SIMULAÇÃO DE ALTA RESOLUÇÃO DAS CIRCULAÇÕES ATMOSFÉRICAS LOCAIS NA REGIÃO DA FOZ DO RIO AMAZONAS

July 24, 2017 | Autor: Diego Souza | Categoria: Atmospheric Modeling
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SIMULAÇÃO DE ALTA RESOLUÇÃO DAS CIRCULAÇÕES ATMOSFÉRICAS LOCAIS NA REGIÃO DA FOZ DO RIO AMAZONAS

Diego Oliveira de Souza1, Jaci Maria Bilhalva Saraiva2 1

Centro de Previsão do Tempo e Estudos Climáticos - Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, Cachoeira Paulista, SP, Brasil. [email protected] 2

Sistema de Proteção da Amazônia, Manaus, AM, Brasil. [email protected]

RESUMO: Com o objetivo de estudar a formação e intensificação das circulações atmosféricas locais na região nordeste da Amazônia foram realizadas simulações numéricas com modelo atmosférico de mesoescala utilizando alta resolução espacial. Resultados preliminares mostram que o contraste térmico entre o oceano atlântico tropical e o continente apresenta-se como principal forçante na formação de circulações do tipo brisa marítima. O contraste térmico entre os grande corpos de água da região e o continente também mostraram-se importantes na formação de outros tipos de circulações locais assim como intensificação da circulação do tipo brisa marítima. Os dados modelados e os observados apresentaram certa coerência de valores, tornando as simulações numéricas muito representativas para o estudo deste tipo de circulação atmosférica. ABSTRACT: With objective to study the formation and intensification of the local atmospheric circulations in the northeast region of Amazon, high resolution numerical simulations with mesoscale atmospheric model had been carried. Preliminary results show that the thermal contrast between the tropical Atlantic Ocean and the continent is presented as main pattern in the formation of the sea-breeze. The thermal contrast between great the water bodies of the region and the continent had also revealed important in the formation of other types of local circulations well as intensification of the sea-breeze circulation. The data of the numerical models and the observed data had presented certain coherence of values, becoming very representative the numerical simulations for the study of this type of atmospheric circulation.

Palavras-chave: Brisa Marítima, BRAMS, Amazônia

1. INTRODUÇÃO O litoral norte do Brasil, que extende-se por três Estados brasileiros: Amapá, Pará e Maranhão, possui uma extensão de aproximadamente 1800 km dominados por diferentes feições fisiográficas. A influência do oceano atlântico tropical sobre esta parte do litoral brasileiro fica muito evidente quando analisa-se as taxas de precipitação ao longo da costa adjacente e na parte interna do continente, região esta onde estão presentes uma das maiores taxas de precipitação da Terra. Nesta região pode-se observar média anual de precipitação de 3000 mm durante o ano no Amapá e delta do rio Amazonas. A região nordeste da Amazônia possui a característica de apresentar duas estações bem distintas em relação ao volume pluviométrico. A estação de seca estende-se dos meses de agosto a novembro, com valores de precipitação inferiores a 100 mm mensais. Os maiores valores de precipitação são registrados durante a estação chuvosa, que esta compreendida entre os meses de janeiro a abril, sendo que no mês de janeiro observam-se médias mensais superiores a 400 mm (Rao e Hada, 1990; Figueroa e Nobre, 1990). Uma das causas deste máximo é o posicionamento da Zona de Convergência Intertropical (ZCIT) durante os meses de janeiro a junho próximo ao litoral da região, que é regulada principalmente pelo aumento da temperatura da superfície do oceano neste período (Horel et al, 1980). A convecção induzida pela convergência em superfície entre o escoamento principal e circulações locais, como por exemplo a brisa marítima, também exerce influência sobre o comportamento da precipitação sobre a região, principalmente na região litorânea. Muitas vezes a nebulosidade gerada sobre o litoral pode propagar-se para o interior do continente como linhas de instabilidade, causando precipitação na parte interior do continente. A formação destas linhas podem ser observadas ao longo do litoral da região norte, desde a Guiana Francesa até o Maranhão (Kousky, 1980; Cohen, 1995). O principal mecanismo de formação das Linhas de Instabilidade de origem costeira é resultado da convecção induzida pela circulação

de brisa marítima (Kousky, 1980; Garstang et. al, 1994; Cohen, 1995). A formação de circulações do tipo brisa está diretamente relacionada com o contraste térmico entre a superfície do continente e da água. Durante o dia, a terra recebe aproximadamente 51% de toda a radiação emitida pelo sol. Esta radiação irá aquecer as superfícies da água e da terra de forma diferenciada, pois estas possuem diferentes capacidades de armazenar calor, gerando assim um gradiente de temperatura que apontará para o continente durante o dia. Já durante o período noturno, a superfície da terra perderá calor mais rapidamente que a superfície da água, o que irá criar um gradiente que terá seu sentido continente-água. Estas circulações estão diretamente relacionadas com o gradiente horizontal de fluxo de calor sensível e com forçantes atmosféricas de grande escala (Avissar e Pielke, 1989; Freitas, 2003; Souza e Saraiva, 2006). Estas circulações não possuem grande profundidade vertical, alcançando alturas menores que 5 km, mas quando analisada a penetração horizontal, estas circulações podem alcançar algumas centenas de quilômetros (Atkinson, 1981). A região leste da Amazônia possui uma fisiografia complexa, onde estão presentes grandes rios como o Tapojós, Xingú, Tocantins e o Amazonas, os quais têm sua foz em uma grande área ao redor da ilha de Marajó. Grandes corpos de água, como lagos e rios, também apresentam influência sobre a formação de circulações locais do tipo brisa. O mecanismo de formação da brisa lacustre ou da brisa fluvial é o mesmo descrito para a formação da brisa marítima, estando diretamente relacionado com o contraste térmico terra/água. Estas circulações são geralmente mais rasas que a brisa marítima como também possuem uma menor penetração horizontal. Alguns estudos como os de Oliveira e Fitzjarrald (1993), Stivari et al. (2003), Saldanha (2003), Moura et al. (2004), Silva Dias et al (2004), comprovaram a formação de circulações do tipo brisa lacustre/fluvial em alguns locais do Brasil. Grande parte da zona costeira da região norte do Brasil é composta de manguezais, que são sistemas estuarinos com grande importância na biodiversidade. Estes sistemas são responsáveis pelo fornecimento de nutrientes importantes para o desenvolvimento da vida no oceano, como também abriga diversas espécies de animais. Do ponto de vista econômico, o sistema estuarino presente nesta região possui grandes pólos portuários, como por exemplo o porto de Macapá e o porto de Belém. Locais como estes são diretamente afetados por fenômenos meteorológicos, como as Linhas de instabilidade, tempestades severas, influenciados de forma direta por circulações locais, principalmente do tipo brisa. Com isso, a presença de circulações de brisa marítima e brisa fluvial criam uma área específica de variabilidade espacial e temporal da precipitação nesta região (Kousky, 1980; Silva Dias et al; 2004). Assim, o objetivo deste trabalho é estudar e caracterizar a formação de circulações locais do tipo brisa na região do estuário do Amapá, na foz do rio Amazonas, através de simulações numéricas de alta resolução realizadas com um modelo atmosférico de mesoescala.

2. DADOS E METODOLOGIA Para o estudo das circulações atmosféricas locais na região da foz do rio Amazonas, serão realizadas simulações numéricas utilizando o modelo atmosférico de mesoescala Brazilian Regional Atmospheric Modeling System (BRAMS), em sua versão 3.2. O modelo BRAMS foi desenvolvido por instituições brasileiras e internacionais com o objetivo de criar e aprimorar parametrizações e atualizações voltadas para a meteorologia do Brasil, sendo baseado no mundialmente conhecido modelo RAMS. No presente trabalho foi realizado um experimento utilizando a inicialização do tipo horizontalmente homogênea. Em um primeiro experimento serão utilizados dados de radiossondagem realizada no aeroporto de Macapá às 12 UTC do dia 06 de julho de 2006. São fornecidos através dos dados de radiossondagem variáveis como pressão, altura geométrica, temperatura do ponto de orvalho, temperatura do ar e direção e intensidade do vento. Desta forma, este experimento será realizado sem a presença dos dados de vento, registrados na radiossondagem, pretendendo-se assim estudar apenas a influência de contrastes térmicos, de vegetação e fisiográficos na formação de circulações locais. As simulações do experimento possuem resolução temporal de 24 horas onde foram criadas duas grades com resolução espacial de 8 km e 2 km, com 50 níveis na vertical, sendo a segunda grade (2 km) aninhada com a grade mais grosseira. Como condições de superfície foram utilizados dados de vegetação e topografia com resolução espacial de 1 km, dados de umidade do solo heterogênea com resolução espacial de 0,25º e dados

de TSM com resolução espacial de 0,5º e temporal de uma semana. Para uma devida validação das simulações numéricas realizadas neste trabalho foram utilizados dados observacionais da estação de Macapá, no Amapá e Belém, no Pará, para o período de estudo em questão.

3. RESULTADOS Nesta seção serão analisados os resultados referentes às simulações numéricas realizadas com o modelo BRAMS e desta forma realizar comparações com dados observados para o período simulado. Foram escolhidos dois pontos, um sobre Macapá, com latitude de 0,05º N e longitude de 51,06º W, e outro sobre Belém, com latitude de 1,54º S e 48,74º W. Para analisar a formação e intensidade de circulação do tipo brisa foram feitos cortes verticais sobre os pontos mencionados anteriormente para a componente zonal do vento, a qual sobre estes locais é a componente que apresenta-se perpendicular a linha de costa. Os resultados para a simulação sem a presença do vento de grande escala mostra que um escoamento perpendicular a linha de costa inicia próximo 15 UTC, sobre Macapá, com intensidade de 1 ms-1. A partir deste horário este escoamento, caracterizado como brisa marítima e/ou fluvial, aumenta sua intensidade até praticamente as 03 UTC, quando observam-se valores de 10 ms-1 entre a superfície e 500 m de altura. O hodógrafo feito pala ilustrar a formação da brisa mostra que praticamente durante todo o período de simulação o escoamento em aproximadamente 15 m de altura possui direção perpendicular a linha de costa, o que caracteriza a formação deste tipo de circulação local. Os dados observados para o ponto sobre Macapá mostram que existe um escoamento perpendicular a linha de costa entre os horários das 12 UTC e praticamente 06 UTC, o que também caracteriza assim a formação de circulação do tipo brisa neste local. Por representarem circulações atmosféricas, escoamentos do tipo brisa marítima ou fluvial possuem uma componente em baixos níveis com sentido oceano/rio – continente e em níveis mais elevados geralmente observa-se um escoamento com sentido contrário, formando assim uma célula de circulação. Observa-se que esta célula de circulação apresenta-se bem definida nas simulações numéricas sobre a cidade de Macapá, com um escoamento penetrando o continente em baixos níveis e em níveis entre 2000 m e 4000 m de altura um escoamento com sentido oposto. Estes resultados mostram que o modelo BRAMS conseguiu de forma satisfatória representar a formação do escoamento de brisa assim como caracterizar a célula de circulação sobre a cidade de Macapá. Já sobre o ponto sobre a cidade de Belém observa-se que o escoamento perpendicular a linha de costa inicia mais tarde do que sobre a cidade de Macapá. Sobre Belém, nos resultados da simulação numérica, um escoamento com intensidade de aproximadamente 1 ms-1 inicia próximo as 00 UTC, apresentando maior intensidade entre as 03 UTC e 12 UTC. Possivelmente o atraso na formação de um escoamento de brisa deve-se a maior distância entre o oceano e este ponto, levando assim um maior tempo para que a brisa marítima penetre sobre esta região. O hodógrafo criado para o ponto sobre a cidade de Belém mostra que durante toda a simulação um escoamento perpendicular a linha de costa está presente, o que caracteriza assim a formação de um escoamento de brisa marítima/fluvial. Diferentemente do que é observado sobre Macapá, apenas em dois horários das observações, as 03 UTC e 06 UTC, o escoamento encontra-se penetrando o continente, caracterizando a brisa marítima/fluvial. O primeiro horário em que observa-se um escoamento penetrando o continente mostra-se de acordo com o horário de maior intensidade do escoamento e início da brisa mostrado no corte vertical. Assim como observado sobre Macapá, sobre Belém uma célula de circulação de brisa também é formada, mas com menor intensidade e em níveis mais elevados. Possivelmente esta menor intensidade e maior profundidade da circulação devem-se ao atraso na entrada da brisa marítima sobre este ponto, chegando a este ponto mais quente, o que favorece ao aprofundamento do escoamento. Mesmo assim, para o ponto sobre Belém o modelo mostrou-se capaz de simular a formação do escoamento de brisa assim como a formação da célula de circulação.

Figura 1: Hodógrafos para (a) dados observados e (b) dados simulados sobre Macapá, e (c) dados observados e (d) dados simulados sobre Belém.

Figura 2: Corte vertical para a componente zonal do vento sobre (a) Macapá e (b) Belém durante todo o período de simulação

4. CONCLUSÕES Neste trabalho realizou-se simulações numéricas com o objetivo de caracterizar a formação e a presença de circulações locais do tipo brisa na região nordeste da Amazônia. Para uma devida validação destas, dados de superfície foram utilizados para dois pontos localizados na área de estudo, um sobre Macapá e outro sobre Belém. Os resultados preliminares obtidos através de simulações numéricas mostraram a formação de um escoamento perpendicular à linha de costa, assim como a formação de uma célula de circulação, o que permitiu assim caracterizar esta circulação como brisa marítima e fluvial em ambos locais. Os dados simulados também mostraram-se de acordo com as observações sobre os pontos previamente determinados. Desta forma pode-se constatar que mesmo sendo uma simulação para apenas 24 horas, circulação do tipo brisa é um tipo de escoamento característico da região, o que foi bem representado pelo modelo BRAMS.

5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Rao, V. B.; Hada, K. Characteristics of rainfall over Brazil: annual variations and connections with the Southern Oscilation. Theoretical and Applied Climatology, v. 42, n. 2, p. 81-91, 1990. Figueroa, S.N.; Nobre, C.A., 1990: Precipitation Distribuition over Central and Western Tropical South America. Climan�lise-Boletim de Monitoramento e An�lise Clim�tica, 5 (6), 36-45 Kousky, V. E. 1980: Diurnal Rainfall Variation in Northeast Brazil. Monthly Weather Review: Vol. 108, No. 4, pp. 488–498. Garstang, M., Massie Jr., H.L., Halverson, J., Greco, S., Scala, J. 1994: Amazon Coastal Squall Lines. Part I: Structure and Kinematics. Monthly Weather Review: Vol. 122, No 4, pp. 608–622. Cohen, J.C.P., Silva Dias, M.A.F. , Nobre, C.A. 1995: Environmental Conditions Associated with Amazonian Squall Lines: A Case Study. Monthly Weather Review: Vol. 123, No. 11, pp. 3163–3174. Avissar, R. e Pielke, R., 1989: A Parameterization of Heterogeneous Land Surfaces for Atmospheric Numerical Models and Its Impact on Regional Meteorology. Monthly Weather Review: Vol. 117, pp. 2113– 2136 Atkinson, B. W. 1981: Mesoscale Atmospheric Circulations. Academic Press London. 495 p. Souza, D.O., Saraiva, J.M.B. 2006: Local Atmospheric Circulations in The Amazonas River Mouth. In: 8th International Conference on Southern Hemisphere Meteorology and Oceanography, 2006, Foz do Iguaçu. 8 ICHMO Proceedings. p. 1417-1425. Oliveira, A.P., Fitzjarrald, D.R. 1993: The Amazon River Breeze and the Local Boundary Layer: I. Observations. Boundary-Layer Meteorology 63, pp 141-162. Saldanha, R.L. 2003: Estudo das Circulações Atmosféricas Locais sobre o Estuário da Lagoa dos Patos. Dissertação de mestrado do curso de Pós-graduação em Oceanografia Física, Química e Geológica da Fundação Universidade Federal do Rio Grande, 81p. Stivari, S.M.S, Oliveira, A.P., Karam, H.A., Soares, J. 2003: Patterns of Local Circulation in the Itaipu Lake Area: Numerical Simulations of Lake Breeze. Journal of Applied Meteorology: Vol. 42, No. 1, pp. 37–50. Silva Dias, M.A.F., Silva Dias, P.L., Longo, M., Fitzjarrald, D.R., Denning, A.S. 2004: River Breeze Circulation in Eastern Amazonia: Observations and Modeling Results. Theoretical and Applied Climatology, 78, pp 111-121. Moura, M.A.L., Meixner, F.X., Trebs, I., Lyra, R.F.F., Andreae, M.O., Filho, M.F.N. 2004: Evidência observacional das brisas do lago de Balbina (Amazonas) e seus efeitos sobre a concentração de ozônio. Acta Amazonica: Vol. 34, No. 4, pp. 605–611.

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