SIM 102 Ainda há tempo para o Amor?

July 12, 2017 | Autor: Vicente Franz Cecim | Categoria: Libro de buen amor, Amor, Figuras De Amor, Sentimentos, Bauman Zygmunt Amor Liquido
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BELÉM, DOMINGO, 28 DE JUNHO DE 2015

OLIBERAL

MAGAZINE  11

sim

VICENTE CECIM

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Ainda há tempo para o Amor? CHARLES SCHULZ

V

ocê gosta do Peanuts , do Charles Schulz? Eu gosto. – Como? Um intelectual? Quadrinhos? Coisa de criança? Pois é, eu gosto. E do Mandrake, do Lee Falk, principalmente. Primeiro, porque não sou e me recuso a ser um intelectual – coisa tendente ao racional, geralmente antipoética, adulta demais para o meu gosto. Segundo, porque até parece que o Tempo passou através de mim, nevando nos meus cabelos embora não caia neve aqui na Amazônia, onde nasci e vivo – mas, sob essa aparência, há uma verdade atemporal: continuo sendo, e me mantendo, o Menino que fui, e gostava de Histórias em Quadrinhos – naquele tempo chamadas Gibi - para manter minha mente fresca, juvenil e arejada. O que isso tem a ver com o título da Sim de hoje? Digo: - Há algumas décadas li/vi um quadrinho do Peanuts, que descrevo: O menino Charles Brown e a menina Lucy sentados embaixo de uma árvore. No primeiro, segundo e terceiro quadrinhos, silêncio, eles não dizem

nada. No quarto, de repente Lucy diz: - Não há tempo para o amor, Charlie Brown! Nunca esqueci esses quadrinhos, porque não consigo imaginar que possa haver um tempo que, nós, muitas vezes selvagens humanos, possamos abrir mão dos sentimentos de Amor & Amizade – ao menos para conseguirmos suportar nossas violências mút uas, nossas intolerâncias intempestivas & institucionalizadas, nossas instintivas & incontidas tendências de reagir imediatamente com violência quando alguém, mesmo sem querem, pisa em nosso pé. Se naquela época uma simples história em quadrinhos já denunciava que a falta de tempo para amar estava banindo o Amor das nossas vidas, como estamos hoje? Aqueles eram tempos em que, por

uma urgente necessidade ou movidos pela sempre misteriosa saudade – uma das famosas razões do coração que a Razão desconhece, como escreveu Pascal em seus Pensamentos - nos víamos atravessando decididamente noites de chuva torrencial, às vezes de madrugada, sob tro-

vões e relâmpagos que iluminavam nossas solidões em ruas desertas, em busca de uma cabine telefônica, e quando descobríamos, oh, que não tínhamos uma ficha telefônica, nos lançávamos novamente através da tempestade em busca de, ao menos, uma, para dar um breve ar de nossa

CHARLES SCHULZ

Não há tempo para o amor, Charlie Brown

distante presença. Agora, vivemos tempos de distantes manifestações de afetos fáceis – sem nenhum sacrifício - todos tão virtualmente próximos e ao mesmo tempo distanciados uns dos outros - em que metade das pessoas que parecem estar ao nosso lado, e fisicamente estão, a um gesto – carinhoso ou não - de distância, na verdade mental & emocionalmente podem estar em São Paulo, Paris, ou virtualmente lá na China – se souberem falar chinês – na companhia de um amigo de olhos oblíquos, através da i nstantaneidade até pouco tempo só imaginável, mas já rapidamente assimilada como a coisa mais natural, de um watsap! Abolidos, então, o Tempo & a Distância, não há mais falta de tempo para o Amor? Agora – a Amizade talvez - mas o Amor pode dispensar o corpo? Abraços virtuais entre amigos? É possível. Mas, e os amantes virtuais? Fazendo aquilo sem nem sequer precisarem tocar as mãos um do outro, como no filme futurista Barbarela? E por falar em mãos, por simetria sonora imaginemos modernas mães virtuais refazendo a ronda

das madrugadas que faziam nossas antigas mães físicas para, virtualmente, agasalhar os filhos. E os alimentos virtuais – matarão a grande Fome física da Somália? Antes que nos percamos em perguntas que tenderão a se tornar, uma depois da outra, cada vez mais hipóteses escritas por um dramaturgo para personagens do Teatro do Absurdo, paremos por aqui. Nem contra nem a favor da Vida Virtual, que - Quem já saberá dizer? - pode até vir a ser uma forma inefável de transcendência da matéria pela Tecnologia, me limito a fazer, como um novo Nostradamus, uma profecia: - Está próximo o tempo em que os escritores, dispensando o atual tráfico comercial de editores & livreiros – transmitirá, sem custos, mais do que virtual, mentalmente, a sua obra aos seus leitores. Bastará que eles se sintonizem na frequência, previamente anunciada, claro, em que será feita a emissão da obra. - O que vocês esperavam de mim, que, desde os anos 80, dedico a minha vida atual a criar Viagem a Andara oO livro invisível, o nãolivro, que não escrevo, e apenas sonho? Em próximas Sins, retornaremos ao tema: Amor.

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