Sergio Buarque de Holanda. Interpretes do Brasil: Classicos, rebeldes, renegados. Boitempo, 2014.pdf

Share Embed


Descrição do Produto

Sérgio Buarque de Holanda

od em

o

Thiago Lima Nicodemo

O

Pa

ra

le i

tu

ra

de

Th

ia

go

Li

m

a

N

ic

ano de 1936 foi dos mais importantes para Sérgio Buarque de Holanda, pois, além de ter publicado seu primeiro livro, Raízes do Brasil, como volume de abertura da “Coleção Documentos Brasileiros”, da Editora José Olympio, casou-se, no Rio de Janeiro, com Maria Amélia Buarque Alvin, com quem teve uma relação que durou toda a sua vida e sete filhos. No mesmo ano, ele vivenciou outra experiência definitiva em seu percurso intelectual ao receber do seu padrinho de casamento religioso, Prudente de Moraes, neto, o convite para trabalhar na recém-fundada Universidade do Distrito Federal. A universidade era um projeto pioneiro da Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro, iniciado no ano anterior. Foi idealizada por Anísio Teixeira, numa colaboração entre professores estrangeiros, majoritariamente franceses, como Pierre Deffontaines, Henri Hauser e Henri Tronchon, e nomes emergentes no cenário nacional, como Gilberto Freyre, Afonso Arinos de Mello Franco, Mario de Andrade, Manuel Bandeira, dentre outros. Sérgio Buarque de Holanda foi assistente na cadeira de História Moderna do professor Henri Hauser, talvez o intelectual mais influente do grupo de professores estrangeiros no Brasil. Hauser havia acabado de se aposentar como o primeiro professor da cátedra de História Econômica da Sorbonne, sucedida por Marc Bloch. Nos anos anteriores, Hauser havia cumprido um papel importante no quadro de profissionalização e especialização da história como disciplina, desde sua participação em revistas como a Revue Historique e a Revue d’Histoire Moderne et Contemporaine, e, mais tarde, em 1929, ao apoiar a criação da famosa revista Annales d’Histoire Économique et Sociale. Ele também foi o responsável, de acordo com Marieta de Moraes Ferreira, pelas indicações de Fernand Braudel e Pierre Moimbeig como professores da recém-fundada Universidade de São Paulo (USP)1. 1 Marieta de Moraes Ferreira, “Os professores franceses e o ensino da história no Rio de Janeiro nos anos 30”, em Marco Chor Maio e Glaucia Villas Bôas (org.), Ideias de modernidade

Intérpretes do Brasil Final.indd 141

25/10/2013 12:45:10

142

INTÉRPRETES DO BRASIL

de

Th

ia

go

Li

m

a

N

ic

od em

o

Não foram poucas as vezes que Sérgio Buarque de Holanda demonstrou otimismo com a institucionalização da universidade e a especialização do conhecimento no Brasil2. Por vezes, reconheceu que a experiência como professor universitário e o “estreito convívio” com Henri Hauser impulsionaram um processo salutar de especialização. Em suas próprias palavras, em texto de maturidade, ao se referir às experiências com Hauser e na universidade, diz: “me haviam forçado a melhor arrumar, ampliando-os consideravelmente, meus conhecimentos nesse setor, e tentar aplicar os critérios aprendidos ao campo dos estudos brasileiros, a que sempre me havia devotado, ainda que com uma curiosidade dispersiva e mal-educada”3. Mesmo em Raízes do Brasil a especialização das letras cumpre um papel estratégico como um dos aspectos necessários para a modernização da sociedade brasileira. A intelectualidade do Brasil ainda era ligada a uma cultura personalista, que constitui uma tradição intelectual solene e rebuscada fundamentada no preceito romântico de que o homem de letras é uma figura de exceção, e sua atividade, estando acima das outras profissões, reveste-se de uma espécie de “poder mágico” ou “dom de nascença”. O intelectual, nesse contexto, tende a uma certa generalidade e dispersão, já que a matéria intelectual opera na esfera de seus interesses particulares e de seu círculo de amizades. O resultado para Sérgio Buarque de Holanda é que as ideias circulam e são “assimiladas” como modismos, mas dificilmente se enraízam, representando genuinamente pulsões sociais4.

tu

ra

e sociologia no Brasil: ensaios sobre Luiz de Aguiar Costa Pinto (Porto Alegre, Universidade/ UFRGS, 1999), p. 11-2. Como, por exemplo, no trecho: “No que se refere à história, inclusive à história do Brasil, em seus diferentes setores, foi certamente decisiva e continua a sê-lo, sobre as novas gerações, a ação de alguns daqueles mestres: de um Jean Gagé, por exemplo, e de um Fernand Braudel em São Paulo; de um Henri Hauser e de um Eugène Albertini, na hoje extinta Universidade do Distrito Federal. O que puseram a realizar até aqui, no sentido de sugerir novos tipos de pesquisa e suscitar problemas novos, é apenas sensível, por hora, em certo tipo de trabalhos – cursos especiais, seminários, teses de concurso – que pela sua mesma natureza hão de fugir ao alcance de um público numeroso. Não parece excessivo acreditar, entretanto, que neles já se encontre o germe de um desenvolvimento novo e promissor dos estudos históricos no Brasil”, Sérgio Buarque de Holanda, “O pensamento histórico no Brasil durante os últimos cinquenta anos”, Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 15 jul. 1951.

Pa

ra

le i

2

Idem, Tentativas de mitologia (São Paulo, Perspectiva, 1979), p. 14. Sobre a experiência de Sérgio Buarque de Holanda na Universidade do Distrito Federal, ver Marcus Vinicius Corrêa Carvalho, Outros lados: Sérgio Buarque de Holanda, crítica literária, história e política, tese de doutorado, Campinas, IFCH-Unicamp, 2003, p. 181-2. 3

4 Sérgio Buarque de Holanda, Raízes do Brasil (26. ed., São Paulo, Companhia das Letras, 1995), p. 155. Sobre o tema ver: Pedro Meira Monteiro, A queda do aventureiro. Aventura, cordialidade e os novos tempos em Raízes do Brasil (Campinas, Unicamp, 1999), p. 191.

Intérpretes do Brasil Final.indd 142

25/10/2013 12:45:10

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.