Sociologia das Brazzavilles Negras: Um livro à frente do seu tempo

May 30, 2017 | Autor: Pedro Patacho | Categoria: Africa, Sociologia, Ciências Sociais, Estudos Africanos, Georges Balandier, Metodologias de Pesquisa
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Pedro Manuel Patacho**

Sociologia das Brazzavilles Negras, publicado pela primeira vez em 1955, não deixa tranquilos os seus leitores. Ele inquieta-nos ainda hoje. E isto acontece porque Sociologia das Brazzavilles Negras foi um livro à frente do seu tempo, para o qual continua a ser importante olhar pelo seu carácter anunciador. Em muitos aspectos, a abordagem de Georges Balandier antecipa-se aos intensos debates epistemológicos que se produziram nas décadas de 1960 e de 1970 e apresenta uma outra perspectiva de investigação em ciências sociais. O livro que agora se publica na colecção «Reler África» é a tradução da segunda edição francesa, revista e aumentada, publicada em 1985 e que, para além do texto original composto por uma introdução e sete capítulos, inclui ainda nas suas 280 páginas uma nova introdução de Georges Balandier, 30 anos depois da edição original,

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Comunicação apresentada no auditório da Faculdade de Ciências Sociais (FCS) da Universidade Agostinho Neto (UAN), no passado dia 27 de Março de 2013, por ocasião da apresentação pública da obra de Georges Balandier, Sociologia das Brazzavilles Negras (Tradução de Glória Sousa; revisão do texto por Isabel Henriques e Pedro Patacho. Luanda, Edições Mulemba; Lisboa, Edições Pedago [«Reler África»], 2013, 280p.); versão original: Sociologie des Brazzavilles Noires. Paris, Presses de la Fondation Nationale des Sciences Politiques, 1985. Professor Adjunto do Instituto Superior de Ciências Educativas (ISCE), Portugal e investigador no Departamento de Pedagogia e Didáctica da Universidade de La Corunha, no Reino da Espanha, onde prepara a sua tese de Doutoramento. É Director das Edições Pedago.

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algumas sínteses de outras obras entretanto publicadas pelo autor (contra-textos) e comentários finais da autoria de Jean Copans. Trata-se de um estudo que foi realizado entre 1948 e 1951, numa altura em que «a etnologia dominante marcava o seu desinteresse pelas cidades» (p. 11), reforçando a perspectiva de que a cidade, a verdadeira cidade, incontestável na sua qualidade, apenas poderia ser a branca, a cidade colonial. Balandier seguiu pelo sentido inverso. Concentrou a sua atenção no estudo daquilo a que chamou a nova cidade africana, resultante da implantação colonial, que se caracterizava por ser um lugar de intensa transformação. O seu estudo foi o primeiro realizado numa capital africana pertencente ao conjunto colonial francês que a considerou efectivamente como uma cidade negra e não como uma «realização equatorial da cidade branca, em que os “centros indígenas” seriam apenas, de certa forma, os complementos servis» (p. 10). O seu objectivo era «definir um conjunto urbano em formação e manifestar a lógica que ligava todos os seus componentes, assim como as contradições que dele resultavam» (p. 10). Para Balandier, Brazzaville constituía a verdadeira materialização desta nova cidade africana. Em pouco mais de três décadas tinha chamado a si cerca de 100.000 habitantes de inúmeras etnias. Ao núcleo central, branco e colonial, a Brazzaville branca, opunham-se os núcleos negros, as Brazzavilles negras. Foi neste conjunto urbano, neste «laboratório de mudança», como lhe chamou, que o autor quis compreender e descrever o social e o cultural na sua génese, apreendendo os problemas e as questões críticas em contexto, no seu ambiente natural. É deste ponto de vista que classifica a sua abordagem de dinamista, no sentido em se foca no movimento, na apreensão do social e do cultural tal como é vivido, com todas as suas contradições e incoerências, determinações e acasos, ordem e desordem. Dito de outra forma, Balandier reconhece e aceita a complexidade do estudo das estruturas sociais num contexto de mudanças numerosas e aceleradas. Contudo, recusa que essa complexidade constitua um obstáculo à produção do conhecimento científico. Pelo contrário, aceita a complexidade dos universos de vida e adequa os métodos de pesquisa a uma nova concepção ontológica do objecto de estudo, o que na sua perspectiva inovadora constitui a base para um outro conhecimento científico menos deformador do real. Como nos diz Balandier, «a abordagem resultara de uma necessidade própria colocada pelo “terreno”» (p. 11), «em que tudo se mostra ligado na acção e na interacção» (p. 12). Impunha-se uma pluralidade de métodos na

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tentativa de conseguir captar uma pluralidade de universos de vida em transformação. Balandier não esteve sozinho no desenvolvimento do seu estudo. Foi apoiado por um geógrafo que procurou «definir a cidade no seu meio e no seu espaço evolutivo» (p. 12), o que se revelava particularmente importante num momento de grande crescimento provocado pelo afluxo de rurais que se organizam em diversos bairros e também num período em que Brazzaville beneficiou da construção de novas infraestruturas e da instalação de novos serviços administrativos. Teve ainda o apoio de um demógrafo, cujos dados estatísticos permitiram «determinar o que era […] designado como elementos constituintes da morfologia social». Foi sobre estas bases que definiu o seu estudo sociológico: a escolha do terreno de investigação (PotoPoto, uma das Brazzavilles negras), dos bairros de Poto-Poto formados em diferentes datas e, dentro destes, dos «blocos onde conduzir a observação dos grupos residentes e das situações individuais» (p. 12). A observação participante, a redacção de fichas biográficas e de histórias de vida, as entrevistas abertas permitiram a Georges Balandier «identificar as relações sociais prevalentes e os procedimentos individuais de negociação da quotidianidade [...] [condensando] o que era movimento, criação de ajustamentos e de formas culturais novas, conflito e reivindicação» (p. 12). Centrou-se na produção de uma sociologia do vivido, preocupada com as respostas que os sujeitos constroem perante situações instáveis «próprias de uma cidade colonial em completa transformação» (p. 12). É por isso que toda a obra se estrutura em torno de problemas específicos que a interpretação dos dados recolhidos em contexto procurou iluminar. No primeiro capítulo da obra é analisado o crescimento das Brazzavilles negras e o problema do êxodo rural. Ao longo deste capítulo o autor destaca alguns aspectos históricos relacionados com o surgimento e o crescimento de Brazzaville, para se debruçar a seguir sobre a paisagem urbana da nova cidade africana e discutir o êxodo rural a que está associada, com implicações significativas tanto para a vida urbana como para os meios rurais tradicionais. O segundo capítulo debruça-se sobre a estrutura demográfica e a estrutura do povoamento. Para o efeito, o autor centra-se nos dois principais centros em redor de Brazzaville, a saber, Poto-Poto e Bacongo. No terceiro capítulo o autor analisa os problemas do trabalho nas Brazzavilles negras. É o maior capítulo da obra, já que o trabalhador surgiu na investigação de Balandier como o actor social principal da nova cidade

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africana, havendo por isso a necessidade de conhecer em profundidade as suas vivências, bem como os desafios e as dificuldades com que se deparava na sua existência urbana. Vários temas são detalhadamente tratados ao longo deste capítulo: a estrutura da população activa, as características do trabalhador assalariado na nova cidade, os salários e os níveis de vida, a organização profissional, a consciência de classe do novo trabalhador assalariado e, ainda, a actividade dos trabalhadores não-assalariados. O quarto capítulo aborda os problemas da organização social e da vida política, procurando descrever os grupos sociais, a organização administrativa da nova cidade e o despertar político dos citadinos. O quinto capítulo descreve as principais situações de conflito e os antagonismos decorrentes tanto da ampla diversidade que caracterizava o meio urbano, como de novas formas de estar, de ser e de fazer que se iam produzindo sob a influência citadina e que marcavam formas radicalmente novas de viver em meio urbano, quando comparadas com os costumes tradicionais. Além disso, o autor não se furta à análise das relações entre a cidade branca e as cidades negras. O capítulo sexto constitui provavelmente um dos mais interessantes de toda a obra. Balandier aventura-se na construção de casos individuais com os quais pretende ilustrar o muito que ficou dito até aí acerca das especificidades das Brazzavilles negras enquanto motores na nova cidade africana. Esta opção por estudos de caso, enquadrados no estudo mais vasto que levou a cabo, é bem exemplificativa do rasgo de Balandier no que à investigação em ciências sociais diz respeito. No sétimo e último capítulo da obra, o autor destaca a forma como muito daquilo que fica dito sobre da nova cidade africana, acerca da expressão da sua suposta modernidade (Cf. LATOUR 1994), não pode ser desligado do facto de se tratar de um estudo em meio afrancesado pela educação formal sob o domínio colonial e, portanto, poderíamos nós acrescentar, em muitos aspectos, ocidentalizado. É por isso, provavelmente, que Balandier apresenta a seguir um ponto de vista africano sobre a nova cidade, baseado-se na sua análise documental de artigos escritos na imprensa local. Contudo, essa visão particular apenas serve para destacar o quão evidente era naquela altura a desconfiança dos líderes e activistas urbanos quanto às potencialidades e recursos que podiam revelar os saberes e as práticas tradicionais. Com efeito, não se vislumbravam ainda, nesta época, na perspectiva desses líderes e activistas, possibilidades de articulação entre os saberes e práticas tradicionais e os saberes e práticas ditos modernos

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(cf. HOUNTONDJI 2012). De certa forma, como nos lembra Mudimbe (2013), encontravam-se violentamente domesticados, intelectualmente falando, preocupando-se sobretudo com questões de evolução moral em direcção a uma modernidade imitativa sob o domínio de uma ordem discursiva que, ainda que não se apercebessem, lhes era imposta como aquela que deveriam seguir. Na parte final da obra são apresentadas algumas notas relativas a outras obras do autor. O livro termina com os comentários finais de Jeans Copans. Também Copans destaca a abordagem inovadora do autor. Na sua perspectiva, «as Brazzavilles negras não são simplesmente um testemunho significativo do nascimento de uma cidade simbólica. É uma obra de método para regressar no tempo, tal como se dá corda a um relógio» (p. 262). Com efeito, o trabalho de Balandier tem um carácter anunciador das profundas discussões epistemológicas que em breve se iriam produzir no seio da comunidade científica. Deste ponto de vista é um olhar poderoso, como diz Copans nos seus comentários finais. Balandier afastou-se propositadamente de uma concepção de investigação em que tanto a teoria como o método são anteriores ao objecto de estudo que, para poder ser estudado, tem de ser concebido de tal forma que possibilite a sua abordagem no âmbito de um modelo linear de investigação e dos métodos por ele admitidos. Não será de estranhar, como Copans parece fazer, a quase ausência de referências teóricas, nem a forma como a abordagem se entrega ao seu objecto. Copans é suficiente subtil na sua análise para conseguir dizer, após expressar estas inquietações, que o efeito estratégico das opções de Balandier é inegável, ou seja, «à realidade nova, discurso novo; ao discurso novo, conceitos inéditos» (p. 264). Contudo, parece ficar implícito algum desconforto1 relativamente a uma concepção do objecto de estudo das ciências sociais que seja ela própria determinante da abordagem metodológica, e não o contrário.

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A propósito destas inquietações e de um eventual desconforto relativamente às opções teóricas e práticas de Balandier, será um exercício certamente interessante confrontar a análise que Jean Copans faz da investigação do autor com a análise que Théophile Obenga faz de alguns trabalhos de Jean Copans, enquanto africanista. Ver, a este respeito, Th. Obenga, O Sentido da Luta contra o Africanismo Eurocentrista. Luanda/Mangualde, Edições Mulemba/Edições Pedago, 2013.

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Para muitos investigadores, durante muito tempo, e ainda hoje, o processo de investigação «segue o método científico, ou seja, propõe um problema a resolver, formula uma hipótese, de forma operacional (testável) e, então, tenta verificar esta hipótese por meio da experimentação» (TUCKMAN 1994: 22). Contudo, para outros investigadores, cada vez mais, o processo de investigação «significa diferentes coisas em diferentes momentos [...]. Em geral, trata-se de uma actividade situada que coloca o [investigador] no mundo [...] um conjunto de práticas interpretativas através das quais os investigadores procuram compreender os fenómenos no seu contexto natural, captando o seu significado do ponto de vista dos sujeitos que neles se encontram implicados» (GUBA & LONCOLN 1994: 113). Estamos, com efeito, perante duas visões muito diferentes do que é (e pode ser) investigação científica no vasto campo das ciências sociais. Estas diferentes visões são reveladoras das disputas entre paradigmas no seio da investigação em ciências sociais. Daí que o ponto de partida para qualquer investigador deva ser, precisamente, uma profunda reflexão acerca destes paradigmas e dos argumentos que os suportam. A definição de um objecto de estudo e a escolha do método serão então posteriores ao posicionamento do investigador, bem como à sua temática, no seio de um determinado paradigma. Os paradigmas de investigação constituem assunções básicas que representam uma visão do mundo e que definem a própria realidade. Esses diferentes paradigmas de investigação podem ser definidos em função das respostas que os seus defensores dão a pelo menos três questões fundamentais: a questão ontológica, a questão epistemológica e a questão metodológica (GUBA & LINCOLN 1994). Nas décadas de 1960 e 1970 produziram-se intensos debates em torno daquelas que são reconhecidas como as duas grandes abordagens na investigação em ciências sociais, a saber: a orientação positivista/empirista e a orientação construtivista/fenomenológica. Estas orientações estão ligadas a debates filosóficos antigos, mas é amplamente aceite que a orientação positivista/empirista moldou fortemente as ciências sociais nos seus primórdios (FLICK 2005; DENZIN & LINCOLN 2011). Na década de 1980 do século passado aprofundaram-se as clivagens entre essas abordagens, surgindo com todo o vigor novas posturas epistemológicas que, nalguns casos, se vieram a revelar totalmente inconciliáveis. Num interessante artigo publicado em 1989, N. L. Gage falava de uma guerra de paradigmas para se referir ao que designou de ataques devastadores dos anti-naturalistas,

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dos interpretativistas e dos teóricos críticos. Gage sistematizou nesse artigo aquilo que considerava serem os ataques à perspectiva positivista/empirista e que aqui recuperamos de forma muito resumida. A crítica anti-empirista reclamava a não existência de um método de investigação comum a todas as áreas do conhecimento que reivindicam o estatuto científico. Esta questão metodológica fundava-se em divisões ontológicas profundas que apontavam para visões radicalmente opostas de conceber o objecto de estudo das ciências sociais, a relação sujeito-objecto e a natureza do conhecimento produzido no contexto dessa relação. A crítica interpretativista reclamava que qualquer conhecimento produzido é sempre subjectivo, já que implica sempre a acção interpretativa de um sujeito investigador que é intrinsecamente subjectivo. Por sua vez, a teoria crítica colocava em causa a ideia de uma suposta neutralidade científica, de uma busca desinteressada do saber, reclamando a não existência de tal coisa como conhecimento neutro, pois todo e qualquer conhecimento é sempre influenciado pelos valores e interesses que estão na base da sua génese. Estes debates, profundamente ligados a aspectos ontológicos, epistemológicos e metodológicos, marcariam as décadas seguintes e transformariam a investigação em ciências sociais, orientando os investigadores, cada vez mais, para problemáticas até aí ignoradas ou insuficientemente trabalhadas, ligadas a questões específicas, complexas e localmente contextualizadas. A investigação qualitativa emancipou-se e definiu os seus próprios critérios de qualidade. A partir daí, e de forma permanente, a chamada investigação qualitativa passou a ser muito mais do que uma mera colecção de métodos de recolha de dados. Muito pelo contrário, passou a significar um modo específico de entender a realidade social e os sujeitos humanos enquanto objectos de estudo, bem como um modo particular de entender a relação entre o objecto de estudo e o método. No seu manual de investigação qualitativa em ciências sociais Uwe Flick chama-nos à atenção para a pluralidade dos universos de vida, o que exige «uma nova sensibilidade para o estudo empírico das questões» dada a «acelerada mudança social e a consequente diversidade» que «confrontam cada vez mais os cientistas com novos contextos sociais e novas perspectivas» que as metodologias dedutivas tradicionais são insuficientes para explicar com a a necessária profundidade, sendo, por isso mesmo, «a investigação [...] cada vez mais forçada a recorrer a estratégias indutivas», em que «o conhecimento e a prática

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são estudados na qualidade de conhecimento e prática locais», e em que «o estudo dos significados subjectivos e da experiência e prática quotidianas é tão fundamental como a análise das narrativas e discursos» (FLICK 2005: 2). Nesta perspectiva, é uma nova concepção da realidade social que impõe uma pluralidade de métodos; métodos que têm forçosamente que ser abertos porque têm de se ajustar à complexidade de um objecto de estudo instável e incerto. Georges Balandier antecipou esta discussão com uma limpidez notável. De certa forma, Balandier, enquanto africanista, abriu as portas a outras possibilidades de aproximação científica à realidade social africana em transformação. Ele foi um percursor deste debate, mas seria necessário ir muito para além de Balandier para imaginar uma nova ordem para as ciências sociais em África. Seria necessário, para invocarmos aqui a expressão de Jean-Marc Ela (2013), pensar África para além do Africanismo. Os intelectuais africanos haveriam de agarrar este debate e de torná-lo seu. Será precisamente a partir desta altura que uma nova geração de africanos reivindicará a noção de vigilância epistemológica (MUDIMBE 2013). Esta geração surgirá sobretudo preocupada com os paradigmas de investigação e com a análise das dimensões políticas do conhecimento, bem como dos procedimentos para instituir novas perspectivas teóricas e práticas nas ciências sociais e, em particular, nos chamados Estudos Africanos. Porém, em vez de reforçarem os paradigmas vigentes irão questionar o seu significado de uma forma bem assertiva, irão interrogar a sua credibilidade e desafiar a escala avaliativa tanto dos processos científicos de investigação como dos pressupostos ideológicos do trabalho em ciências sociais (MUDIMBE 2013). Então, o que aprendemos hoje, quase seis décadas depois, com Balandier? Em primeiro lugar, esta importante obra de Georges Balandier recorda-nos da importância de orientar os esforços da investigação em ciências sociais no sentido de compreender as transformações socioculturais na África contemporânea, como de resto foi declarado pouco tempo depois, em 1959, no Segundo Congresso dos Escritores e Artistas Negros, que teve lugar em Roma (Cf. ELA 2013). Em segundo lugar, somos forçados a concordar com Balandier quando ele afirmava que a cidade era o motor na nova África. Com efeito, é no seio da cidade que a antropologia e a sociologia encontram hoje os seus novos objectos de estudo. Como dizia Ela, na edição francesa publicada pela primeira vez em 1994, já «não é necessário ir para o fundo das florestas ou das savanas para exercer a profissão de

Referências bibliográficas DENZIN Norman & LINCOLN Yvonna 1994, Handbook of qualitative research. Thousand Oaks, Sage Publications. ELA Jean-Marc 2013, Restituir a História às Sociedades Africanas. Promover as Ciências Sociais na África Negra. Luanda/Mangualde, Edições Mulemba/Edições Pedago. FLICK Uwe 2005, Métodos qualitativos de investigação científica. Lisboa, Monitor. GAGE N. L. 1989, «The paradigma wars and their aftermath: A “historical” sketch of research on teaching since 1989», Educational Research, vol. 18, n.º 7, pp. 4-10. GUBA E. & LINCOLN Y. 1994, «Competing paradigms in qualitative research», in Norman Denzin & Yvonna Lincoln. Handbook of qualitative research. Thousand Oaks, Sage Publication, pp. 105-117. KAJIBANGA Víctor 2008, «Liberdades académicas e responsabilidade social dos universitários africanos», Revista Angolana de Sociologia (Luanda), n.º 1, Junho, pp. 73-83.

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antropólogo» (p. 13). Neste quadro, e na esteira de Balandier, o autor desperta-nos a atenção para a possibilidade e, porventura, a imperiosa necessidade, de «esclarecer e compreender a actualidade a partir dos rituais e dos códigos, das imagens e dos mitos, dos objectos e dos sinais oferecidos à investigação no mundo [urbano] de hoje» (p. 13). Por fim, Balandier apela decididamente à criatividade e à interdisciplinaridade da investigação em ciências sociais, servida por uma pluralidade metodológica que seja menos redutora e deformadora da realidade social. Isso remete, de forma indiscutível, para a necessidade de os académicos e investigadores assumirem a sua actividade enquanto cientistas sociais como o exercício de uma intensa democracia criativa num quadro de responsabilidade social (KAJIBANGA 2008), de forma que a compreensão profunda, sofisticada e densa das realidades socioculturais possa resultar em benefícios duradouros e solidamente fundados para as instituições e para a sociedade.

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LATOUR Bruno 1994, Jamais fomos modernos. São Paulo, Editora 34. MUDIMBE V. Y. 2013, A invenção de África. Gnose, filosofia e ordem do conhecimento. Luanda, Edições Mulemba; Lisboa, Edições Pedago [«Reler África»].

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TUCKMAN B. 1994, Manual de investigação em educação. Lisboa, Fundação Calouste Gulbenkian.

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Pedro Manuel Patacho É Licenciado em Educação pelo Instituto Superior de Ciências Educativas (ISCE) e também Mestre em Educação pela Universidade de Lisboa. Actualmente prepara a sua tese de doutoramento na Universidade da Corunha, no Reino de Espanha, onde é investigador no Departamento de Pedagogia e Didáctica. Supervisiona trabalhos de mestrado em diversas áreas e tem leccionado diversos cursos na formação inicial e pósgraduada, entre eles: Metodologia de Investigação e Técnicas Avançadas em Investigação Qualitativa. É membro do Conselho Editorial da Revista Angolana de Sociologia da Sociedade Angolana de Sociologia (SAS) e do Conselho Redactorial do Fórum Global de Investigação Educacional. As suas principais áreas de interesse situam-se no campo da Investigação Etnográfica em Educação e da Sociologia da Educação, em particular: Educação e Justiça Social; Participação Democrática nas Escolas; Educação e Activismo Social; Análise das Políticas Educativas e Curriculares. Entre os seus trabalhos mais recentes destacam-se: «Práticas educativas democráticas», Educação & Sociedade, vol. 32, n.º 114, pp. 39-52; «Os professores como activistas sociais», Itinerários, n.º 8, pp-37-47; «Mercantilização da educação. Uma abordagem ancorada no caso português», artigo submetido para avaliação à revista Currículo sem Fronteiras (processo de avaliação em curso). Em 2004 ajudou a fundar as Edições Pedago, de que é Director. Trata-se de uma editora académica vocacionada para a publicação em Ciências Sociais com um alinhamento editorial crítico. [e-mail: ediçõ[email protected]].

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