SINERGIA REVISTA DO INSTITUTO DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS, ADMINISTRATIVAS E CONTÁBEIS (ICEAC) A INTERNACIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR: DESCRIÇÃO DO PROCESSO EM CURSO NA UNIVERSIDADE FEDERAL DA FRONTEIRA SUL

May 24, 2017 | Autor: Luciane Stallivieri | Categoria: International Relations, Internationalization of higher education
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SINERGIA REVISTA DO INSTITUTO DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS, ADMINISTRATIVAS E CONTÁBEIS (ICEAC)

A INTERNACIONALIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR: DESCRIÇÃO DO PROCESSO EM CURSO NA UNIVERSIDADE FEDERAL DA FRONTEIRA SUL HUMBERTO TONANI TOSTA* LUCIANE STALLIVIERI** KELLY CRISTINA BENETTI TONANI TOSTA*** RESUMO Com o crescente debate sobre o tema da internacionalização da educação superior no Brasil, e a adoção em âmbito nacional de ações que visam aprimorar a participação do país na construção do conhecimento científico e tecnológico mundial, as Universidades Brasileiras vêm promovendo ações de adequações internas para permitirem o melhor aproveitamento dos incentivos governamentais e de organismos internacionais. Visando apresentar e compreender o impacto das ações governamentais em uma realidade específica, este artigo foi desenvolvido voltando suas atenções para a Universidade Federal da Fronteira Sul. Dessa maneira, é objetivo deste estudo “Descrever o processo de internacionalização, de 2010 a 2015, na Universidade Federal da Fronteira Sul - UFFS”. Este estudo caracteriza-se por sua abordagem qualitativa, por ser descritivo; uma pesquisa aplicada, quanto aos fins; e quanto aos meios é bibliográfica, documental, pesquisa de campo e estudo de caso. Como técnica de coleta de dados, foi utilizada a entrevista semiestruturada, realizada com dois dirigentes envolvidos com a internacionalização na UFFS. Verifica-se, após as informações apresentadas, que a UFFS, desde seu início, esteve acompanhando as ações de internacionalização no país e vem construindo ações concretas para se inserir nesse contexto. Apesar de não possuir uma política formal sobre o assunto, a Instituição apresenta uma visão clara do que pretende com a internacionalização e está envidando esforços em projetos que tenham propósitos específicos e resultados concretos. Palavras-chave: Internacionalização. Educação Superior. Universidade Federal da Fronteira Sul. ABSTRACT With the growing debate on the subject of internationalization of higher education in Brazil, and the adoption of national actions aimed to improve the country's participation in the construction of scientific and technological knowledge worldwide, Brazilian Universities have been promoting internal adjustments to allow actions aiming the best use of government and international organizations incentives. In order to present and understand the impact of government actions in a specific reality, this article is designed turning its attention to the Federal University of Fronteira Sul. The aim of this study is "to describe the internationalization process, from 2010 to 2015, at the Federal University of Fronteira Sul - UFFS ". This study is characterized by its qualitative approach with a descriptive study. It is also an applied research, a case study, that uses documentary and bibliographic data. Semi structured interviews were used to the collection technique. They were held with two directors involved with the internationalization process at UFFS. After analyzing the information obtained with this study, it is possible to conclude that since its conception UFFS has been following the internationalization actions in the country and it has built concrete actions to be included in that context. Despite of not having a formal policy on the matter, the Institution has a clear vision of what it wants with the internationalization and it is putting efforts specially on projects that have specific purposes and concrete results. Key-words: Internationalization; Higher Education; Universidade Federal da Fronteira Sul. Recebido em: 25-02-2016 Aceito em: 08-11-2016

1 INTRODUÇÃO A internacionalização da educação superior não é algo recente. Desde o século doze e treze na Europa, o movimento de alunos, pesquisadores e ideias para além das fronteiras eram comuns (HUDZIK, 2011). Contudo, com a globalização e o avanço das tecnologias de informação, as distâncias foram se tornando cada vez menores e as barreiras ao diferente também. De acordo com Knight e De Wit (1995), a globalização da economia e da sociedade impactou e tem influenciado a pesquisa e a educação, uma vez que, progressivamente, ao longo dos anos, a educação superior se tornou o centro dos desenvolvimentos social, político e econômico. *

Professor do Curso de Administração – Campus Chapecó da Universidade Federal da Fronteira Sul. Doutorando em Administração Universidade Federal da Fronteira Sul. E-mail: [email protected]; End: Rua General Osório, 413D, Bairro Jardim Itália, Chapecó – SC. ** Professora do Mestrado Profissional em Administração Universitária. Doutora em Línguas Modernas pela Universidade Federal de Santa Catarina. *** Professora do Curso de Administração – Campus Chapecó da Universidade Federal da fronteira Sul. Doutora em Engenharia e Gestão do Conhecimento – Universidade Federal da Fronteira Sul.

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Segundo os mesmos autores supracitados, com a globalização, as universidades passam por um processo de renovação, que deve levá-las a suas origens, quando eram promotoras de um conhecimento universal, sem as barreiras promovidas pela ascensão dos estados-nação. Portanto, para isso, as mesmas estão restaurando aspectos do passado como os pesquisadores itinerantes que foram contribuidores para uma educação universal (KNIGHT; DE WIT, 1995). Especificamente sobre o Brasil, nota-se que o desenvolvimento do Ensino Superior no país se deu associado às políticas de desenvolvimento nacional ao longo de sua história, bem como a internacionalização, tanto econômica quanto educacional, que, quando compreendida como uma estratégia para o desenvolvimento econômico nacional, foi incentivada (MUELLER, 2013). A internacionalização da educação superior no Brasil assume diversas características ao longo da história, passando por um período de “exportação” de pessoas abastadas para cursarem o Ensino Superior, principalmente em Portugal, até um processo de atração de pesquisadores estrangeiros para as Universidades Brasileiras, visando desenvolver estudos em áreas definidas como estratégicas, como pode se observar com o lançamento do programa Ciências sem Fronteiras. Com o crescente debate sobre o tema da internacionalização da educação superior no Brasil e a adoção, em âmbito nacional, de ações que visam aprimorar a participação do país na construção do conhecimento científico e tecnológico mundial, as Universidades Brasileiras vem promovendo ações de adequações internas para permitirem o melhor aproveitamento dos incentivos governamentais e de organismos internacionais. Cabe destaque ao programa Ciências Sem Fronteiras que previa, em seu lançamento, a concessão de cento e uma mil bolsas para estudantes e professores brasileiros desenvolverem estudos no exterior e, também, a vinda de estudantes e pesquisadores estrangeiros para o Brasil. Assim, de maneira geral, a internacionalização da educação superior no Brasil apresenta nos últimos anos um salto quantitativo. Visando apresentar e compreender o impacto das ações governamentais em uma realidade específica, este artigo foi desenvolvido voltando suas atenções para a Universidade Federal da Fronteira Sul-UFFS. A UFFS foi criada em 2009 e iniciou suas atividades acadêmicas em 2010. Por suas características peculiares, como atender a três estados do Sul do Brasil e estar localizada em uma região de fronteira, ela está, desde o seu nascimento, atenta aos movimentos da internacionalização. Dessa maneira, é objetivo deste estudo “Descrever o processo de internacionalização, de 2010 a 2015, na Universidade Federal da Fronteira Sul – UFFS”. Tal pesquisa justifica-se pelo fato de que, até a realização da mesma, não havia na Instituição estudos sobre esse processo, assim, como lacuna, tem-se como são pensadas e operacionalizadas as ações de internalização e quais são as perspectivas futuras para esta temática na UFFS. Ressalta-se também que, em pesquisa realizada no Portal Periódicos da Capes, usando as palavras "Internacionalização e Educação Superior", encontraram-se 53 artigos, e após o uso do filtro "revisado por pares, a busca resultou em 34 artigos, que tiveram seus resumos lidos. Após, identificou-se que alguns deles (quatro) estavam aderentes àquilo que se pretendia e foram utilizados para pavimentar o caminho do presente trabalho na construção de sua argumentação teórica como "Lima e Contel (2005), Albatch (2005), Lima e Riegel (2015) e Bartel (2015). 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Neste tópico, será realizada uma discussão sobre a internacionalização, educação superior e ainda especificamente a internacionalização da educação superior no Brasil. 2.1 Globalização e internacionalização da educação superior A globalização é um fenômeno real e irreversível e traz para os diferentes segmentos da sociedade grandes oportunidades, mas também grandes desafios, uma vez que as tecnologias de informação aproximam as nações e seus povos. Esse cenário não é diferente para as universidades ao redor do mundo, pois as mesmas enfrentam uma das épocas mais interessantes, incertas e complexas (SEGRERA, 2008). Corrobora com a visão apresentada, Altbach (2005, p. 72) ao afirmar que a globalização da educação superior e da ciência são inevitáveis e que, apesar da internacionalização da educação superior sempre ter existido, a tecnologia moderna tem acelerado o processo e, portanto, “nenhum sistema acadêmico existirá por si só no século XXI”. Muller (2013, p. 22) destaca que a “globalização é constituída de processos complexos que possuem relação e interdependência e se pautam na atual ordem global que compreende novas formas de relações entre pessoas, instituições e países na chamada sociedade do conhecimento”. A globalização econômica, política e da sociedade presente no século 21 leva a educação superior a um grande envolvimento internacional. Isso porque o capital global tem investido em indústrias do conhecimento ao redor do mundo, no que se conhece por sociedade do conhecimento, promovendo o setor de serviços e a dependência de diferentes sociedades em produtos resultantes do conhecimento e de pessoas altamente qualificadas (ALBATCH ; KNIGHT, 2007).

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Gacel-Avila (2003, p. 40) apresenta sua contribuição sobre essas diferenças e afirma que a “globalização seria o input e a internacionalização, o output, ou seja, os esforços das instituições para adaptarem-se a esse fenômeno”. Ainda segundo a autora, a internacionalização é diferente da globalização no sentido de que a primeira reside na relação entre nações e na existência do Estado-nação, e como tal, adota como ponto de partida o reconhecimento das diferenças entre os países. Por outro lado, a globalização tende a minar a existência de nações e suas diferenças, e destaca mais similaridades do que diferenças. Portanto, a internacionalização impulsiona o reconhecimento e o respeito às diferenças e promove a harmonização, enquanto a globalização promove a homogeneização. De acordo com Knight (2005, p. 6 e p. 11), a globalização pode ser definida como um “fluxo de tecnologia, economia, conhecimento, pessoas, valores, ideias... para além das fronteiras”. Já a internacionalização seria “um processo de integrar uma dimensão internacional e intercultural às funções de ensino, pesquisa e serviços da instituição”. Ou seja, globalização e internacionalização são temas relacionados, mas não são a mesma coisa (ALBATCH ; KNIGHT, 2007). Sobre a educação neste contexto, Gacel-Avila (2003) destaca que a mesma tem seus esforços direcionados na criação, por parte de seus formandos, da consciência do pertencimento a uma comunidade de nações, reconhecendo na cultura e na própria educação elementos balizadores para uma integração tanto econômica quanto política das nações. Dessa maneira, a autora propõe que a internacionalização seja uma alternativa à educação atual, focada primordialmente em uma perspectiva nacional e local, para uma nova visão educativa, que possibilite a transição dos pensamentos para alcançar uma sociedade comprometida com a construção e planejamento de uma comunidade local. Nesse ínterim, o ente capaz de promover mudanças paradigmáticas que são requeridas pela sociedade global é a universidade, pois “nela aparece a consciência mais clara da época, daí a importância dos universitários (comunidade – professores, alunos) para formação de uma comunidade global”. Para estar a altura desse papel, será necessário levar adiante reformas curriculares profundas que respondam às necessidades contemporâneas (GACELAVILA, 2003, p. 34). 2.2 Internacionalização da educação superior Adentrando especificamente sobre a internacionalização da educação superior, sem deixar de considerá-la inserida em um contexto de globalização, percebe-se que alguns autores possuem uma definição clara do papel da mesma, como pode ser notado no discurso de Gacel-Avila (2003) ao afirmar que a internacionalização da educação superior seria a resposta adequada da comunidade universitária aos efeitos como a homogeneização e desnacionalização promovidos pela globalização. Dessa forma, ainda na visão de Gacel-Avila (2003, p. 37), a internacionalização da educação seria “pensar em termos globais para atuar no âmbito local”. Segue no mesmo raciocínio Hudzik (2011, p. 9) ao apresentar que o “desenvolvimento global do sistema de educação superior é o reconhecimento de um paradigma sobre o qual as instituições de educação superior não são somente locais, regionais ou nacionais, mas são também recursos globais, globalmente conectadas”. Destarte, tal entendimento leva à educação dois grandes desafios na contemporaneidade: estar globalmente conectado, mas, ao mesmo tempo, permanecer atenta às demandas locais. No que se refere às razões para a internacionalização, Knight e De Wit (1995) apresentam diversas, como podem ser observadas no Quadro 01, apresentado na sequência. QUADRO 1 – Razões e incentivos dos stakeholders Razões Econômica e política

Cultural e educacional

Descrição •

Crescimento da economia e investimento na economia futura;



Mercado de trabalho, uma vez que, quanto mais internacional o mercado se torna, mais os graduados têm que competir com pessoas de outros países e mais têm que trabalhar em um ambiente internacional;



Política estrangeira – imagem do país no mundo;



Incentivos financeiros – pelo pagamento das taxas estudantis e gastos para manutenção;



Demanda educacional insuficiente;



A função cultural – normalmente com ênfase em exportar a cultura e os valores nacionais;



Desenvolver o indivíduo – melhor capacitação para enfrentar o mundo;



Promoção de uma dimensão internacional da pesquisa e docência - promover a interdependência entre nações e preparar a faculdade, staff e alunos para atuarem em contexto internacional e intercultural;



Construção institucional – permite às instituições alcançarem um nível de expertise que não seria possível sem a internacionalização;



Melhorar a qualidade da educação e da pesquisa; FONTE: Knight e De Wit (1995, p. 9-14).

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Assim como existem diversas razões para a internacionalização da educação superior, verificam-se diferentes definições, sejam elas de associações ou de pesquisadores. Enquanto definição, Knight e De Wit (1995, p. 15) apresentam aquela trabalhada pela Província de British Columbia no Canadá, a qual afirma que “internacionalização é um processo que prepara a comunidade para uma participação bem sucedida em um crescente interdependente mundo”. Outra definição é da Associação Europeia para Educação Superior. Para esta, “internacionalização é uma gama inteira de processos que transformam a educação superior menos nacional e mais internacionalmente orientada” (KNIGHT ; DE WIT,1995, p. 15). A internacionalização também pode ser entendida, segundo Knight (apud KNIGHT; DE WIT 1995, p.15) como “um processo de integração da dimensão internacional do ensino, pesquisa e serviços da instituição de educação superior” ou ainda, como uma “perspectiva, atividade ou programa que introduz ou integra uma perspectiva internacional/intercultural/global nos maiores propósitos da universidade/faculdade”. Para o Conselho Americano de Educação, “as instituições de educação superior devem se tornar em um sentido genuíno em instituições sem fronteiras, se seu povo e nação querem prosperar no contexto do novo século” (BARTELL, 2003, p. 49). Continuando na apresentação das diferentes percepções a respeito da definição, é possível trazer a da autora Morosini (2006), que destaca a internacionalização como a marca das relações entre as universidades, pois, em função de sua natureza de produtora de conhecimento, a universidade sempre teve como norma a internacionalização da função pesquisa, apoiada na autonomia do pesquisador. Por fim, Mueller (2013) contribui para essa discussão ao afirmar que foi a partir de Bolonha que a definição de internacionalização do Ensino Superior passou de uma visão tradicional baseada exclusivamente na mobilidade de estudantes, para uma estratégia de análise de um engajamento de políticas institucionais, nacionais e internacionais, ou seja, sem fronteiras. Por outro lado, como destacam Correia-Lima e Riegel (2015), mobilidade internacional é vista na comunidade europeia como um processo de renovação da conjuntura social, política e econômica, que pode gerar consequências sobre indivíduos, instituições e sociedades de origem e de acolhimento. Destarte, verifica-se a relevância de tal processo no desenvolvimento social e econômico de um país ou região. Especificamente no caso brasileiro, a seção seguinte fará a contextualização. 2.3 Internacionalização da educação superior no Brasil A internacionalização da educação superior brasileira tem sua raiz histórica ainda no período colonial, quando alguns privilegiados deixavam o país para cursarem faculdades tradicionais na Europa. Após um período, com o surgimento das primeiras universidades no Brasil, o que ocorreu foi o movimento de professores e estudiosos estrangeiros para auxiliarem no desenvolvimento dessas universidades, como ocorreu com maior visibilidade na Universidade de São Paulo, com a vinda de franceses. Ainda, a educação superior brasileira sofre grande influência americana no período militar, com o acordo MECUSAID (United States Agency for International Development). Posteriormente, com a criação e crescimento dos cursos stricto sensu, o país começa a ter maior presença internacional, ainda que de maneira tímida, e ocorreu principalmente com o envio de estudiosos para universidades do norte para cursarem programas de mestrado e doutorado. Lima e Contel (2009) adicionam a esse cenário brevemente apresentado que, historicamente, a educação superior esteve e se mantém atrelada às ações do Estado e à participação das universidades públicas e institutos de pesquisa por ele mantidos. Dessa maneira, a internacionalização dependeu tanto da criação de universidades como também do interesse político. Nesse sentido, nota-se, para Lima e Contel (2009), que a inauguração da política de cooperação internacional no Brasil ocorreu no século 30, quando as principais universidades brasileiras foram criadas e, desde então, a partir do reconhecimento da necessidade de formação de quadro profissional qualificado para contribuírem com o desenvolvimento científico e tecnológico do país, o governo Brasileiro tem investido, de maneira mais ou menos intensa com o passar dos anos. Ainda de acordo com o trabalho histórico realizado por Lima e Contel (2009), é possível destacar 4 períodos, com suas respectivas motivações, como pode ser observado no Quadro 02.

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QUADRO 2 – Motivações e fases da internacionalização da educação superior Períodos 1º Período Anos 30 e50

2º Período Anos 60 e70

3º Período Anos 80 e90

4º Período Dos anos 2000 em diante

Programa *Programas de cooperação acadêmica internacional com ênfase nas missões que traziam professores visitantes.

Provedores *Universidades estrangeiras e brasileiras.

*Programas de cooperação acadêmica *Agências internacionais e internacional com ênfase na presença de Governo brasileiro. consultores e na concessão de bolsas de *Agências nacionais e estudos para realizar mestrado/doutorado internacionais. no exterior. *Programas de cooperação acadêmica internacional com ênfase na formação de *Agências internacionais grupos de estudo e pesquisa em torno de e Governo brasileiro. temas de interesse compartilhado. *Agências nacionais e *Concessão de bolsas de estudos para internacionais. realizar doutorado no exterior, em áreas *Universidades classificadas como estratégicas. estrangeiras; *Programas de cooperação acadêmica instituições de internacional com ênfase na vinda de educação superior professores visitantes, na ida de privadas. estudantes para realização de poucas disciplinas. *Programas de cooperação acadêmica internacional com ênfase na formação de grupos de estudo e pesquisa em torno de * Governo brasileiro. temas estratégicos e de interesse *Agências internacionais partilhado. e Governo brasileiro. *Concessão de bolsas de estudos para *Agências nacionais e realizar doutorado no exterior em áreas internacionais. classificadas como estratégicas e sem *Universidades tradição de pesquisa no País. estrangeiras *Programas de cooperação acadêmica e instituições internacional com ênfase na vinda de brasileiras de educação professores visitantes, na ida de superior privadas. estudantes para realização de poucas *Corporações disciplinas. internacionais. *Projetos de criação de universidades *Universidades federais orientadas pela corporativas. internacionalização ativa. *Comercialização de serviços educacionais. FONTE: Lima e Contel (2009, p. 4)

Motivação *Acadêmica: fortalecimento do projeto acadêmico das universidades emergentes. *Político–Acadêmica: reestruturação do sistema educacional superior em consonância com o “modelo americano”. *Acadêmico-Mercadológica: a) Expansão e consolidação dos programas de pósgraduação stricto sensu. b) Incremento da pesquisa de ponta em áreas estratégicas. c) Diferencial competitivo de algumas instituições ou de alguns cursos.

*Acadêmica, Política, Econômica e Mercadológica: a) Inserção internacional dos programas de pósgraduação stricto sensu. b) Incremento da pesquisa de ponta em áreas estratégicas. c) Integração regional de caráter inclusivo. d) Diferencial competitivo de algumas instituições ou de alguns cursos. e) Captação de estudantes.

Percebe-se, a partir da análise do Quadro 02, uma evolução nas ações de internacionalização, que começam com a vinda de professores estrangeiros ao país, passando por um período de ênfase na mobilidade acadêmica e concessão de bolsas, até um período com a criação de universidades públicas voltadas para a integração internacional, como a Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA) com foco no Mercosul e a Universidade Federal de Integração Luso-Afro-Brasileira (UNILAB). Correia-Lima e Riegel (2015), em seu estudo comparativo da mobilidade acadêmica no Brasil e Colômbia, apresentam que, naquele, de 1990 até o surgimento de um programa nacional para financiamento da mobilidade (Ciências Sem Fronteiras), principalmente em cursos de graduação, a participação de graduandos se dava de maneira espontânea e fortemente condicionada à capacidade da família em arcar com os custos, assim, apenas a elite nacional se beneficiava dessa modalidade. Em uma análise das características atuais das políticas de internacionalização da educação superior no Brasil, Correia Lima e Betioli (2008) perceberam que tal temática está na agenda dos dirigentes das Instituições de Ensino Superior, sejam elas públicas ou privadas, contudo, aquelas empenham-se mais, mas estas, em função de uma pressão crescente por parte dos estudantes, estão ampliando suas ações para a internacionalização que incluem mobilidade estudantil e docente, bem como a adequação de projetos pedagógicos que forneçam aderência maior ao mercado mundial. É conclusão desse estudo também que tendo em vista que a experiência com programas de internacionalização faz parte do DNA das universidades públicas, numa perspectiva pautada pela cooperação, formou-se uma cultura de internacionalização passiva, ou seja, ancorada em programas de emissão de estudantes e professores pesquisadores e recepção de professores visitantes, muito pouco afeitos aos princípios de reciprocidade. Indício disso é o desequilíbrio existente entre o número de estudantes que anualmente deixam o Brasil para estudar fora e o número de estudantes que as universidades brasileiras acolhem (CORREIA LIMA; BETIOLI, 2008, p. 20).

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De fato, a internacionalização da educação superior brasileira, que ainda resiste ao movimento de mundialização da educação e ao efeito homogeneizador da globalização, apresenta um longo caminho a ser percorrido, contudo, com as ações governamentais dos últimos anos, tanto instituições particulares quanto públicas podem possibilitar aos seus estudantes o intercâmbio estudantil, por meio do Programa Ciência sem Fronteiras. Ciência sem Fronteiras é um programa que busca promover a consolidação, expansão e internacionalização da ciência e tecnologia, da inovação e da competitividade brasileira por meio do intercâmbio e da mobilidade internacional. A iniciativa é fruto de esforço conjunto dos Ministérios da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e do Ministério da Educação (MEC), por meio de suas respectivas instituições de fomento – CNPq e Capes –, e Secretarias de Ensino Superior e de Ensino Tecnológico do MEC (CIÊNCIAS SEM FRONTEIRAS, 2015).

Visualiza-se, nesse cenário, que, apesar de ainda estarmos atrasados em relação aos países, principalmente do hemisfério norte, algumas ações estão sendo promovidas para a consolidação da participação brasileira na internacionalização da educação superior, e que tais investimentos promovidos, por seu caráter educacional, serão melhor compreendidos e mensurados em um médio prazo. 3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Entendendo método como um caminho, uma lógica de pensamento, faz-se necessária a apresentação da forma como este trabalho foi conduzido e as etapas percorridas. Assim, este estudo, quanto à sua abordagem, caracteriza-se por ser qualitativo, pois objetiva investigar, com maior nível de detalhamento, um fenômeno particular, descrevendo suas características e compreendendo suas nuances. No que tange aos tipos de pesquisa, para Vergara (2007), existem várias taxionomias. No entanto, a autora propõe dois critérios para a categorização da pesquisa, que são: quanto aos fins e quanto aos meios empregados. Quanto aos fins, o presente estudo pode ser classificado como descritivo. Conforme Gil (2002, p. 42), “as pesquisas descritivas têm como objetivo primordial a descrição das características de determinada população ou fenômeno ou, então, o estabelecimento de relação entre as variáveis”, que, no presente estudo, é de investigar as variáveis: internacionalização e as práticas de internacionalização na Universidade Federal da Fronteira Sul. É ainda considerada uma pesquisa aplicada, pois a motivação para realizá-la é de resolver um problema concreto. Quanto aos meios de investigação utilizados, esta pesquisa pode ser classificada como bibliográfica, documental, pesquisa de campo e estudo de caso. É pesquisa bibliográfica porque foi realizada uma investigação sobre os seguintes assuntos: internacionalização, internacionalização da educação superior e internacionalização da educação superior brasileira. De acordo com Vergara (2007), a pesquisa de campo corresponde ao levantamento de dados no próprio local onde os fenômenos ocorrem ou que dispõe de elementos para explicá-lo, por isso da classificação deste estudo como pesquisa de campo, uma vez que os dados foram coletados dentro do ambiente da UFFS. No que tange aos documentos a que a pesquisa teve acesso, pode-se citar o Relatório da Gestão Pro Tempore, elaborado para marcar o fim da indicação do Reitor pelo Ministério da Educação, sem a realização da consulta pública à comunidade acadêmica para escolha do Reitor, e, ainda, de relatórios das ações da Assessoria que cuida da internacionalização, solicitados especificamente para fins deste artigo. É também um estudo de caso, pois, de acordo com Richardson (2008), não é o estudo de um objeto, mas de um fenômeno, o que, neste estudo, significa o processo de internacionalização da Universidade Federal da Fronteira Sul, sendo, dessa maneira, a unidade de análise do estudo. A instituição analisada apresenta peculiaridades quanto às suas características, pois é uma Instituição com apenas 6 anos de existência, criada do zero, que está se construindo e se reinventando a todo momento, o que demanda de seus dirigentes e funcionários competências específicas e diferenciadas e atenção aos movimentos nacionais e internacionais sobre a educação superior, justificase também a escolha em função dos critérios de conveniência e acessibilidade, uma vez que o acesso às pessoas responsáveis pelo assunto é amplo, bem como a divulgação das ações é feita de maneira transparente e corriqueira pelos órgãos da Reitoria da UFFS, caracterizando, dessa forma, uma Instituição aberta a solicitações diversas com fins de análise de suas práticas gerenciais. Para a coleta de dados foram entrevistados dois dirigentes da Universidade Federal da Fronteira Sul, por meio de um roteiro previamente estruturado, que continha vinte e duas questões norteadoras. A escolha dos entrevistados deu-se em função dos cargos ocupados na Gestão da Universidade, que têm como objeto o processo de internacionalização da Instituição, sendo um o Reitor e o outro o Assessor Especial para Assuntos Internacionais à época da coleta. As perguntas realizadas objetivavam conhecer a percepção dos entrevistados quanto ao processo de internacionalização no Brasil, os programas governamentais, opinião quanto aos acertos das estratégias adotadas em nível federal, bem como as perspectivas para a UFFS e as dificuldades que tais ações traziam ao interior da Universidade. Ainda, buscou-se compreender qual era a visão deles para a internacionalização da UFFS, as ações desenvolvidas e aquelas planejadas, entre outras questões para descrição geral do processo de internacionalização em curso na Instituição no período analisado. Tais entrevistas duraram em média sessenta minutos cada uma e foram transcritas. Para facilitar a compreensão do leitor na apreciação dos resultados, os respondentes são denominados por Dirigente ‘A’ e Dirigente ‘B’.

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A análise dos dados se deu por meio do conteúdo das entrevistas e sua comparação com o referencial bibliográfico e com a pesquisa documental, realizada em documentos oficiais da Instituição, como o Relatório da Gestão Pro Tempore, apontando possíveis divergências e convergências. O período de análise compreende as ações desenvolvidas no campo da internacionalização nos anos de 2010, 2011, 2012, 2013, 2014 e primeiro semestre de 2015. 4 ANÁLISE DOS DADOS Esta sessão destaca o perfil da Universidade Federal da Fronteira Sul, descreve as ações de internacionalização que estão sendo desenvolvidas, coordenadas pela Assessoria de Assuntos Internacionais, bem como apresenta a visão que dois dirigentes, envolvidos com o assunto, possuem sobre a internacionalização da UFFS. 4.1 Universidade Federal da Fronteira Sul De acordo com o site institucional da UFFS, a seguir são apresentadas as informações relativas à sua história e ao seu perfil institucional (UFFS, 2016). A criação da UFFS foi oficializada em 15 de Setembro de 2009, com a promulgação da Lei n 12.029. Nesse ato, foram oficializadas também as cidades onde estão os campi da universidade e sua estrutura. A posse de seu primeiro Reitor veio em 15 de outubro quando o professor Dilvo Ristoff, então presidente da comissão de implantação, foi empossado como reitor pro tempore da UFFS. Em função do histórico de surgimento da Universidade e o cenário onde se deu tal fato, a UFFS possui características que lhe são peculiares. Dessa forma, a Universidade Federal da Fronteira Sul tem como missão: a) assegurar o acesso à educação superior como fator decisivo para o desenvolvimento da região da fronteira sul, a qualificação profissional e a inclusão social; b) desenvolver atividades de ensino, pesquisa e extensão, buscando a interação e a integração das cidades e estados que compõem a grande fronteira do Mercosul e seu entorno; e c) promover o desenvolvimento regional integrado — condição essencial para a garantia da permanência dos cidadãos graduados na região da fronteira sul e a reversão do processo de litoralização hoje em curso (UFFS, 2016). Assim, a UFFS caracteriza-se por ser uma universidade pública, popular e de qualidade, comprometida com a formação de cidadãos conscientes e comprometidos com o desenvolvimento sustentável e solidário da Região Sul do País. Além disso, é uma Universidade democrática, autônoma, que respeita a pluralidade de pensamento e a diversidade cultural, com a garantia de espaços de participação dos diferentes sujeitos sociais (UFFS, 2016). Suas metas são promover o desenvolvimento regional integrado — condição essencial para a garantia da permanência dos cidadãos na região –; assegurar o acesso ao ensino superior como fator decisivo para o desenvolvimento das capacidades econômicas e sociais da região, a qualificação profissional e o compromisso de inclusão social; e desenvolver o ensino, a pesquisa e a extensão como condição de existência de um ensino crítico, investigativo e inovador e a interação entre as cidades e estados que compõem a grande fronteira do Mercosul e seu entorno (UFFS, 2016). Como visto, a UFFS possui uma estrutura multicampi em três estados brasileiros, por isso sua administração ocorre em seis lugares distintos. Ela possui como natureza jurídica o regime autárquico, sendo vinculada diretamente ao Ministério da Educação, com sede e foro na cidade de Chapecó, Santa Catarina (BRASIL, 2009). Sua administração superior é exercida pelo Reitor e pelo Conselho Universitário. No período de análise para elaboração deste artigo, a administração estava em caráter de “em implantação”, ou seja, os cargos de Reitor e ViceReitor da UFFS foram exercidos em regime pro tempore, portanto, por determinado tempo. Com relação aos seus números, hoje estão matriculados quase oito mil alunos, distribuídos em seus 42 cursos de graduação nos seis campi e onze cursos de mestrado. Para dar operacionalidade a isso, são mais de 700 técnicos administrativos em educação e quase 700 professores (UFFS, 2016). Tendo sido apresentada a unidade de análise deste artigo, no próximo tópico serão tratados assuntos específicos da internacionalização. 4.2 A Internacionalização na Universidade Federal da Fronteira Sul Inicialmente, será feita uma apresentação das ações de internacionalização atualmente em curso na Instituição analisada. Mesmo com pouco tempo de criação, a UFFS esteve conectada às ações nacionais desenvolvidas para a internacionalização da educação superior, o que culminou com a criação, em novembro de 2011, da Assessoria de Assuntos Internacionais – AAI. De acordo com sua página institucional, a AAI está “vinculada ao Gabinete do Reitor e é responsável pelo fomento à internacionalização da UFFS por meio de intercâmbio acadêmico e de contatos profissionais e interinstitucionais” (UFFS, 2016). São atribuições da AAI: – assessorar a Administração Superior da UFFS nos assuntos que envolvam as relações com a comunidade internacional; – intermediar a proposição e assinatura de convênios com instituições estrangeiras, bem como a participação

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da universidade em programas internacionais de ensino, pesquisa e extensão; – coordenar a mobilidade acadêmica acadêmica de estudantes, professores e corpo técnico-administrativo técnico mediante acordos de cooperação bilaterais e convênios, assim como de programas específicos, regidos por seus respectivos regulamentos; – fomentar a internacionalização da UFFS, através da realização realização de viagens de estudos internacionais e da participação em eventos e atividades voltadas a esta finalidade; – divulgar os programas de intercâmbio das universidades estrangeiras conveniadas e de agências de fomento; – apoiar os estudantes estrangeiros nos seus projetos de estudo, pesquisa e extensão no âmbito da UFFS; – executar outras atividades inerentes à área que venham a ser delegadas pela Administração Superior (AAI, 2015a). Cabe a essa Assessoria coordenar todas as ações de internacionalização, internacionalização, sejam convênios ou programas como o Ciência sem Fronteiras (Csf) e o Idiomas sem Fronteiras (IsF) (AAI, 2015b). A AAI é responsável pelo intercâmbio de alunos dos cursos de Graduação da UFFS com universidades de vários países estrangeiros, tais como a Austrália, Estados Unidos, Canadá, Reino Unido, Hungria, Itália, Alemanha, dentre outros. Para auxiliar este Programa, a AAI realiza, realiza de forma direta, o contato dos estudantes da UFFS com as empresas de fomento, oportunizando auxílio para a inscrição nos editais, editais, tradução da documentação documenta e acompanhamento do estágio (AAI, 2015b). 2015 Especificamente sobre o Ciência sem Fronteiras, Fronteiras a UFFS apresenta o seguinte cenário,, no primeiro semestre de 2015. 2015 Estavam participando do Programa rograma 56 alunos, sendo originários de 6 cursos,, são eles: Arquitetura e Urbanismo, Agronomia, Ciência da Computação, Enfermagem, Engenharia Ambiental e Medicina Veterinária. Destaca-se aqui que o Ciência sem Fronteiras contempla apenas as áreas tecnológicas e biológicas, dessa maneira, a concentração conce nesses cursos torna-se natural. FIGURA 1 – Alunos no Programa Ciências Sem Fronteiras

Fonte: UFFS, 2015, p. 100.

Destaca-se, contudo, que, em função dos cortes no orçamento federal, o programa sofreu um “congelamento” e a UFFS enviou em 2015 apenas 1 aluno ao exterior (AAI, 2015b). Além do programa supramencionado, cabe destaque também ao Programa Idiomas Idioma sem Fronteiras, que no âmbito da UFFS se materializa mediante a aplicação do teste de proficiência em língua inglesa – TOEFL ITP – para toda a comunidade acadêmica, em todos os Campi da UFFS. A figura a seguir expõe os dados dos anos de 2013 e 2014. FIGURA 2 – Programa Ciências Sem Fronteiras – Aplicação do TOEFL ITP

Fonte: UFFS, 2015, p.101.

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Dentro da estratégia de fornecer cursos de idiomas para os alunos universitários, um Núcleo de Línguas – NucLi – será instalado na UFFS e ofertará aulas presenciais do idioma inglês, inicialmente em 3 Campi (AAI, 2015b). A UFFS, por meio da AAI, oferece aos alunos da universidade um serviço pouco usual na realidade das IFES, por meio de uma equipe de tradutores oficiais de documentos. Tais documentos são necessários para a participação nas ações de intercâmbio e podem ser traduzidos nos seguintes idiomas: Italiano, Inglês, Espanhol e Francês. Isso sem custos. Ainda há o PROHAITI – Programa de Acesso para Haitianos nos cursos de Graduação da UFFS. Este Programa, além de ser coordenado pela AAI, foi também planejado pela mesma. Contou e conta, para sua execução, com a Embaixada da República do Haiti no Brasil. Tal programa facilita e oportuniza o ingresso nos cursos de graduação aos cidadãos Haitianos que residem no Brasil e que apresentem as condições para o ingresso na UFFS como aluno regular (AAI, 2015b). Visualiza-se, nas ações já em andamento na UFFS, que existe, desde muito cedo, uma preocupação com a inserção da Universidade nas ações de internacionalização promovidas pelo atual contexto de políticas nacionais, bem como uma intenção no fomento a projetos próprios. 4.3 Apresentação da percepção dos Dirigentes da UFFS sobre a internacionalização Após a caracterização da área e das ações desenvolvidas pela Instituição, na sequência, trabalha-se com a apresentação da visão dos Dirigentes entrevistados sobre a internacionalização no país e mais especificamente na UFFS, com o objetivo de auxiliar na compreensão e na contextualização das razões que levam a UFFS a buscar a sua internacionalização e como tal campo vem sendo pensado e trabalhado na Instituição. Inicialmente, visando verificar a percepção dos entrevistados com o processo histórico da internacionalização da educação superior, questionou-se como os mesmos percebiam o contexto atual. Interessante destacar que ambos apresentam bom entendimento sobre a construção histórica da internacionalização da educação superior, em especial a brasileira. Tal percepção pode ser reforçada por um trecho das respostas dos Dirigentes. O assunto internacionalização acompanha a história das Universidades, não tenho a menor dúvida disso, pois as Universidades sempre mantiveram um diálogo internacional forte e fizeram a mobilização de professores e alunos, sempre ao longo da história. Essa é uma condição de origem das Universidades (DIRIGENTE A, 2015). Internacionalização da pesquisa é o que está por trás do Ciência Sem Fronteiras, mandar os alunos para as melhores universidades no mundo, isso não é novidade, é no Brasil, mas não no mundo, o Japão fez isso em 1880, a China e Coreia do Sul também, e para universidades de ponta, normalmente eurocêntricas (DIRIGENTE B, 2015).

Sobre a política de internacionalização, atualmente em curso no Brasil, é perceptível que, em função de um cenário de pouco desenvolvimento científico e tecnológico, ações foram envidadas no sentido de qualificar pessoas para possibilitar ao país condições para o enfrentamento do cenário mundial. O Dirigente A afirma que (...) por conta da falta de profissionais, mais habilitados, principalmente nas áreas mais tecnológicas no Brasil, sentida nos movimentos de expansão da economia, e também da dificuldade que o país tem de fabricar objetos técnicos que incorporem tecnologias nacionais, criou uma necessidade de colocar estudantes, o máximo possível, nos centros tecnológicos mais importantes (...) Então, essa disputa do sistema produtivo internacional, obrigou de alguma forma o país a impulsionar programas, políticas internacionalistas.

O Dirigente B (2015) afirma que o Brasil, no que tange à internacionalização, é incipiente, sendo acertada a busca do governo de mandar alunos para fora, para tentar capacitar a inovação tecnológica e científica no Brasil. “Na minha ótica, a internacionalização da Educação Brasileira começa agora. E o grande programa para isso é o Ciência Sem Fronteiras, sem dúvida” (DIRIGENTE B, 2015). Ainda com o objetivo de detectar o entendimento dos entrevistados para a internacionalização da educação superior, ambos destacaram que as ações neste campo têm que ser claras, bem pensadas e direcionadas para resultados práticos. ... a internacionalização tem que gerar impacto, seja na pesquisa, no ensino, na extensão e tem que ser melhor estruturada. As Universidades brasileiras passaram por um caminho de convênios. Até hoje internacionalização significa fazer convênios, mas o que estes convênios traziam de retorno para a vida prática, operativa das universidades? (DIRIGENTE B, 2015).

Especificamente sobre a UFFS, pode-se revelar que “a internacionalização na UFFS surfa, neste momento, nos programas governamentais que estão em curso” (DIRIGENTE B, 2015). Verifica-se, dessa forma, que, sendo uma universidade com apenas 5 anos de existência, suas ações iniciais neste campo foram no sentido de aproveitar o momento nacional, referente às políticas de internacionalização da educação superior, e proporcionar, desde cedo, aos seus alunos oportunidades de aprimoramento e desenvolvimento pessoal e profissional.

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Nós entramos nessa área humildemente, sem claramente uma definição de uma política, pois não se institucionaliza aquilo que não se tem. Primeiro tínhamos que montar uma universidade, e ao fazer isso, evidentemente prestávamos atenção aos assuntos internacionais, mas a nossa visão, sempre foi de que, se faz ações não proforma, pois se faz muito isso nas universidades brasileiras, uma internacionalização via convênios, cartas de interesse, termos de cooperação técnica, que de maneira geral, não se traduzem em ações efetivas de grande monta (DIRIGENTE A, 2015).

A partir da fala do Dirigente A, supra apresentada, fica nítido que, no caso específico de uma universidade em construção, não se pode internacionalizar o que não existe, portanto, as ações iniciais foram no sentido de colocar para funcionar o ensino de graduação e pós-graduação, pesquisa e extensão, sem deixar de observar o movimento nacional sobre esse assunto. Outro ponto de destaque é a visão dos Dirigentes para a internacionalização na UFFS, uma internacionalização real, materializada por meio de convênios que de fato tragam benefícios para os envolvidos, como pode ser enfatizado pelo trecho da entrevista com o Dirigente A, Agora é possível coisas mais consistentes, nós estamos preparando um passo bastante significativo de internacionalização, portanto nós temos, sim, uma política de internacionalização, em gestação, ela ainda não adquiriu toda sua performance, acho que é cedo mesmo para a gente poder alinhar, a gente visualiza o caminho à medida que a gente vai construindo o caminho. Mas há pelo menos um norte muito claro, nós vamos gastar energia e fazer empenhos reais em propostas que tenham chances de materialização, que tenham de fato chance de desencadear um processo com consequências reais e positivas (DIRIGENTE A, 2015).

Citado pelos entrevistados, o projeto NOSOTROS apresenta-se como um marco na internacionalização da UFFS. Consiste em um projeto a ser desenvolvido em conjunto com universidades na Argentina, inicialmente com a graduação, mas com previsão para a pós-graduação e a pesquisa. Há um conjunto de ações sendo feitas aqui com a região das Missões, Posadas na Argentina, do Campus Cerro Largo, para o qual queremos entrar aqui um projeto bastante sui generis, com um impacto bastante importante, que é criar um curso de língua e literatura, duplo, em espanhol e português, feita por duas universidades, a nossa e uma da Argentina que podem evidentemente dar dupla titulação (DIRIGENTE, A).

Na proposta inicial, os cursos de graduação, tanto na instituição parceira como na UFFS seriam ofertados com a mesma grade curricular, sendo as disciplinas do idioma espanhol ofertados na Argentina, por professores Argentinos e todos os conteúdos de língua portuguesa serão tratados no Brasil, por professores Brasileiros e outras disciplinas que são complementares a esse escopo serão tratadas em ambos os países. Para a operacionalização do curso, a ideia é que turmas de cinquenta alunos, por exemplo, sejam divididas em dois grupos, nesse cenário, 25 alunos na turma seriam de origem do país e outros 25 estrangeiros, mudando a configuração no semestre posterior, “Eu acho que essa é uma ação de internacionalização absolutamente efetiva e forte, mas isso é possível fazer com proximidade geográfica” (DIRIGENTE A, 2015). Reforça essa visão o Dirigente B, Tenho certeza que esse processo com Argentina vai virar referência. Nós vamos ter o primeiro curso Binacional do mundo, o aluno vai fazer em dois países ao mesmo tempo. Isso não existe no mundo, a gente vai criar isso e vai ser um curso de Letras e possivelmente um de matemática (DIRIGENTE B, 2015).

Como visto, ações estão sendo desenvolvidas no campo da internacionalização, buscando sempre o máximo de retorno aos envolvidos. Nós vamos fazendo história à medida que nos engajamos em alguma coisa e a gente consegue dar respostas positivas, por exemplo, no terreno da pesquisa é possível fazer internacionalização fantástica, mas para isso precisa de tempo para maturação, as pessoas se engajarem em pesquisas internacionais não é tão simples, mas especialmente aqueles que vão fazer seus doutorados no país, essa experiência no exterior cria vínculos especialmente na pesquisa. Então a universidade está atenta para isso, e nós estamos entusiasmando as pessoas para que elas superem aquilo que é considerado a pior barreira para a internacionalização, que é a língua (DIRIGENTE A, 2015).

Percebe-se, a partir dessa fala, que o processo de internacionalização é longo e depende da experiência e vivência dos envolvidos, assim, há ainda um longo caminho para a UFFS, contudo percebe-se a construção de uma base sólida, que permitirá colher bons frutos. Outra ação desenvolvida na Universidade, que pode ser destacada como de internacionalização é o PROHAITI, voltado para os cidadãos Haitianos, residentes no Brasil, especialmente aqueles das cidades onde existe um campus da UFFS. Por meio dessa, mudanças no campus universitário já podem ser sentidas, uma vez que convivem no mesmo espaço culturas diferentes, línguas distintas. Eu acho que internacionalização é também isso que estamos fazendo com o Haiti. Nós estamos abrindo espaço para os Haitianos na Universidade e provavelmente vamos abrir para outras nacionalidades que aqui estão. Eu senti, por exemplo, que há uma mobilização para a língua francesa no campus Chapecó, pela presença dos Haitianos, então você vai lançando

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bases. Daqui a pouco esses Haitianos que estão aqui, que vieram para trabalhar, conseguem um diploma de Ensino Superior e voltam para o Haiti, darão contribuições mais sofisticadas ao seu país de origem e levam junto relações e nesse rastro a Universidade pode estender, como já tem algumas propostas de envolver a Universidade, em projetos com o Haiti. Tudo isso são oportunidades que a Universidade não pode deixar de aproveitar, e assim ela vai amadurecendo (DIRIGENTE A, 2015).

Sobre a política e as ações futuras de internacionalização na UFFS, o Dirigente B diz que “um dia a gente vai escrever uma política, mas que será muito menos de projeção, mas muito mais de assentamento das coisas que foram feitas”. Quanto ao futuro, Nós não temos condições de dizer como será a nossa internacionalização daqui a dez, vinte anos, mas tenho certeza que será forte e robusta, porque vamos dar passos claros, nada proforma, vamos atrás com convênios depois de existir relações reais, nós não vamos fazer convênios para depois achar uma necessidade real que justifique uma viagem internacional. Não é nesse sentido que nós vamos operar, espero que a Universidade não saia desse rumo, porque esse é o rumo que utiliza os recursos e que realiza produtos reais.

Verifica-se, após as informações apresentadas, que a UFFS, desde seu início, esteve acompanhando as ações de internacionalização no país e vem construindo ações concretas para se inserir nesse contexto. Apesar de não possuir uma política formal sobre o assunto, apresenta uma visão clara do que se pretende com a internacionalização, assim, está envidando esforços em projetos que tenham um propósito claro, e resultados concretos. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente artigo teve como objetivo “descrever o processo de internacionalização na Universidade Federal da Fronteira Sul – UFFS, no período de 2010-2015”. Pode-se afirmar que o mesmo foi atingindo, uma vez que foram desenvolvidas análises do processo histórico da internacionalização da educação superior, por meio de um referencial teórico construído a partir de estudos e autores de destaque, bem como foram discutidos e apresentados os elementos que caracterizam o processo de internacionalização na UFFS. Visualiza-se que a internacionalização da educação superior é assunto debatido há muito tempo e executada por países, inicialmente fundamentada na mobilidade de estudantes, avançando para se tornar uma estratégia de engajamento de políticas internacionais. O Brasil, nesse contexto, em função da criação tardia de suas universidades e da baixa articulação das mesmas com vistas à internacionalização, torna-se um país emissivo, ou seja, as suas instituições de ensino superior, hoje, tornaram-se entidades de envio de alunos ao exterior, não conseguindo transformar-se em entidades que atraiam para seus campi pessoas do mundo todo em quantidade significativa. Contudo, o atual cenário da internacionalização das IES brasileiras é interessante, uma vez que, com programas como Ciência sem Fronteiras, apresentam metas audaciosas, principalmente para o envio de alunos ao exterior, mas também fomentam a vinda de alunos e pesquisadores estrangeiros ao Brasil. Além desse projeto, ainda há iniciativas para fomentar o estudo de línguas pelos brasileiros, notadamente ainda uma barreira nacional. Apesar do corte no orçamento federal, que impactou nas ações deste programa, o mesmo não foi extinto, e segundo veiculado, sofrerá ajustes, aumentando o rigor nos processos de seleção e será focada a pós-graduação. Especificamente no caso da UFFS, foco deste estudo, é relevante destacar o percurso percorrido pela Universidade, o qual é pequeno, pois são apenas seis anos de existência, em uma realidade de construção total, seja no campo da infraestrutura física, corpo funcional, processos administrativos e de ensino, pesquisa e extensão, mas que já se posiciona como uma instituição de ensino superior em vias de internacionalização. Por obstante, releva-se no cenário apresentado que a UFFS ainda é muito dependente de programas e iniciativas do Governo Federal, e mesmo que não tenha como objetivo a pulverização de convênios pouco eficazes, seria oportuno investir em parcerias bilaterais profícuas, que são possíveis mediante uma trajetória de relações institucionais. Portanto, a internacionalização, nesse cenário, está em construção, assim como a Universidade, mas já apresenta iniciativas concretas e um direcionamento claro do que se pretende fazer. A partir das falas dos entrevistados, fica nítido que a internacionalização na UFFS não será pautada pela assinatura pulverizada e aleatória de convênios ou protocolos de intenção, mas sim, será pautada em projetos que apresentem possibilidades concretas de ganhos para todos os envolvidos. REFERÊNCIAS ASSESSORIA DE ASSUNTOS INTERNACIONAISAAI. Apresentação. Disponível em:. Acesso em: 10 de jan. 2015a. ______. Relatório Interno sobre a Assessoria de Assuntos Internacionais. Recebido por e-mail. 2015b ______. Ciências sem Fronteiras na UFFS. Relatório Interno da Assessoria de Assuntos Internacionais. Recebido por e-mail. 2014.

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