Sempre uma coisa a seguir à outra. André Cepeda
Descrição do Produto
André Cepeda Ana Pires Quintais
André Cepeda apresenta-‐nos um conjunto de fotografias feitas a partir
das colecções disponíveis nos Gabinetes de Física e de Zoologia do Museu da Ciência. Dispostas em dois conjuntos através de um formato seriado, numa sequência vertical e horizontal, as imagens parecem sugerir uma história carregada de mistério, aventura e espanto. Uma narrativa próxima das histórias fantásticas descritas nas Voyages Extraordinaires de Jules Verne ou em The Time Machine de H. G. Wells, obras que os instrumentos científicos fotografados por Cepeda parecem certificar. Estas são fotografias de objectos que indiciam uma jornada, uma procura motivada talvez, pelo desejo de recordar ou mesmo de decifrar um momento do passado, cujo protagonista pode ser o artista ou alguém já desaparecido, perdido na voragem da história que as imagens fotográficas permitem testemunhar. Ou pode calhar-‐nos a nós, aos observadores de tais imagens, esse papel de herói e aventurarmo-‐nos na tradução do ocorrido, na leitura de pistas que, enigmáticas, preenchem de cor e de realismo o trabalho de André Cepeda.
Confirmando a ideia da fotografia como “um incitamento ao devaneio”,1
como um constante convite “à dedução, especulação e fantasia”,2 a exposição patente no átrio do Laboratório Chimico inquire com toda a força o seu observador. Formas piramidais e circulares, um feixe de luz, objectos com cordas e tubos de metal, rasuras e partículas microscópicas acrescentam alguma dose de inquietação quanto à natureza da viagem, quanto ao destino do herói desconhecido. O macaco saturado de vermelho, ou melhor, os dentes do macaco cuja imagem se encontra tingida de vermelho permitem o transporte para um mundo catastrófico e pós-‐apocalíptico de pandemias, surtos e contágios, loucura e morte. Se preferirmos outra história, podemos então escolher olhar para este mamífero através das lentes científicas e contextualizadas que o presente espaço físico proporciona, confrontando o olhar aterrorizado do animal que olha para nós, um olhar petrificado, duplamente congelado – primeiro pela ciência e agora 1 Susan Sontag (1977/2012). Ensaios sobre Fotografia. Lisboa: Quetzal. pp: 24 2 Idem. pp. 31
pelo take fotográfico de Cepeda. Uma história que pode ser também a história da própria fotografia, um medium que paira entre a ciência e a arte, entre a vida e a morte, entre o tempo e o espaço, revelando-‐se mais do que um instrumento, mais do que uma mensagem, mais do que um produtor de imagens bidimensionais, sublinhando a capacidade da fotografia em fornecer múltiplas histórias e abrindo passagem para inúmeras possibilidades narrativas, multifacetadas e não-‐ lineares.
Nesta sequência de imagens que se desdobram a meio tempo e que
integram um tríptico em separado – três fotografias que surpreendem o olhar através da repetição de algo indecifrável – podemos ler um conjunto de fotografias que se unem para contar não uma, mas múltiplas histórias, e que produzem uma exposição que consegue envolver o visitante/espectador num conto fantástico e inquietante, num mundo perdido mas real, num universo de objectos vivos e escultóricos que narram histórias imaginárias e poderosas. Outubro, 2015 In VVAA (2015). Anozero’15. Um lance de dados. Textos e ensaios. Bienal de Arte Contemporânea de Coimbra. Coimbra: Anozero e Edições Almedina, SA. (pp. 113-‐ 115).
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