Sobre ego-documentos e espectralidades

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A recente produção de ego-documentos literários e cinematográficos na cena brasileira tem se mostrado cada vez mais afeta ao que chamarei aqui de estética da espectralidade, uma proposta que se volta para a (des)aparição da primeira pessoa do singular no espaço narrativo autobiográfico. O romance O falso mentiroso, de Silviano Santiago, e o documentário Santiago de João Moreira Salles (ambos com pouco mais de 10 anos) são produções que notabilizam essa estratégia, valendo-se criativamente de um modo memorialista que enreda as vias do referencial e do ficcional. Tanto o romance quanto o documentário mencionados problematizam a idéia de uma primeira pessoa extra-textual que paira na cena narrativa de forma " nem visível nem invisível " , como um vulto que se afirma não por uma presentificação mas pela negação do desaparecimento, impedindo que a moldura autodiegética tradicional se imponha de forma totalizante. São produções que ousam criar uma condição fronteiriça, em que se privilegia o trânsito estético por um terreno documental preservado e um substancial recusado. Em seu livro Specters of Marx (1994), o filósofo franco-argelino Jacques Derrida denomina hauntology a esse modo umbralino assumido pelo escritor no corpo da obra que legou. Trata-se da condição do espectro, que se afirma narrativamente por oposição a idéia de ontologia (ontology), sustentando assim a figura de um sujeito-autor que insiste em " assombrar " o território literário que o desencarnara. Não se trata, pois, de uma nova metafísica da presença ou do retorno do autor. O espectro é tão somente o modo narrativo que inscreve uma primeira pessoa indecidível, um eu que
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