Série entrevistas - Zbigniew Brzezinski / Q&A Series - Zbigniew Brzezinski

July 8, 2017 | Autor: Claudia Antunes | Categoria: Iranian Studies, Grand Strategy, Zbigniew Brzezinski, US Foreign Policy, American Grand Strategy
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ENTREVISTA/ ZBIGNIEW BRZEZINSKI

"Não tenho ilusão sobre fim rápido da bomba atômica"
Estrategista veterano da política externa dos EUA diz que negociação com
Irã deve ser mais ampla

GRANDE estrategista da política externa americana no século 20, Zbigniew
Brzezinski defende negociações amplas sobre o programa nuclear do Irã, em
que o país receba garantias de que não será atacado ao abrir mão da bomba.
Ele afirma que os EUA devem tomar a frente de um plano para a criação do
Estado palestino, porque o conflito ameaça a segurança americana, e
demonstra ceticismo sobre a meta, expressa pelo presidente Barack Obama, de
pôr fim aos arsenais atômicos. Brzezinski diz que os EUA não pretendem
abdicar de sua hegemonia: "Se a atual proeminência da América entrasse em
declínio rápido, todo o mundo seria lançado no caos político e econômico".

CLAUDIA ANTUNES
DA SUCURSAL DO RIO 

Como assessor de Segurança Nacional do presidente democrata Jimmy Carter
(1977-1981), Zbigniew Brzezinski contabilizou uma vitória importante e um
grande revés no Oriente Médio: o acordo de paz Israel-Egito, o primeiro
entre o Estado judeu e um vizinho árabe, em 1978; e a Revolução Islâmica de
1979 no Irã, com a tomada de reféns na Embaixada dos EUA, que teve peso
decisivo para a vitória do republicano Ronald Reagan na eleição
presidencial de 1980.
A região e os dois países, Israel e Irã, continuam nos cálculos de
Brzezinski, que em março esteve na Casa Branca, com outros antigos
assessores presidenciais, para tratar do assunto com o atual conselheiro de
Segurança Nacional, general James Jones, e Barack Obama. A urgência de um
acordo de paz na Palestina e o programa nuclear iraniano foram os
principais temas desta entrevista à Folhade um Brzezinski de voz firme, aos
82 anos.


FOLHA - O sr. é um dos veteranos da política externa americana que
propuseram que Obama apresente um plano pronto para a solução de dois
Estados do conflito israelense-palestino. Acredita que ele fará isso?
ZBIGNIEW BRZEZINSKI - Eu não sei.
FOLHA - Por que defende essa abordagem?
BRZEZINSKI - Porque acho que um arranjo de paz no Oriente Médio é de
interesse de todas as partes envolvidas. Os EUA estão cada vez mais
ameaçados pelo radicalismo e o extremismo na região, e parte disso é
provocada pelo conflito contínuo entre Israel e os palestinos. Israel
precisa de paz para se tornar uma parte aceita do Oriente Médio, no qual
viva em segurança e prospere e possa até mesmo se tornar a Cingapura da
região. E os palestinos têm direito à dignidade política, à independência
política e a um território nacional.
FOLHA - E os dois lados, sozinhos, não poderiam alcançar um acordo? 
BRZEZINSKI - Isso é absolutamente certo. A questão é que esse conflito
agora se prolonga por várias décadas, e todo esforço de paz baseado apenas
na negociação entre os dois lados fracassou.
FOLHA - Faz sentido negociar sem incluir o Hamas? 
BRZEZINSKI - De uma forma ou de outra, os elementos extremistas dos dois
lados terão de ser envolvidos, e, se a acomodação proposta responder aos
interesses básicos tanto de Israel quanto do público árabe, os extremistas
acabarão isolados politicamente.
FOLHA - Acredita na chance de o Hamas aderir a um acordo? 
BRZEZINSKI - Se o acordo parecer justo e atraente para uma porção
significativa dos palestinos, e se ele trouxer benefícios tangíveis,
acredito que o Hamas pode muito bem evoluir. Mas é algo que nunca saberemos
se acontecerá se não tentarmos fazer acontecer.
FOLHA - Houve esse choque recente entre Obama e o premiê Netanyahu após o
anúncio de construções em Jerusalém Oriental. Não está claro, no entanto,
se Israel vai suspender as construções. Qual deve ser o próximo passo dos
EUA?
BRZEZINSKI - Em geral, eu apoio a posição que Obama adotou até agora, e
veremos como Israel responde às propostas americanas mais recentes.
FOLHA - O balanço de forças dentro dos EUA favorece que haja mais pressão
sobre Israel?
BRZEZINSKI - Eu acho que o povo americano em geral é a favor de uma solução
pacífica, mas apoiar uma solução pacífica não é a mesma coisa que
pressionar Israel. Uma solução requer compromissos tanto de Israel quanto
dos palestinos. O problema é que nenhum dos dois lados parece disposto a
dar o primeiro passo. A equipe de Obama está penosamente consciente desse
fato.
FOLHA - As últimas iniciativas de Obama na questão nuclear contêm uma
mensagem para o Irã suspender seu programa atômico. Ele será bem-sucedido? 
BRZEZINSKI - Não tenho certeza de que estamos pedindo ao Irã que suspenda
seu programa nuclear [o país tem o direito a tê-lo, como signatário do
Tratado de Não Proliferação]. Acho que pedimos ao Irã provas convincentes e
que concorde com acordos com credibilidade para dar à comunidade
internacional a confiança de que seu programa não está destinado à produção
de armas atômicas.
FOLHA - O sr. já disse que o programa nuclear do Irã deveria ser negociado
num quadro em que os iranianos receberiam garantias de segurança. Obama não
encampou essa iniciativa. Sustenta essa proposta? 
BRZEZINSKI - Eu apoio a inclinação de Obama de negociar com o Irã, mas eu
era a favor no passado e sou ainda hoje de negociações de maior amplitude,
nas quais várias grandes questões, incluindo a segurança regional e as
relações econômicas, sejam tratadas simultaneamente às discussões
específicas sobre a questão nuclear.
FOLHA - O que está impedindo o governo Obama de fazer isso?
BRZEZINSKI - Em parte, a falta de uma resposta palpável do Irã.
FOLHA - Existem outros fatores? BRZEZINSKI - Pode haver alguma hesitação em
ampliar de modo prematuro a pauta de negociações, mas minha opinião sobre
isso é diferente da do governo.
FOLHA - O Itamaraty tem insistido em que há espaço para um pacto no qual o
Irã entregaria parte de seu estoque de urânio pouco enriquecido em troca de
combustível para seu reator de uso médico. A Turquia seria intermediária
dessa troca. A posição brasileira é ingênua?
BRZEZINSKI - Eu não conheço a posição brasileira precisamente. Mas do que
eu já ouvi sobre ela, e, pela sua descrição, me parece que representa um
ponto de vista que deveria ser levado em consideração.
FOLHA - Brasil e Turquia, com cadeiras não permanentes no Conselho de
Segurança, dizem que gostariam de ver mais negociações antes de novas
sanções ao Irã. Se aprovadas, as sanções darão resultado? 
BRZEZINSKI - Não tenho como saber que tipo de sanções será aprovado. Haverá
negociações, e certamente haverá diferentes posições sobre a questão.
Também sabemos que sanções demoram bastante tempo para ter efeito, e que é
melhor que sejam acompanhadas por negociações sérias.
FOLHA - Alguns analistas nos EUA dizem que é inevitável que o Irã obtenha
arma atômica e que será preciso conviver com isso. Concorda?
BRZEZINSKI - Eu espero que isso não aconteça, porque acho que seria
desafortunado, e poderia criar tensões muito sérias nas relações
internacionais. Ao mesmo tempo, tenho confiança em que poderemos conter
qualquer nova potência nuclear, assim como contivemos por muitos anos
potências perigosas e poderosas como a União Soviética stalinista e a China
de Mao Tsé-tung. [ele se refere ao conceito de contenção, da Guerra Fria,
em que o poderio bélico é usado não em conflitos, mas para dissuadir o
oponente de atacar].
FOLHA- Como o senhor avalia a nova estratégia nuclear de Obama? É otimista
em relação ao objetivo de pôr fim aos arsenais atômicos? 
BRZEZINSKI - Eu acredito que as iniciativas adotadas recentemente são uma
contribuição positiva para um mundo que se torne cada vez menos dependente,
por um período prolongado, de armas nucleares. Mas não tenho nenhuma ilusão
de que o movimento nessa direção será rápido e não tenho meios de prever
quando as armas atômicas desaparecerão de todo, se é que isso acontecerá, e
de qualquer forma com certeza não será em pouco tempo.
FOLHA - China e EUA são interdependentes na economia. Mas setores nos EUA
demonstram preocupação de que a China ameace o domínio militar americano no
Pacífico. O sr. teme o desafio militar chinês? 
BRZEZINSKI - Não há dúvida de que a relação entre os EUA e a China tem
importância enorme, talvez central, para os dois países. E eu sei que a
China, em longo prazo, está destinada a ter uma corporação militar cada vez
mais poderosa. No entanto, acho que, neste estágio, análises alarmistas não
são acuradas nem propiciam a manutenção de uma relação bilateral estável e
responsavelmente cooperativa.
FOLHA- O século 20 foi o século americano. O sr. acredita que os EUA terão
a capacidade de manter seu papel proeminente nas questões internacionais no
futuro próximo? 
BRZEZINSKI - No futuro próximo, com certeza. Os EUA não estão se preparando
para abdicar. Mas o futuro próximo são no máximo 20 anos. O que virá depois
é impossível prever com confiança. Mas uma coisa é clara para mim: se a
atual proeminência da América entrasse em declínio rápido, todo o mundo
seria lançado no caos político e econômico.
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