Sobre o conceito de amizade em Ecce Homo

Share Embed


Descrição do Produto

13

Hernán Camilo Ávila
Sobre o conceito de amizade em Ecce Homo
O presente texto visa expor a amizade como conceito, em conexão com outros conceitos que permeiam a filosofía de Nietzsche, como são os de grandeza, decadénce e jovialidade. Partindo dos pressupostos de que os conceitos na obra de Nietzsche têm uma fecunda polissemia e de que não há um padrão único de significação (Paschoal 2011: 204), pretende-se, contudo, destacar a relevância deste conceito na linha argumentativa de Nietzsche, particularmente no Ecce Homo. O conceito de amizade pode ser tomado como um conceito que aporta à coerência das teses apresentadas por Nietzsche sobre a grandeza, a decadência e a jovialidade.
Entretanto, Nietzsche não apresenta esse conceito de maneira fortuita, senão que é um conceito que se constrói ao longo do texto em mais ou menos determinadas seções. Nesse sentido, eu me centrarei no comentário de algumas seções do Ecce Homo e de A Gaia Ciência, nas quais se progrede na elaboração do conceito da amizade ou nas quais esse conceito é trabalhado. À vista disso, partirei da questão inicial do livro, a dupla ascendência (Por que sou tão sábio 1), caracterizando cada um dos momentos dessa ascendência. Depois, farei a apresentação do conceito de amizade no horizonte de uma "ética para o futuro" a partir do desdobramento da questão da dupla ascendencia. Finalmente concluirei com a formulação de uma série de reflexões sobre as implicações do conceito da amizade, sobre todo para a compreensão do conceito de amor fati, pensamento central da obra de Nietzsche.
I. A questão da dupla ascendência
Os conceitos de decadénce e grandeza permeiam o livro Ecce Homo. Sua primeira enunciação se encontra na seção Por que sou tão sábio 1, onde Nietzsche diz que a fortuna da sua existência está em sua fatalidade, e para expressar esa fatalidade enigmaticamente, diz: «[Eu] como meu pai já morrí, e como minha mãe ainda vivo e envelheço» Mas, o que pode significar esse enigma? Com isto Nietzsche aceita que possue uma dupla ascendência. Reconhece que ele é, a um tempo decadént e começo. Está admitindo, desde o início do livro, que ele é esses dois modos de ser. Esse ser-a-um-tempo-decadént-e-começo é, por enquanto, sinal da radical tensão que experimenta o homem sadio em si mesmo. Ele conhece, aliás, ele é tanto a sua própria ascensão quanto o seu próprio declínio. Isto, se é que algo explica, explica a neutralidade, a ausência de partidarismo por parte de Nietzsche em relação ao problema global da vida (Por que sou tão sábio 1), quer dizer, o acento desta filosofia está no próprio e singular homem Nietzsche. A perspectiva desde a qual esta filosofia, esta doutrina que ele apresenta, é feita é uma perspectiva pessoal e só pode ser pessoal. A partir desta passagem Nietzsche inverte todo o peso da sua filosofia sobre si mesmo: não se trata aqui de achar a "coisa-em-si", nem de postular um "ideal"; a filosofia de Nietzsche aborda o problema da vida desde quem vive, perguntando pela gênese desse que vive, pela sua ascendência. Neste sentido a sua tarefa é uma auto-gnosis. Outra das conclusões que podemos extrair dessa passagem é que decadénce e grandeza não são como que dois instintos inamigáveis, ou, no caso da decadénce, prejudicial per sé. Cumpre lembrar que o próprio Nietzsche é muito grato com a sua longa enfermidade; ele deve o que ele é a ela (EH Por que sou tão sábio 6). Juntas decadénce e grandeza pertencem à mesma árvore genealógica, essa árvore complexa que é o instinto individual. Decadénce e grandeza, a última no sentido de instinto de defesa e ataque e não de fortaleza ou grande saúde, são modos possíveis em que nosso instinto tende. Dependendo dessa inclinação o indivíduo adoece ou é sádio. A questão da saúde depende, então, da tendência de nosso instinto, mas essa tendência é determinada pelo modo em que entendemos esse instinto. A tarefa de uma tresvaloração consiste no re-encaminhamento desse instinto ao serviço da vida; é uma correção do modo em que o instinto se entende, e desde essa compreensão uma orientação possível para o Sim.
Agora, como se passa do estado de doença ao estado de saúde levando em conta que tanto decadénce como grandeza fazem parte da minha ascendência, da minha natureza? Que é o que eu tenho que fazer para avivar esse processo de restabelecimento em mim, se eu sou a um tempo instinto imcompreendido, logo, instinto de negação, e instinto compreendido, logo, vontade de vida? Afinal, cómo se passa do estado de fraqueza ao estado de saúde? Para responder a essas perguntas tomemos o exemplo que Nietzsche nos dá de si mesmo. O primeiro passo para curar-se, o primeiro passo à convalescença é se libertar do ressentimento. Mas para se libertar do ressentimento deve-se estar esclarecido sobre ele. Este esclarecimento só se alcança tendo vivido o ressentimento a partir da força e a partir da fraqueza (EH Por que sou tão sábio 6). A vivencia do ressentimento desde essas duas óticas é caracterizada por Nietzsche da maneira seguinte: «Da ótica do doente ver conceitos e valores mais sãos, e, inversamente, da plenitude e certeza da vida rica descer os olhos ao segredo lavor do instinto de decadénce – este foi o meu mais longo exercício, minha verdadeira experiência, se em algo vim a ser mestre, foi nisso. Agora tenho-o na mão, tenho mão bastante para deslocar perspectivas: razão primeira porque talvez somente para mim seja possível uma 'tresvaloração dos valores'» (Nietzsche 2005: 27). Para liberar-nos do ressentimento devemos estar esclarecidos sobre ele, e para estar esclarecidos sobre ele devemos tê-lo vivido, desde a fraqueza e desde a saúde. Viver o ressentimento desde a perspectiva do doente significa precisamente estar doente, mas esclarecido de seu próprio declínio, esclarecimento que se alcança na plenitude da vida rica. Por sua vez, viver o ressentimento desde a saúde significa descer os olhos para o segredo instinto da decadénce, que continua obrando ainda na vida forte/sádia. A grandeza só é possível após da toma de consciência da sua própria decadénce no estado de doente e da toma de consciência da sua própria decadénce no estado de saúde.
A noção de decadénce está ligada à noção de doença do seguinte modo: o fisiólogo diagnostica decadénce em um corpo doente. O que é sintomático da decadénce é o instinto de compaixão. O instinto da compaixão é considerado por Nietzsche como um impulso baixo e míope, pois ele é falso e negador da vida. Costumamos chamá-lo de "desinteressado", mas ele já está sempre disposto à palavra e ao ato; é, porém, um falso desinteresse. A tendência à compaixão é, por exemplo, o ultimo pecado de Zaratustra, porque essa tendência busca substraí-lo de si mesmo e a decadénce, entendida como moral da renúncia a sí mesmo, é, par excellence, a moral de decadénce. A verdadeira demonstração de força do Zaratustra consiste em resistir a esses impulsos: em manter-se fiel a sua tarefa. Permanecer senhor da situação, mantendo a altura da sua tarefa, limpa desses impulsos que agem nas ações chamadas desinteressadas: isso é para Nietzsche uma virtude nobre (Nietzsche 2005: 31 32). Por sua vez, as virtudes nobres são as virtudes do homem livre do ressentimento.
O importante aqui é notar que o afirmamento na plenitude e autosegurança da vida rica, é já uma espécie de declínio, na medida em que se acredita que esses valores que possuem-se nesse estado são algo último e como a verdade de si mesmo. Se restabelecer-se é recuperar a saúde elevando-se para valores mais altos, não é esta atitude do Eu como que uma padronização, uma supressão dos matizes da vida instintiva individual, porém, uma ameaça de si mesmo para si mesmo com ocultar-se o que se é? Não é essa padronização, instintiva do Eu, uma inclinação natural, incluso na saúde, a uma espécie de declínio? Parece que é a isso ao que Nietzsche refere-se quando fala do restabelecimento como um longo processo de caída numa espécie de decadénce: « – Restabelecimento significa em mim uma longa sucessão de anos – significa também, infelizmente, recaída, decaída, periodicidade de uma espécie de decadénce. Necessito dizer, após tudo isso, que sou experimentado em questões de decadénce? Conheço-a de trás para frente» (EH Por que sou tão sábio 1). De Oliveira explica que Nietzsche, no entanto, abdica «da padronização do ethos e afirma o valor experimental do pathos, abre a mão da determinação de padrões ou normas formadoras de algum cânone moral, já que seu projeto não busca algo a priori ou universal, ao contrário, está arraigado nas experiências transitórias de cada indivíduo» (de Oliveira 2009: 14, 15). Nessa linha de interpretação, parece que para Nietzsche o passo da doença à saúde não consiste na simples contraposição de uns valores, de uma moral sacerdotal, por exemplo, pegados como universais, a outros novos universais, resultado de uma compreensão aparentemente "boa" de meu instinto. Eis a trampa da decadénce, numa vontade de inimizar o que eu sou (mas que nego por uma má compreensão de mim, de meu corpo) com os modos de se entender cedo demais, modos de não compreender-me como o que eu sou. Mas, em que consiste esse modo de ser, o ser-começo, que parece ter certa prioridade sobre o outro, no sentido em que parece estar associado à grandeza?
Esse homem que tende ao declínio é (pode tornar-se) o contrário da decadénce «Sem considerar que sou um decadént, sou também o seu contrário» (EH Por que sou tao sábio 1). Mas, como pode o mesmo individuo ser estas duas coisas aparentemente contrapostas? Cumpre lembrar que não se trata de uma contraposição, mas de uma relação como a que tem doença e saúde: uma pode ser superada pela outra, mas no corpo elas estão em constate guerra. Diz Nietzsche: «Como summa summarum [totalidade] eu era sadio, como ângulo, como especialidade era decadént [...] Tomei a mim mesmo em mãos, curei a mim mesmo: a condição para isso – qualquer fisiólogo admitirá – é ser no fundo sadio» (Nietzsche 2005: 27).
O homem sadio tende ao declínio de maneira superficial, mas bem no fundo dele o instinto de vontade de vida flui silencioso: ele só está doente porque já como pressuposto fisiológico goza de uma grande saúde. Em contraste com o homem tipicamente sadio, «o decadént em si sempre escolhe os meios que o prejudicam» (EH Por que sou tão sábio 2). Prova de que Nietzsche sempre esteve sadio é que ele pôde curar-se a si mesmo, pois Nietzsche, ao invés do decadént, lutou por prevalecer; literalmente, ele recuperou-se. «[F]oi durante os anos de minha menor vitalidade que deixei de ser um pessimista: o instinto de auto-restabelecimento proibiu-me uma filosofia da pobreza e do desanimo» (Nietzsche 2005: 28). Ele, que sempre esteve sadio, se proibiu esses instintos de negação na doença, por prejudicá-lo e, depois, na saúde, por estar debaixo dele. Nietzsche conta-nos sobre as suas próprias vivências o seguinte: «Nos períodos de decadénce eu os proibi a mim [os sentimentos de vingança e rancor] por prejudiciais; tão logo a vida voltou a ser rica e orgulhosa o bastante para isso, eu os proibi como abaixo de mim» (EH Por que sou tão sábio 6). Ser o contrário da decadénce significa proibir-se os instintos de vingança por estar debaixo de nós, mas essa operação de proibição é já, como expliquei, uma mostra de decadénce: não se trata de inimizar e, além disso, não deve-se fazer a guerra se vê-se algo como debaixo de si. Que significa aqui fazer a guerra e qual é a sua importância para a constituição da fortaleza, da grandeza no sentido de uma grande saúde?
Em outra seção diz Nietzsche sobre seus princípios para a guerra que «[q]uando se despreza não se pode fazer a guerra; quando se comanda, quando se vê algo abaixo de si, não há que fazer a guerra». Está realmente livre do ressentimento o homem que enxergue os instintos de vingança ou o rancor como por debaixo dele? Enxerguer eles dessa maneira não impossibilita o duelo honesto e, por tanto, vai contra a nosso instinto guerreiro, instinto que é característico do homem forte? O que queda dito de maneira implícita com isso é que o analise de cada instinto, daquilo que podemos chegar a enxerguer como abaixo de nós, se realiza em distintas etapas investigativas (Nietzsche faz de si mesmo um experimento). Não é o mesmo o que pensa da decadénce o Nietzsche doente, o que pensa o Nietzsche sadio da decadénce e o que pensa o Nietzsche jovial, aquele que olha para atrás e para frente desse instinto de decadénce. Pelo menos esses três modos de olhar se entrecruzam aqui. Cada um dos modos da decadénce, seja vivida desde a doença ou desde a saúde, é um modo cedo demais em que a consciência se entende. A consciência deve distinguir esses momentos, conservar a própria distancia de si mesma, isto é, de seus instintos, sem inimizar uns com outros. Não se trata de proibir-se os seus instintos, nem sequer o "instinto" de negação: ele também desempenha um papel na constituição de um homem sadio. Tampouco trata-se de "conciliar" o instinto de negação com o instinto de afirmação, na medida em que não há nada que conciliar, pois na verdade somos ambos instintos. Não se trata tanto de substituir uns valores por outros como de fazer-se a si mesmo o bastante forte como para proporcionar-se esses valores continuamente, transvalorá-los e assimilá-los. A força do homem radica em poder dizer "sim" inclusível ao instinto de negação plena e corretamente compreendido e em ser capaz de pôr em guerra, em um duelo honesto no qual não se vê nada de si por debaixo, esses instintos e os valores que eles moldam.
Só a assimilação da nossa verdade, e o apropriamento daquilo que somos, pode-nos tornar começo e abrir-nos ao futuro. Só sendo isso que nos mesmos somos, ficamos abertos à ação livre.
Isto não exime da limpeza desses impulsos, que estão muito abaixo da hierarquia, porque a saúde é algo que se conquista a cada vez; é precisamente nessa disposição sadia à guerra (luta com nossos impulsos mais baixos, mais superfluos) que consiste a força. «Como campo de forças, esse indivíduo se apresenta como transitório e criado a partir dos processos relacionais de disputa e resistência cujo espaço mais significativo de exercício é a amizade» (de Oliveira 2009: 15). Trata-se de amizar em nós mesmos e por meio da jovialidade, isto é, de uma leviandade bem-humorada frente à vida e frente a nós, esses dois impulsos; leva-los conosco, mas com pés ligeiros, e ao mesmo tempo, em condições de fazer a guerra. «O homem do conhecimento deve poder não somente amar seus inimigos, como também odiar seus amigos» (EH Prólogo 4). Cumpre notar que, a hierarquia desses instintos que constrói Nietzsche é provisória, pois afinal a grande proeza de um homem sadio é estar em condições fisiológicas suficientes para tirar a escada por onde ele ascendeu a essa perspectiva: o próprio Zaratustra quis ser humano depois de ter estado muito alto.
II. A amizade como virtude nobre
Se formos capazes de ver a nos mesmos com zombaria bondosa após ter sido levados tão alto como para fazer uma tresvaloração dos nossos valores, já não quereremos inimizar uns valores com os outros, um instinto fundo com outro supérfluo (além do necessário). Como diz Nietzsche, quem se compreende na palavra dionisíaco não necessita refutação de Platão (EH O Nascimento da Tragedia 2). Desde esse zombamente bondoso ficaremos abertos para apropriar-nos daquilo que somos a um tempo: força e fraqueza, decadénce e começo. "Amizaremos" ambos os modos de ser que aparentemente são contrários, para simplesmente rír de nós: para caminhar com pés ligeiros que permitam-nos dançar. Assim começará a tragédia. Isto implica, como presuposto, um dizer-Sim-à-vida incondicional. A amizade consigo mesmo não é possível se se toma como ponto de partida a negação a si mesmo de si mesmo. A chave para a apertura ao que se é e ao agir, está em não inimizar senão em amizar, é por isso que ela é uma virtude nobre, porque o seu exercício situa-nos além dos impulsos baixos.
Desde essa perspectiva podemos apresentar já o conceito da amizade. Ele aparece formulado em EH Por que sou tão sábio 6 de maneira expressa, e a propósito da higiêne de Buda, da seguinte forma: «"Não pela inimizade termina a inimizade, pela amizade termina a inimizade"; isto se acha no começo dos ensinamentos de buda- assim não fala a moral, assim fala a fisiologia».
Não devemos desprezar o que somos: por mais alto que possamos chegar, continuaremos sendo humanos. Como diz Nietzsche: «minha humanidade não consiste em sentir com o homem como ele é, mas em suportar que o sinta... Minha humanidade é uma continua superação de mim mesmo» (EH Por que sou tão sábio 8). Por isso Zaratustra aconselha guardar-nos de cuspir contra o vento, quer dizer, de sentir náusea pelo homem, pois, afinal, somos apenas homens. Essa náusea representa o instinto de decadénce que aparece com a autodefesa, com a primeira iniciativa de curar-se a si mesmo, mas como expliquei, é uma trampa do instinto. A questão é como apropriarnos disso que nós somos sem sentir náusea, como amizar em nos tudo o que é instinto de decadénce e tudo o que é instinto de defesa e ataque (Nietzsche 2005: 39). Expressado em outras palavras, como compreender o que somos para chegar a ser esse começo (EH Por que sou tão sábio 1) que é a nossa radical tarefa?
Antes de entrar nesse ponto, convém deter-nos um pouco na noção de fortaleza. O pathos agressivo é o que determina a natureza forte. Poderíamos dizer a respeito das naturezas fortes, que o típico delas é o instinto de defesa e de ataque. O primeiro signo de restabelecimento é, porém, a cria de um ego. Quando a defesa que devemos desplegar, quando as armas que temos têm que ser empunhadas contra nós mesmos, inicia uma autodefesa. No estado de doença tudo fere, por isso o nosso instinto é reagir contra aquilo que nos prejudica, emparedando-nos a nós mesmos (EH Por que sou tão esperto 3). No entanto, este instinto, que já é um indício de saúde, inclina-se, desde que aparece, para a fraqueza, na medida em que a continua negação de algo vai enfraquecendo-nos. Rejeitar é um desgaste; rejeitar é empregar forças em uma negação daquilo em que nosso "sim" representaria um "desinteresse". Por isso o instinto não somente nega algo, senão que evita-nos aquelas situações nas quais gostaríamos mais de dizer "não".
Outra coisa é nem sequer obedecer a esse instinto. É o caso do erudito. Ele não se defende mais dos livros, apenas reage aos pensamentos lidos dizendo "sim" ou "não". Ele mesmo já não pensa. No erudito o instinto de autodefesa tem emboutado-se. Por isso diz Nietzsche: o erudito – um decadent. O erudito renuncia a si mesmo porque o seu próprio instinto de autodefesa o tem enfraquecido: de tanto dizer não aos pensamentos dos outros ele esqueceu cuidar de si mesmo, de criar um ego, de cultivar-se a si mesmo. (EH Por que sou tão esperto 8). Propriamente, esqueceu-se.
Esse esquecimento de si mesmo é uma perda de si mesmo. O que temos que fazer é lançar-nos ao proibido em nos. Para começar a exercer a amizade devemos lançar-nos ao proibido. É por isso que Nietzsche define o signo da sua filosofía como «Nitimur in vetitum» (EH Prólogo 3), quer dizer "lancamo-nos ao proibido". Com isso Nietzsche quer expressar que precisamente o ressentimento, aquilo que «é o proibido em si para o doente - seu mal: infelizmente também sua mais natural inclinação» (EH Por que sou tão esperto 6) é o que temos que conhecer desde a perspectiva da fraqueza e desde a perspectiva da força. O erro de quem é apenas um crente é venerar um ídolo sem fazer nenhuma objeção; seu erro é crer cegamente sem lançar-se primeiro ao proibido em ele mesmo, pois essa crença pode ter sido gerada por uma primeira contranatureza, pelo fato de que não conhecia-se o bastante o instinto de decadénce que corre no nosso fundo. Como diz Zaratustra «Aínda não vos havíeis procurado: então me encontrastes. Assim fazem todos os crentes: por isso valem tão pouco todas as crenças» Nos crentes não se dá o momento do lançamento para o proibido. Assim, não podem curar a si mesmos. Ainda menos, chegarão a renegar de suas crenças mais afianzadas, que são como diamantes que conseguiriam se, pelo menos, tivessem afundado em eles mesmos e com isso sentido a necessidade de superar a sua doença. Por isso, conclui Zaratustra de maneira contundente: «Agora ordeno que me percais e vos encontreis [que se curem a eles mesmos, que vejam a decadénce desde a perspectiva da fraqueza]; e somente quando me tiverdes todos renegado [quando serem capazes de destruir a suas próprias verdades criadas, quando serem capazes de destruir a martelazos os diamantes extraídos do fundo de si mesmos, quando tenham visto a decadénce desde a perspectiva da força] retornarei a vos [como um espirito dançarino- jovial, que se ri de si mesmo, do que ele é] »
Do esboço da noção de fortaleza entende-se qual a diferença de hierarquia entre a decadénce e a grandeza. Mesmo ela ainda não se determinou completamente em todos seus desdobramentos, me interessa leva-la em conta como um pressuposto fisiológico para sair da doença.
III. A função amizadora da jovialidade
A inimizade não acaba com inimizade, senão com amizade. À decadénce não se opõe a grandeza mais elas duas podem, e de fato, devem encontrar amizade no ser humano. Não se trata de refutar uma com a outra, ou de envergonhar-se da decadénce e instituir a grandeza como uma grande meta senão de alcançar um estado de bom-humor que abra à perspectiva desde a qual essas duas tendências resultem constitutivas de nós mesmos, e entroncadas no profundo instinto de afirmação da vida. « [P]ermanecer alegre e zombar bem-humorado também de si mesmo – ridendo dicere severum [rindo dizer coisas severas], quando o verum dicere [dizer coisas veras] justificaria toda dureza – é o máximo de humanidade» (EH O caso Wagner 1). Essas duas tendências, inclinações do homem, são possibilidades que se desdobram da abertura que é o instinto do Sim, e cada uma, por sua vez, adscreve-se a uma determinada compreensão daquilo que somos. A tarefa vital é, porém, alcançar a perspectiva desde a qual «[a] dor não é vista como objeção à vida» (Nietzsche 2005: 104), ou, posto na forma do aforismo 268 da Gaia Ciência, em «acolher igualmente nosso supremo sofrimento e nossa suprema esperança» (Nietzsche 66), ficar abertos à vida sem que uma má compreensão do que somos seja um obstáculo para o desenvolvimento de nosso mais natural instinto.
Zaratustra encarna essa doutrina. Ele, a pesar de ser a antítese do espírito da negação, pois diz não a tudo ao que até esse momento se diz sim, não é, ele mesmo, negativo. Ele não encontra nenhuma objeção que poderia ser feita ao existir, mas vê em sua dura e terrível percepção da realidade (no sentido em que é oposta ao "bom" e ao "nobre") a razão para ser ele mesmo o Sim. «A todos os abismos levo a bênção do meu Sim» nos diz (EH Assim falou Zaratustra 6). Cumpre notar que, a descrição do tipo de homem feita por meio da imagem de Zaratustra não é, segundo Nietzsche, apenas um tipo, senão verdadeiramente o que somos nós mesmos; ter entendido a doutrina do Zaratustra é, portanto, conceber a si mesmo como poeta trágico. «[E]sse gênero de homem que ele concebe [Zaratustra], concebe a realidade como ela é: ele é forte o bastante para isso – ele não é a ela estranho, dela estranhado, ele é ela mesma, ele tem ainda em si tudo o que dela é terrível e questionável, somente então pode o homem possuir grandeza... » (EH Por que sou um destino 5).
O homem que se torna o que é, que se apropria da sua verdade, vira uma apertura para à ação. «Precisamente nessa extensão de espaço, nessa acessibilidade aos contrários, é que Zaratustra se sente como a forma suprema de tudo o que é» (EH Assim falou Zaratustra 6) Aqui a amizade joga um papel fundamental. Em virtude da amizade e da faculdade de fazer guerra com nós, da eliminação do desprezo pelo que se é, e do reconhecimento de que não se possui certeza de tudo o que poder-se-ia chegar a ser, é que podemos apropriarnos do que somos mas sem dar-nos por esgotados nisso. Quem se apropria do que é, vira uma apertura para a ação. Desde esta perspectiva se entende que Nietzsche diga que «ninguém antes [dele] conhecia o caminho reto, o caminho para cima: apenas a partir de mim [a partir do que o próprio Nietzsche tem devenido, tem se tornado] há novamente esperanças, tarefas, caminhos a traçar para a cultura» (EH).
Dito de outra forma, o amor fati que professa o homem dionisíaco (o homem que exerce em si mesmo a virtude da amizade, mas também da guerra honesta, da imposição de seu regime ao confronto com outras posições, atravessado por um radical dizer Sim) abre-o, por quanto este amor se torna nele ato supremo «por ele medido, todo o restante fazer humano aparece como pobre e limitado» (EH Assim falou Zaratustra 6). Que esta apertura seja ato supremo significa que é um ato além dos outros atos subsequentes, um ato que possibilita os demais, no sentido em que desde essa posição, além da moral, se pode criar a verdade. Por isso, «a amizade pode ser compreendida como virtude basilar e condição para a emergência de uma "moral do futuro [Moral der Zukunft]" porque ela se apresenta como o espaço excepcional de exercício do indivíduo consigo e com os seus pares [...] Todavia, essa moral não é apresentada por Nietzsche como uma doutrina temporal, mas como uma moral de preparação e também de possibilidade, uma moralidade que se situa "além de bem e mal", que ainda não veio porque está por vir e que liberta o futuro em suas posibilidades» (de Oliveira 2009: 16).
Como vinhamos argumentando junto com Nietzsche «Que alguém se torne o que é pressupõe que não suspeite sequer remotamente o que é. Desse ponto de vista possuem sentido e valor próprio até os desacertos da vida, os momentâneos desvios e vias secundárias, os adiamentos, as "modéstias", a seriedade desperdiçada em tarefas que ficam além da tarefa»
O amor fati se expressa no amor a tudo que tem se tido que ser para devenir o que se é. Contudo, a que se refere Nietzsche com essa tarefa? É algum imperativo que postula a razão e que devemos seguir imperativamente? Como tentei mostrar, a doutrina do amor fati não está formulada na forma de uma moral, mas como a radical tarefa do ser humano, além de toda moral. Esta doutrina não estabelece um padrão de conduta, se não que por meio de um experimento vital mostra uma serie de conclusões, entre elas a importante conclusão de que a tarefa do ser humano é uma continua luta consigo mesmo para ficar livre de si mesmo, do ressentimento que ele mesmo se impõe, e abrir-se a si mesmo e ao futuro em uma atitude jovial para o que está por vir. O amor fati só é possível desde uma apertura prazerosa ao futuro, condição que se abre desde uma atitude amizadora para com nossos instintos e uma fisonomia tipicamente forte. A lição de Zaratustra é leviandade frente à vida e frente ao que se é: uma segunda inocência frente à vida.
Por isso é que ser humano é a mais difícil tarefa, pois o caminho à auto-gnosis é tortuoso. Ela exige de nós uma vitória sobre nós mesmos, mas, como já vimos, a simples preparação para o duelo honesto, amistoso, com nós mesmos, exige a preparação do campo onde vai desenvolver-se esse duelo, quer dizer, esclarecimento sobre o ressentimento e exercício da amizade. O exercício da amizade só é possível desde uma condição fisiológica ótima, isto é, desde a fortaleza de um corpo que conquista, entrega e reconquista a saúde.
IV. O amor fati como tarefa
A conclusão anterior sobre a virtude amizadora da jovialidade encontra-se em concordância com a importância que Nietzsche concede ao futuro «A questão da origem dos valores morais é para mim, portanto, uma questão de primeira ordem, porque condiciona o futuro da humanidade» (EH Aurora 2).
O que Nietzsche chama aqui de tarefa, parece indicar a tarefa de tornar-se o que se é, ser esse começo do que fala ao início do livro. Começo no sentido de que é uma possibilidade para a qual o ser humano se abre, vira uma abertura para o futuro e para a ação, após de ter-se apropriado de si mesmo. Desse jeito ficamos abertos, ou melhor, com uma força e em uma altura na qual estamos em condições de fazer guerra continuamente e conquistar nossa saúde uma e outra vez. «Minha fórmula para a grandeza no homem é amor fati: nada querer diferente, seja para trás, seja para a frente seja em toda a eternidade » (Nietzsche 2005:61).
Levando a sério a questão da cria de um ego, do cultivo de si, nos aproximamos a uma tresvaloração dos valores e à libertação do ressentimento. Isso exige de nós não suspeitar o que somos, atender àquilo que em nós pode ser tarefa, quer dizer, prestar atenção àquilo que cresce nas profundidades: nosso instinto mais radical que é instinto de afirmação da vida. Este instinto é preponderante, corre baixo dos outros instintos, que são meros modos em que o instinto entende-se cedo demais (EH Por que sou tão esperto 9). Também exige de nós a virtude da amizade, a faculdade de apropriarnos de nossas vivências infelizes e daquilo que a vida tem de magoante; apropriarnos também de nosso ressentimento e nossa doença, pois, a fim de contas, devemos o que somos a ela; «[n]ão apenas suportar o necessário, menos ainda ocultá-lo –todo idealismo é mendacidade ante o necessário –mas amá-lo» (Nietzsche 2005:61). O desejo de quer-ser-distinto, quer-se distinto ao que se é, é um desejo de pegar vingança do que se é; é dizer "não" à vida, por achar ela problemática. É quer ir contra a vida porque nela há dor, mais é um desprezo segredo, porque precisamente o ressentimento é o proibido em si para o doente. Ele tem que descomedir esse ressentimento de forma que não seja visível, não pode exteriorizar seu ressentimento, então o interioriza em um desprezo por si mesmo, da sua vida. «O dizer Sim à vida, mesmo em seus problemas mais duros e estranhos; a vontade de vida, alegrando-se da própria inesgotabilidade no sacrificio de seus mais elevados tipos - a isto chamei dionisiaco, isto entendí como a ponte para a psicología do poeta trágico. Não para livrar-se do pavor e da compaixão, não para purificar-se de um perigoso afeto mediante uma veemente descarga – assim o entendeu mal Aristóteles -, mas para, além do pavor e da compaixão, ser em si mesmo o eterno prazer do vir a ser» (EH O nascimento da tragédia 3).
Atender a nossa tarefa é organizar nossos instintos e as ações que partem deles conforme ao instinto de afirmação da vida. Por isso podemos compreender o amor fati como a nossa radical tarefa, e a amizade como momento que constitui parte dessa tarefa, como a atitude que abre-nos ao amor de nosso devenir. Nesse sentido uma tresvaloração faz parte da tarefa, na medida em que ela possibilita a toma de distância, a ascensão a um ponto de vista em relação com as nossas próprias vivências e crenças. Essa ascensão só faz sentido, entretanto, como afundamento em si mesmo e encaminhamento do instinto de afirmação, sepultado pelos modos (contrainstintivos) de se entender cedo demais. Em virtude do encaminhamento desse instinto é que o autor de Ecce Homo pode «olhar para o seu futuro – um vasto futuro- como para um mar liso, nenhum anseio o encrespa» (Por que sou tão esperto 9).
Nietzsche faz a aclaração de que por meio da abordagem dos casos Wagner e Schopenhauer, ele tentou expressar um problema de educação «um novo conceito de cultivo de si, defesa de si até a dureza, um caminho para a grandeza e para tarefas histórico-universais» (Nietzsche 2005: 87). Com isso fica constatado que Nietzsche concebe a apertura que é o amor fati como uma tarefa, algo a-fazer, tarefa da qual a dureza, quer dizer, o egoísmo, o emparedamento em si mesmo, é um estágio. A amizade é um estágio, mas ele é entre os diferentes estágios (doença, fatalismo russo, auto-defesa) um estágio muito mais elevado.
Expressado com a beleza da pluma de Nietzsche, ficar liberado para o amor fati é: «a grande paz no prometer, o feliz mirar em um futuro que não permanecerá mera promessa!» (Nietzsche 2005: 87). É poder rir de si mesmo após ter vivido a decadénce; chegar a ser jovial. É poder ter cultivado si mesmo e, ainda mais, poder ter sacrificado os seus próprios valores depois de uma tresvaloração, para finalmente sentir prazer em nosso próprio devenir como essa totalidade de vivências. É ser com mais certeza que nunca, nós mesmos, sem renegar de nenhuma parte de nós, nem sequer da dor. Isso é o que significa tornar-se o que se é, e essa é a potência amizadora da jovialidade, porque ela nos abre, não à resignação, mas ao inesgotável prazer do vir a ser. É propriamente chegar a ser o que se é, o que está em questão é "cómo", por isso a apresentação dos descobrimentos de Nietzsche tem a forma de uma doutrina, e tem que lidar com questões educativas.
A tragédia era para Nietzsche a arte suprema do dizer Sim à vida. Ela só renasceria quando a humanidade tiver atrás de si a consciência das mais duras, porém necessárias guerras, sem sofrer por isso (O nascimento da tragédia 4). Tarefa então se compreende como a volta da tragédia, como um radical ficar-aberto-ao-futuro sentindo um profundo prazer no devenir.
Com a tresvaloração inicia "todo um mundo de novos dias". Ao estar além da moral, ao dizer Sim a todo o que até aqui foi proibido, o ser humano é capaz de devolver o privilégio à existência de coisas tidas por ruins até o momento prévio ao apropriamento de si mesmo (EH Aurora 1). No entanto, o passo da decadénce à grandeza é uma superação que se faz usando como ponte a amizade. O fato que Nietzsche descreve como fluir e refluir, como olhar desde o alto para baixo, e desde baixo para o alto, é precisamente ter tempo de interpretar nossas vivências. Reagir imediatamente a elas, optando por uma moral que, qua moral, é decadente, é exatamente o que faz adoecer ao homem doente. O super-homem, o homem além do homem, tem tempo bastante para as suas vivências, e ele mesmo é começo, no sentido em que ele se proíve detiver-se ante uma sabedoria última, um poder último, uma moral última, e da rédea solta a seus instintos mais fundos. Este super-homem, pois tem conseguido ir além de si, tem distinguido o que nele parecía ethos de seu radical pathos; ele deseja o eterno retorno da guerra e da paz: enfrenta-se com uma força renovada à vida, quer atuar uma e outra vez e de um modo que unicamente ele poderia fazer (Nietzsche 2009: 75), mas já não desistindo do que ele é, senão após haver-se apropriado de si mesmo, fazendo a guerra com si mesmo, em cada ação, com a mira posta em sua tarefa. Ante cada situação que a vida apresenta-lhe, se volve a abrir para ele a posibilidade de superar a si mesmo em si mesmo, de levar a cabo o desdobramento de uma tresvaloração de seus valores, de seus padrões de ação. Esta é a grande saúde, a fortaleza do homem sadio, uma saúde que não apenas se possui, mas que se conquista e se tem que conquistar continuamente, porque ela se entrega por honestidade consigo mesmo, ela é tal que «não apenas se tem, mas constantemente se adquire e é preciso adquirir, pois sempre de novo se abandona e é preciso abandonar...» (EH Assim falou Zaratustra 2).
A amizade se configura então como um conceito chave não só do Ecce Homo, mas da própria filosofia de Nietzsche, e determina a filosofia de Nietzsche como uma filosofia para apropriarse da (própria) vida e para situar-nos ante o futuro. Cabe, no entanto, fazer a pergunta: temos hoje ouvidos para Nietzsche?
Referências Bibliográficas
de Oliveira, J.R. (2009). Para uma ética da amizade em Nietzsche. São Carlos: UFSCar (Tese de doutorado).
Nietzsche, Friedrich. (2005). Ecce Homo. Madrid: Alianza. Andrés Sánchez Pascual (trad.)
Nietzsche, Friedrich. (1995). Ecce Homo. São Paulo: Companhia de Bolso. Paulo César de Souza (trad.)
Nietzsche, Friedrich. (2009). La gaya ciencia. Madrid: Akal.
Paschoal, A.E. (2012). "A superação do ressentimento na filosofia de Nietzsche" em Estudos Nietzsche, v.3, n.2. Curitiba. 183 – 206.



Embora Nietzsche refere-se de modo explícito a ele mesmo, às suas vivências, à sua pessoa como o indivíduo no qual têm lugar esses descobrimentos, prefiro não restringir sua análise psicológica-fisiológica a seu caso pessoal, senão, melhor, abrir a questão de quem é o homem, que tipo de homem é o que poderia estar sendo descrito aqui (eu gosto de pensar que é um tipo de homem a fazer, fato que compagina com a vocação educativa de Nietzsche). O anterior, por um lado pela fundura e abrangência da sua análise; tão abrangente é que parece tocar o coração do humano: parece englobar ao gênero humano desde sua perspectiva pessoal. Por outro lado, pela "entonação histórico-universal" da sua tarefa, de que o próprio Nietzsche fala, e porque ele se entende a si mesmo como um destino «Esta é a mais estranha "objetividade" que pode haver: a absoluta certeza sobre o que eu sou prejetou-se sobre uma realidade eventual qualquer – a verdade sobre mim fez-se ouvir de uma terrível profundeza» (EH Humano, demasiado humano 6; EH As extemporâneas 4).
"Nobre" não no sentido da moral sacerdotal, senão em seu sentido transformador.
A imagem do poeta trágico preexistente do Zaratustra é uma imagem desenhada com "abismal profundidade". Esta imagem parece apontar, por sua abismal profundidade, àquilo que subjaza ao homem Nietzsche, mais que pertence, por extrapolação da importância da sua tarefa histórico-universal, à natureza dos homens fortes, dos elegidos, como Nietzsche gosta de falar. Cumpre notar que, traço decisivo dessa natureza, é o coexistir nele «as forças mais luminosas e mais fatídicas, a vontade de poder, como homem nenhum a possui, a valentia considerada nas coisas do espírito, a ilimitada força de aprender, sem que com isso a vontade de ação seja sufocada» (Nietzsche 2005: 80).




Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.