Seringais do Amazonas: cotidiano e doenças

July 25, 2017 | Autor: Monica Lage | Categoria: HISTORIA DA SAUDE
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Rubber tree plantations of the Amazon: Daily life and diseases (1880-1925)

Summary: In the first decades of 1900, the rubber tree plantations of
the Amazon suffered a sharp population increase. This population increase
was due to the arising migration stream, mainly from the Brazilian
northeast . Seduced by rubber, thousands of people migrated to the rubber
tree plantations with hope that, by exploiting latex they could
accumulate wealth and to enjoy a better life. However, given the abundant
wealth that was pouring from the rubber not only health conditions, but
also the living conditions of the rubber tappers were harsh. Affected by
selvatic yellow fever, cholera, malaria and other diseases, tappers who
ventured into the woods, constantly lived a fight against death that
haunted the rubber plantations. Often Cornered by disease and hunger,
tappers became easy prey to epidemics which ravaged the rubber tree
plantations of the Amazon during the period analyzed in this article.

Keywords: rubber tree plantation; tapper; epidemics; Amazonas.







Seringais do Amazonas: Cotidiano e doenças (1880/ 1925)


Mônica Maria Lopes Lage
Antônio Emilio Morga





No final do século XIX, quando começaram a surgir os primeiros
seringais no entorno dos rios amazônicos, as condições de moradia e de
saúde dos desbravadores que ousaram viver da exploração do látex, eram
precárias. Constituídos em lugares de isolamento, os seringais, segundo
Bárbara Weinstein, eram grandes "extensões de área de florestas,
administradas por um patrão, que coordenava a produção da borracha,
mediante arrendamento de estradas de seringa a seus fregueses: os
seringueiro".[1] Neste cenário, poucas eram as alternativas que os
moradores tinham para lidar com as doenças, com as epidemias e com os
problemas de saúde que assolavam a população. Segundo Arthur César
Ferreira Reis, no início da formação dos seringais a impressão que se
tinha era a de que seria impossível conquistar a mata por meio de
concentrações humanas, as doenças e as epidemias eram muitas, as
condições sanitárias péssimas e a mortalidade principalmente na época da
vazante dos rios eram altíssimas.


As condições sanitárias na Amazônia, durante o período
áureo do assalto a floresta, no "rush", autorizavam a
impressão de que não seria possível conquistá-la social e
economicamente pela permanência de concentrações humanas.
Nenhuma sociedade vingaria ali, impondo a sua vontade na
disciplinação do ambiente. A mortalidade era alta, em
particular na época das vazantes.[2]


A literatura indica como os moradores dos seringais, nesta
primeira fase de exploração da borracha se organizaram, em busca da
sobrevivência. O patrão, aquele a quem os seringueiros deviam obrigação e
respeito, estabelecia seu barracao de madeira em um ponto estratégico do
seringal. Ao redor, e respeitando determinada distância, eram
estabelecidos os pequenos casebres de madeira que serviam de moradia para
os seringueiros trabalhadores, em volta ficavam as extensas estradas de
seringa, onde os seringueiros passavam a maior parte do dia.









Figura 01 – Barranco onde os seringueiros se abasteciam de mercadorias


Além dos relatos deixados pelos viajantes, é possível saber sobre
os hábitos de vida dos habitantes do interior do Amazonas, analisando
relatórios deixados por agentes sanitários. Homens que percorreram a
floresta levando remédios, roupas e oferecendo assistência. Este
profissional da saúde era enviado para as regiões mais remotas da mata, e
sua função também era a de observar os hábitos higiênicos e as condições
de moradia da população e, desta forma, relatar e propor as autoridades
de Manaus medidas para amenizar a dor e o sofrimento das pessoas.


Neste artigo, pautaremos nossas análises em alguns relatos deixados
por viajantes que percorreram os autos rios amazônicos, onde relataram
sobre o que viram, sentiram e analisaram, bem como no relatório publicado
no ano de 1924 pelo senhor Dr. Belizário Pena, que na época era diretor
do serviço de saneamento e profilaxia rural do Amazonas. Esse relatório é
conhecido como: "Dois anos de saneamento". Por fim trabalharemos à luz de
alguns jornais que circularam as vilas e comarcas, próximas aos
seringais. Trataremos também a respeito da solidariedade mútua que
contagiava os habitantes da floresta.

















Figura 02 – Seringueiro sangrando as árvores de seringas














Muitos foram os viajantes que percorreram a região da Amazônia. La
Condamine, Martius, Spix, Ave-Lallemant, Louis Agassiz, Henry Walter
Bates, Wallace, dentre outros. Alguns desses viajantes passaram pela
região antes do "boom" da borracha na Amazônia, período em que a região
sofreu suas maiores transformações sociais, políticas e culturas. Outros,
porém, puderam presenciar este momento importante na história da região,
é o caso, por exemplo, de Bates e Wallace. Esses viajantes geralmente
eram naturalistas que vinham para o Brasil em busca de ampliar seus
conhecimentos em determinadas ramificações da ciência.


Ao chegarem, os viajantes se depararam com situações nunca
vivenciadas, era o contraste entre o "mundo civilizado", e a selva. O
trabalho deles consistia em observar os hábitos da população e, colher
espécies de animais e plantas para estudar sua composição e origem.


Como parte do processo de adaptação, os viajantes tiveram que
suportar o calor intenso da mata, se alimentar do que a selva oferecia e
muitas vezes passaram pelos mesmos problemas que a população passava.
Segundo Ana Maria de Morais Belluzo, Henry Bates não ficou imune às
doenças que assolavam a população, ele foi vítima por várias vezes das
constantes epidemias que castigava os habitantes da floresta. Diante de
sua enfermidade Bates relata:


Minha febre parecia ser a culminância da deteriorização da
saúde, que vinha processando a alguns anos. Expusera-me
demais ao sol, trabalhara além das minhas forças, seis
dias por semana, além de tudo, sofrerá muito com a
alimentação má e insuficiente.[3]


Os fatores que ameaçavam a saúde da população eram muitos: terrenos
alagadiços, calor intenso, insetos, má alimentação, tudo isso associado a
falta de hábitos saudáveis, resultava em constantes doenças e epidemias
propiciando um cenário de morte e sofrimento. "As doenças que mais
dizimam a população eram a malária, a beribéri e a polinevrite palustre,
essas doenças provocavam desfalques espantosos na população".[4]





Figura 03- Manipulando ervas medicinais






A luta das autoridades do Amazonas para por fim às constantes
epidemias que assolavam a população e dizimavam inúmeras vidas, começou
logo cedo. À medida que os seringais foram se desenvolvendo e pessoas
foram chegando, mais doenças foram surgindo. Esta situação exigia
respostas rápidas por parte das autoridades e uma das alternativas
encontradas foi a de publicar diariamente nos jornais informações
contendo conselhos médicos, medidas de prevenção e algumas soluções para
os casos mais graves.


Conselhos Médicos:


O paludismo é nosso supremo mal, é pela sua extincção que
devemos fazer convergir todos os esforços possíveis. Outro
morbo aqui não existe que tenha tanta influência
perniciosa, tanta tendência congestiva para o lado das
vísceras abdominaes, arruinando a saúde, predispondo o
organismo a outras moléstias que elle implica e agrava.[5]


Além dos conselhos médicos, publicados nos jornais diariamente, que
serviam como medidas preventivas, as autoridades do Amazonas
disponibilizavam postos itinerantes de atendimento clínico, eram barcos
que passaram regularmente pelos seringais, distribuindo remédios e
divulgando informações sobre hábitos de higiene e prevenção de doenças. O
paciente convalescido era atendido com os devidos cuidados, entretanto,
em casos de recaída após a passagem do barco, o doente ficava a mercê da
sorte, a espera de uma nova oportunidade de atendimento.


O que não se verifica com os nossos postos itinerantes,
pois após a passagem do clinico vizitador, o doente se vê
privado de recursos médicos e pharmaceuticos para fazer
face a uma recaída ou uma convalescência necessária.[6]


Os surtos de malária chegavam muitas vezes a dizimar metade da
população. E os postos de atendimentos itinerários não eram suficientes
para atender a todos. A doença de manifestava inicialmente através de uma
forte indisposição seguida de febres, dores de cabeça, calafrios, calor
intenso e em casos mais graves pelo comprometimento visceral. O único
remédio capaz de amenizar o sofrimento era o quinino e os pacientes
podiam adquiri-lo através dos postos itinerantes. "sabemos que é a
quinina o específico do palludismo por excellência, cumpre, pois,
administrá-la systematicamente desde que a absorpção seja possível"[7].
Porém, nem sempre o organismo aceitava o remédio, e havendo rejeição a
morte era inevitável. "Por carta que nos foi gentilmente mostrada,
sabemos haver fallecido no rio Pauhiny, deste município a senhora Cândida
Rodrigues Cavalcante de Souza, victima de um terrível ataque de
febres".[8]


Estes postos itinerantes de atendimento e assistência aos seringais
tiveram um papel importantíssimo na vida dos moradores. Além de servirem
como elo entre a cidade de Manaus e o interior do Amazonas, trazendo
notícias, informações sobre as ultimas novidades com relação a borracha
enviada para a capital, orientações sobre hábitos higiênicos e
alimentares, eles eram esperados com ansiedade, pois neles era
depositadas a esperança de cura e de sobrevivência.


Estes homens que passavam dias e dias sobre as águas, percorrendo
longas distancias, levando saúde e esperança às comunidades também
sofriam suas agruras, alguns deixavam seus lares, suas famílias e se
colocavam sobre os rios enfrentando épocas de calor intenso, outras de
chuvas torrenciais e ventos fortes. E ao final de cada ano, deveriam
entregar às autoridades um relatório contento informações sobre os
caminhos percorridos por entre os rios amazônicos. Um dos agentes, no
relatório de viagem, descreve minuciosamente os caminhos percorridos no
atendimento das populações que viviam nos seringais


Consegui realizar em 1922 três viagens, percorri o rio
Amazonas até os limites do Pará, e do rio Javary, do lago
o Solimões até o Remate de Males, o Purus até Lábrea,
parte do rio Javary, do lago Ayapuá com os igarapés que
lhes ficam próximos. [9]


E com o tempo, as ações dos agentes sanitários, através dos postos
itinerantes, não foram mais suficientes para resolver os problemas de
saúde da população que se multiplicava. Surge então a necessidade de
criação de hospitais, e estes deveriam ser criados não apenas nos maiores
centros urbanos, ou seja, nas comarcas, mas também nas vilas e vilarejos
próximos aos seringais, garantindo assim assistência médica à todos.


Além da creação de hospitaes nas cidades principais e
postos itinerantes para descobrir os necessitados de
auxilio médico e difundir rudimentos de hygiene, deveriam
ser creados hospitaes em todos e qualquer núcleo de mais
de quinhentos habitantes, quer fossem fazendas, seringais,
ou povoados. Hospitaes esses para prestar socorro não
somente as pessoas do núcleo mais também aos habitantes da
circunvizinhança.[10]




Além do atendimento dos postos de saúde itinerantes e da
assistência medica hospitalar, exista entre os moradores dos seringais do
Amazonas um sistema de solidariedade mútua. Providenciar uma receita
caseira feita com ervas e plantas oferecidas pela floresta, e compartilha-
la com os conhecidos eram atitudes corriqueiras, procurar um curandeiro,
feiticeiro ou benzedor para atender o doente, e em casos mais graves,
percorrer longas distâncias em canoas e barcos com o convalescido a bordo
em busca de um farmacêutico que pudesse lhes prestar socorro, eram
algumas alternativas recorridas. "Nos seringais, como era natural não
havia nem medico nem farmacêutico."[11]


Arthur César Ferreira Reis relata que muitos seringueiros faziam
uso de "café beirão" e outros medicamentos que julgavam apropriados em
momentos de crise, porém essa medida pouco resolvia. A medida mais
sensata era procurar ajuda nos grandes centros urbanos, porém o autor
ressalta ainda, que as remessas de enfermos para Manaus ou Belém nas
gaiolas e lanchas eram interrompidas constantemente para enterrar nas
beiras dos barrancos os doentes que faleciam no percurso.







Figura 04 – Casa de palha onde viviam os seringueiros


















A prática de recorrer a benzedores, feiticeiros e curandeiros
também surgiu como alternativa nos seringais. A pesar de ter sido
proibida pela Coroa Portuguesa desde o período colonial, essa prática era
bastante difundida entre os moradores do interior do Amazonas, talvez
pela necessidade de se apegar a alguma solução imediata, eles recorriam a
tais práticas. Segundo Laura de Melo e Souza[12], um significativo número
de feiticeiros e curandeiros veio degredado de Portugal logo no início da
colonização, essas pessoas, incursas no crime de feitiçaria e
curandeirismo em Portugal, disseminaram tais práticas por onde passaram.
Na ausência de um curandeiro buscavam-se com a sabedoria dos pages as
várias formulas de cura das sociedades indígenas. Entre os seringalistas
os pages tinham preferência, pois acreditavam por serem profundos
conhecedores da floresta e por viverem nelas sabiam exatamente como lidar
com as ervas e quais eram as mais adequadas para as várias enfermidades
que assolavam os seringalistas.


No interior do Amazonas, a feitiçaria, a pajelança, o curandeirismo
e a benzedura eram práticas extremamente comuns entre os moradores.
Apesar dos jornais instruírem a população quando a ineficácia e quanto
aos perigos de destas práticas, os moradores da mata insistiam em
recorrer a elas, pois acreditavam, tinham fé, que a magia e feitiçaria
poderia os livrar das enfermidades.


Victimão, grandemente os habitantes do Purus, as moléstias
agudas das vias respiratórias, o tratamento empregado é
igualmente defeituoso e temos visto em vez de uma poção de
Laennec, os doentes mandarem buscar um curandeiro
qualquer, a que dão o nome de resador ou benzedor o qual
os medica bensendo a parte em que o acham que manifesta
pela dor agudíssima.[13]


Segundo o cronista, do jornal Purus, buscar por curandeiros,
feiticeiros, pages e benzedores contava com a simpatia de pessoas de
vários segmentos sociais.


Isso vê-se em todas as classes e o concurso de tal
superstição mantêm se invencível no preparo da
mortalidade, pela educação do povo em parte e muito mais
pelo abandono em que se acham longe do auxilio medicinais,
a instancia da dor e a tendência de acreditar no
maravilhoso, a míngua de socorros inteligentes e
apropriados impellem o doente de apegar-se as tradições
paternas das velhas raças tupy-lusa, de que descendem.[14]


A grande maioria dos moradores vivia em casas de madeira,
construídas com madeiras "Paxaúba", essas casas eram erguidas do chão,
suspensas por grandes pernas de paus que serviam para protegê-las das
constantes inundações que aconteciam em épocas das cheias dos rios. Esse
era o período de maior proliferação das doenças, a água invadia o
seringal e juntamente com ela, vinham moscas e insetos. O ideal a se
fazer era tomar as providencias de higiene e proteger as janelas e portas
das casas com telas de forma a não permitir a entrada dos insetos.
Entretanto, mesmo com todos os cuidados necessários as epidemias
assolaram os seringais e dizimam muitas pessoas."Devido a vazante do rio,
como sempre acontece nesta época do ano, desenvolveu-se em diversos
pontos cazos de febre palustre, sendo que algumas delas foram
fatais".[15]


Muitas notícias publicadas nos jornais dizem da falta de asseio da
população nos seringais, e muitos relatos de viajantes também mencionam
esta condição entre os moradores da mata. Entretanto, Wallace, viajante
que percorreu a Amazônia no séc. XIX saiu em defesa dos moradores e
afirmou que eles viviam em harmonia com as condições oferecidas pela
mata.


Essa impressão de falta de asseio e ordem desapareceu ao
admitir que essas características "são decorrentes do
clima", porque os amplos e altos cômodos, com pisos de
tabuas, escasso mobiliário, e meia dúzias de porta e
janelas em cada um, podem parecer a primeira vista
desconfortáveis, mas são absolutamente adequados para a
região tropical na qual seriam absolutamente insuportáveis
os quartos cheios de tapetes, cortinas e almofadas.[16]


As doenças nos seringais do Amazonas não se restringiam apenas aos
surtos epidêmicos de malária, a beribéri ou as febres palustres. No caso
das mulheres, por exemplo, os jornais registravam que as principais
doenças sofridas por elas eram conhecidas como flores-brancas,
hemorragias, cólicas uterinas, dores reumáticas e irregularidades
menstruais, sempre seguidas de febres altas. Alguns jornais traziam
colunas semanais sobre a saúde da mulher, informando as mulheres quanto
as principais doenças da região, sobre os métodos de prevenção e
divulgação de tratamentos.


Elizabeth Agassiz, esposa de Louis Agassiz, importante viajante que
percorreu a floresta amazônica por volta de 1865, dedicou parte de sua
viajem para auxiliar o marido em seus relatos, mas também, deixou algumas
de suas observações sobre o modo de vida das mulheres indígenas. E neste
contexto, registrou suas impressões sobre as doenças que elas sofriam,
principalmente nos olhos e na pele.


Mesmo quando se mostra surpresa pela beleza das indígenas
de Tefé, no Amazonas, Elizabeth relata na mesma
oportunidade a recorrência de doenças às quais os índios
estariam predispostos, especialmente nos olhos e na pele.
Apesar da perspicácia, Elizabeth não imagina que a
condição precária de saúde dos indivíduos indígenas podia
dever-se à situação de contato, e chega a dizer que "estes
estão mais sujeitos às doenças do país que os
estrangeiros.[17]






Entre os moradores havia solidariedade. De acordo com os jornais as
receitas caseiras que obtinham sucesso eram repassadas entre a
comunidade, e muitas vezes apareciam nos jornais em forma de depoimentos,
registrando assim, sua eficácia diante do tratamento.


Declaro que minha sobrinha Mariana, 15 annos de idade,
achava-se gravemente doente do peito. Sentia grandes
palpitações de coração, tosse desesperadora e dores
agudisimas no peito e nas costas, quando tomava
respiração. Lembrei-me, depois della ter usado muitos
medicamentos sem resultado, dar-lhe o elogiado "peitoral
de cambara "descoberta do Sr. Visconde de Souza Soares, e
com o uso deste medicamento, achou-se completamente livre
de tão terrível enfermidade.[18]


Além da circularidade de notícias publicadas nos jornais, médicos e
farmacêuticos que residiam nos grandes centros próximos aos seringais,
tinham por hábitos elaborarem os "guias médicos", que eram manuais
contendo informações básicas sobre saúde e, estes manuais eram deixados à
disposição dos moradores. "Acha-se a venda na typographia do jornal do
Purus, à ultima edição da utilíssima obra "Guia medico" para uso dos
habitantes do interior, pelo Ilustre Dr. Hermenegildo Lopes de Campos".
[19]


Um remédio muito usado no tratamento de várias doenças entre os
moradores dos seringais era conhecido como emulsão Scott. Feito a base de
óleo de fígado de bacalhau, esse medicamento era utilizado na prevenção
de várias doenças, auxiliando também, no tratamento de infecções
pulmonares. Sua eficácia era difundida pelos jornais, que alertavam os
moradores a comprarem a legitima emulsão scott, levando o leitor a
entender que imitações do remédio percorriam a região.


Houve um período da historia da extração do látex, onde havia
fartura de mercadorias circulando os seringais, estudos têm mostrado[20]
que no auge da exploração da borracha no Amazonas, as casas aviadoras
abasteciam os barracões com produtos diversos, desde produtos
alimentícios à remédios e roupas adequadas para o viver na mata. Neste
período a alimentação dos moradores dos seringais não era mais tão
precária, principalmente, a daqueles que tinham condições de adquirir os
produtos oferecidos pelos barracões. Porém ao chegar a crise da borracha,
muitas pessoas foram abandonando os seringais e os poucos seringueiros
que permaneceram na floresta voltaram a viver naquela condição de miséria
que marcou os primeiros anos de exploração do látex. Muitas pessoas que
ali permaneceram passaram a alimentar-se basicamente de farinha e peixe e
essa alimentação empobrecida deixava o organismo exposto a mais doenças.


As crianças vêem nuas a beira dos barrancos a passagem dos
navios, não tem os homens a mínina noção de higiene e de
conforto, não sonham ambições, não economizam, o que aliás
seria impossível com a crise presente, de modo que se
acham a comer farinha e peixe, e são incapazes de
enfrentar contratempos, mesmo as moléstias que lhes minam
o organismo pauperado.[21]














Mariana Pantoja, pesquisadora que acompanhou a vida, as histórias e
o cotidiano de uma família por varias gerações nos seringais mais
distantes do Amazonas, revelou através da fala do Sr. Milton que no
período da crise, havia barracões onde nas prateleiras não havia sequer
os produtos necessários a sobrevivência na floresta. "[...], os seringais
estão cheios , os seringueiros trabalham e produzem borracha, o patrão
está lá no barracão, mas não há nas prateleiras fartura dos artigos de
estiva necessários a vida dos grupos domésticos na floresta".[22]


Apesar de todas as diversidades que a floresta impunha aos
seringalistas e diante de todos estes problemas e dificuldades em que
viviam os moradores dos seringais do Amazonas buscavam soluções para seus
problemas. Como demonstra a historiografia o seringalista era um
sobrevivente por natureza. Conhecedor das entranhas da floresta espessa
estes homens reinventaram sua existência diante das epidemias, buscando
nas plantas nativas, nas pajelanças, nas rezas das benzedeiras o conforto
e a cura para as doenças. A fé e o desejo de ser livre da doença eram
fatores que os motivavam a buscarem uma saída diante da morte que os
espreitavas no seu labor diário.





























Referências:

ALVES; José Jerônimo de Alencar. Determinismo climático e salubridade
Amazônica na percepção de Bates e Wallace. In: Caderno, história e
ciências. v.4. n.2. Rio de janeiro 2008.
BELLUZO; Ana Maria de Morais. O Brasil dos viajantes. São Paulo:
Metalivros , 1994.
LEONARD, Victor. Os Historiadores e os rios: Natureza e ruína na Amazônia
brasileira. Brasília: Paralelo 15. Editora Universidade de Brasília,
1999.
PANTOJA, Mariana. Os Milton: Cem anos de história nos seringais. Recife:
Fundação Joaquin Nabuco / Editora Massagana, 2004.
REIS, Artur César Ferreira. O Seringal e o Seringueiro. 2. ed. Manaus:
Editora da Universidade do Amazonas. Governo do Estado do Amazonas, 1977.


SANTOS; Fabiane Venente. Brincos de ouro, saias de chita: Mulher e
civilização na Amazônia segundo Elizabeth Agassiz em viajem ao Brasil
(1865- 1866) In: História, ciência e saúde – Manguinhos, v.2 n.1. Rio de
janeiro. 2007
SOUZA, Laura de Mello e. O diabo e a Terra de Santa Cruz: feitiçaria e
religiosidade popular no Brasil colonial. São Paulo: Companhia das
Letras, 1986.
WEINSTEIN, Barbara. A borracha na Amazônia: expansão e decadência, 1850-
1920. São Paulo: HUCITEC – Editora da Universidade de São Paulo, 1993.

Fontes: Arquivos/ Amazonas

Museu Amazônico
Relatório – Dois anos de saneamento – 1923



IGHA – Instituto Histórico e Geográfico do Amazonas
Jornais:

Correio de Purus – 13 -05 - 1900
Jornal do Purus - 17/06/1911 - 04/06/1911 - 10/04/1904
Senna Madureira – 27 – 04 - 1911
O Alto Purus – 05 – 10 - 1918
-----------------------
[1] WEISNTEIN, Barbara. A borracha na Amazônia: expansão e decadência,
1850-1920. São Paulo: HUCITEC: Editora da Universidade de São Paulo, 1993.
P 21.
[2] REIS, Artur César Ferreira. O Seringal e o Seringueiro. 2. ed. Manaus:
Editora da Universidade do Amazonas. Governo do Estado do Amazonas, 1977. p
132.





[3] BELLUZO; Ana Maria de Morais. O Brasil dos viajantes. São Paulo:
Metalivros, 1994. p. 130.


[4] Idem, p 133.


[5] Jornal Senna Madureira – 27 – 04- 1911


[6] Relatório "Dois anos de saneamento" 1924. P.13.


[7] Jornal O Alto Purus – 05-10-1918


[8] Jornal do Purus – 17-06-1911


[9] Relatório "Dois anos de saneamento", 1924, p 51.


[10] Idem, p.13.


[11] REIS, op.cit.; p. 134


[12] SOUZA, Laura de Mello e. O diabo e a Terra de Santa Cruz: feitiçaria
e religiosidade popular no Brasil colonial. São Paulo: Companhia das
Letras, 1986.


[13] Jornal do Purus 10-04-1904


[14] Idem


[15] Idem


[16] ALVES; José Jerônimo de Alencar. Determinismo climático e
salubridade Amazônica na percepção de Bates e Wallace. In: Caderno,
história e ciências. v.4. n.2. Rio de Janeiro, 2008. p 43.


[17] SANTOS; Fabiane Venente. Brincos de ouro, saias de chita: Mulher e
civilização na Amazônia segundo Elizabeth Agassiz em viajem ao Brasil
(1865- 1866) In: História, ciência e saúde – Manguinhos, v.2 n.1. Rio de
janeiro. 2007.


p 15.


[18] Correio de Purus 13-05-1900


[19] Jornal do Purus 04- 06- 1911


[20] LEONARD, Victor. Os Historiadores e os rios: Natureza e ruína na
Amazônia brasileira. Brasília: Paralelo 15. Editora Universidade de
Brasília, 1999, p. 98.


[21] Relatório – "Dois anos de saneamento". 1924, p 11.


[22]PANTOJA, Mariana. Os Milton: Cem anos de história nos seringais.
Recife: Fundação Joaquin Nabuco / Editora Massagana, 2004. p 102.
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