Sexualidade e Identidade na Historiografia Brasileira

July 21, 2017 | Autor: Margareth Rago | Categoria: História do Brasil, Estudos De Gênero, Identidade De Gênero E Sexualidade.
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Sexualidade e Identidade na Historiografia Brasileira[1]





Margareth Rago
Depto de História - IFCH-UNICAMP


A preocupação em "inventar o Brasil", isto é, em descobrir as
supostas raízes históricas do país, contidas na linha de continuidade dos
eventos históricos, unindo presente e passado, encadeando os processos
sociais, políticos e culturais marcou o horizonte de muitos intelectuais
brasileiros, entre os anos vinte e trinta.[2] Envolvidos com a tarefa de
determinar futuros possíveis, de encontrar as formas de superação dos
obstáculos ao desenvolvimento social e econômico, perguntaram-se pelos
traços que marcaram a cultura nacional, pelas características essenciais do
"povo brasileiro", pelo passado que o havia constituído como tal. "Que
país é este?" foi a questão a que procuraram responder em termos das
interpretações das origens históricas do Brasil, da colonização à
contemporaneidade. "Que país queremos que seja?" tem sido a pergunta
colocada desde então, retomada em sucessivas ocasiões, inclusive agora, na
era da globalização, em que se desfazem as antigas referências nacionais.
Se hoje os conceitos de nação, Estado-nação, conciência nacional
envelheceram e são insuficientes para dar conta das realidades políticas,
naquele instante pareciam extremamente férteis para representar a
"comunidade imaginada" e desejada pelas elites intelectualizadas.[3] Se
hoje, para a maioria das pessoas, como lembra Eric Hobsbawm, a
identificação nacional não exclui outras formas de identificação que
constituem o ser social, como a religiosa, a sexual, a étnica, naquele
momento significava a possibilidade de encontrar um forte laço comum, a
partir do qual as dificuldades sociais poderiam ser problematizadas e
possíveis soluções aventadas.[4]
As reflexões de Pierre Nora a respeito das relações entre memória e
história sugerem que as constantes desterritorializações a que somos
expostos cotidianamente têm abalado tão profundamente o sentimento de
pertencimento a um grupo fixo, como a Nação; que necessitamos de outros
operadores conceituais para a compreensão do presente, para nos situarmos
no mundo e, também, para reorganizarmos nosso espaço interno, delimitando a
constituição de novas subjetividades fugazes e mutantes, antes
impensáveis.[5] Poucos ainda acreditam haver um só Brasil, e diante de
tanta multiplicidade e expansão territorial, inclusive a desejante, cada
vez mais procuramos nos localizar a partir de referências específicas,
flexíveis e provisórias.
Para aquela geração, no entanto, as questões se colocavam de outro
modo. Fundamentalmente, tratava-se de definir sua suposta identidade
cultural, encontrando os pontos fixos, ou a tão prestigiada "essência",
oculta nas profundezas da terra e da psique. Tratava-se de compreender o
passado para transformar o presente e, para tanto, libertar-se de um fardo,
romper com as pesadas tradições que emperravam o progresso e entrar no
compasso da História. Tendo em vista produzir uma nova leitura da história
nacional, leitura esta que legitimasse suas posições políticas e
ideológicas, o leque de questões que esses intelectuais nacionalistas
abriram tinha por objetivo detectar as raízes dos males que assolavam o
Brasil, entender os problemas socio-econômicos tão violentos e gritantes da
sociedade e, principalmente, analisar o que consideravam ser a
incapacidade do povo brasileiro de construir uma Nação moderna, rica e
poderosa, a exemplo dos Estados Unidos.
Quase todos esses intelectuais das elites davam especial ênfase à
indole pacífica, acomodada, preguiçosa, imitativa do "povo brasileiro",
retratado, no período, por outro conhecido escritor, Monteiro Lobato, como
Jeca Tatu, figura das mais poderosas em nosso imaginário social. Buscando
historicizar essa herança histórica, Sérgio Buarque de Holanda, por
exemplo, perguntava-se por que a modernidade não se completara no país e
quais eram os entraves à formação da esfera pública moderna. Visava, deste
modo, perceber as linhas tendenciais de uma possível modernização
transformadora, que pudesse igualar o país, ou, ao menos, aproximá-lo das
fases de desenvolvimento dos povos mais adiantados.
A intelectualidade do período consagrou alguns dos trabalhos
produzidos nessa época, como Retrato do Brasil. Ensaio sobre a Tristeza
Brasileira, de Paulo Prado, publicado em 1928; Casa Grande e Senzala, de
Gilberto Freyre e Evolução Política do Brasil, de Caio Prado, de 1933;
Raízes do Brasil, de Sérgio Buarque de Holanda, de 1936.[6]
Republicados pelas gerações seguintes, amplamente elogiados e
difundidos até o final dos anos sessenta, essas leituras históricas do
passado formaram inúmeras gerações, moldaram a "consciência nacional",
tornando-se uma das principais referências acerca da identidade nacional,
lentes através das quais os brasileiros/as passaram a se olhar e a
reconhecer sua própria imagem. Erigidos como cânones da cultura brasileira,
foram definidos com as matrizes do pensamento social no Brasil, certamente
menos por suas evidentes qualidades científicas, do que pelo regime
discursivo de verdade que produziram e reforçaram, falando do lugar
privilegiado da ciência.
Assim sendo, estas obras firmaram-se como aquelas que diziam "a
verdade" do "povo brasileiro" e, assim, mantiveram-se inquestionáveis por
várias décadas, enquanto outras interpretações produzidas no período caíram
num total esquecimento. Vale lembrar que apenas a partir do final dos anos
sessenta e inícios dos setenta, formulou-se uma crítica mais aguda aos
estudos de Gilberto Freyre, de Sérgio Buarque de Holanda, ou mesmo ao
marxista Caio Prado Junior, por sua vez, já crítico ferrenho das teses
enunciadas pelos intelectuais contemporâneos do Partido Comunista, como
Leôncio Basbaum ou Nelson Werneck Sodré. Ao mesmo tempo, outros autores do
período passaram a ser descobertos e reavaliados mais recentemente, a
exemplo de Euclides da Cunha, Monteiro Lobato e Manoel Bonfim, para não me
referir aos anarquistas e socialistas daquele momento histórico, ou às
escritoras, como a libertária Maria Lacerda de Moura, ou a modernista Pagu
(Patrícia Galvão), cujos livros continuam de difícil acesso.[7]
Hoje, ao se analisarem aquelas obras canonizadas pela academia
brasileira, destaca-se um aspecto que passou totalmente despercebido tanto
pelas leituras tradicionais apologéticas, quanto pela crítica da esquerda,
que, não obstante, teve uma atitude bastante severa na reavaliação
daqueles trabalhos, três décadas depois. Trata-se da dimensão que a
sexualidade ocupa na construção dessas interpretações da realidade
brasileira e, portanto, da idéia da identidade nacional. Em torno dela,
produziu-se a referência maior das características que têm explicado o
"povo brasileiro", sua índole e vocação, como observou, pela primeira vez,
o antropólogo norte-americano Richard Parker, nos anos noventa.[8] O
desenvolvimento histórico que se observa ao longo de nossa história
aparece, então, contido, em germe, em traços que se constituíram nos
primórdios da colonização, nas relações primárias que se estabeleceram na
"infância" do Brasil, quando chegaram os primeiros conquistadores e iniciou-
se o processo de miscigenação racial, sendo doravante repostas
interminavelmente.
As relações entre a cultura erótica e a ciência parecem ter sido
sempre tensas e complicadas, não apenas no Brasil. Aliás, neste país talvez
sejam até mais fáceis, comparado com os países de tradição puritana. O
erótico permeia o cotidiano dos brasileiros, de norte a sul, das piadas aos
jogos de sedução, das roupas aos comportamentos, nos escritórios, nas
praças ou nos bares. Séria, só mesmo a ciência, que alguém já chamou de
cinza. Vive-se aí uma cultura e sociedade extremamente sexualizadas em
todos os sentidos, inclusive no da violência, enquanto que a imagem da
"sexualidade-tropical-do-sul-do-Equador" não deixa de ser muito estimulada
pelas indústrias do turismo, na exportação das mulatas sensuais, do samba,
do carnaval, do "tchan" e de tudo aquilo que é muito bem conhecido como o
imaginário do "Brasil Tropical".
Já disse Sérgio Buarque que fomos colonizados por "aventureiros" mais
do que por trabalhadores, pelos "semeadores" portugueses, que iniciaram a
colonização respondendo à imediatez das situações, ao contrário dos
"ladrilhadores" espanhóis, preocupados em planejar as formas de sua empresa
e ordenar o espaço urbano. Portadores de uma "concepção espaçosa do mundo",
os colonizadores portugueses não viam limites para sua expansão
desterritorializante e, diante da capacidade administrativa e da
racionalidade dos rivais, recitavam com o padre Antonio Vieira: "Não fez
Deus o céu como um xadrez de estrelas...".[9] Enfim, conclui o
historiador: "Somos ainda hoje uns desterrados em nossa própria terra.",
propondo-se, então, a encontrar as "raízes do Brasil".[10]
Por tudo isso, chama a atenção o fato de que apenas recentemente os
brasileiros passam a perceber a centralidade conferida à sexualidade no
discurso dos intelectuais voltados para a interpretação científica da
realidade e para a definição da identidade nacional ou, em outros termos,
para a questão do enclausuramento do desejo na casa-grande-e-senzala.
Recentemente, republicado numa bela edição, Retrato do Brasil recebeu
várias páginas nos jornais e revistas da atualidade, sem contanto que se
fizesse qualquer alusão à dimensão que irrompe vigorosamente do próprio
texto: a sexualidade tropical, constitutiva da identidade nacional.
Mais recentemente, alguns historiadores, a exemplo de Ronaldo
Vainfas, questionaram a imagem desregrada da Colônia, produzida pelos
observadores dos primeiros séculos da Colonização e pelos intelectuais dos
anos vinte e trinta, encontrando muitas regras, normas e formas de
culpabilização, onde outros viram apenas caos e descompromisso. " À
fornicação tropical não faltaram, pois, normas bem rígidas. (...) Por mais
sexualmente intoxicada que tenha sido a Colônia, como quer Gilberto Freyre,
os valores da família, mescla da cultura popular e do discurso oficial se
fizeram presentes."[11]
Nos limites deste texto, porém, não se trata precisamente de decidir
sobre a moralidade ou imoralidade historicamente constitutiva do país, mas
de desconstruir as narrativas históricas produzidas e reproduzidas
incessantemente, destacando a importância que o discurso da sexualidade
assume na leitura que os brasileiros fazem de suas origens. Como observou
Richard Parker, aliás, a noção da sexualidade, no Brasil, não está apenas
presente na percepção que cada indivíduo faz de sua existência, mas na auto-
interpretação de toda a sociedade. "E' uma visão que se tornou cada vez
mais acentuada em anos recentes nas histórias que os brasileiros escolheram
para relatar sobre si próprios, como um povo." [12]

A Tristeza Brasileira

Em seu ensaio inaugural de 1928, Retrato do Brasil. Ensaio sobre a
Tristeza do Brasil, Paulo Prado procura explicar o Brasil, construindo um
fiel retrato, como indica o próprio título.[13] Inicia definindo a
principal característica do "povo brasileiro", comparado ao pássaro
jaburu, na epígrafe de Capistrano de Abreu. Logo na primeira página, o
autor afirma: "Numa terra radiosa vive um povo triste". Nas seguintes,
explicita o significado da tristeza, que passa progressivamente a
denominar, a partir de um vocabulário médico, de "melancolia". Somos,
então, informados de que melancolia é o estado físico e psíquico
decorrente da "hiperestesia sexual". De tantos excessos sexuais e vícios da
multiplicação das "uniões de pura animalidade", desde os inícios da
colonização no Brasil, os brasileiros se tornaram um povo triste, cansado,
prostrado. A terra virgem, a mata abundante, os rios caudalosos, a natureza
farta, o clima, "o homem livre na solidão", o encanto da nudez total das
índias, posteriormente a presença das negras sensuais, tudo, na formação
histórica do país, contribuiu para que os brasileiros se tornassem um povo
mole, instintivo e sensual, dionisíaco, em comparação com os norte-
americanos apolíneos.

"A história do Brasil é o desenvolvimento desordenado dessas obsessões
subjugando o espírito e o corpo de suas vítimas. Para o erotismo exagerado
contribuíram como cúmplices - já dissemos - três fatores: o clima, a terra,
a mulher indígena ou a escrava africana. Na terra virgem tudo incitava ao
culto do vício sexual....Desses excessos de vida sensual ficaram traços
indeléveis no caráter brasileiro. Os fenômenos de esgotamento não se
limitam às funções sensoriais e vegetativas; estendem-se até o domínio da
inteligência e dos sentimentos. Produzem no organismo perturbações
somáticas e psíquicas, acompanhadas de profunda fadiga, que facilmente toma
aspectos patológicos, indo do nojo até o ódio."(p.120)

Em outra passagem afirma:


"No Brasil a tristeza sucedeu à intensa vida sexual do colono,
desviada para as perversões eróticas, e de um fundo acentuadamente
atavico."(p.121)


"A hiperestesia sexual que vimos no correr deste ensaio ser traço
peculiar ao desenvolvimento étnico da nossa terra, evitou a segregação do
elemento africano, como se deu nos Estados Unidos,dominados pelos
preconceitos das antipatias raciais. Aqui a luxúria e o desleixo social
aproximaram e reuniram as raças."(p.188)

Esse traço original, que marca definitivamente a cultura brasileira
desde os primórdios da colonização, será responsável pela incapacidade
atávica de evolução, pela não-realização da Modernidade brasileira. Ao
contrário dos povos de origem puritana, como os norte-americanos, nos
quais o lado racional e administrador é mais forte do que o instintivo, o
Brasil não consegue romper com o passado arcaico, pesado, conservador e
autoritário, que entrava sua marcha rumo ao Progresso.
É interessante lembrar que também de 1928 é a famosa obra do
modernista Mário de Andrade, Macunaíma. O herói sem nenhum caráter, aliás,
dedicada ao amigo Paulo Prado.[14] O herói, ou anti-herói é um homem da
natureza, como os nossos antigos habitantes, que se diverte todo o tempo
"brincando com as cunhãs", ou prostitutas, que, por sua vez, se divertem
e deliram todo o tempo. Não é à toa que até seu ingresso na civilização,
sua entrada na moderna e barulhenta cidade de São Paulo e o contato
repentino com as máquinas se fazem através de três lindas e alvas cunhãs,
com quem ele passa a noite e para quem paga quatrocentos bangarotes.

"A inteligência do herói estava muito perturbada. As cunhãs rindo
tinham ensinado pra ele que o sagüi-açu não era sagüim não, chamava
elevador e era uma máquina. De-manhãzinha ensinaram que todos aqueles
piados berros cuquiadas sopros roncos esturros não eram nada disso não,
eram mas cláxons campainhas apitos buzinas e tudo era máquina."(p.32)


Assim, são as prostitutas, figuras da margem, que realizam a mediação
entre universos opostos, fazendo a passagem do herói do reino da Natureza
para o da Civilização, da terra verdejante para o mundo da técnica, sendo
a mercantilização do sexo a primeira relação capitalista que vive o herói.
Entre a história e a literatura, portanto, emerge um povo indolente, fraco
e muito sexualizado, traço que indica seu grau de atraso cultural, o
predomínio do lado instintivo sobre o racional, o que o torna, por sua vez,
inadequado para construir a Modernidade, tornando-se um cidadão de
Primeiro Mundo.
Vale perguntar porque a cultura sexual descrita por Prado seria
origem da tristeza brasileira e não da alegria, como aparece em Mário de
Andrade? E' verdade que o paulistano Prado é conhecido como membro da
elite oligárquica decadente, representante de seu pessimismo em termos da
avaliação do país, às vésperas das transformações políticas de 1930. Medo
da degeneração da raça, do escurecimento em vez do embranquecimento
populacional que tanto queriam, medo do predomínio do instinto sobre a
razão, medo de uma "psyché racial" que predeterminaria os brasileiros ao
fracasso.
Esta visão pessimista sobre o povo brasileiro parece assentar numa
concepção altamente negativa da sexualidade que tem o próprio autor, para
além de toda a influência do darwinismo social em sua obra. Afinal, o
excesso de energia sexual, a abertura para o outro, a facilidade de contato
físico, em princípio, poderiam não ser percebidos como fatores negativos na
constituição de um povo. Aliás, ainda está para ser esclarecido por que o
desejo sexual deveria ser o principal traço da "psyché nacional", questão
que obviamente não incomodou os pensadores do século 19 e meados do século
20. Dando visibilidade à problemática, Michel Foucault afirma a necessidade
de compreender por que a sexualidade se converteu, nas culturas cristãs,
no "sismógrafo de nossa subjetividade." E completa:

"E' um fato, um fato misterioso, que dentro desta espiral indefinida
da verdade e da realidade, a própria sexualidade se tenha transformado de
primeira importância desde os primeiros séculos de nossa era. Cada vez é
mais importante. Por que existe uma conexão tão íntima entre sexualidade,
subjetividade e obrigação com a verdade?" [15]

Como explicaria Richard Sennett, aluno do filósofo francês:

"Este valor psicológico tão pleno que se dá à sexualidade é um
legado da sabedoria vitoriana, apesar do orgulho que possuímos de não
partilhar seus preconceitos repressivos. A idéia de possuir uma identidade
baseada em nossa própria sexualidade traz uma carga imensa a nossos
sentimentos eróticos, uma carga que, para alguém do século XVIII, seria
muito difícil de compreender." (idem)

Certamente, os intelectuais aqui focalizados basearam-se em
importantes fontes documentais para construírem suas intepretações
históricas do passado nacional, e certamente os viajantes, inquisidores,
colonizadores que produziram influentes representações imaginárias sobre o
país, desde o século 16, além do olhar masculino, traziam toda a bagagem
de preconceitos culturais da Europa renascentista, através da qual
codificaram as práticas sociais e sexuais, como mostrou Vainfas. Assim,
enxergaram nas práticas sexuais dos indígenas todos os vícios que o
cristianismo lhes ensinava ver. As índias nuas foram transformadas em
"ninfomaníacas" e "devassas", segundo as classificações das "perversões
sexuais" elaboradas pelo médico vienense Von Krafft-Ebing, em meados do
século 19. As representações instituíram-se como fatos, e, apenas nas
últimas décadas têm-se desconstruído essas imagens, entre misóginas e
racistas, veiculadas pela documentação.[16]
Além disso, é possível afirmar que é o discurso médico não-citado,
apenas referido, que constitui a matriz das interpretações cientificistas
de Paulo Prado sobre o povo e a raça. Ora, sabe-se, desde Foucault, o
quanto este discurso, instituidor das referências modernas sobre a
sexualidade é severo, moralista e sexista.[17] Para os médicos do século
passado, o desejo sexual era visto como força ameaçadora, vulcânica,
destrutiva que deveria ser combatida e bem administrada pelo intelecto.
Segundo o dr. Heredia de Sá, por exemplo:

"o homem sequioso do prazer venéreo sente-se atormentado por necessidade
imperiosa, irresistível, uma excitação espantosa vivifica seu organismo, um
fogo ardente abrasa seus órgãos, as artérias pulsam com excessiva força, os
olhos incendeiam-se com brilho sobrenatural, sua face colora, sua
respiração se torna anelante, as partes genitais se intumescem, se
congestam e nelas se experimenta um sentimento de ardor e titilamento. O
pensamento não tem mais força, a vontade não domina, todas as faculdades
estão concentradas em a idéia fixa;(...) ." (1845)

Ora, nem o índio, nem o negro, nem o "português aventureiro" que para
cá vinha possuíam esta capacidade interior de autocontrole. Obcecados com a
sexualidade, voyeuristas disfarçados, os homens da ciência não paravam de
falar da sexualidade desde o século 19, principalmente para condená-la.
Dissecaram o corpo da meretriz, do cafetão, do homossexual, "perverteram o
sexo". Todas as práticas sexuais foram postas sob o signo do discurso
científico, explicadas, analisadas, classificadas, contidas e condenadas.
Mas, todas ganharam ampla visibilidade. Dir-se-ia que a ciência domou o
sexo, com medo de ser dominada. [18]
Em relação à prostituição, por exemplo, o médico Francisco Ferraz de
Macedo classificava as prostitutas que encontrava na cidade do Rio de
Janeiro, por volta de 1872, na esteira do que diria o pai da antropologia
criminal, Cesare Lombroso, como "degeneradas natas", gulosas, preguiçosas,
excêntricas, irrecuperáveis para a Nação, signos da involução das espécies:
sub-raça. Seus pares insistiam na ausência de instinto sexual nas "mulheres
castas", a não ser para fins reprodutivos. Juristas como Viveiros de
Castro, ao lado dos médicos, enxergavam onanistas, pedófilos, homossexuais,
tríbades, perversos sexuais em quase todos os cantos da cidade, sobretudo
nas ruas, bares, restaurantes, teatros e cafés-concertos do submundo.
Especialmente importante foi a condenação da masturbação, masculina e
feminina, vista como caminho certo para a loucura. Segundo o discurso
médico do século 19:

"O onanismo reina como senhor entre a mocidade dos colégios e casas
de educação.(...) Com a reclusão, a instigação diária e muitas vezes quse
contínua da excitação vai, pouco a pouco, embotando as faculdades
intelectuais, o seu desenvolvimento orgânico não continua; há mesmo parada
do desenvolvimento geral do organismo, enquanto que o dos orgãos
solicitados se faz com assustadora precocidade."[19]

Como procede, então, Paulo Prado para definir a identidade nacional
dos brasileiros? Seu primeiro passo é nutrir-se do discurso médico
vitoriano para organizar sua percepção da sociedade e construir uma
representação da sexualidade dos habitantes do país, incorporando assim,
ou então, reforçando seus próprios preconceitos. Todas as "verdades" do
pensamento médico sobre a sexualidade são reproduzidas pelo historiador.
Segundo passo: sobre esta base interpretativa, ele elabora sua leitura da
identidade nacional, generalizando para todos os brasileiros/as uma forte
dose de sensualidade, uma sexualidade latente, transbordante, irradiadora
para todas as outras dimensões físicas e psíquicas. O terceiro movimento
lhe escapa: é a reprodução e a apropriação destas teses por seus pares.
Assim, o discurso médico sobre o corpo e a sexualidade é apropriado
como verdade científica, o que equivale dizer, aceito acriticamente pelos
historiadores, servindo de fundamento para construírem a interpretação de
uma "psique nacional" que, triste ou alegre, passa pela perversão, pelo
predomínio do instinto sobre a razão, por tudo aquilo, portanto, que
impossibilita a formação do indivíduo racional, cidadão apto a participar
da esfera pública e administrar o bem público. Do olhar dos viajantes e
inquisidores à historiografia, essas misóginas e fantasiosas representações
sobre a "realidade brasileira" foram reproduzidas e repetidas
indefinidamente, ensinando quem era e o que seria ser brasileiro.[20]
O resultado é a construção de um campo discursivo que, de ordem
biológica, reforça a estigmatização do outro percebido como desvio,
monstruosidade, diferença. Etnocêntrico e xenófobo, apreende o outro
biologicamente como raça inferior; falocêntrico, institui o masculino como
lugar da verdade e da perfeição. Neste imaginário, por exemplo, as índias
nuas - pura animalidade - desejam entregar-se aos homens brancos, pois
vivem em estado de natureza e não de sociedade. No reino da natureza
exuberante, só mesmo a sexualidade desvairada poderia ter espaço. O Brasil,
então, não teria chances?

A Alegria Brasileira

Será preciso outro famoso autor, Gilberto Freyre, para devolver
parcialmente aos brasileiros a alegria e notar como a vida sexual no Brasil
é positiva, responsável, aliás, pela "democracia racial", apesar da
propagação das doenças venéreas. O povo brasileiro se origina, nesta
perspectiva, da miscigenação das três raças que, no Brasil especialmente,
não tiveram maiores problemas para se fundirem, pois a atração sexual foi
mais forte do que as exigências legais e racionais de união entre os
diferentes. Daí uma cultura particular, marcada pela cordialidade, pela
leveza, pelo instinto, pelo corporal e pela tolerância. As relações
primárias em Freyre se caracterizariam pela intensa atividade sexual:

"O ambiente em que começou a vida brasileira foi de quase intoxicação
sexual.
O europeu saltava em terra escorregando em índia nua; os próprios
padres da Companhia precisavam descer com cuidado, senão atolavam o pé em
carne. Muitos clérigos, dos outros, deixaram-se contaminar pela devassidão.
As mulheres eram as primeiras a se entregarem aos brancos, as mais ardentes
indo esfregar-se nas pernas desses que supunham deuses. Davam-se ao europeu
por um pente ou um caco de espelho."( p.60)
A aproximação entre as diferentes raças, segundo ele, decorre de um
forte impulso sexual, especialmente do europeu, pouco vaidoso de suas
tradições culturais e incapaz de opor resistências à diferença étnica e ao
furor uterino das índias:

"Foram sexualidades exaltadas as dos dois povos que primeiro se
encontraram nesta parte da América: o português e a mulher indígena. Contra
a idéia geral de que a lubricidade maior comunicou-a ao brasileiro o
africano, parece-nos que foi precisamente este, dos três elementos que se
juntaram para formar o Brasil, o mais fracamente sexual; e o mais
libidinoso, o português."(p.67)

Assim, inspirando-se em Paulo Prado, Freyre constrói sua argumentação
a respeito das origens do povo brasileiro:

"Paulo Prado salienta que o "desregramento do conquistador europeu"
veio encontrar-se em nossas praias com a "sensualidade do índio". Da índia,
diria mais precisamente. Das tais cablocas "priápicas", doidas por homem
branco."(p.68)

"À vantagem da miscigenação correspondeu no Brasil a desvantagem
tremenda da sifilização. Começaram juntas, uma a formar o brasileiro - o
tipo ideal do homem moderno para os trópicos, eurpoeu com sangue negro ou
índio a avivar-lhe a energia; outra a deformá-lo. (...) De todas as
influências sociais talvez a sífilis tenha sido, depois da má nutrição, a
mais deformadora da plástica e a mais depauperadora da energia econômica do
mestiço brasileiro. (...) Costuma dizer-se que a civilização e a
sifilização andam juntas: o Brasil, entretanto, parecer ter-se sifilizado
antes de se haver civilizado." (p.50)

"A escassez de mulheres brancas criou zonas de confraternização entre
vencedores e vencidos, entre senhores e escravos. Sem deixar de ser
relações - as dos brancos com as mulheres de cor - de "superiores" com
"inferiores" e, no maior número de casos, de senhores desabusados e sádicos
com escravas passivas, adoçaram-se, entretanto, com a necessidade
experimentada por muitos colonos de constituírem família dentro dessas
circunstâncias e sobre esta base. A miscigenação que largamente se praticou
aqui corrigiu a distancia social que doutro modo se teria conservado enorme
entre a casa grande e a mata tropical; entre a casa grande e a senzala."

E' interessante observar que um intelectual competente como Freyre
tenha trabalhado a documentação tão literalmente, encontrando aí a verdade
mesma sobre a "índole do povo brasileiro", constituída a partir de toda uma
tradição de licenciosidade, cujas raízes por sua vez teriam vindo das
índias e caboclas "priápicas" e de portugueses aventureiros, "garanhões
desbragados". Note-se, aliás, que o adjetivo "priápico", geralmente
utilizado para referir-se à ereção do pênis, é aqui mobilizado para referir-
se à mulher, numa tirada bastante misógina, diga-se de passagem. Assim, se
inicialmente o autor se refere aos indígenas sem diferenciações de gênero,
progressivamente seu discurso se desloca para focalizar especificamente as
índias, as quais, revelando uma sexualidade desenfreada, oferecem-se
despudoradamente ao conquistador branco.
Quanto a este, a ausência de "consciência de raça" no "português
cosmopolita e plástico" marca a formação social brasileira radicalmente. O
português que chega é "predisposto para a colonização híbrida e
escravocrata" pela influência africana em seu sangue um pouco mouro, e
pelas marcas do ar quente e oleoso da África, que amolece as instituições.
A "moura encantada", envolta em misticismo sexual, imagem deixada pelo
contato com os sarracenos para os portugueses, teria sido, então,
projetada nas índias que se banhavam nos rios, "gordas como as mouras" e
menos ariscas:
"Por qualquer bugiganga ou caco de espelho estavam se entregando, de
pernas abertas, aos "caraíbas" gulosos de mulher."( p.8)

Retomando Paulo Prado, afirma:

"Atraídos pelas possibilidades de uma vida livre, inteiramente solta,
no meio de muita mulher nua, aqui se estabeleceram por gosto ou vontade
própria, muitos europeus do tipo que Paulo Prado retrata em traços de um
vivo realismo. Garanhões desbragados." (p.21)
Edward Said, ao analisar a construção imaginária do Oriente pelos
discursos produzidos etnocentricamente no mundo ocidental, expôs os perigos
das transferências na representação de outras culturas e as relações de
poder implícitas. [21] Aqui também, as fantasias eróticas dos europeus
foram projetadas sobre as/os orientais, vistos como o seu outro sombrio e
irracional. A figura sensual da mulher oriental, quente e voluptuosa,
associada às danças exóticas, construída pela imaginação ocidental é
revivida na metáfora da "moura encantada", utilizada por Freyre e
identificada à indígena da nova terra.
Além disso, a sexualidade adquire ainda uma dimensão muito poderosa
na interpretação histórica de Freyre, na medida em que é fator fundamental
na determinação das relações que se estabelecem na esfera pública. Esta
molda-se por modelos emprestados do mundo privado, onde as relações
primárias são sobretudo marcadas pelo sado-masoquismo. Assim, o modelo de
relação sexual sado-masoquista estabelecido entre senhor e escravas ou
escravos transfere-se para a esfera pública, caracterizando as relações
sociais.

"Mas esse sadismo de senhor e o correspondente masoquismo de escravo,
excedendo a esfera da vida sexual de doméstica, tem-se feito sentir,
através da nossa formação, em campo mais largo: social e político. Cremos
supreendê-los em nossa vida política, onde o mandonismo tem sempre
encontrado vítimas em quem exercer-se com requintes às vezes sádicos;
certas vezes deixando até nostalgias logo transformadas em cultos cívicos,
como do chamado "marechal de ferro." (p.54)

Ainda assim, e seguindo pois seu raciocínio, o patriarcado permitiu a
estabilidade social, garantindo uma forma de coesão social que, de outro
modo, estaria perdida:

"Em contraste com o nomadismo aventureiro dos bandeirantes, em sua
maioria mestiços de brancos com índios, os senhores das casas-grandes
representaram na formação brasileira, a tendência mais caracteristicamente
portuguesa, isto é, pé-de-boi, no sentido da estabilidade patriarcal.
Estabilidade apoiada no açúcar (engenho) e no negro (senzala)." - p.XX

Casa grande e senzala x modernidade urbana

Sérgio Buarque, em Raízes do Brasil, embora não se refira à
sexualidade como lugar de constituição e origem da personalidade do homem
brasileiro, compromete-se parcialmente apenas com este imaginário sexual ao
desenhar a figura de cordialidade essencial do brasileiro.[22] A despeito
da profundidade e da perspicácia de sua análise histórica sobre as
dificuldades políticas para a construção da moderna esfera pública no
Brasil, não deixa de ser curioso o peso dado à sexualidade para explicar a
índole emotiva que caracteriza o "homem cordial". Embora este tenha ficado
mais conhecido por uma suposta passividade e benevolência, é seguramente de
outra maneira que aparece na construção original deste historiador
profundamente moderno.
Herdeiro dos portugueses "personalistas" que para cá vieram, o "homem
cordial" é o produto de uma pesada tradição marcada pelo personalismo, pelo
ruralismo, pelo patriarcalismo e, sobretudo, por uma forma de colonização
aleatória, onde importava muito mais atender aos caprichos pessoais do que
a um planejamento racional. Afirma o historiador:

"É compreensível, assim, que jamais se tenha naturalizado entre gente
hispânica a moderna religião do trabalho e o apreço à atividade utilitária.
Uma digna ociosidade sempre pareceu mais excelente , e até mais nobilitante
, a um bom português, a um bom espanhol, do que a luta insana pelo pão de
cada dia."(p.10)


O "aventureiro" e o "semeador" predominaram sobre o "trabalhador" e o
"ladrilhador", responsáveis pela colonização espanhola, produzindo uma
figura mais emotiva e instintiva do que racional, portanto, anti-moderna. A
mentalidade da casa-grande invadiu as cidades e conquistou as profissões,
diz ele, até as mais humildes; o culto da personalidade predominou sobre o
fortalecimento dos laços de solidariedade, a ética da aventura sobre a do
trabalho; as cidades cresceram à mercê do momentâneo dado o espírito livre
e avesso a compromissos dos colonizadores; tudo contribuiu, enfim, para
formar uma ética anti-moderna, uma sexualidade permissiva e, ao mesmo
tempo, corrosiva. Nem mesmo orgulho da raça tiveram os portugueses, que se
fundiram com os negros e os índios sem problema algum, sem impor nenhuma
barreira étnica ou sexual. Os valores morais não se firmaram nunca entre
nós. Cidadãos, só mesmo os grandes proprietários de terras no período
colonial.
O pater poder inconteste e ilimitado, o predomínio da família e da
casa-grande sobre o Estado e a vida pública, a ditadura do campo sobre as
cidades, a extensão do poder da esfera privada impediram a formação do
conceito de cidadania no país.

"O quadro familiar torna-se, assim tão poderoso e exigente, que sua
sombra persegue os indivíduos mesmo fora do recinto doméstico. A entidade
privada precede sempre, neles, a entidade pública. A nostalgia dessa
organização compacta, única e intransferível, onde prevalecem
necessariamente as preferências fundamentadas em laços afetivos, não podia
deixar de marcar nossa sociedade, nossa vida pública, todas as nossas
atividades."(p.50)

Sérgio Buarque chama a atenção para as dificuldades de se mudar a
mentalidade criada num meio patriarcal "tão oposto às exigências de homens
livres e de inclinação cada vez mais igualitária", e para os problemas
decorrentes da enorme importância que a estrutura familiar patriarcal
obteve em relação ao mundo público: "as relações que se criam na vida
doméstica sempre forneceram o modelo obrigatório de qualquer composição
social entre nós." (p.104) Daí firmar-se a "cordialidade brasileira", uma
psique emotiva, o sentimento de que tudo nos é familiar, o desejo de
estabelecer intimidade em todos os domínios do relacionamento, o maior
obstáculo para que o país se torne moderno.
Richard Sennett pode-nos ser bastante útil para discutir a
problemática da incapacidade estrutural de formação da esfera pública no
Brasil.[23] No primeiro mundo, diz ele, o desejo de intimidade se sobrepôs
à consciência pública, ou melhor, à crença na coisa pública, ao longo de um
longo processo iniciado no século 19. O medo diante do aparecimento das
multidões desordenadas das grandes cidades e das inúmeras formas da
violência urbana levou à busca de refúgio no interior de cada um,
dissolvendo toda possibilidade de constituição de redes de solidariedade. O
privado foi, nesse contexto, representado como ninho, espaço do aconchego e
do calor entre as pessoas, em oposição ao público, percebido como lugar da
concorrência fria e da guerra.
No Brasil, o predomínio do privado se deu de outra forma, mas também
dificultou a formação do público. O poder dos fazendeiros em suas grandes
propriedades, a confusão da família com o Estado, o não-reconhecimento dos
interesses públicos, a repressão dos movimentos sociais que pressionaram
pelo reconhecimento dos direitos específicos levaram à cristalização da
lógica da casa-grande-e-senzala, reproduzida nos microcosmos das
instituições públicas ou privadas. O espaço público foi instituído como
"quintal de minha casa" pelos dirigentes, chefes, governantes,
caracterizando-se pelas relações clientelísticas que permeiam inclusive as
formas de sociabilidade nas favelas e nos meios populares.[24] Além do
mais, a vida íntima do brasileiro, liberal e permissiva, afirma o autor,
não se torna "bastante coesa para envolver e dominar toda a sua
personalidade, integrando-a como peça consciente, no conjunto social. Ele é
livre, pois, para se abandonar a todo o repertório de idéias, gestos e
formas que encontre em seu caminho, assimilando-os frequentemente se
maiores dificuldades." (p.112)
Se Sérgio Buarque não fundamenta sua construção do caráter brasileiro
no campo da sexualidade, a exemplo de Paulo Prado e Gilberto Freire, que
aliás cita e admira, participa de certa forma deste imaginário em busca da
identidade nacional nos anos trinta, ao enfatizar como principal traço da
brasilidade o predomínio do emocional e do instintivo sobre o racional.
Afinal, o "homem cordial" é um homem do coração, dos sentimentos e afetos,
à flor da pele, em conformidade com a imagem do brasileiro/a difundida nos
Estados Unidos.


"Seria engano supor que essas virtudes (a lhaneza no trato, a
hospitalidade, a generosidade) possam significar "boas maneiras",
civilidade. São antes de tudo expressões legítimas de um fundo emotivo
extremamente rico e transbordante."(p.107)

Também aqui os brasileiros são associados às imagens corporais, à
imediatez na organização de suas vidas, mais ao estilo "casa grande e
senzala" do que como figuras modernas. A herança rural pesa fortemente
impedindo a emergência de novos valores culturais. Por isso mesmo, não
conseguem realizar a esfera pública no Brasil, desenvolver laços efetivos
de solidariedade e construir uma sociedade justa e democrática. A figura do
"homem cordial", essência do caráter brasileiro, impede a modernização, é
um enorme obstáculo ao desenvolvimento nacional. Nas palavras do
historiador:

"A democracia no Brasil foi sempre um lamentável mal-entendido. Uma
aristocracia rural e semifeudal importou-a e tratou de acomodá-la, onde
fosse possível, ao s seus direitos ou privilégios, os mesmos privilégios
que tinham sido, no Velho Mundo, o alvo da luta da burguesia contra os
aristocratas."(p.119)


Valeria, ainda, examinar como o "homem cordial" foi apropriado em
nossa cultura e indagar por que passou para a história como uma figura
simpática, contemporizadora e "boazinha", ao contrário do que queria,
aliás, insistia o autor, ao argumentar contra Cassiano Ricardo. Valeria
observar que o tipo de apropriação sofrida destituiu-o de tudo aquilo que
constitui o ponto forte da análise crítica de Sérgio Buarque. Nesse
sentido, a figura do "homem cordial" foi esvaziada do conteúdo
profundamente contestador, sendo aprisionado pela lógica da própria casa-
grande-e-senzala que denunciava. Gilberto Freyre, por exemplo, encontrou-
o no mulato sorridente, que ascende social e etnicamente: o "riso
abundante" que lhe é característico, não advém da raça, mas de um
desenvolvimento ou especialização social, em função das condições de
ascensão social que pode desfrutar na vida livre, "e não apenas nas
senzalas e nos haréns dos engenhos(...)".[25] Segundo o sociólogo, o
mulato procurou vencer o branco, agradando o "povo", os clientes, sorrindo.
Seu riso foi um instrumento de ascensão racial - na passagem de uma raça
para outra, quanto na de uma classe para outra, o que se explicaria pela
ação do meio cultural sobre o indivíduo. Finalmente, ele é identificado ao
"homem cordial" por ser "criador de intimidade", o que revelaria seu firme
propósito de encurtar a distância em relação aos brancos. "No uso
brasileiro do diminutivo, uso um tanto dengoso, ninguém excede ao mulato."


O sentido sexual da colonização

Caio Prado Jr, com suas obras Evolução Política do Brasil, (1933) e
Formação do Brasil Contemporâneo (1942), inaugura a tendência marxista de
interpretação histórica, apontando para a infra-estrutura econômica como o
lugar privilegiado de inteligibilidade da História. O historiador inicia o
segundo livro citado, com um capítulo sobre o "Povoamento", em que
focaliza a constituição sexual da população, já que a relação sexual
permite a miscigenação das raças e o surgimento da população. Ela é, pois,
condição de possibilidade de todas as demais dimensões da vida em
sociedade, isto é, das relações produtivas abordadas nos capítulos
denominados "Vida Material" e da "Vida Social". Nesse sentido, a
sexualidade está na base da economia e da sociedade, já que é da fusão
sexual produzida pela mistura das raças que nasce o povo brasileiro.
Aqui, Caio Prado reproduz as teses conservadoras e moralistas de
Paulo Prado, seu tio, e de Gilberto Freyre, assumindo uma leitura
evolucionista da formação histórica brasileira, considerada hoje bastante
controversa e ingênua. Segundo ele,


"A licença dos costumes, que sempre foi a norma do Brasil-colônia,
(...) teve ao menos esta contribuição positiva para a formação da
nacionalidade brasileira: e graças a ela que foi possível amalgamar e
unificar raças tão profundamente diversas, tanto nos seus caracteres
étnicos como na posição relativa que ocupavam na organização social da
Colônia." (p.93)

Não é, pois, por acaso que o historiador reproduza literalmente as
teses do sociólogo pernambucano, no capítulo intitulado "Raças". Aí, o
marxismo dá lugar a outro tipo de análise, de cunho fortemente positivista
e darwinista em que, ao contrário do autor que reproduz, trata das
superestruturas, consideradas secundárias pois determinadas. Destaco este
capítulo, em que Caio explica que o "cruzamento das raças" foi o que mais
contribuiu para a absorção do indígena, o que se deu não por providência
oficial, mas pelo " impulso fisiológico dos indivíduos de uma raça de
instinto sexual tão aguçado como a portuguesa."(p.98.) Aliás, a
mestiçagem, "signo sob o qual se forma a nação brasileira, e que constitui
seu traço característico mais profundo e notável, foi a verdadeira solução
encontrada pela colonização portuguesa para o problema indígena."
Vale, nesse sentido, acompanhar suas próprias palavras mais
detidamente:

"A mestiçagem brasileira é antes de tudo uma resultante do problema
sexual da raça dominante, e por centro o colono branco. Neste cenário em
que tres raças, uma dominadora e duas dominadas estão em contato, tudo
naturalmente se dispõe ao sabor da primeira, no terreno econômico e social,
e em consequência, no das relações sexuais também."(p.110) O branco "dirige
assim a seleção sexual no sentido do branqueamento."

A mestiçagem decorre, pois, de uma qualidade excepcional do
português, sua facilidade em se cruzar com outras raças. Novamente
parafraseando Freyre, o historiador explica que isso se deve grande parte à
forma da emigração dos colonizadores do sexo masculino, que vieram sós. "A
falta de mulheres brancas sempre foi um problema de toda colonização
européia em territórios ultramarinos,(...)." (p.103) Logo, o colono foi
forçado a procurar aí a satisfação natural de suas necessidades sexuais,
para o que não enfrentou grandes dificuldades.


"Aliás, particularmente, no caso da índia, é notória a facilidade com
que se entregava, e a indiferença e passividade com que se submetia ao ato
sexual. A impetuosidade característica do português e a ausência total de
freios morais completam o quadro: as uniões mistas se tornaram a
regra."(p.104)

É interessante observar que a despeito de toda a concepção de
História fundada no materialismo histórico e dialético, utilizada para
construir sua interpretação da "realidade nacional", o autor incorpora as
análises e os preconceitos difundidos pela documentação em que se apóia,
seja a que elaboram os viajantes e os colonizadores, seja a que divulgam os
historiadores e os cientistas sociais de sua época. E, talvez, mais
interessante ainda seja notar como a própria estruturação do livro acaba
por colocar a sexualidade, considerada em uma acepção mais abrangente, como
fundamento mesmo de constituição da vida em sociedade, aspecto que o
próprio autor chega a comentar, quando diz:

"Toda sociedade organizada se funda principalmente na regulamentação,
não importa a complexidade posterior que dela resultará, dos dois instintos
primários do homem: o econômico e o sexual."( p.345)

Novamente, a sexualidade é referida como centro de explicação da
organização social e como lugar privilegiado da leitura que se produz a
respeito do passado e da cultura brasileira.


Concluindo


Está claro que os/as brasileiros/as se percebem, em grande parte,
através da sexualidade, mas também está clara a dificuldade que as ciências
sociais tiveram em trabalhar a questão, reconhecendo pelo menos a
centralidade que esta assume no discurso científico. O privilégio do
discurso racional sobre outras formas de conhecimento, a dicotomia
teoria/prática, o foco exclusivo nas questões estritamente políticas e
econômicas, menos do que as culturais levaram a que esta discussão ficasse
obscurecida.
Mais recentemente, as pressões do feminismo, dos movimentos
homossexuais e negro forçam a incorporação de novos olhares e de novos
temas. Opera-se como que uma invasão do feminino na cultura: o dionisíaco,
o instintivo, o sagrado, o sexual, o corpo passam a ser objeto de
discussão, aceitos como importantes dimensões constitutivas das práticas
sociais e das formas de conhecimento. Retomamos as problemáticas e os
ensinamentos dos historiadores da Escola dos Annales, preocupados com as
"mentalités", com diferentes temporalidades e com novos instrumentais
conceituais. Mudamos os temas e os procedimentos de análise, questionando
os campos epistemológicos tradicionais e os instrumentos fornecidos.
É nesse sentido que a questão do lugar central da sexualidade na
construção da identidade nacional e na interpretação da história brasileira
pode ser enunciada, forçando uma releitura da historiografia. Produzida
num momento de profunda modernização do país, de crescimento urbano-
industrial e de fortalecimento do Estado, esta teve um impacto bastante
forte sobre a construção do passado, transformada em memória oficial e
transmitida sucessivamente de geração a geração. Inegavelmente, as formas
de produção desta História conformaram a imaginação social, definindo uma
identidade nacional muito negativa, pesada herança que os brasileiros
acabam por carregar. Por isso mesmo, é importante que sejam desconstruídas,
refeitas ou abandonadas.
Uma outra questão, ainda, parece-me inevitável no confronto com a
tradição historiográfica brasileira. É de se perguntar para quem olhavam
os autores consagrados dos anos vinte/ trinta, de que "povo" falavam? Se se
focalizar a cultura operária do período, as greves e manifestações que
pipocaram entre os anos dez e vinte, nos centros que se industrializavam no
país levam a questionar radicalmente as imagens negativas construídas sobre
os imigrantes estrangeiros e os trabalhadores nacionais, muitos dos quais
ex-escravos, que como sabemos hoje eram explorados ilimitadamente nas
inúmeras fábricas e espaços da produção. E' de se perguntar de onde vinha a
indolência a que aqueles autores se referiam? De quem falavam eles que não
liam Maria Lacerda de Moura, nem Pagu? O que dizer, ainda, da exploração do
trabalho infantil tão denunciada na imprensa anarquista e socialista do
período, absolutamente ausente de seus discursos?
Para finalizar, creio que se há algum sentido em render homenagem aos
"inventores do Brasil", certamente é fundamental considerar que continuam
silenciadas as vozes alternativas que, no mesmo período, se recusaram a
aceitar as imagens negativas projetadas em espelhos misóginos. E mais, é de
se perguntar por que os brasileiros continuam a reafirmar traços
estigmatizadores que não os levam a uma auto-construção pessoal e social
positiva e mais saudável?

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[2]A bibliografia sobre o tema é grande. Destaco: Carlos Guilherme Mota –
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[3]Expressão de Benedict Anderson - IMAGINED COMMUNITIES. Chapel Hill,
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[4]E. Hobsbawm - NAÇÕES E NACIONALISMO desde 1870. Rio de Janeiro: Paz e
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[5] Pierre Nora (org.) – LES LIEUX DE LA MÉMOIRE. Paris: Gallimard, 1994.
[6] Paulo Prado - RETRATO DO BRASIL. Ensaio sobre a Tristeza Brasileira.
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DO BRASIL. Rio de Janeiro: José Olympio, 1994,2a.ed.; Caio Prado Jr –
EVOLUÇÃO POLÍTICA DO BRASIL. São Paulo: Livraria Martins Editora, 1933.
[7] Sobre as escritoras brasileiras das primeiras décadas do século,
destaco o belo estudo de Norma Telles – ENCANTAÇÕES LITERÁRIAS, no prelo;
Margareth Rago - "A subjetividade feminina entre o desejo e a norma: moral
sexual e cultura literária feminina no Brasil, 1900-1932", REVISTA
BRASILEIRA DE HISTÓRIA, ANPUh, Marco Zero, no.28, 1995.
[8] Richard Parker - CORPOS, PRAZERES E PAIXÕES. Cultura Sexual no Brasil
Contemporâneo. Rio de Janeiro: Editora Bestseller, 1993.
[9] Holanda,op.cit. p.82
[10] idem,p.3.
[11] Ronaldo Vainfas – TRÓPICO DO PECADO. Rio de Janeiro: Campus, 1989,
p.65. Veja-se, ainda, Angela Mendes de Almeida – O GOSTO DO PECADO.
Casamento e Sexualidade nos manuais de confessores dos séculos VI e XVII.
Rio de Janeiro: Rocco, 1992.
[12]Richard Parker, op.cit., p.22.
[13] Uma análise instigante da obra de Paulo Prado, recentemente publicada
é o livro de Carlos Eduardo Ornelas Beriel – TIETÊ, TEJO, SENA: A obra de
Paulo Prado. Campinas: Papirus, 2000.
[14]Mário de Andrade - MACUNAÍMA. O herói sem nenhum caráter. São Paulo:
Livraria Martins Editora, 1981, 18a.ed.
[15]Foucault, M.; Sennett, R. – "Sexualidade e Solidão" (1981), Ditos e
Escritos, vol. 5, Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004,p.93-103; ver
ainda Thomas Abraham - FOUCAULT Y LA ÉTICA. Buenos Aires: Editorial
Biblos,1988, p.175.
[16] Vejam-se, por exemplo, o trabalho de Ronald Raminelli – IMAGENS DA
COLONIZAÇÃO. A representação do índio de Caminha a Vieira. Rio de
Janeiro: Zahar, 1996; Ronaldo Vainfas, op.cit.; Ligia Bellini – A COISA
OBSCURA. Mulher, sodomia e Inquisição no Brasil Colonial.São Paulo:
Brasiliense, 1987.
[17]M. Foucault - HISTÓRIA DA SEXUALIDADE.vol.1 A Vontade de Saber. Rio de
Janeiro: Graal, 1979.
[18] Veja-se Margareth Rago – OS PRAZERES DA NOITE. Prostituição e Códigos
da Sexualidade Feminina em S.Paulo (1890-1930). Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1991.
[19] C.R. Vasconcellos – Higiene Escolar, suas aplicações à cidade do Rio
de Janeiro, tese de doutoramento, 1888. In: Jurandir Freire Costa – ORDEM
MÉDICA E NORMA FAMILIAR. Rio de Janeiro: Editora Graal, p. 191.
[20]Veja-se Tania Navarro Swain - "Feminino/Masculino no Brasil do Século
XVI: Um Estudo Historiográfico", 1996, mimeo.
[21] Edward Saïd – ORIENTALISMO. São Paulo: Companhia das Letras, 1990.
[22] Veja-se, ainda, VISÃO DO PARAÍSO, de 1958,(São Paulo, Brasiliense,
1994,6ªed.) em que Sérgio Buarque opera com a construção da identidade
nacional a partir da sexualidade forte e primitiva. Afinal, mostra que
para cá vieram os portugueses buscando a "cópia do Eden", o Paraíso
perdido, ao contrário dos calvinistas da Nova Inglaterra, que buscavam no
Eden "abrigo" para a sua própria igreja perseguida. No Paraíso, onde o
homem era livre, onde as regras inexistiam, a vegetação era abundante,
dádiva da Natureza, o pecado não tinha lugar. Aqui também aparecem as
imagens das índias nuas se oferecendo aos portugueses, dos índios avessos
ao trabalho, das práticas de incesto e licenciosidade ilimitada no Inferno
Atlântico.

[23] Richard Sennett - O DECLÍNIO DO HOMEM PÚBLICO. S. Paulo: Companhia das
Letras, 1989.
[24]Veja-se Robert Gay - POPULAR ORGANIZATION AND DEMOCRACY IN RIO DE
JANEIRO: A TALE OF TWO FAVELAS. Philadelphia. Temple University Press, 1994
[25] Gilberto Freyre – SOBRADOS E MUCAMBOS. Rio de Janeiro: Livraria José
Olympio,t.2, 3ªed., p.644
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