m o n s t r a n d o c o m o as novas formas de o r g a n i z a ç ã o da p r o d u ç ã o e as n o v a s tecnologias t ê m p r o m o v i d o u m a m i g r a ç ã o d e atividades d e regiões tradicionalmente industriais p a r a n o v a s áreas, s e n d o o e x e m p l o paradigmático o d e s l o c a m e n t o da indústria do N o r d e s t e d o s Estados Unidos (frostbelt) para o S u d o e s t e (sunbelt). De forma c o m p l e m e n t a r , e s t u d o s c o m o o de G r a h a m e Marvin (1996) analisaram o i m p a c t o d a s transformações nas t e l e c o m u n i c a ç õ e s no m u n d o d o s n e g ó c i o s e na constituição dessa n o v a o r d e m territorial. Diversos t r a b a l h o s t ê m t e n t a d o analisar a vida e a cultura u r b a n a s da n o v a o r d e m . Esse g r u p o d e e s t u d o s inclui análises gerais s o b r e a l g u m a s cidades (Davis, 1993) assim c o m o investigações s o b r e a s p e c t o s particulares de e s p a ç o s específicos (Sorkin, 1992; Soja, 1987, 1992a e 1996; J u d d , 1995; Davis, 1992). O t e m a principal d e s s e s autores, m e s m o q u e a l g u m a s v e z e s n ã o explícito, é a m u d a n ç a da vida u r b a n a , a destruição d o s e s p a ç o s públicos e a e m e r g ê n c i a de n o v a s formas de sociabilidade. Nessas análises, os autores t ê m e n c o n t r a d o p a d r õ e s inusitados de "gentrificação" e segregação socioespaciais, j u n t a m e n t e c o m a r e p r o d u ç ã o artificial da vida u r b a n a em e s p a ç o s privatizados isolados e c o n t r o l a d o s , c o m o os c o n d o m í n i o s fechados, os shopping centers e p a r q u e s temáticos. Outros a u t o r e s q u e t a m b é m t ê m a n a l i s a d o a vida u r b a n a e a segregação e n f o c a m a s n o v a s formas d e p o b r e z a e n o v o s tipos d e g u e t o s

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EDUARDO MARQUES E HAROLDO TORRES urbanos q u e estariam surgindo nas mais importantes cidades do sistema mundial 2 . Há forte polêmica sobre o a r g u m e n t o de Wilson (1990) de q u e esta nova p o b r e z a estaria associada à formação de u m a subclasse — c o m marcadas características étnicas — nas maiores cidades norte-americanas. Autores c o m o Massey e D e n t o n (1993) e Bullard e outros (1994) discordam do argumento de Wilson, mas todos p a r e c e m observar a elevação do nível de pobreza e de segregação racial e étnica, c o m u m a redução das possibilidades de mobilidade social e u m a cristalização dessas condições em áreas específicas e muito segregadas das cidades. Em u m a linha diferente de análise, outros autores têm enfocado a produção do e s p a ç o e os processos de decisão das políticas estatais nas mais importantes cidades do m u n d o . Fainstein (1994) e Fitch (1993), entre outros, analisaram a incorporação e a p r o d u ç ã o imobiliárias das áreas centrais de cidades c o m o Nova York e Londres, destacando o p a p e l e as estratégias da indústria imobiliária em tais iniciativas. Em u m a a b o r d a g e m até certo p o n t o próxima, Mollenkopf (1983 e 1992) e Smith (1988) analisaram a p r o d u ç ã o daqueles espaços, e m b o r a c o m ênfase nos aspectos políticos das coalizões pró-crescimento dos anos 1970 e das iniciativas de renovação u r b a n a dos anos 1980. De especial interesse para este artigo são as análises que, de m o d o mais sistêmico, têm u s a d o a idéia do sistema mundial para explorar a existência de u m a r e d e de cidades através da qual os mais importantes fluxos de informação, capital e recursos estariam circulando. As mais importantes decisões da e c o n o m i a mundial estariam s e n d o tomadas nesses lugares especiais, d e n o m i n a d o s "cidades globais" 3 . Este d e b a t e c o m e ç o u há mais de dez anos, c o m o artigo fundador de Friedman (1986), e tem c o n t i n u a d o p o r m e i o de u m a série de análises sobre a rede global de cidades. A primeira geração de estudos, q u e inclui os de Sassen (1987 e 199D, Mollenkopf e Castells (1991) e Abu-Lughod (1995), enfocou principalmente os aspectos e características das mais importantes cidades daquela rede. Tais análises mostraram q u e estes centros são caracterizados pela localização das sedes de grandes empresas multinacionais e p o r u m a presença desproporcional de serviços, graças n ã o a p e n a s ao aumento destas atividades, mas t a m b é m ao decréscimo de atividades e empregos industriais. Esses serviços seriam n ã o a p e n a s orientados ao consumidor, mas t a m b é m ao auxílio a atividades de negócios, constituindo um crescente setor de "serviços produtivos". Essa forma específica de terciário incluiria c o m especial destaque empresas de finanças, c o m p a n h i a s de seguros, a indústria imobiliária, empresas de advocacia, marketing e informática. A hipótese central é q u e essas cidades ofereceriam condições especiais para atividades de c o m a n d o de negócios. As inovações das telecomunicações e d o s c o m p u t a d o r e s teriam criado condições para q u e as empresas espalhassem suas redes e cadeias de p r o d u ç ã o p o r territórios tão vastos c o m o o planeta, c o m o Reich (1992) mostrou c o m muitos exemplos. Certas atividades de negócios, entretanto, continuariam necessitando da proximidade entre empresas, e n q u a n t o outras teriam fortes externalidades

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(2) De acordo com a Sociedade de Serviços de Nova York, 1/6 dos habitantes da cidade viviam, em 1995, em pobreza extrema, o que significava manter uma família de quatro pessoas com US$ 10.750 ou menos por ano. Mais que 100.000 dos empobrecidos não tinham lugar algum para morar e cerca de 7.300 famílias estavam em abrigos no estado, das quais 5.700 na cidade de Nova York. A cidade também abrigava mais de 6.800 adultos sozinhos, mais do que 90% dos sem-teto (cf. The Economist, 22/04/95, p. 26).

(3) Esta categoria é a terceira de uma família que inclui "megacidades" e "cidades mundiais". A primeira se refere ao tamanho da população de acordo com a classificação da ONU das cidades com mais de 8 milhões de habitantes. A segunda é menos precisa, embora seja utilizada em alguns casos como um equivalente de "cidade global" (Feagin e Smith, 1987).

SÃO PAULO NO CONTEXTO DO SISTEMA MUNDIAL DE CIDADES espaciais. Nesses casos, as c i d a d e s globais seriam as preferidas p a r a a localização, o q u e as levaria a p o s i ç õ e s e p a p é i s de c o m a n d o na e c o n o m i a mundial. Esta literatura t a m b é m m o s t r o u u m a c r e s c e n t e dicotomia n o interior d a força d e trabalho, c o m c r e s c i m e n t o d a p r o p o r ç ã o d e p o s t o s d e t r a b a l h o de alta especialização e de baixa qualificação e forte p e r d a p a r a as p o s i ç õ e s intermediárias. A estrutura de r e n d i m e n t o s t a m b é m teria se t o r n a d o mais polarizada e c o n c e n t r a d a , c o m a u m e n t o d o s c o n t i n g e n t e s n o s estratos e x t r e m o s e d e c r é s c i m o no intermediário. De a c o r d o c o m esta literatura, a e c o n o m i a cotidiana d a s g r a n d e s c i d a d e s estaria c a d a vez mais d e p e n d e n t e d o c o n s u m o d o s profissionais d e alto nível e m p r e g a d o s n o s serviços produtivos e n a s atividades de c o m a n d o de n e g ó c i o s . Os n o v o s p a d r õ e s e e s p a ç o s residenciais d a s partes centrais d a s c i d a d e s seriam t a m b é m p r o d u zidos p a r a o c o n s u m o d a q u e l e s profissionais e estariam s e n d o r e i n v e n t a d o s pela indústria imobiliária ou p o r e m p r e s a s semipúblicas, criadas a partir de n o v a s coalizões políticas q u e a transformação e c o n ô m i c a e social d a s metrópoles engendraria. A descrição d a s características básicas do f e n ô m e n o , assim c o m o o status central de c i d a d e s globais atribuído a Nova York, Londres e T ó q u i o , são q u a s e um c o n s e n s o e n t r e os a u t o r e s desta literatura. Entretanto, a discordância a u m e n t a q u a n d o a análise diz respeito ao p a p e l de outras g r a n d e s c i d a d e s n e s t e sistema m u n d i a l . D e t a l h a m o s tal a r g u m e n t o a seguir.

Cidades globais de segunda ordem: algumas considerações metodológicas

De fato, esta literatura t e m tentado encontrar e caracterizar outras possíveis cidades globais, assim c o m o determinar os elos q u e as ligam àquela rede. Nesta s e g u n d a geração de estudos poderíamos incluir Friedmann (1995), Sassen (1994), Knox e Taylor (1995), Smith e Timberlake (1995), Portes e Stepick (1993), Shatkin (1998) e Godfrey e Zhou (1999). A idéia de cidades globais de segunda o r d e m n ã o é nova, estando presente n o s primeiros estudos sobre cidades globais, c o m o o artigo fundador de Friedmann (1986) 4 . Entretanto, somente agora um n ú m e r o substancial de estudos começa a aparecer. Este n o v o conjunto de trabalhos já parte de questões bem-definidas e de uma boa c o m p r e e n s ã o sobre a natureza dos processos de transformação q u e têm ocorrido nas cidades globais de primeira ordem. Vários d o s artigos incluídos em Knox e Taylor (1995), por exemplo, analisam o tema: Grasfoguel (1995) estudou as cidades do Caribe e suas relações c o m Miami, Simon (1995) analisou as cidades africanas ao sul do Saara, T o d d (1995) investigou Toronto. Shatkin (1998), por sua vez, analisou as características e conexões de P h n o m P e n h

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(4) Estas seriam mais parecidas com centros regionais, ligados às cidades globais de primeira ordem por fluxos de diversas naturezas. Os principais fluxos mundiais, entretanto, passariam por aquelas cidades até alcançar as de segunda ordem, caracterizadas por fluxos nacionais e regionais.

EDUARDO MARQUES E HAROLDO TORRES com a economia mundial. Outras análises enfocaram o sistema de cidades dos Estados Unidos e suas relações c o m as cidades globais daquele país (Warf e Erickson, 1996). Seguindo outra linha de análise, Keeling (1995) e Smith e Timberlake (1995) exploraram as relações entre cidades u s a n d o dados sobre transportes e fluxo de passageiros. Neste esforço, algumas importantes dificuldades metodológicas têm surgido. Vale a p e n a discuti-las mais detidamente, já q u e está presente o conhecido risco de se impor um m o d e l o geral a casos particulares, n ã o necessariamente adaptáveis àquele. No plano empírico, p o r exemplo, é sempre difícil separar os processos causados p o r forças locais daqueles realmente causados pelas recentes transformações globais. A história, os atores, as configurações espaciais e as instituições de cada lugar específico permeiam a m b o s os processos 5 . Embora importante, esta n ã o era u m a questão muito significativa no estudo das cidades globais de primeira ordem, pois suas ligações ao sistema mundial são muito evidentes e seus processos locais, p o r decorrência, são praticamente globais. No caso das cidades globais de s e g u n d a ordem, a necessidade de considerar os processos locais e a história da p r o d u ç ã o e transformação de cada lugar está muito mais presente. Há d u a s formas analíticas de tratar a questão. Na primeira, define-se um certo conjunto de atributos das cidades globais — desindustrialização, localização de sedes de e m p r e s a s multinacionais, a u m e n t o de serviços produtivos e m e r c a d o s financeiros, concentração de atividades de comando de negócios etc. — e checa-se se estão ou n ã o presentes em u m a cidade específica. P o d e m o s chamar esse p r o c e d i m e n t o de "análise d o s atributos" (Emirbayer, 1996). Não é difícil defender, p o r exemplo, q u e u m a cidade muito importante c o m o Nova York é global se conseguimos demonstrar que lá se concentra parte significativa do fluxo financeiro mundial — a atividade econômica fundamental na economia global dos anos 1990. Também n ã o é difícil sustentar a força de u m a certa cidade d e m o n s t r a n d o uma concentração especial de atividades de c o m a n d o de negócios. Este procedimento ao m e s m o t e m p o determina o p a p e l da cidade na rede mundial e soluciona o p r o b l e m a de se impor processos globais a lugares específicos, já q u e ao descrever os processos locais se está simultaneamente descrevendo a p r o d u ç ã o d o s atributos e a formação dos vínculos c o m o sistema mundial. No entanto, este m é t o d o cria a dificuldade de demonstrar os m o m e n t o s de ruptura histórica, de definir q u a n d o e o n d e acaba o velho e começa o n o v o 6 . A aplicação da análise de atributos se torna muito mais difícil c o m as cidades globais de s e g u n d a o r d e m . Estas n ã o a p e n a s n ã o concentram u m a parte tão significativa do p o d e r financeiro mundial, c o m o suas atividades de c o m a n d o e ligações c o m os fluxos globais são mais reduzidas. O q u e as torna globais é o seu p a p e l de "porteiros" ou "intermediadores" na r e d e mundial de cidades, c o n e c t a n d o regiões inteiras aos centros mundiais de comando de negócios ( q u e p o r sua vez se conectam entre si e c o m as demais cidades de s e g u n d a o r d e m ) . C o n s e q ü e n t e m e n t e , o estudo das

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(5) "Apesar de ser plausível que as funções características das cidades globais sejam acompanhadas pelas mudanças globais (localização de sedes de grandes empresas, papel de destaque no setor e nos serviços produtivos etc.), essas condições podem surgir onde funções de cidade global estão ausentes. Tais condições podem ocorrer em cidades com funções nacionais em vez de globais ou em cidades que estão participando do processo de globalização mas não têm funções poderosas de comando" (Nijman, 1996, p. 7).

(6) A crítica que autores como Logan (1997) fazem ao trabalho de Sassen (1991) está exatamente nesta dificuldade. Para Logan, Nova York já era global há muito tempo, pelo menos desde o início do século.

SÃO PAULO NO CONTEXTO DO SISTEMA MUNDIAL DE CIDADES c i d a d e s d e s e g u n d a o r d e m d e v e enfatizar s u a s ligações c o m a q u e l a r e d e , o q u e faz da análise de r e d e s a forma mais c o n v e n i e n t e de investigá-las. C h a m a m o s esta s e g u n d a forma de tratar o p r o b l e m a de "análise relacional". Ela mostra q u e u m a c i d a d e específica está c o n e c t a d a c o m o s principais n ó s d a r e d e d e c i d a d e s p o r m e i o d e fluxos d e p e s s o a s , r e c u r s o s e informação. E m b o r a este m é t o d o n a m a i o r p a r t e d a s v e z e s d e s c r e v a fluxos, r e p r e s e n t a mais do q u e isso, i n c l u i n d o t a m b é m o e s t u d o d a s p o s i ç õ e s e da estrutura d o sistema m u n d i a l d e c i d a d e s . O p r o b l e m a c o m esta s e g u n d a forma de a b o r d a r a q u e s t ã o está na dificuldade d e o b t e r i n f o r m a ç õ e s e m p í r i c a s q u e i n d i q u e m q u e certa c i d a d e seja u m n ó i m p o r t a n t e n a r e d e m u n d i a l . Este tipo d e d a d o está disponível para o primeiro g r u p o de c i d a d e s globais, assim c o m o p a r a o u t r o s centros importantes e m p a í s e s d o Primeiro M u n d o , c o m o Miami e Frankfurt, m a s n e m s e m p r e o está p a r a c i d a d e s c o m o São Paulo, B u e n o s Aires e C i d a d e do México 7 . Esta é talvez u m a d a s e x p l i c a ç õ e s p a r a a falta de e s t u d o s s o b r e as relações d e s s a s c i d a d e s c o m a s c i d a d e s globais, p a r t i c u l a r m e n t e n o c a s o brasileiro. C o m o c o n s e q ü ê n c i a , e m b o r a alguns e s t u d o s internacionais incluam a s g r a n d e s c i d a d e s latino-americanas c o m o p a r t e d a r e d e global (cf. Friedman, 1995), a maioria d o s a u t o r e s n ã o t e m sido c a p a z de coletar evidências ( a l g u m a s p r e s e n t e s n a literatura brasileira) q u e p e r m i t a m c o n e c tar de forma e m p i r i c a m e n t e c o n s i s t e n t e as d i n â m i c a s globais c o m as transformações e m c u r s o n e s t a s c i d a d e s .

(7) No caso de São Paulo, dispomos quase que somente de informações para realizar análises de atributos.

As cidades brasileiras no sistema global de cidades

As cidades brasileiras foram mencionadas pela primeira vez nesta literatura p o r Friedman (1986), q u e incluiu São Paulo e Rio de Janeiro na lista de cidades globais, s e n d o a primeira d e n o m i n a d a "centro global periférico" e a s e g u n d a "centro global periférico de segunda ordem". Em artigo de 1995, o autor voltou a incluir São Paulo c o m a d e n o m i n a ç ã o "importante articulação internacional" 8 , mas o Rio de Janeiro n ã o foi incluído. Para ele, o Rio de Janeiro p e r d e u status global em razão de sua longa crise econômica, em curso ao m e n o s d e s d e o final dos anos 1960. Ambas as listas foram construídas a partir de informações baseadas em atributos, e a sua consolidação seguiu a análise do autor. Vale destacar o trabalho recente de Godfrey e Z h o u (1999), q u e avança em relação às tentativas anteriores de construir listas de cidades a partir de um único critério, introduzindo informações referentes à localização da s e g u n d a s e d e das principais empresas multinacionais. A localização de sedes é u m a informação bastante explorada pela literatura, mas q u a n d o se utiliza a s e d e principal da empresa a importância das principais cidades dos países centrais t e n d e a ser aumentada, e n q u a n t o a de cidades de países periféricos t e n d e a ser extremamente reduzida. Para escapar de tal problema, os autores incluíram em sua lista as sedes do primeiro nível

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(8) Este é o terceiro agrupamento — após "articulações financeiras globais" e "articulações multinacionais" —, no qual, além de São Paulo, Friedman incluiu Paris, Zurique, Madri, Cidade do México, Seul e Sydney.

EDUARDO MARQUES E HAROLDO TORRES de subsidiárias das multinacionais, o q u e levou a u m a completa alteração da lista de cidades mais importantes no c o m a n d o do m u n d o dos n e g ó cios. São Paulo passou e n t ã o para o 11º lugar, muito à frente das demais cidades sul-americanas (Buenos Aires era a mais próxima, em 23º lugar), destacando-se sua importância c o m o s e d e de c o m a n d o regional de n e g ó cios. As mais importantes cidades do Terceiro M u n d o seriam H o n g Kong (4 a ), Cingapura (5 a ), Cidade do México (8 a ) e Seul (10 a ). O artigo indica uma significativa centralidade de cidades localizadas em países do Terceiro Mundo na r e d e mundial, ao contrário do q u e c o m u m e n t e considera a literatura internacional 9 . Smith e Timberlake (1995) desenvolveram u m a e n g e n h o s a utilização da análise de redes para estudar os fluxos de transporte de passageiros. Na tentativa de m a p e a r a r e d e global de cidades, seguiram a linha de estudos sobre a " e c o n o m i a - m u n d o " utilizando análise de redes (Smith e White, 1992; Kim e Barnett, 1996). Naquele estudo, em razão do t a m a n h o e do p a d r ã o de seus fluxos de passageiros, São Paulo aparece caracterizada p o r um p a d r ã o similar ao e n c o n t r a d o em Seattle, no sétimo e m e n o s conectado a g r u p a m e n t o dentre 23 das trinta cidades da lista original de Friedman (1986). O artigo apresenta importantes limitações metodológicas, já q u e é impossível separar fluxos turísticos de fluxos de negócios. Além disso, a localização geográfica de u m a cidade e sua distância em relação às mais importantes cidades globais obviamente alteram os fluxos de passageiros. Esta parece ser u m a forma muito promissora de abordar o problema, assim c o m o de m a p e a r as cidades de forma relacional, embora d e m a n d e informações q u e permitam capturar a complexidade dos vínculos entre cidades. A literatura internacional t a m b é m carece de descrições simples das transformações ocorridas nas cidades brasileiras recentemente. Dentre os poucos estudos existentes destacamos o de Ribeiro e Lago (1995), q u e descreve o p a d r ã o de transformação das regiões metropolitanas c o m o marcado pela disseminação da pobreza no tecido u r b a n o e p o r novos processos de auto-segregação das classes médias. Os autores sustentam que esses processos foram p r o d u z i d o s n ã o a p e n a s pela crise econômica nas cidades brasileiras, m a s t a m b é m p o r transformações n o s próprios processos de p r o d u ç ã o do ambiente construído. Confirmando esses argumentos sobre as novas formas de mobilidade e sociabilidade das metrópoles brasileiras, Caldeira (1996) descreveu o n o v o p a d r ã o de segregação social e espacial em São Paulo. Seu artigo dialoga fortemente c o m estudos como os de Sorkin (1992) e Davis (1992), mostrando a crescente produção de "enclaves fortificados" em um tecido u r b a n o mais diversificado e fragmentado, no qual as distâncias espaciais entre ricos e pobres diminuem, a discriminação a u m e n t a e a interação social praticamente desaparece. Já Lavinas e N a b u c o (1995) estudaram as transformações nos mercados de trabalho em algumas das mais importantes cidades brasileiras, mostrando q u e apesar do a u m e n t o da informalização e da terceirização há importantes diferenças regionais no m u n d o do trabalho relacionadas às

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(9) É necessário acrescentar que isso nada nos informa sobre a adequação das decisões estratégicas das empresas aos interesses nacionais dos países onde essas sedes se localizam.

SÃO PAULO NO CONTEXTO DO SISTEMA MUNDIAL DE CIDADES características d a s atividades industriais e ao conjunto de estratégias de sobrevivência disponíveis localmente. Estes a r g u m e n t o s são c o m p l e m e n tares aos da análise de Rocha (1995) s o b r e a dinâmica da p o b r e z a na d é c a d a de 1980, na qual se sustenta q u e os efeitos de l o n g o p r a z o d o s ciclos de stop-and-go p e l o s quais p a s s o u a e c o n o m i a brasileira na d é c a d a foram neutros s o b r e a p o b r e z a se se considerar a p e n a s os níveis de renda. Se o m e r c a d o de trabalho for l e v a d o em conta, entretanto, o b a l a n ç o da década é significativamente negativo. Por fim, Diniz (1994) discutiu a transformação da localização da indústria brasileira e sua "desconcentração concentrada", ainda e m torno d a cidade d e São Paulo, m a s alcançando distâncias maiores. Embora todos estes autores p o s s a m ter tido em m e n t e as q u e s t õ e s levantadas pela literatura, n e n h u m deles b u s c o u relacionar os p r o c e s s o s estudados às dinâmicas globais. C o m o já afirmamos, este relativo silêncio p o d e ser atribuído à insuficiência de d a d o s para r e s p o n d e r às q u e s t õ e s de forma relacional. A c e i t a n d o esta limitação, d e s c r e v e r e m o s as transformações e m curso e m São Paulo t e n d o c o m o referência o s processos globais descritos p e l a literatura internacional e l a n ç a n d o m ã o de informações de atributos e, s e m p r e q u e possível, relacionais.

São Paulo e o contexto das transformações recentes

Migração e crescimento demográfico

A informação mais geral sobre as grandes cidades dos países periféricos encontrada no d e b a t e internacional diz respeito a seu porte e grau de centralidade na r e d e u r b a n a local. No q u e se refere ao Brasil, o tema envolve alguns d o s equívocos presentes naquela literatura, já q u e os autores estrangeiros via de regra d e s c o n h e c e m a baixa primazia urbana brasileira, assim c o m o os processos de transformação nas dinâmicas demográfica e migratória recentes. O b s e r v e m o s essas dinâmicas de forma sucinta. O grau de urbanização no Brasil é bastante elevado: em 1996, 7 8 % da p o p u l a ç ã o total vivia em cidades e 47% desta p o p u l a ç ã o urbana em cidades de mais de um milhão de habitantes. Apesar desta concentração populacional em grandes cidades — e e m b o r a São Paulo e Rio de Janeiro estejam entre as quinze maiores do m u n d o —, a primazia urbana n ã o é tão acentuada c o m o em outros países latino-americanos. Em 1996, São Paulo tinha 16,6 milhões de habitantes, o q u e correspondia a 10,5% da p o p u l a ç ã o nacional, e n q u a n t o Rio de Janeiro e São Paulo juntas r e s p o n d i a m p o r 17% (tabela 1). Em 1993, a Cidade do México concentrava 24% da p o p u l a ç ã o mexicana, e n q u a n t o Buenos Aires respondia p o r 36% dos habitantes da Argentina (UNFPA, 1994).

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EDUARDO MARQUES E HAROLDO TORRES Tabela 1 Evolução populacional e taxas de crescimento Brasil e Regiões Metropolitanas do Rio de Janeiro e de São Paulo 1970-1996 Brasil e regiões 1970

População (em milhares) 1980 1991

1996

RM do Rio de Janeiro 7.081 9.014 9.815 10.160 RM de São Paulo 8.140 12.589 15.369 16.562 População urbana/Brasil 52.085 80.436 110.991 123.082 População total/Brasil 93.139 119.003 146.825 157.080

Taxas de crescimento a.a. (%) 1970/80 1980/91 1991/96 2,4 4,5 4,4 2,5

0,8 1,8 3,0 1,9

0,7 1,5 2,1 1,4

Fonte: IBGE (Censos Demográficos de 1970, 1980, 1991 e Contagem Populacional de 1996).

É v e r d a d e q u e , até recentemente, ocorreu um importante processo de concentração da p o p u l a ç ã o nas cidades mais importantes. Durante a década de 1970, p o r exemplo, a p o p u l a ç ã o da Região Metropolitana de São Paulo (RMSP) cresceu à impressionante taxa de 4,5% ao ano, e n q u a n t o a população nacional cresceu a 2,5% ao a n o (tabela 1). Com esse ritmo, a RMSP alcançou 10,6% da p o p u l a ç ã o brasileira em 1980. Considerando a participação crescente de São Paulo na p o p u l a ç ã o urbana, alguns autores afirmaram que o país estava e x p e r i m e n t a n d o um vigoroso processo de urbanização e destacaram um m o v i m e n t o de concentração crescente da p o p u l a ç ã o urbana em regiões metropolitanas, particularmente em São Paulo. Esse movimento foi c h a m a d o de "metropolização" (Martine, 1987). Essa metropolização foi explicada pela ocorrência de fluxos migratór i o s derivados n ã o a p e n a s d a criação d e n o v o s e m p r e g o s industriais d e forma concentrada na g r a n d e metrópole, m a s t a m b é m pela melhor qualidade d o s serviços sociais, tais c o m o s a ú d e , e d u c a ç ã o e s a n e a m e n t o básico (Santos, 1993). Nas d é c a d a s seguintes, p o r é m , a idéia de metropolização se tornou problemática. Nos a n o s 1980 as principais áreas metropolitanas passaram a crescer a taxas mais modestas. E n q u a n t o a p o p u l a ç ã o urbana total cresceu a 3,0% ao a n o , a RMSP cresceu a 1,8%. Entre 1991 e 1996 essa queda de ritmo de crescimento continuou: a p o p u l a ç ã o urbana cresceu a 2,1% ao a n o e a RMSP a 1,5%. C o m o conseqüência, a participação da RMSP na p o p u l a ç ã o u r b a n a brasileira caiu de 15,7% em 1980 para 13,5% em 1996. Inúmeros fatores teriam contribuído para desacelerar o ritmo da urbanização e para a s u s p e n s ã o do p r o c e s s o de metropolização, entre os quais p o d e m o s destacar a q u e d a da fecundidade — n ã o a p e n a s na RMSP, m a s também no país —, a d e s c o n c e n t r a ç ã o industrial e a grave crise e c o n ô m i c a dos anos 1980 e 1990 (Martine, 1992; Pacheco, 1992; Diniz, 1994). Do p o n t o de vista do d e b a t e internacional, é v e r d a d e q u e cidades como Nova York e Londres deixaram de apresentar crescimento d e m o g r á -

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fico desde os anos 1960, p a s s a n d o a experimentar um processo de "troca de população", c o m a entrada de migrantes oriundos de países do Terceiro Mundo e a saída de operários especializados (blue collars) e de famílias de classe média (Harris, 1992) 10 . No entanto, é improvável q u e a desaceleração do crescimento da RMSP possa ser facilmente interpretada p o r analogia com esses centros, u m a vez q u e a q u e d a da fecundidade já tinha ocorrido há muitas d é c a d a s nesses países e a sua dinâmica migratória apresenta características diversas. De t o d o m o d o , observa-se u m a importante característica c o m u m a todos esses locais, relacionada c o m a marcada presença da migração internacional.

Atividade

econômica11

(11) As informações apresentadas nesta seção são principalmente originárias de Torres, 1999.

A análise da dinâmica demográfica nas grandes cidades brasileiras é complementada p o r informações sobre a concentração das atividades e do e m p r e g o industriais. Embora nesse caso a concentração na RMSP tenha realmente alcançado patamares muito altos, é s e m p r e necessário destacar o processo de desconcentração ocorrido nas últimas décadas, assim c o m o as alterações observadas mais recentemente no m e r c a d o de trabalho, c o m a elevação do d e s e m p r e g o e a disseminação dos vínculos precários. C o m o já vimos, esses atributos apresentam g r a n d e importância na caracterização das cidades globais pela literatura internacional, e portanto m e r e c e m discussão detalhada.

Tabela 2 Distribuição regional da produção industrial Brasil e regiões selecionadas 1970-1990

Brasil e regiões selecionadas

Em porcentagem Distribuição da produção industrial 1970 1980 1990 1975 1985

RMSP 43,4 Interior do estado de São Paulo 14,8 Estado do Rio de Janeiro 15,5 Estado de Minas Gerais 6,5 Região Sul 12,0 Outras regiões 7,8 Brasil 100,0

38,8 17,1 13,5 6,7 14,8

33,0 20,4 10,6 7,7 15,8

9,1 100,0

12,5 100,0

29,4 22,5 9,5 8,3 16,7 13,6 100,0

26,3 23,0 9,9 8,8 17,4 14,6 100,0

Fonte: IBGE (Censos Industriais de 1970, 1975, 1980 e 1985); Negri e Pacheco, 1994 (para 1990).

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(10) A dinâmica demográfica de Los Angeles é destoante dos processos de Nova York e Londres porque lá vinha se registrando crescimento demográfico significativo até recentemente (Soja, 1992b).

EDUARDO MARQUES E HAROLDO TORRES No início dos anos 1970 a RMSP era a mais importante área industrial do país, r e s p o n d e n d o p o r 43,4% da p r o d u ç ã o industrial brasileira. Entretanto, entre 1970 e 1990 a participação da região caiu 17,1 pontos percentuais. De todo m o d o , em 1990 São Paulo ainda respondia p o r mais de um quarto da produção industrial (26,3%). O interior do estado de São Paulo parece ter sido a região mais beneficiada pela perda de participação da RMSP na produção industrial (tabela 2). Na literatura brasileira, esse processo tem sido d e n o m i n a d o c o m o "desconcentração industrial" (Azzoni, 1985). Aparentemente, essa desconcentração teria p e r d i d o ímpeto entre 1985 e 1993, s o b r e t u d o em virtude da crise econômica, q u e desestimulou novas iniciativas de investimento, principal motor da desconcentração industrial no Brasil (Diniz e Crocco, 1995). No p e r í o d o posterior ao Plano Real a desconcentração industrial parece ter r e t o m a d o seu ímpeto, em face de um n o v o ciclo de investimentos. Como se trata de u m a experiência bastante recente, a avaliação a respeito do porte, intensidade e localização destes novos investimentos só pode ser realizada a partir de informações fragmentadas, colhidas na imprensa e junto a entidades de classe. Um dos raros trabalhos q u e buscou sistematizar este tipo de informação é o de Rodrigues (1998), q u e pesquisou as intenções de investimento anunciadas em 1996 e 1997. O montante de investimentos industriais anunciados em 1996 para o período de 1997 a 2002 atingia a cifra de US$ 55 bilhões. É difícil avaliar até q u e ponto estas intenções se concretizaram ou vão se concretizar, principalmente no contexto turbulento da economia brasileira do período 1998-99. Segundo a autora, os destaques em termos de intenção de investimento se concentravam nas indústrias de bens duráveis e de bens intermediários, c o m 27,8% e 49,3% do total de recursos, respectivamente. De certa forma, apesar da precariedade desta fonte de dados, a intenção de investimentos na indústria de bens intermediários parece ter bastante sentido analítico, pois trata-se de indústrias predominantemente de capital nacional, recém-privatizadas e q u e encontraram nos últimos anos um contexto de significativo a u m e n t o da d e m a n d a interna, decorrente sobretudo do a u m e n t o da p r o d u ç ã o de bens de c o n s u m o duráveis. Estudos do BNDES mostram q u e ocorreram significativos aumentos das importações neste segmento e um considerável estreitamento da capacidade ociosa, apontando para o esgotamento da capacidade produtiva nacional, particularmente no caso da indústria química (Andrade e outros, 1997; Andrade, Cunha e Vieira, 1998; Montenegro e Monteiro Filha, 1997; Macedo e outros, 1998). A indústria de b e n s intermediários tem apresentado significativa tendência a desconcentração industrial desde os anos 1970, e investimentos adicionais nessa área tenderão a aprofundar esta dinâmica. A avaliação do p a d r ã o espacial das intenções de investimento a partir dos d a d o s colhidos p o r Rodrigues é ainda mais precária. Esses d a d o s apontam para as maiores intenções de investimento nos estados de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina, Bahia e Ceará, afetadas em parte pela a d o ç ã o de políticas ativas de guerra fiscal entre os estados. A classificação do investimento p o r

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SÃO PAULO NO CONTEXTO DO SISTEMA MUNDIAL DE CIDADES regiões e n v o l v e t a n t o o s i n v e s t i m e n t o s industriais q u a n t o a q u e l e s e m infraestrutura, c o m é r c i o e serviços. São Paulo, em 1997, p o r e x e m p l o , a p r e s e n tava a s m a i o r e s i n t e n ç õ e s d e i n v e s t i m e n t o (US$ 8,3 bilhões), c o m d e s t a q u e p a r a os setores de t r a n s p o r t e s e de serviços. Assim, a p e s a r do d e s t a q u e da RMSP no i n v e s t i m e n t o total, p a r e c e ter h a v i d o u m a nítida d e s c o n c e n t r a ç ã o da indústria de transformação: a química, p o r e x e m p l o , teria s e u s n o v o s investimentos d i r e c i o n a d o s p r i n c i p a l m e n t e p a r a Bahia, Rio de J a n e i r o e São Paulo (Paulínia); a siderúrgica, p a r a Minas Gerais, Rio de J a n e i r o , Ceará, Paraná e Rio G r a n d e do Sul; e a indústria de p a p e l e celulose, p a r a Bahia, Minas Gerais, São P a u l o e P a r a n á (Rodrigues, 1998). As n o v a s p l a n t a s da indústria automobilística estariam s e localizando p r i n c i p a l m e n t e n o Paraná, Rio G r a n d e do Sul, Minas Gerais, Rio de J a n e i r o e interior de São P a u l o . Vale a p e n a d e t a l h a r a d i n â m i c a de inversões n e s t e setor, em r a z ã o de sua importância histórica p a r a o m e r c a d o de trabalho da RMSP. A indústria automobilística foi a principal responsável p e l o crescimento q u e a indústria de transformação a p r e s e n t o u n o s a n o s 1990, mais do q u e d u p l i c a n d o sua p r o d u ç ã o a o l o n g o d a d é c a d a . E m 1991 o b s e r v o u - s e u m a p r o d u ç ã o total de 960 mil veículos, e n q u a n t o em 1997 esta p r o d u ç ã o atingiu q u a s e 2,1 milhões de u n i d a d e s 1 2 . Nesse p e r í o d o verificaram-se t a m b é m algum crescimento d a s e x p o r t a ç õ e s e um forte crescimento das importações, o q u e era p r a t i c a m e n t e inimaginável no início da d é c a d a . O salto o b s e r v a d o na p r o d u ç ã o e n a s v e n d a s automobilísticas p o d e ser e x p l i c a d o p o r u m a série d e fatores c o n v e r g e n t e s , e n t r e o s q u a i s p o d e m o s destacar os seguintes: a política de c â m a r a s setoriais surgida a partir de 1992, q u e contribuiu p a r a a r e d u ç ã o do p r e ç o final do p r o d u t o e a valorização d o s m o d e l o s p o p u l a r e s ; o a d v e n t o do Mercosul, q u e induziu à a d o ç ã o d e estratégias d e a ç ã o regional p o r p a r t e d a s m o n t a d o r a s (especialização e m m o d e l o s p o p u l a r e s n o Brasil e e m m o d e l o s m é d i o s n a Argentina); o P l a n o Real, q u e g e r o u a u m e n t o e x p r e s s i v o da d e m a n d a a partir de 1994, p r i n c i p a l m e n t e c o m o r e s t a b e l e c i m e n t o de m e c a n i s m o s de crédito ao c o n s u m i d o r ; e, p o r fim, o n o v o r e g i m e a u t o m o t i v o , q u e t a x o u significativamente a i m p o r t a ç ã o p o r p a r t e d a s m o n t a d o r a s q u e n ã o t i n h a m fábricas n o país o u q u e n ã o e x p o r t a v a m a partir d o Brasil, a l é m d e reduzir a taxação s o b r e a i m p o r t a ç ã o de c o m p o n e n t e s e o coeficiente de n a c i o n a lização d o s veículos (Santos, 1998; Santos e P i n h ã o , 1997). C o m o c o n s e q ü ê n c i a , assistiu-se a um notável n o v o ciclo de investim e n t o s no setor, c o m a instalação de várias n o v a s p l a n t a s e a a t r a ç ã o de e m p r e s a s internacionais até e n t ã o a u s e n t e s n o m e r c a d o brasileiro. D e p o i s d e 1996 j á foram c o n s t r u í d a s d o z e n o v a s fábricas, c o m u m i n v e s t i m e n t o total de US$ 4,3 b i l h õ e s e u m a c a p a c i d a d e instalada adicional de 490 mil novas u n i d a d e s p o r a n o (tabela 3), a q u a l c o r r e s p o n d e u a um v o l u m e de p r o d u ç ã o potencial d e a p r o x i m a d a m e n t e 2 5 % d a p r o d u ç ã o e m 1997 1 3 . Está t a m b é m prevista o u e m e x e c u ç ã o a c o n s t r u ç ã o d e mais o n z e plantas, n u m v o l u m e de investimentos total da o r d e m de US$ 4,2 bilhões (tabela 3). Parte d e s t e investimento já está s e n d o concretizada, m a s seria temerário afirmar q u e t o d o s esses projetos s e r ã o c o n c l u í d o s n o s p r ó x i m o s

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(12) Dados preliminares indicam uma queda na produção e vendas em 1988, apontando para algo como 1,6 milhão de unidades produzidas. Ver, por exemplo, revista América Economia, 22/10/98, pp. 28-33.

(13) Estes dados referem-se apenas aos investimentos efetuados em novas plantas. Os investimentos ocorridos ou previstos para as plantas já existentes não foram computados para fins desta análise. Isto permite supor que o investimento global da indústria automobilística no Brasil estaria sendo mais significativo do que o apresentado na tabela 3.

EDUARDO MARQUES E HAROLDO TORRES anos, c o m o c o m p r o v a m os conflitos entre o governo do estado do Rio Grande do Sul e a Ford em torno d o s incentivos concedidos pela administração anterior à implantação da unidade de Guaíba, q u e acabaram resultando na implantação da fábrica na Bahia após a concessão de substanciais incentivos fiscais. De fato, i n d e p e n d e n t e m e n t e da confiabilidade dos dados de intenção de investimento, a dúvida q u a n t o à continuidade destes projetos é bastante razoável em face da recente crise cambial e das projeções de crescimento negativo para o a n o de 1999. Um dos aspectos mais relevantes deste n o v o ciclo de investimentos tem a ver c o m o p a d r ã o espacial bastante desconcentrado das novas plantas automobilísticas no Brasil. Até recentemente, à exceção da Fiat em Betim (MG), quase toda a p r o d u ç ã o brasileira estava localizada na RMSP e no Vale do Paraíba, em São Paulo. Nesta nova fase, dos US$ 4,3 bilhões já investidos, apenas 3,5% se destinaram à RMSP (a fábrica da Land Rover) e apenas 16,6% ao estado de São Paulo (Land Rover, Honda, Toyota e Volkswagen). Os maiores beneficiários de novos investimentos foram os estados do Paraná, com 47,7% (Chrysler, Renault e Volkswagen/Audi), e Minas Gerais, c o m 24,5% (Fiat e Mercedes-Benz). Caso os investimentos previstos v e n h a m a se concretizar, o Rio G r a n d e do Sul receberá os investimentos mais importantes, ao lado do Paraná, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Bahia. Esses dados indicam q u e o processo de desconcentração industrial está se fortalecendo de forma decisiva, ao menos no caso da indústria automobilística. Isto será tanto mais verdade quanto mais as novas montadoras atraírem indústrias de autopeças e outros fornecedores para suas imediações. Novos processos de gestão empresarial, c o m o o just-in-time por exemplo, requerem grande proximidade entre fornecedores e fabricantes, de m o d o a assegurar a minimização dos estoques e a agilização das entregas 1 4 . Em síntese, toda a evidência disponível aponta para a continuidade do processo de desconcentração industrial, q u e parece ter atingido um novo patamar a partir do ciclo de investimentos de 1995-97. Os d a d o s indicam q u e a RMSP continuará a p e r d e r participação relativa, e m b o r a o porte e a sofisticação da indústria metropolitana v e n h a m s e m p r e a lhe assegurar p a p e l relevante na área. Cabe destacar q u e o debate brasileiro sobre economia regional tem discutido há bastante t e m p o esses processos de desconcentração industrial ocorridos na RMSP. Sobressaem três grandes linhas explicativas para o fenômeno: i) A desconcentração demográfica e industrial experimentada pela RMSP é episódica, refletindo principalmente um certo p a d r ã o "artificial" de crescimento da economia brasileira. O uso de incentivos fiscais e outras políticas regionais p r o m o v e u essa desconcentração, e no contexto da Terceira Revolução Industrial, b a s e a d a na microeletrônica e nos computadores, haveria tendência a reconcentração das atividades produtivas na metrópole de forma a obter maior proximidade c o m os centros de pesquisa e universidades e maior concentração de trabalho altamente qualificado (Cano, 1995).

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(14) A Fiat de Minas Gerais, empresa mais avançada neste processo, instituiu com o apoio do governo estadual uma política de "mineirização" de seus fornecedores, tendo em vista essas novas exigências do processo produtivo.

SÃO PAULO NO CONTEXTO DO SISTEMA MUNDIAL DE CIDADES

Tabela 3 Investimento em novas fábricas automobilísticas Brasil 1996-98 Empresas

Cidade/UF

Investimento realizado até dezembro de Fiat Belo Horizonte/MG Sumaré/SP Honda Campo Largo/PR Chrysler Mercedes-Benz Juiz de Fora/MG Renault São J. dos Pinhais/PR Toyota Indaiatuba/SP Volkswagen São Carlos/SP Volkswagen Resende/RJ Volkswagen/Audi São J. dos Pinhais/PR Land Rover São Bernardo/SP Navistar Caxias do Sul/RS Mitsubishi Catalão/GO Total Investimento previsto ou em realização Camaçari/BA Ford GM Mogi das Cruzes/SP GM Gravataí/RS Renault São J. dos Pinhais/PR Sete Lagoas/MG Iveco/Fiat Curitiba/PR Volvo Simões Filho/BA Hyundai Kia Itu/SP Peugeot/Citroen Porto Real/RJ Chrysler/BMW Campo Largo/PR Fiat Betim/MG Total

Produto

Investimento (em US$ milhões)

Capaci- Fase dade em (em mil dez./981 unid.)

1998 Comerciais leves 240 45 Automóveis 150 30 Comerciais leves 315 15 Automóveis 820 50 Automóveis 1.000 120 Automóveis 30 150 Motores 270 Caminhões 250 Automóveis 750 168 Comerciais leves 150 1,5 Caminhões 200 1,2 Comerciais leves 30 35 4.330 490,7 ND 700 Componentes 150 Automóveis 600 Motores 500 Comerciais leves 240 Motores e cabines 90 Comerciais leves 286 Caminhões 42 Automóveis 600 Motores 500 Motores 500 4.208

Pronta Pronta Pronta Testes Pronta Pronta Pronta Pronta Pronta Pronta Pronta Pronta

ND Terraplan. - Acabamento 150 Estruturas ND 12 ND ND 30 Parado 10 Parado 100 ND ND - Terraplan. 302

Fonte: Anuário Estatístico da Anfavea, 1998. (1) Segundo a revista América Economia (22/10/98, p. 33) e Anfavea. Nota: ND - dado não disponível.

ii) O f e n ô m e n o de desconcentração tem raízes demográficas e econômicas mais fundas, refletindo novas formas de organização das economias mundial e brasileira na direção da desindustrialização (Gunn, 1995). De acordo c o m os argumentos levantados p o r essa perspectiva, haveria um risco de a cidade retroceder à condição de metrópole adminis-

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NOVOS ESTUDOS N.° 56

EDUARDO MARQUES E HAROLDO TORRES trativa e de negócios, típica da periferia capitalista, repetindo a tendência experimentada p e l o Rio de Janeiro a partir da d é c a d a de 1950. iii) A desconcentração produtiva estaria refletindo a criação de u m a cidade c o m capacidade de c o m a n d o regional: a RMSP estaria p e r d e n d o indústrias mas c o n c e n t r a n d o serviços produtivos e financeiros, assim c o m o as sedes das mais importantes empresas regionais (Azzoni, 1985 e 1995; Lencioni, 1994). Esta última linha de interpretação da desconcentração industrial apresenta importantes paralelos c o m a literatura internacional sobre reestruturação urbana. A hipótese de "desconcentração concentrada" lançada por Azzoni (1985), p o r exemplo, tem grandes similaridades com a descrição da transformação de grandes centros industriais em financeiros e de serviços feita pela literatura internacional (Sassen, 1991; Friedman, 1995). Do ponto de vista dessa literatura internacional, é verdade q u e Nova York e Londres (mas n ã o Los Angeles) apresentaram perda significativa na produção e nos empregos industriais (Soja, 1992b; Drennan, 1992). Tanto no caso dessas cidades quanto no da RMSP é provável q u e fatores locacionais clássicos tais c o m o o preço da terra e o custo de mão-de-obra, b e m c o m o outras deseconomias de escala derivadas do tráfego pesado, do alto nível de poluição etc., tenham induzido à desconcentração industrial (Drennan, 1992). No entanto, há especificidades q u e m e r e c e m ser consideradas. A rigor, cidades c o m funções globais n ã o necessariamente são incompatíveis c o m perfis industriais, principalmente em indústrias de ponta e alta tecnologia, que requerem padrões espaciais mais concentrados (Soja, 1992b; Pacheco, 1996). A desconcentração industrial no Brasil foi também facilitada p o r fatores c o m o a melhora da infra-estrutura de transportes e energia em todo o país e agressivas políticas estaduais de desenvolvimento industrial. Em outras palavras, a desconcentração industrial em relação à RMSP, apesar de estabelecer um outro paralelo importante entre São Paulo e as cidades globais, não deve necessariamente ser explicada a partir da lógica produtiva presente naquelas cidades.

O mercado de trabalho

Nos anos 1980 a desconcentração industrial progrediu sob condições de extrema instabilidade econômica, c o m inflação alta e lento crescimento da economia c o m o um t o d o . A crise alcançou São Paulo de forma muito intensa. Estimativas t ê m m o s t r a d o q u e o PIB da RMSP teria caído em termos reais de US$ 92 bilhões em 1980 para US$ 85 bilhões em 1990. C o m o a população esteve c r e s c e n d o a u m a taxa de 1,8% ao ano, o PIB per capita caiu 27% (Azzoni e outros, 1993). Apenas a recuperação p r o p o r c i o n a d a pelo Plano Real, entre 1994 e 1997, parece ter sustado o q u a d r o de deterioração do nível de renda. O biênio 1998-99, no entanto, recolocou o problema.

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SÃO PAULO NO CONTEXTO DO SISTEMA MUNDIAL DE CIDADES No mercado de trabalho, o resultado agregado da desconcentração industrial e da crise econômica parece ter sido complexo. De um lado, a RMSP experimentou uma mudança estrutural em seu mercado de trabalho, com redução da participação do setor industrial no emprego total e aumento do emprego nos serviços (tabela 4). De fato, os dados sobre o mercado de trabalho na RMSP apontam queda da participação da indústria no emprego total entre 1976 e 1995 (de 39,5% para 24,1%). Entretanto, essa queda não ocorreu no estado como um todo, já que a participação estadual aumentou entre 1971 e 1986 de 15,5% para 24%. De qualquer forma, a partir de 1990 a participação dos empregos industriais caiu também no interior.

Tabela 4 Distribuição da PEA, por setores de atividade RMSP e interior do estado de São Paulo 1971-1995

Anos

1971 1976 1981 1986 1990 1995

RMSP Agricul- Indús- Comértura tria cio e serviços 1,5 0,9 0,8 0,5 0,4 1,6

35,8 39,5 35,8 36,4 32,1 24,1

56,6 53,3 56,5 57,3 61,3 67,9

Construção civil 6,1 6,8

6,9 5,8 6,2

6,4

Em porcentagem Interior de São Paulo Agricul- Indús ComérConstura tria cio e trução civil serviços 36,6 28,7 21,3 17,2 13,8 15,0

15,5 19,8 22,5 24,0 23,3 18,8

42,7 43,4 48,3 51,7 55,8 59,1

5,3 8,0

7,9 7,1 7,1 7,1

Fonte: IBGE (PNADs); Costa, 1994.

A dinâmica do e m p r e g o em São Paulo (tabela 5) permite dividir o período em q u e s t ã o em três m o m e n t o s : 1971-86, 1986-90 e 1990-95. Entre 1971 e 1986 a participação da indústria na PEA da RMSP se m a n t e v e em torno de 35%, c h e g a n d o a q u a s e 40% na segunda m e t a d e dos anos 1970, e n q u a n t o n o interior d o estado passou d e m e n o s d e 15% n o início dos anos 1970 para q u a s e 24% em 1986. Entre 1986 e 1990 a participação da indústria no e m p r e g o metropolitano caiu significativamente, p a s s a n d o de 36% para 3 1 % , e n q u a n t o no interior se manteve constante, em torno de 23%. Finalmente, entre 1990 e 1995 a participação da indústria caiu em ambas as áreas, c o m q u e d a maior na RMSP 15 . O q u e ocorreu no mercado de trabalho em ambas as áreas entre 1971 e 1986 parece ter sido principalmente a conseqüência do processo de desconcentração industrial: o interior ganhou empregos industriais e n q u a n to a RMSP os perdeu em termos relativos. O período 1990-95 seria mais b e m

156 NOVOS ESTUDOS N.° 56

(15) A Pesquisa de Condições de Vida da Fundação Seade indica que em 1994 a indústria respondia por 22,4% do total dos ocupados nos municípios com mais de 80 mil habitantes do interior do estado de São Paulo, e que em 1998 este percentual seria de 21,8%. Em outras palavras, nas maiores cidades do interior paulista não parece ter havido queda no emprego industrial no período recente.

EDUARDO MARQUES E HAROLDO TORRES descrito c o m o um m o m e n t o de reestruturação industrial, pois a participação da indústria na PEA caiu em ambas as regiões. A partir desse último ano, ao menos na RMSP, as tendências de q u e d a dos empregos industriais e de elevação dos e m p r e g o s nos serviços e no comércio n ã o apenas p e r m a n e c e ram, c o m o se aprofundaram. A reestruturação parece indicar, assim, q u e o crescimento da p r o d u ç ã o industrial está se tornando mais e mais independente do crescimento do e m p r e g o industrial. Enquanto no período 1985-97 o PIB industrial brasileiro cresceu cerca de 30%, s e g u n d o o IBGE, o n ú m e r o de pessoas empregadas na indústria na RMSP caiu algo em torno de 15%. Mais recentemente, m e s m o em períodos de crescimento da p r o d u ç ã o industrial, c o m o em 1993-96, o n ú m e r o de empregados na indústria continuou a cair. No caso da RMSP, esta tendência de perda de e m p r e g o s industriais parece ter c o n t i n u a d o na s e g u n d a m e t a d e da década de 1990 (tabela 5). Enquanto o e m p r e g o em geral cresceu cerca de 10% entre 1989 e 1999, o e m p r e g o industrial caiu 32%, s e n d o q u e a p e n a s em 1994 e 1995 ocorreu aumento relativo das o c u p a ç õ e s na indústria, q u e voltaram a cair a partir de 1996. Enquanto isso, os e m p r e g o s no comércio aumentaram entre 1989 e 1997 cerca de 40%, d e c a i n d o em seguida. O nível de atividade no setor de serviços se elevou de maneira q u a s e contínua no período, alcançando em 1999 um p a t a m a r 38% superior ao de 1989. Infelizmente, n ã o d i s p o m o s de informações comparáveis para o restante do estado.

Anos

1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999

Total

112,0 114,3 115,0 115,8 119,4 119,9 127,5 126,4 129,0 126,9 125,2

112,1 125,0 133,2 136,5 138,2 143,0 153,9 153,5 156,6 152,2 147,6

116,5 115,8 126,5 130,2 140,9 137,7 147,4 149,9 155,1 160,7 160,1

Andrade, Maria, Cunha, Luís e Vieira, José. Evolução do mercado de alumínio. Rio de Janeiro: BNDES, 1998 (série Perfis Setoriais). Andrade, Maria e outros. Setor siderúrgico no Brasil e no mundo. Rio de Janeiro: BNDES, 1997 (série Perfis Setoriais). Araújo, Maria de F., Diniz Filho, Luís e Bessa, Vagner. "O terciário metropolitano". In: Fundação Seade (org.). São Paulo no limiar do século XXI (vol. 6). São Paulo, 1993. Arrighi, Giovanni. The long twentieth century: money, power and the origins of our times. Londres: Verso, 1994. Azzoni, Carlos R. Indústria e reversão da polarização no Brasil. São Paulo: tese de livre docência, Fipe-USP, 1985.

. e outros. "Como está a produção paulista? Alguns indicadores econômicos". In: Azzoni, Carlos R. (org). Como está São Paulo: as pessoas, a produção, os municípios e o meio ambiente. São Paulo: Secretaria de Planejamento e Gestão, 1993.

101,7 97,4

Benko, Georges e Lipietz, Alain. Les régions qui gagnent: districts et reseaux— les nouvaux paradigmes de la geographie economique. Paris: Presses Universitaries de France, 1992.

96,3 97,0 102,9 105,3 106,8 112,8 121,4 118,4 118,8

Bercovich, Alicia, Madeira, Felícia e Torres, Haroldo. "Descontinuidades demográficas". In: Fundação Seade (org.). 20 anos no ano 2000: estudos sociodemográficos sobre a juventude paulista. São Paulo, 1998. Bógus, Lúcia e Ribeiro, Luís C. (orgs). Cadernos Metrópole ("Desigualdade e governança"). São Paulo: Educ/Fapesp/ Pronex-CNPq, nº 1, 1999.

Fonte: Pesquisa de Emprego e Desemprego Seade-Dieese, 1999. (1) Referem-se ao mês de março.

MARÇO DE 2000

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. "Formação sócioespacial metropolitana: novas tendências ou novas evidências?" In: Gonçalves, Maria (org.). O novo Brasil urbano. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1995.

Média de 1985 = 100 Setores de atividade Indústria Comércio Serviços Outros 110,2 114,2 100,2 96,3 90,9 93,4 99,4 90,8 87,5 77,1 74,6

Abu-Lughod, Janet. BeforeEuropean hegemony: the world system. Nova York: Oxford University Press, 1989.

. O novo endereço da indústria paulista, 1987 (mimeo).

Tabela 5 Evolução dos índices de ocupação, por setores de atividade RMSP 1989-99

1

REFERÊNCIAS

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SÃO PAULO NO CONTEXTO DO SISTEMA MUNDIAL DE CIDADES E m síntese, n o e s t a d o d e São P a u l o a q u e d a d a participação d a indústria n o e m p r e g o antes d e 1990 p a r e c e ter sido u m f e n ô m e n o restrito à RMSP. Esse declínio foi m o t i v a d o s o b r e t u d o p o r p r o c e s s o s de l o n g o alcance, p r o v a v e l m e n t e d e r i v a d o s n ã o a p e n a s d a dinâmica d e d e s c o n c e n tração industrial, m a s t a m b é m da forte t e n d ê n c i a à m o d e r n i z a ç ã o industrial, e m q u e p a s s a m a p r e v a l e c e r e l e m e n t o s c o m o n o v a s práticas gerenciais (terceirização, just-in-time, sistema de q u a l i d a d e etc.) e a u t o m a ç ã o d a s linhas d e p r o d u ç ã o . A p e r d a de e m p r e g o s industriais é um d o s atributos mais freqüentem e n t e identificados c o m o característica universal d a s c i d a d e s globais, m a s n ã o n e c e s s a r i a m e n t e restrito a elas. M e t r ó p o l e s industriais c o m o M a n c h e s ter e Detroit sofreram forte p e r d a do e m p r e g o , e n q u a n t o c i d a d e s c o m o Los Angeles a p r e s e n t a r a m c r e s c i m e n t o no e m p r e g o industrial (Soja, 1992b). A r i g o r , é o c r e s c i m e n t o d o e m p r e g o n o s e t o r d e serviços n a RMSP q u e m a i s claramente n o s permitiria associá-la a o s principais centros d e d e c i s ã o d o m u n d o d o s n e g ó c i o s . Infelizmente, o s d a d o s disponíveis t o r n a m c o m p l e x a a identificação d o c r e s c i m e n t o d o e m p r e g o n o s c h a m a d o s serviços m o d e r n o s (marketing, finanças, informática e outros serviços de a p o i o à p r o d u ção), típicos d e s s a s localidades. Vale ressaltar a p o s s i b i l i d a d e de q u e a grave e c o n t i n u a d a crise e c o n ô m i c a do p e r í o d o 1981 a 1993 t a m b é m t e n h a influenciado tal d i n â m i ca. Entre 1985 e 1994 o país e x p e r i m e n t o u seis p l a n o s de estabilização e alguns e p i s ó d i o s d e hiperinflação (incluindo u m a inflação d e mais d e 1.000% ao a n o em 1989). C o n s e q ü e n t e m e n t e — e a d e s p e i t o d o s fatores estruturais —, a taxa de d e s e m p r e g o a p r e s e n t o u u m a e l e v a ç ã o dramática e o n ú m e r o total d e t r a b a l h a d o r e s d e s e m p r e g a d o s a u m e n t o u e m 110% e n t r e 1985 e 1998 (tabela 6). É de se e s p e r a r q u e a e v o l u ç ã o do e m p r e g o industrial e n o s serviços ( q u e e n g l o b a m g r a n d e p a r t e do setor informal) t e n h a s i d o afetada p o r esta dinâmica. N o s últimos treze a n o s , de fato, e n q u a n t o a PEA a p r e s e n t o u um c r e s c i m e n t o a b s o l u t o de cerca de 2,4 milhões, o n ú m e r o de d e s e m p r e g a d o s cresceu 800 mil. C a b e d e s t a c a r q u e a PEA cresceu 37,8% e n t r e 1985 e 1998, e n q u a n t o a p o p u l a ç ã o da RMSP cresceu m e n o s de 20% no p e r í o d o . Desta forma, o forte c r e s c i m e n t o do d e s e m p r e g o em São P a u l o t e m a ver n ã o a p e n a s c o m a m o d e r n i z a ç ã o produtiva, a d e s c o n c e n t r a ç ã o industrial e a crise e c o n ô m i c a , m a s t a m b é m c o m fatores sociodemográficos específicos, c o m o a expressiva e n t r a d a d a s m u l h e r e s n o m e r c a d o d e trabalho e o significativo a u m e n t o da p r o p o r ç ã o de jovens na p o p u l a ç ã o total da RMSP na s e g u n d a m e t a d e da d é c a d a de 1990 (Bercovich, Madeira e Torres, 1998). De t o d o m o d o , é inegável r e c o n h e c e r q u e o d e s e m p r e g o a p r e s e n t o u crescimento d r a m á t i c o . Entre 1985 e 1998 o a u m e n t o do n ú m e r o de d e s e m p r e g a d o s c o r r e s p o n d e u a a p r o x i m a d a m e n t e 4 0 % d o s n o v o s trabalhadores q u e e n t r a r a m no m e r c a d o de trabalho, o q u e é um i n d i c a d o r m u i t o evidente d a dificuldade d o m e r c a d o d e t r a b a l h o d a RMSP e m a b s o r v e r n o v o s t r a b a l h a d o r e s (tabela 6).

158

NOVOS ESTUDOS N.° 56

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EDUARDO MARQUES E HAROLDO TORRES

Tabela 6 Evolução da taxa de desemprego e número relativo de ativos, empregados e desempregados RMSP 1985-98 Anos

1

1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998

Taxa de desemprego (%) 13,5 10,3 9,4 10,1 9,7 12,1 13,0 16,2 15,4 15,2 13,2 16,2 16,0 19,0

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Números relativos (média de 1985 = 100) Ativos Empregados Desempregados 100,5 104,4 106,3 108,4 113,2 112,7 118,9 122,3 125,3 125,4 130,5 134,7 137,3 137,9

99,3 107,0 110,1 111,4 116,9 113,3 118,2 117,2 121,1 121,6 129,5 129,0 131,8 127,6

108,3 85,8 79,8 87,4 87,7 109,0 123,4 158,3 154,0 152,2 137,5 174,3 175,4 209,1

Drennan, Mathew. "The decline and rise of New York economy". In: Mollenkopf, John e Castells, Manuel (orgs.). Dual city: restructuring New York. Nova York: Russell Sage, 1992. Emirbayer, Mustafa. Manifesto fora relational sociology. Nova York: New School of Social Research, 1996 (mimeo). Fainstein, Susan. The city builders: property, politics and planning in London and New York. Cambridge: Basil Blackwell, 1994. Feagin, John e Smith, Peter. "Cities and the new international division of labor: an overview". In: Smith, Michael e Feagin, John (orgs.). The capitalist city. Cambridge: Basil Blackwell, 1987.

Fonte: Pesquisa de Emprego e Desemprego Seade-Dieese. (1) Referem-se a junho.

Featherstone, Mike. Global culture: nationalism, globalization and modernity. Londres: Sage, 1990.

Tabela 7 Evolução do emprego, por posição do trabalhador RMSP 1985-98 Anos1 1985 1986 1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998

Fitch, Bob. The assassination of New York. Nova York: Verso, 1993. Friedmann, John. "The world cities hypothesis". Development and Change, nº 4, 1995.

(Média de 1985 = 100) Setor privado Setor público Autônomos Com carteira Sem carteira 99,2 107,9 113,4 113,9 116,0 117,7 110,3 105,0 104,6 106,2 111,6 105,9 102,6 102,1

98,0 116,0 114,0 118,0 137,9 103,5 141,0 129,8 144,5 149,6 175,0 175,9 198,9 187,9

98,6 107,4 103,7 111,8 119,6 120,5 116,3 128,4 141,2 128,2 124,7 117,8 110,9 113,8

. "Where we stand: a decade of world city research". In: Knox, Paul e Taylor, Peter (orgs.). World cities in a world economy. Cambridge: Cambridge University Press, 1995.

97,0 105,9 116,2 108,9 124,1 116,6 140,4 144,5 147,8 144,4 158,1 170,3 180,9

Giddens, Anthony. The constitution of society: outline of a theory of structuration. Cambridge: Polity Press, 1984. Godfrey, Brian e Zhou, Yu. "Ranking world cities: multinational corporations and the global urban hierarchy". Urban Geography, 20(3), 1999. Graham, Stephen e Marvin, Simon. Telecommunications and the city: eletronic spaces, urban places. Londres: Routledge, 1996. Grasfoguel, Ramón. "Global logics in the Caribbean city system: the case of Miami". In: Knox, Paul e Taylor, Peter (orgs). World cities in a world economy. Cambridge: Cambridge University Press, 1995.

168,4

Fonte: Pesquisa de Emprego e Desemprego Seade-Dieese, 1997. (1) Referem-se a junho.

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SÃO PAULO NO CONTEXTO DO SISTEMA MUNDIAL DE CIDADES N o d e b a t e internacional h á ainda u m o u t r o e l e m e n t o i m p o r t a n t e r e l a c i o n a d o a o m e r c a d o d e t r a b a l h o m e t r o p o l i t a n o : a c h a m a d a "precarização". Nesse a s p e c t o , o n ú m e r o de t r a b a l h a d o r e s e m p r e g a d o s c o m carteira a s s i n a d a ( n o s e t o r p r i v a d o ) c r e s c e u s o m e n t e 2 , 1 % e n t r e 1985 e 1998 na RMSP, e n q u a n t o o c o n t i n g e n t e de t r a b a l h a d o r e s s e m carteira a u m e n t o u 87,9% e o de a u t ô n o m o s 68,4%. Assim, n ã o a p e n a s a taxa de d e s e m p r e g o cresceu muito, m a s t a m b é m a s c o n d i ç õ e s d e inserção n o m e r c a d o d e t r a b a l h o — em t e r m o s de s e g u r a n ç a e benefícios sociais — p i o r a r a m m a r c a d a m e n t e (tabela 7). E n q u a n t o o total de t r a b a l h a d o r e s cresceu 37,9% e n t r e 1985 e 1998, o n ú m e r o de registros de carteira assinada do setor p r i v a d o cresceu s o m e n t e 2 , 1 % . Esse d a d o é p r o v a v e l m e n t e o principal i n d i c a d o r do a g r a v a m e n t o d a s c o n d i ç õ e s d o m e r c a d o d e t r a b a l h o n a RMSP. Q u a s e t o d o s o s n o v o s e m p r e g o s criados n o p e r í o d o (1,6 m i l h ã o ) e r a m s e m registro o u a u t ô n o m o s , c o m u m a p e q u e n a participação d o setor p ú b l i c o n a oferta d e e m p r e g o s , a qual, p o r é m , sofreu r e d u ç ã o a partir de 1994, devida à política de ajuste do Estado i m p l e m e n t a d a p e l o s g o v e r n o s estadual e federal e às privatizações. Em r e s u m o , t a n t o os p r o c e s s o s de d e s c o n c e n t r a ç ã o e m o d e r n i z a ç ã o industrial q u a n t o a crise e c o n ô m i c a p a r e c e m ter c o n t r i b u í d o p a r a a transformação d a RMSP. N a d é c a d a d e 1970 t í n h a m o s u m g r a n d e centro industrial, c o m u m a pujante classe trabalhadora, e l e v a d a s taxas d e migraç ã o e forte d i n a m i s m o no m e r c a d o de trabalho. Na d é c a d a de 1990 o e m p r e g o e as atividades industriais p e r d e r a m participação e assistiu-se a um c r e s c i m e n t o d o setor d e serviços. A taxa d e d e s e m p r e g o t a m b é m cresceu e o b s e r v o u - s e a c e n t u a d a p r e c a r i z a ç ã o d a s c o n d i ç õ e s de trabalho. É e v i d e n t e q u e m u i t o s d e s s e s c o n t e ú d o s s ã o similares a o s p r e s e n t e s n a literatura internacional q u e d e s c r e v e o m e r c a d o de t r a b a l h o de c i d a d e s globais c o m o L o n d r e s e N o v a York. N o e n t a n t o , o s m e c a n i s m o s q u e p r o d u z i r a m estes efeitos n e m s e m p r e t ê m a m e s m a natureza.

As atividades de comando de negócios

A existência d e u m a r e d e d e g r a n d e s c i d a d e s c o n e c t a d a s m u n d i a l m e n t e é f e n ô m e n o r e l a t i v a m e n t e a n t i g o e c o n h e c i d o , c o m o já discutimos. S e g u n d o a literatura internacional, u m a d a s mais i m p o r t a n t e s características distintivas do p e r í o d o atual de transformações seria a alta c o n c e n t r a ç ã o d e atividades d e c o m a n d o , e s p e c i a l m e n t e d e n e g ó c i o s , assim c o m o d e serviços d e alta c o m p l e x i d a d e o r i e n t a d o s a e m p r e s a s n o s n ó s centrais d o sistema m u n d i a l . C a b e advertir p o r é m q u e e m s e t r a t a n d o d e c i d a d e s localizadas e m p a í s e s periféricos essas atividades d e c o m a n d o t e n d e m a ter d i m e n s ã o a p e n a s n a c i o n a l ou regional e de c o n e x ã o c o m as principais e m p r e s a s d o s p a í s e s centrais. O b s e r v e m o s a l g u m a s informações s o b r e São P a u l o n e s s e c o n t e x t o .

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NOVOS ESTUDOS N.° 56

Gunn, Philip. "Urbanização do Sudeste: dominação das metrópoles?" In: Gonçalves, Maria (org.). O novo Brasil urbano. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1995. Harris, Richard. "The geography of employment and residence in New York since 1950". In: Mollenkopf, John e Castells, Manuel (orgs.). Dual city: restructuring New York. Nova York: Russell Sage, 1992. Judd, Dennis. "The rise of the new walled cities". In: Liggett, Helen e Perry, David (orgs.). Spatial practices: critical explorations in social/spatial theory. Londres: Sage, 1995. Keeling, David. "Transport and the world city paradigm". In: Knox, Paul e Taylor, Peter (orgs.). World cities in a world economy. Cambridge: Cambridge University Press, 1995. Kim, Kyungmo e Barnett, George. "The determinants of international news flow: a network analysis". Communication Research, 23(3), 1996. Knox, Paul e Taylor, (orgs.). World cities in a economy. Cambridge: bridge University Press,

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EDUARDO MARQUES E HAROLDO TORRES A desconcentração industrial n ã o significou q u e São Paulo tenha perdido sua capacidade de polarização do processo econômico, pois conseguiu manter as sedes e atividades de c o m a n d o das grandes corporações. As informações existentes indicam q u e , embora o estado tenha perdido algumas sedes de empresas entre 1984 e 1994 em n ú m e r o s absolutos, a u m e n t o u a participação das empresas brasileiras c o m s e d e em São Paulo no faturamento total (tabela 8)16. A participação da cidade do Rio de Janeiro e de Brasília é explicada pela localização das sedes de grandes empresas estatais, q u e atraem suas congêneres privadas ( p o r exemplo, a s e d e da Petrobrás no Rio de Janeiro leva a u m a concentração de indústrias petroquímicas naquela cidade). Entretanto, c o m as políticas de privatização e r e d u ç ã o do Estado implementadas pelo governo federal é provável q u e diminua o p a p e l dessas cidades nas atividades de c o m a n do da economia brasileira.

Tabela 8 Distribuição das duzentas maiores empresas brasileiras não-financeiras, segundo localização da sede, por faturamento e número de empresas Unidades da Federação 1984-1994

Unidades da Federação

Faturamento 1984 1994

São Paulo Rio de Janeiro Rio Grande do Sul Minas Gerais Paraná Bahia Brasília Santa Catarina Outros Total

32,9 33,4 3,9 4,3 1,1 1,3 1,7 2,0 19,4 100,0

39,2 31,7 3,3 9,0 3,0 3,7 3,1 3,1 3,9 100,0

Em porcentagem Número de empresas 1984 1994 52,0 20,0 6,5 4,0 2,5 2,5 2,5 3,0 7,0 100,0

42,5 16,0 6,5 8,5 5,0 6,0 6,0 4,0 5,5 100,0

Fonte: Gazeta Mercantil—Maiores e melhores, 1985 e 1995.

Em termos gerais, a RMSP t e m sido t a m b é m a localização preferencial das sedes de e m p r e s a s estrangeiras no Brasil. O total de capital estrangeiro no país em 1995 chegava a US$ 98,8 bilhões, ou q u a s e 15% do PIB (Presidência da República, 1996). C o m o vimos anteriormente, o investimento estrangeiro foi muito significativo nos últimos anos, implicando provável a u m e n t o desta participação. O g r u p o mais importante dessas

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(16) Infelizmente, nesse caso as informações são organizadas por estados, e não por cidades.

SÃO PAULO NO CONTEXTO DO SISTEMA MUNDIAL DE CIDADES

empresas era o norte-americano, c o m 36,6% do total. Uma importante evidência da centralidade de São Paulo é o d a d o de que, em 1996, 61,2% das empresas norte-americanas tinham c o m o s e d e a RMSP, participação q u e n ã o se alterou substancialmente d e s d e 1975 (tabela 9).

Tabela 9 Distribuição da localização das sedes de empresas norte-americanas Estados e regiões 1975-1996

Estados e regiões

RMSP Interior do estado de São Paulo Rio de Janeiro Minas Gerais Rio Grande do Sul Outros Total

Em porcentagem Distribuição das sedes 1986 1996 1975 58,0 3,3 31,9 0,7 0,9 5,3 100,0

60,2 4,8 26,6 1,6 1,4 5,4 100,0

61,2 8,6 20,5 1,2 2,0 6,4 100,0

Fonte: Directory of American Firms Operating in Foreign Countries.

Há evidências de q u e os m e r c a d o s financeiros t a m b é m têm tendido a se concentrar em São Paulo, e m b o r a a informação histórica existente n ã o seja tão confiável em razão da alta inflação e das modificações na regulamentação d o s b a n c o s feitas pelo governo federal no final dos a n o s 1980 (Araújo, Diniz Filho e Bessa, 1993). Alguns dos c h a m a d o s b a n c o s de investimento (especializados em o p e r a ç õ e s financeiras sofisticadas, especialmente no m e r c a d o de capitais) se localizam no Rio de Janeiro, mas as sedes dos c h a m a d o s b a n c o s comerciais ( c o m grande n ú m e r o de agências e depósitos) são altamente concentradas em São Paulo (Gunn, 1995). A distribuição das agências bancárias, um indicador dos fluxos financeiros da economia local assim c o m o de sua ligação c o m as economias nacional e internacional, confirma a centralidade da cidade. C o m o p o d e m o s ver na tabela 10, em 1992 São Paulo tinha q u a s e o d o b r o das agências q u e a cidade do Rio de Janeiro e cinco vezes mais q u e Belo Horizonte. Os fluxos de transporte a c e n t u a m ainda mais a centralidade de São Paulo c o m o cidade de c o m a n d o e de p r o d u ç ã o . C o m o se observa na tabela 10, em 1992 a cidade concentrava cerca de um terço dos fluxos aéreos domésticos de passageiros e mais de dois terços dos internacionais. A cidade do Rio de Janeiro aparecia c o m o segunda mais importante, concentrando um v o l u m e q u a s e três vezes maior do q u e Belo Horizonte.

162

NOVOS ESTUDOS N.° 56

Markussen, Ann, Hall, Peter e Glasmeier, Amy. High tech America: the what, how, where and why of the sunrise industries. Boston: Allen and Unwin, 1986. Martine, George. "Êxodo rural, concentração urbana e fronteira agrícola". In: Martine, George e Garcia, Renato C. Impactos sociais da modernização da agricultura. São Paulo: Caetés, 1987. . Processos recentes de concentração e desconcentração urbana no Brasil: determinantes e implicações. Brasília: ISPN, 1992. Massey, Doreen e Denton, Nancy. American apartheid: segregation and the making of the underclass. Cambridge: Harvard University Press, 1993. Mollenkopf, John. The contested City. Princeton: Princeton University Press, 1983. . A Phoenix in the ashes: The rise and fall of the Koch coalition in New York City politics. Princeton: Princeton University Press, 1992. . e Castells, Manuel (orgs.). The dual City: restructuring New York. Nova York: Russell Sage, 1991. Montenegro, Ricardo e Monteiro Filha, Dulce. Complexo químico. Rio de Janeiro: BNDES, 1997 (série Perfis Setoriais). Negri, Barjas e Pacheco, Carlos. "Mudança tecnológica e desenvolvimento regional nos anos 90: a nova dimensão espacial da indústria paulista". Espaço & Debates, nº 38,1994. Nijman, J. "Breaking the rules: Miami in the urban hierarchy". Urban Geography, 17(1), 1996. Pacheco, Carlos. "Dinâmica econômica regional dos anos 80: notas para uma discussão dos resultados do Censo de 91". Anais... (vol. 3). VIII Encontro Nacional de Estudos Populacionais, Abep, 1992. . A questão regional brasileira pós-1980: desconcentração econômica e fragmentação da economia nacional. Campinas: tese de doutorado IE/Unicamp, 1996. Piccioto, Sol. "The internationalization of the State". Capitalism and Class, nº 43, 1991. Portes, Alejandro e Stepick, Alex. City on the edge: the transformation of Miami. Berkeley: University of Califórnia Press, 1993.

EDUARDO MARQUES E HAROLDO TORRES É importante observar q u e os fluxos de passageiros incluem tanto movimentos de negócios q u a n t o de turismo. Por essa razão, outras cidades, inclusive as n ã o discriminadas, apresentam p r o p o r ç õ e s elevadas de fluxos. Já os fluxos internacionais, m e s m o de passageiros, deixam claro o papel de São Paulo e do Rio de Janeiro c o m o nós de c o n e x ã o do Brasil com a América Latina e o resto do m u n d o , e a diferença entre os fluxos das duas cidades ressalta a importância muito maior de São Paulo. O fluxo de carga acentua ainda mais a tendência de centralidade da metrópole paulista.

São Paulo

Agências bancárias

2.157

Rio de Janeiro 1.113 407 Belo Horizonte 238 Salvador Porto Alegre 371 26 Campinas Brasília 213 Manaus 67 Outras cidades ND

Transporte aéreo de carga (% do total do país)

Doméstico Internacional

Doméstico Internacional

5,3 5,5 4,8 0,9 9,4 2,6 38,2

67,3 21,3 0,5 2,7 2,2 0,0 0,3 0,4

25,2

5,3

24,3

11,6 1,9 4,8 5,6 9,2 7,3 10,1

Reich, Robert. The work of the nations: preparing ourselves for the 21st century. Nova York: Knopf, 1992.

. e Lago, Luciana. "Restructuring in large Brazilian cities: the centre/periphery model". International Journal of urban and Regional Research, 19(3), 1995.

Transporte aéreo de passageiros (% do total do país)

31,5 13,8

Preteceille, Edmond e Ribeiro, Luís C. "Tendências da segregação social em metrópoles globais e desiguais: Paris e Rio de Janeiro nos anos 1980". Revista Brasileira de Ciências Sociais, 14(40), 1999.

Ribeiro, Luís C. "Rio de Janeiro: metrópole partida". Novos Estudos, nº 45, 1996.

Tabela 10 Agências bancárias e fluxo de transporte aéreo Brasil 1992 Cidades

Presidência da República (Brasil). Brasil, 1996: from reform to growth. Brasília, 1996 (mimeo).

41,7 18,5 1,2 1,2 2,7 29,0

Rocha, Sônia. "Metropolitan poverty in Brazil: economic cycles, labor market and demographic trends". International Journal of Urban and Regional Research, 19(3), 1995. Rodrigues, Denise. Os novos investimentos no Brasil: Aspectos setoriais e regionais. Rio de Janeiro: BNDES, 1998 (série Perfis Setoriais). Sanchez, Fernanda. "Políticas urbanas em renovação: uma leitura crítica dos modelos emergentes". Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais, nº 1, 1999. Santos, Ângela. Complexo automotivo. Rio de Janeiro: BNDES, 1998 (série Perfis Setoriais).

0,3 2,1 4,3

Fonte: IBGE/Ipea/Nesur (projeto "Regiões de influência das cidades", 1993); IBGE (Deptº de Geografia).

. e Pinhão, Caio. Panorama da indústria automobilística na América do Sul. Rio de Janeiro: BNDES, 1997 (série Perfis Setoriais). Santos, Milton. A urbanização brasileira. São Paulo: Hucitec, 1993.

Nota: ND - dado não disponível.

A informação relativa aos fluxos internacionais reforça a centralidade das duas principais cidades, m a s nesse caso p o d e m o s observar u m a elevada participação da cidade de Campinas (aeroporto de Viracopos), q u e supera o fluxo relacionado ao Rio de Janeiro, c o m 29% dos fluxos internacionais de carga aérea. Vale destacar t a m b é m q u e cidades c o m o Brasília, Salvador, Porto Alegre e principalmente Manaus apresentam razoável importância em relação aos fluxos domésticos de carga aérea, m a s são de p e q u e n a expressão q u a n d o se observam os fluxos de carga internacional. As cidades de São Paulo e Campinas, juntas, m o v i m e n t a m mais de 70% da carga internacional aérea no país.

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163

. Por uma economia política da cidade. São Paulo: Hucitec/Educ, 1994. Sassen, Saskia. The informal economy in low-income communities. Nova York: Columbia University, 1987 (mimeo). . The global city: New York, London, Tokyo. Princeton: Princeton University Press, 1991. . Cities in a world economy. Thousand Oaks: Pine Porge Press, 1994.

SÃO PAULO NO CONTEXTO DO SISTEMA MUNDIAL DE CIDADES De forma geral, essas evidências empíricas sustentam o a r g u m e n t o de q u e São Paulo, m e s m o c o m m e n o r p r o d u ç ã o industrial ( e m t e r m o s relativos), m a n t e v e a sua centralidade e capacidade de c o m a n d o sobre a economia nacional nas últimas décadas, inclusive c o m o a u m e n t o da concentração de serviços produtivos e financeiros 1 7 . Essa t a m b é m é a conclusão de muitos outros analistas (Azzoni, 1987; Santos, 1994; Diniz e Crocco, 1995). Assim, m e s m o c o m a d e s c o n c e n t r a ç ã o industrial São Paulo continua a ser a principal m e t r ó p o l e nacional e o principal elo de ligação da economia brasileira c o m o restante do m u n d o . Contudo, precisamos explorar este a r g u m e n t o c o m cuidado. A primazia nacional n ã o implica obrigatoriamente status de cidade global, q u e , se assim fosse, t a m b é m deveria ser atribuído a Lima, Santiago, Bogotá, Caracas, São D o m i n g o s etc. — questão q u e discutiremos a seguir.

A abertura comercial e os fluxos econômicos

O início d o s a n o s 1990 t a m b é m trouxe importantes m u d a n ç a s na economia brasileira c o m respeito à sua abertura. A a g e n d a de livre-mercado adotada a partir da administração Collor levou, p o r e x e m p l o , a u m a r e d u ç ã o das tarifas de comércio exterior brasileiras de u m a média de 32% em 1989 para u m a m é d i a de 14% em 1995 (Presidência da República, 1996). Essa r e d u ç ã o gerou a intensificação das c o n e x õ e s da e c o n o m i a brasileira com os m e r c a d o s estrangeiros, a u m e n t a n d o as importações em 180% e as exportações em 60% (tabela 11).

Tabela 11 Comércio internacional e com o Mercosul Brasil 1990-98 Anos Comércio com países Comércio internacional Participação do do Mercosul (US$ bilhões) (US$ bilhões) Mercosul (%) Exportações Importações Exportações Importações Exportações Importações 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998

1,32 2,31 4,10 5,40 5,92 6,15 7,31 9,04 8,88

2,32 2,27 2,25 3,36 4,02 6,82 8,27 9,62 9,42

31,41 31,62 35,86 38,60 43,54 46,50 47,75 52,99 51,12

Fonte: Ministério da Indústria e Comércio. 164

NOVOS ESTUDOS N.° 56

20,66 21,04 20,55 25,48 33,10 49,70 53,3 61,36 57,55

4,20 7,31 11,43 13,99 13,60 13,23 15,31 17,01 17,37

11,23 10,79 10,95 13,19 12,15 13,72 15,60 15,68 16,37

(17) As informações disponíveis nesse caso são escassas e dispersas, mas o mercado de publicidade, por exemplo, hoje altamente internacionalizado, se concentra em Sâo Paulo: as quinze maiores empresas de publicidade instaladas no Brasil aí se localizam, tendo quase todas elas atuação em outros países da América do Sul (cf. Gazeta Mercantil, 07/06/99, p. C-8). Informações mais recentes sobre a distribuição do PIB regional confirmam essa hipótese. De acordo com dados produzidos recentemente pelo IBGE, "a participação de São Paulo no PIB da indústria de transformação do país caiu de 51,58% em 1985 para 43,97% em 1997. Essa queda, no entanto, foi altamente compensada pela participação nos serviços. [...] os serviços de intermediação financeira cresceram sua participação de 41,32% para 48,88%" (cf. Gazeta Mercantil, 22/02/2000, p. A-9).

EDUARDO MARQUES E HAROLDO TORRES Ao m e s m o t e m p o foi criado o Mercosul, c o m o q u e a u m e n t o u em quatro vezes o m e r c a d o regional em cinco anos. No curto p e r í o d o de 1990 a 1998 as exportações do Brasil para Argentina, Uruguai e Paraguai passaram de US$ 1,32 bilhão para US$ 8,88 bilhões, o q u e representou cerca de 17% de todas as exportações do país em 1998. A Bolívia e o Chile se associaram ao Mercosul em 1996, fortalecendo o bloco e abrindo u m a porta para o Pacífico. Se esse processo continuar, em breve os países do Mercosul p o d e r ã o se tornar os mais importantes parceiros comerciais do Brasil. É importante observar q u e a conjuntura de crise da economia mundial em 1998 e 1999 t e n d e u a afetar o comércio no âmbito dos países do Mercosul. Contudo, projetos conjuntos nas áreas de energia e transportes estão se concretizando, c o m o p o r e x e m p l o o g a s o d u t o Brasil-Bolívia. Empresas e fundos de p e n s ã o chilenos estão investindo nos processos de privatização no Brasil e na Argentina. Algumas das maiores empresas privadas brasileiras estão investindo na Argentina, em áreas c o m o a bancária (Itaú), de b e b i d a s (Brahma) e alimentos (Sadia). G r u p o s argentinos c o m o o Bung a n d Born, YPF e Perez C o m p a n c estão fazendo significativos investimentos no Brasil nas áreas de agroindústria, petroquímica, energia e telefonia. Várias empresas multinacionais — c o m o Fiat, Ford, GM, Ericsson, Du Pont, Cargill, Whirlpool, Monsanto, Nabisco etc. — passaram a adotar u m a estratégia integrada para o Mercosul (Cepal, 1998). São Paulo t e n d e a se tornar um dos locais preferenciais para a sede de empresas multinacionais para a América do Sul e m e s m o para a América Latina, s o b r e t u d o em razão do p e s o relativo da economia brasileira 18 . De fato, em 1997 as v e n d a s das c e m maiores empresas multinacionais na América Latina atingiram US$ 250 bilhões, das quais 39,4% foram feitas no Brasil, 24,3% no México e 22,7% na Argentina (Cepal, 1998). Em outras palavras, d a d a a crescente internacionalização e integração das economias da América Latina, é provável q u e p o s s a m o s começar a falar de novas centralidades urbanas em âmbito macrorregional. A competição pela centralidade entre cidades c o m o São Paulo, B u e n o s Aires, Rio de Janeiro, Cidade do México e Miami vai d e p e n d e r principalmente das estratégias espaciais das grandes empresas multinacionais ao definirem os seus escritórios regionais, centros regionais para pesquisa e desenvolvimento e centros de p r o d u ç ã o 1 9 . Ao longo do processo, parece existir alguma m a r g e m de ação para as elites políticas e o p o d e r público locais, e m b o r a nesse particular a situação de São Paulo n ã o mereça destaque, visto q u e suas elites locais p a r e c e m n ã o dispor de projetos de desenvolvimento n e m de visão de conjunto para o p a p e l da cidade nos contextos nacional e internacional 2 0 . A abertura comercial descrita acima ocorreu em um cenário de crescente abertura financeira. A partir de 1993 os investimentos externos nos mercados de capitais brasileiros cresceram de forma muito significativa. Em 1991 as bolsas brasileiras receberam aproximadamente US$ 500 milhões em investimentos externos, e em 1997 esses investimentos alcan-

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(18) Um exemplo disso é a recente decisão da Ford de criar uma divisão para a América do Sul com sede em São Bernardo do Campo. Essa decisão segue as estratégias anteriores da Volkswagen, com sede em São Paulo, e da Fiat, com sede em Belo Horizonte (cf. Gazeta Mercantil, 17/08/ 98, p. B-7). Existem, entretanto, contratendências, sendo Miami a mais forte competidora na localização de sedes para a América Latina. Um levantamento recente da Beacon Council, entidade que congrega 302 multinacionais norteamericanas, indicou que cerca de metade delas tem sua matriz para a América Latina em Miami (cf. Gazeta Mercantil Latino-Americana, 12/10/98). (19) O mercado de trabalho brasileiro sempre foi mais polarizado do que o dos países desenvolvidos, o que é fartamente evidenciado pelos dados de distribuição de renda. (20) A atual gestão municipal, risível com relação à gestão da cidade e às políticas sociais, tem ficado inteiramente a reboque de projetos privados de pequena ou nenhuma utilidade para a cidade e sua população, mas que prometem produzir algum impacto na mídia. Esse estilo foi inaugurado pelo prefeito anterior, que encampava projetos privados e criava os seus próprios fatos (e políticas) sem importância, enquanto a cidade se deteriorava e a dívida municipal explodia. A atual administração não consegue nem mesmo criar seus factóides, usando apenas os propostos pelo setor privado. Ao menos nessa categoria, se não em outra mais escandalosa, se classifica o projeto do grupo Brasilinvest de construir no centro de São Paulo o maior prédio do mundo, com 494 metros de altura e 103 andares, em associação com o Maharishi Global Development Fund. O projeto envolve investimentos internacionais de US$ 1,65 bilhão e produziria uma área construída de 1,3 milhão m2, totalmente dissociado de qualquer projeto de desenvolvimento econômico ou ocupação do território. São inúmeras as "vantagens" oferecidas pela prefeitura municipal, em especial a desapropriação de uma área correspondente a uma cidade em região totalmente coberta por infra-estrutura urbana. Do governo do estado, os incorporadores pedem nada menos que uma estação de metrô (cf. Folha de S. Paulo, 07/06/99).

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çaram US$ 32,2 bilhões (tabela 12). Em 1998, como internacional e dos seus rebatimentos na economia investimentos estrangeiros se reduziu para US$ 21,9 entradas e saídas foi negativo pela primeira vez em de US$ 6,5 bilhões.

efeito direto da crise brasileira, o total de bilhões e o saldo de sete anos, em cerca

Tabela 12 Fluxo de investimentos estrangeiros e total anual negociado nas bolsas de valores Brasil 1991-98

Anos

Em bilhões de US$ Total negociado nas bolsas

Fluxo de investimentos estrangeiros Entrada

1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998

0,482 2,966 14,614 20,532 22,026 22,936 32,192 21,887

0,096 1,6552 9,136 16,778 21,498 19,342 30,577 28,349

Saída 0,386 1,314 5,478 3,752 0,528 3,594 1,615 - 6,462

Saldo 13,37 20,53 57,41 109,50 79,19 112,11 203,26 ND

Fonte: Comissão de Valores Mobiliários. Nota: ND - dado não disponível.

C o m o conseqüência desse processo de crescimento acelerado d o s volumes negociados nos anos 1990, o v o l u m e total de negócios das bolsas de valores brasileiras cresceu mais do q u e quinze vezes entre 1991 e 1997, passando de US$ 13,4 bilhões para US$ 203,2 bilhões, s e g u n d o a Comissão de Valores Mobiliários. A maior parte deste movimento (mais de 90%) está concentrada na bolsa de São Paulo. Até os anos 1980 as bolsas de São Paulo e do Rio de Janeiro c o m p e t i a m pela primeira posição no m e r c a d o nacional, mas a internacionalização do m e r c a d o contribuiu para tornar a bolsa paulista a maior do país. Hoje os valores médios diários nela negociados representam quarenta vezes os negociados na bolsa do Rio. A recente integração dessas bolsas c o m p r o v a a h e g e m o n i a da Bovespa 2 1 . São Paulo tem também u m a g r a n d e bolsa de mercadorias e futuros (BMF), a quarta maior do m u n d o , n e g o c i a n d o milhares de contratos de câmbio, juros e commodities. Para efeito de c o m p a r a ç ã o , observe-se q u e em 1997 as bolsas de valores da Argentina, do Chile e do México movimentaram respectiva-

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(21) A bolsa do Rio ficou com o importante mercado de títulos públicos, e a Bovespa, com o mercado de ações. Esta divisão tem origem em uma decisão política.

EDUARDO MARQUES E HAROLDO TORRES mente US$ 25,70, US$ 7,45 e US$ 52,65 bilhões, q u e correspondiam em conjunto a a p e n a s 42,4% do m o v i m e n t o brasileiro.

Conclusão

Em síntese, tanto os d a d o s relativos ao processo de integração das economias regionais c o m o aos investimentos financeiros sugerem q u e São Paulo tem se destacado significativamente c o m o cidade de c o m a n d o na década de 1990. Os processos apresentados confirmam a importância do papel da cidade c o m o c o n e x ã o entre a economia brasileira e a economia mundial. No entanto, essas dinâmicas só se tornaram nítidas a partir da abertura da e c o n o m i a brasileira no início da década de 1990. A desconcentração da indústria e a precarização do m e r c a d o de trabalho paulista estavam presentes em diferentes graus d e s d e os anos 1970 (no caso da desconcentração) e 1980 e p o d e - s e creditá-las a fatores predominantemente nacionais ou locais. Apenas c o m a abertura comercial — ao se fortalecerem os vínculos entre a economia brasileira e a economia mundial — p a r e c e m emergir os m e s m o s tipos de condição q u e formam ou produzem outras cidades globais. Embora os antigos mecanismos ainda estejam presentes, c o m o mostra a intensa guerra fiscal entre estados ocorrida nos últimos anos, é provável que as transformações mais recentes no m e r c a d o de trabalho e nas atividades econômicas e, em especial, o n o v o ciclo de investimentos se devam à constituição desse n o v o cenário produtivo no país. Trata-se de uma economia mais internacionalizada e c o m um n o v o p a d r ã o locacional de atividades produtivas, em q u e São Paulo teria, aparentemente, p a p é i s de comando mais intensos do q u e os cumpridos até então, mediante um aprofundamento do processo divisado p o r Azzoni (1985). Esses processos têm p r o d u z i d o e n o r m e s impactos sociais no contexto da cidade de São Paulo. Entretanto, o debate local n ã o os tem discutido profundamente, m e s m o p o r q u e é p e q u e n a a atenção dedicada pela literatura sociológica a esses processos, analisados até agora q u a s e q u e totalmente p e l o â n g u l o da economia. É importante enfatizar q u e as conseqüências sociais da desconcentração e da reestruturação industrial são claramente negativas. A cidade e muitos de seus grupos sociais têm ficado mais p o b r e s em termos relativos; os e m p r e g o s industriais caíram significativamente, e n q u a n t o os outros setores da economia q u a s e n u n c a foram capazes de criar e m p r e g o s no m e s m o ritmo, c o m a m e s m a qualidade e nos m e s m o s locais. Esses processos têm se refletido diretamente nos padrões de moradia e de condições de vida dos grupos sociais mais pobres, dando origem a novas formas de p o b r e z a urbana impossíveis de caracterizar com as ferramentas de análise disponíveis no m o m e n t o . Ao m e s m o t e m p o , a sofisticação do m e r c a d o financeiro e dos serviços produtivos p a r e c e estar consolidando um s e g m e n t o de profissionais de alta

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SÃO PAULO NO CONTEXTO DO SISTEMA MUNDIAL DE CIDADES

qualificação e elevado r e n d i m e n t o t a m b é m presente nas cidades globais, ampliando a antiga e recalcitrante polarização de nosso m e r c a d o de trabalho. Esses g r u p o s sociais têm se encastelado em bairros fortificados como Alfaville e T a m b o r é , em um processo a p a r e n t e m e n t e similar ao presente nas cidades globais (Caldeira, 1996). Entretanto, u m a análise mais detida desses p a d r õ e s de moradia indica q u e a nova segregação socioespacial brasileira associa traços dos e s p a ç o s de baixa d e n s i d a d e característicos da habitação de classe média d o s "trinta anos gloriosos" do pós-guerra a elementos das "cidadelas urbanas" habitadas pelos indivíduos engajados no t o p o do m e r c a d o de trabalho das cidades globais (Sorkin, 1992; Davis, 1992; Sassen, 1991). Assim, tanto do p o n t o de vista e c o n ô m i c o q u a n t o principalmente em relação à p r o d u ç ã o das cidades e às condições de vida dos seus g r u p o s sociais, a c o m p r e e n s ã o das transformações recentes nos principais e s p a ç o s metropolitanos d o país d e p e n d e d a construção d e u m n o v o conjunto d e ferramentas analíticas q u e leve em conta os processos globais, mas os associe às dinâmicas locais de forma conceitualmente sólida. Essa tarefa, necessariamente coletiva, ainda está p o r ser executada, mas nos parece q u e n ã o p o d e prescindir de diálogos claros e diretos c o m a literatura internacional e a realidade das principais cidades do sistema mundial.

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Recebido para publicação em 8 de setembro de 1999. Eduardo Marques é doutor em Ciências Sociais (IFCH/Unicamp) e pesquisador da Fapesp no Cebrap. Haroldo Torres é doutor em Ciências Sociais (IFCH/Unicamp), assessor da Fundação Seade e pesquisador do Cebrap.

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