“SORTEIO DE LIVROS”: A INFLUÊNCIA DA LEITURA NA FORMAÇÃO DE FUTUROS EDUCADORES

June 24, 2017 | Autor: L. Mendonça Lopes... | Categoria: Teacher Education, Literature
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“SORTEIO DE LIVROS”: A INFLUÊNCIA DA LEITURA NA FORMAÇÃO DE FUTUROS EDUCADORES Letícia Mendonça Lopes Ribeiro – Universidade Federal do Acre / [email protected] Cynthia de Fátima Sousa Oliveira Moura – Faculdade Meta /[email protected] Eixo: Formação Docente – Subeixo: Aprendizagem docente e desenvolvimento profissional.

RESUMO Ao se reconhecer o professor como o propulsor das expectativas de leitura entre os estudantes, o educador, que se mostra um admirador da leitura, aprende a amar os livros e encontra a chave do conhecimento a ser difundido entre os seres humanos em formação. Nesta perspectiva, objetivou-se analisar como um projeto, de doação de livros literários, influenciou os acadêmicos da licenciatura em pedagogia na prática da leitura. As principais referências teóricas do estudo foram: Batista (1998), Carvalho (2002), Quadros e Miranda (2009), Rangel (2012) e Alves (2013). Participaram, como sujeitos da pesquisa, os 44 acadêmicos de pedagogia, regularmente matriculados no primeiro semestre letivo do curso na Faculdade Meta em 2014 e participantes do projeto “Sorteio de Livros”, o qual presenteou vários destes acadêmicos com obras literárias. Ressalta-se que a coleta de dados se concentrou nas informações ofertadas pelos participantes no questionário aplicado ao final do projeto, delimitando-se à análise da seguinte questão: “tendo sido sorteado(a) ou não, este projeto influenciou sua relação com a leitura? Descreva”. Quanto ao tratamento das informações, elegeu-se a abordagem qualitativa dos dados, oriundos dos questionários, com o suporte da técnica de análise de conteúdo, como orientado por Bardin (2008). Dentre os 44 participantes da pesquisa, 39 indicaram que o projeto os influenciou positivamente na prática de leitura; apenas três afirmaram não receberem influências da proposta e outros dois participantes não responderam à questão. Conclui-se que esta ação apresenta perspectivas promissoras para incentivar a leitura entre os educadores em formação e, consequentemente, entre seus futuros educandos. Palavras-chave: Leitura. Aprendizagem Docente. Formação Discente.

1. INTRODUÇÃO É através do livro que muitas crianças encontram o prazer da leitura e, por isso, as obras literárias são valorizadas desde a infância (VELOSO, 2006). Nesse contexto, reconhece-se o professor da educação básica como um dos propulsores das expectativas de leitura entre os estudantes. Destaca-se que a leitura, desenvolvida na sala de aula, deve estar a cargo de todos aqueles que se dispõem a educar e a dirigir a ação de ler (RANGEL, 2012). Logo, o incentivo à leitura deve receber um especial estímulo nos cursos de formação de professores, uma vez que um professor, envolvido com a prática de leitura, motivará o hábito de ler entre seus estudantes (QUADROS e MIRANDA, 2009). Ao se reconhecer o professor como o propulsor das expectativas de leitura entre os estudantes, o educador, que se mostra um admirador da leitura, aprende a amar os livros e encontra a chave do conhecimento a ser difundido entre os seres humanos em formação

(ALVES, 2013). Apesar disso, muitos professores não gostam de ler e leem somente o necessário para lecionar ou desenvolver atividades profissionais (CAVALCANTI, 2002). Sugere-se que esta postura esteja associada ao pouco interesse deste público pela leitura durante toda a vida escolar – inclusive no ensino superior. É reconhecido que a muitos dos atuais acadêmicos – especialmente nos cursos de licenciatura – estão em instituições com bibliotecas pouco atrativas, têm escasso recurso para a aquisição de obras e possuem acesso à maior parte dos textos acadêmicos através das fotocópias, popularmente chamadas de cópias xerox (CARVALHO, 2002). Este quadro demonstra dificuldades factuais da aprendizagem docente em relação à leitura, indicando o desafio de estabelecer um processo formativo docente com características que despertem a compreensão (e o gosto) pela leitura. O ideal seria que, durante o processo de formação discente, o futuro professor já tenha consciência e aprecie o potencial da prática de leitura para seus alunos – e, especialmente, para ele próprio. É sob esses argumentos que o problema do presente trabalho se consolida: é possível influenciar os acadêmicos de pedagogia (em plena formação discente) a se entusiasmarem com o hábito de ler através do fácil acesso a obras literárias? Com esta visão, o estudo objetivou analisar como um projeto, de doação de livros literários, influenciou os acadêmicos da licenciatura em pedagogia na prática da leitura. O projeto de doação de obras literárias, mencionado anteriormente, foi nomeado como “Sorteio de Livros” e procurou, através da entrega gratuita de títulos conhecidos no meio literário, estimular o prazer da leitura entre os acadêmicos de licenciatura em pedagogia da Faculdade Meta, na cidade de Rio Branco, Acre. Para a descrição do projeto e dos propósitos que motivaram a execução deste estudo, o presente texto está organizado da seguinte forma: a próxima seção apresenta a revisão de literatura e expõe como se estabeleceu o “Sorteio de Livros”; a terceira seção indica a metodologia utilizada para a realização da pesquisa; a quarta seção descreve os resultados delineados pelo estudo e discute os principais aspectos que sugerem o impacto positivo do projeto na formação discente de futuros professores leitores; por fim, a última seção oferece as considerações finais do texto e os futuros estudos que podem ocorrer a partir da proposta aqui apresentada. 2. AS ENTRELINHAS DO “SORTEIO DE LIVROS” E A REVISÃO LITERÁRIA Antes da apresentação formal da revisão literária que norteou este trabalho, é importante ressaltar como a proposta “Sorteio de Livros” nasceu, cresceu e gerou frutos a serem obtidos em um futuro próximo.

Em setembro de 2013 um incidente nada agradável levou uma professora – que se rotulava como uma aficionada pela leitura – a visitar a biblioteca particular de uma de suas alunas, acadêmica do segundo semestre letivo. Ao entrar naquele local mágico e ouvir os incríveis relatos da acadêmica, a professora sentiu que aqueles livros carregavam mais que literatura. Eles transportavam a riqueza de uma leitora ávida, generosa e leal aos “amigos de páginas” que a apoiaram durante toda a vida. Era inegável o anseio de aprendizagem docente a qual a professora experimentava nesta situação. Logo, era preciso que a preciosidade trazida por esta acadêmica ímpar fosse capaz de se multiplicar entre seus colegas (e futuros professores), ao demonstrar a eles o quanto ler pode ser prazeroso e como, de fato, aquele que aprende a amar os livros encontra a chave do conhecimento (ALVES, 2013). Com estímulos iniciais sólidos e com uma pequena fonte de recursos próprios (e sem quaisquer financiamentos), professora e acadêmica se uniram para o nascimento da ideia que se consolidou na proposta “Sorteio de Livros”. Em princípio, a rotina era simples: alguns livros usados e/ou novos eram doados por professora e/ou acadêmica e colocados em sorteio (de acordo com o número de chamada dos acadêmicos presentes) durante as aulas da disciplina ministrada pela professora na classe da acadêmica, enquanto elas ocupavam suas respectivas posições de docente e discente. Entretanto, com o avançar dos encontros, os demais alunos da classe passaram a doar livros (novos e usados) para enriquecer a proposta. Rapidamente, percebeu-se que o projeto passou a conquistar mais leitores e a criar nestes efeitos muito positivos, levando-os a lerem com gosto (VELOSO, 2006) e a se interessarem cada vez mais em ganhar os exemplares sorteados. A descrição do projeto demonstra o propósito motivacional desta ação para a sensibilização de novos e/ou renovados leitores, os quais podem ser conquistados pelo prazer da leitura já no ensino superior. Sabe-se que, no Brasil, a grande produção acadêmica atual, sobre a necessidade de leitura na escola, geralmente possui foco nas práticas de leitura e nos leitores da educação básica, enquanto os leitores que já alcançaram a educação superior não caracterizam um público comumente explorado. Nada se sabe sobre o hábito prazeroso de ler entre os acadêmicos e, o pouco que se conhece sobre a prática de leitura destes, restringe-se “embates travados entre professores que prescrevem e cobram leituras, e alunos que as devolvem aos mestres nos seminários, aulas e provas” (CARVALHO, 2002, p. 3). No caso da proposta aqui apresentada, é importante ressaltar que, com muitos livros doados, alguns leitores sugestivamente conquistados e o segundo semestre de 2013 concluído, a professora e a acadêmica idealizadoras do “Sorteio de Livros” resolveram se unir formalmente. Para tanto, iniciaram um projeto de iniciação científica fundamentado em uma

versão mais organizada do sorteio, o qual foi promovido entre os ingressantes no curso de pedagogia no primeiro semestre de 2014 – e que será detalhadamente apresentado na exposição metodológica deste artigo. A partir da apresentação das idealizadoras do projeto e de todas as ações que nortearam a proposta, é possível ressaltar a relevância da formação discente aliada à previsão de uma melhor aprendizagem docente. Reconhece-se que a boa qualificação do acadêmico, para que ele se torne um leitor do mundo enquanto ainda está na graduação, oferece uma oportunidade real para ele venha a

superar a alienação presente na formação discente

(PIMENTA e ANASTASIOU, 2002). Enquanto isso, o professor que estabelece uma proposta, como o “Sorteio de Livros”, pode melhorar a compreensão do processo formativo de seus futuros colegas pedagogos, buscando a constante apropriação de conhecimentos, saberes e fazeres próprios à área de atuação de educação, o que potencializa sua aprendizagem docente (BOLZAN e ISAIA, 2006). O importante é que discente e docente assumam que estão em formação e aperfeiçoem seu aprendizado em um processo partilhado e contínuo – assim como fizeram durante todo trabalho aqui apresentado. Assim sendo, com o intuito de corroborar a proposta, destacam-se alguns trabalhos relacionados, como o estudo desenvolvido por Carvalho (2002), ao analisar as práticas de leitura de um grupo de 25 alunas do curso de pedagogia da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Neste, a autora indicou que a leitura é um dos principais instrumentos de formação, mas nem todos os acadêmicos estão preparados para realizar complexas tarefas de leitura do ensino superior. Assim, é preciso criar uma política de leitura na universidade, capaz de facilitar o acesso aos textos impressos e digitalizados, bem como defendeu uma “pedagogia da leitura, que exigiria dos docentes universitários uma tomada de consciência de seu papel de formadores de leitores” (CARVALHO, 2002, p. 1). Outro trabalho que merece ser mencionado é a pesquisa realizada por Quadros e Miranda (2009) na investigação de leituras que os acadêmicos do curso de licenciatura em Química, na modalidade a distância, afirmam fazer. Foi percebido que a maioria dos universitários lê apenas textos acadêmicos e, portanto, as chances de desenvolverem estratégias de entendimento do texto, necessárias para o próprio curso e a outros interesses, são limitadas. A limitação da leitura aos textos acadêmicos foi justificada pelo pouco tempo disponível em função das diversas atividades exercidas pelos universitários. Dessa forma, é preciso desenvolver estratégias que motivem os professores em formação (ainda como discentes) a se interessarem pela prática prazerosa e compreensível texto – compreensão esta que se desenvolve com mais fluência entre aqueles que têm o hábito de leitura de diferentes

gêneros. Apenas um professor leitor será capaz de incentivar a leitura em seus estudantes e, para isso, é reponsabilidade dos pesquisadores iniciar “um processo de discussão dessa leitura dentro dos cursos de formação de professores” (QUADROS e MIRANDA, 2009, p. 239). Em uma perspectiva semelhante, porém aplicada à profissionais já graduados, Batista (1998) desenvolveu um estudo sobre práticas de leitura; neste caso, os sujeitos investigados foram professores de Português dos anos finais do ensino fundamental e do ensino médio que atuavam, nesta data, no estado de Minas Gerais. De acordo com o autor, o capital cultural deste público é modesto e é na atuação como professores que estes sujeitos vão repetir os modelos de leitura a que foram submetidos. Infelizmente, ao evidenciar a complexidade dos processos envolvidos nas práticas de leitura de professores e em sua apreensão e conhecimento, a pesquisa reafirma o pouco interesse pela leitura não escolar que este público apresenta. Rangel (2012) também desenvolveu uma pesquisa com profissionais já graduados, objetivando compreender o processo de leitura instituído nas nossas escolas. Foram entrevistados 11 educadores de duas escolas de ensino fundamental (uma pública e outra privada) na cidade do Rio de Janeiro. Tais sujeitos eram professores de várias disciplinas e também profissionais da direção escolar. A partir da coleta e análise dos dados apresentados, indicou-se a necessidade da escola em ser um espaço de leitura prazerosa, ultrapassando práticas rotineiras de respostas prontas. Neste aspecto, ressalta-se que “o professor é o mediador por excelência, entre os suportes de leitura e os leitores, sendo a sua atuação fundamental para a formação do leitor” (RANGEL, 2012, p. 110). Trabalhos como estes apoiam a ideia de que a leitura deve ser motivada ao início da escolarização. Assim, futuros professores chegarão ao ensino superior com hábitos de leitura consolidados. Entretanto, como essa não uma realidade na maioria das salas de aula da licenciatura, reconhece-se que os acadêmicos precisam ler – e, especialmente, compreender e aproveitar o que leem – sendo estes os anseios almejados pelo “Sorteio de Livros”.

3. A CONSTRUÇÃO METODOLÓGICA Entre os meses de março e julho de 2014, os 44 acadêmicos da classe do primeiro período de pedagogia da Faculdade Meta foram os sujeitos da pesquisa de iniciação científica nomeada como “Acesso e motivação à leitura: uma proposta de melhoria para a formação de educadores acrianos”. As bases da ação de campo se concentraram em momentos dedicados à doação dos explares através do “Sorteio de Livros”. Tais sorteios ocorriam sempre ao início da aula – de

História da Educação – ministrada pela professora orientadora do projeto, tendo a colaboração da acadêmica bolsista e, eventualmente, de outra acadêmica voluntária. Salienta-se que todos os participantes receberam e assinaram o Termo de Consentimento Livre Esclarecido, o qual assegurou o anonimato de todos os sujeitos às informações por eles prestadas. Graças à garantia de sigilo, os nomes dos sujeitos foram substituídos por nomes de flores na apresentação da análise de resultados, como poderá ser visto na seção seguinte. Foram nove momentos de sorteio e um total de 24 exemplares entregues – ou seja: 24 acadêmicos foram presenteados com uma obra doada pelas pesquisadoras e/ou seus parceiros e colaboradores eventuais. Os títulos sorteados podem ser caracterizados como literários e, apesar de não terem relação direta com o curso, admitiu-se que todos eles podem contribuir, direta ou indiretamente, com a formação discente dos sujeitos participantes. É fundamental destacar que grande parte das obras ofertadas foi lida pelo grupo de pesquisadoras e, os poucos exemplares não lidos na íntegra, passaram por uma seleção criteriosa para que a relevância de cada obra fosse (desejosamente) indicada como positiva e, principalmente, atrativa aos acadêmicos e futuros professores. Ao início dos sorteios, todas as obras eram apresentadas com entusiasmo aos sujeitos da pesquisa. As pesquisadoras tinham o intuito de sensibilizar os acadêmicos a se deliciarem com o poder maravilhoso “que têm os livros para criar pontes entre pessoas que se amam sem se conhecer” (ALVES, 2008, p. 250). Ressalta-se que a coleta de dados, apresentada no presente texto, concentrou-se nas informações ofertadas pelos sujeitos no questionário aplicado ao final do projeto. Optou-se pela execução do questionário, por ser este um instrumento privilegiado de sondagem que permite alcançar rápida e simultaneamente um grande número de pessoas (LAVILLE e DIONE, 1999). Deste instrumento, composto por questões objetivas e subjetivas, foi extraída apenas uma questão para a apresentação aqui proposta, a qual foi analisada sob a luz da técnica de análise do conteúdo, por esta pressupor um adequado tratamento dos resultados obtidos e interpretação de maneira a se tornarem significativos e válidos (BARDIN, 2008).

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO Os sujeitos da pesquisa responderam à seguinte questão: “tendo sido sorteado(a) ou não, este projeto influenciou sua relação com a leitura? Descreva”. Dentre os 44 participantes, 39 indicaram que o projeto os influenciou positivamente na prática de leitura, três disseram não receber influências do projeto e dois não responderam à questão.

Entre os sujeitos que disseram se sentir motivados a ler, a partir do projeto, destacamse as indicações daqueles que afirmam mudanças na prática rotineira da leitura. Acácia, por exemplo, afirmou que quando um acadêmico ganhava e lia uma obra, os demais colegas também tinham vontade de lê-la e emprestavam o livro lido a outros alunos. Já Açucena apontou que, com a execução do projeto, tem orgulho em assumir sentir-se incentivada a ter a prática da leitura em seu cotidiano. Dois sujeitos que mencionaram a repercussão do projeto em suas famílias e, especialmente, na prática de leitura para os seus filhos. Jasmim apontou que depois que começou a ler, diante da influência do projeto, incentivou seu filho a ler. Dália também indicou que gostou muito do projeto por ele a ajudar como educadora e na criação de seu filho ao motivá-lo a ler. Sugere-se que estes sujeitos perceberam o quanto ler é prazeroso e como, de fato, aquele que aprende a amar os livros encontra a chave do conhecimento (ALVES, 2013). É interessante entender ainda que este conhecimento valoroso foi ampliado aos leitores em formação, o que ressalta ainda mais a relevância da ação para a formação discente. Nesse contexto, outros sujeitos citaram a importância do projeto na formação do educador. Azaleia indicou que como (futura) pedagoga, precisa apreciar uma boa leitura – como as promovidas pelo “Sorteio de Livros”. Margarida apontou que o conhecimento na área educacional tem o compromisso de passar o gosto e o interesse do que se lê aos outros indivíduos. Já Rosa afirmou que, quando se lê, melhora-se a linguagem e se passa a ter outra visão do que é lido, pressupondo também uma melhoria na qualidade da formação dos discentes. Essas indicações dialogam com o estudo realizado por Rangel (2012) ao sugerir que o professor é o mediador entre os suportes de leitura e os leitores em formação. Além disso, percebe-se que estes sujeitos valorizam sua trajetória acadêmica com ganhos à criticidade própria de uma leitura de mundo que pode superar a alienação tão comum no processo de formação discente (PIMENTA e ANASTASIOU, 2002). É importante ressaltar que muitos sujeitos aludiram o não hábito de leitura aos mais diversos motivos. Fúcsia afirmou que nunca esteve em uma livraria para comprar livros e agora, ao ganhar uma obra, tem apreço e pretende lê-la até o final, pressupondo não perceber – antes da realização do projeto – a aquisição de livros como uma prática necessária a um estudante do ensino superior. O desinteresse em investir na aquisição de obras e leituras que possam enriquecer o universo pessoal e acadêmico do estudante sugere que o capital cultural dos estudantes da licenciatura é modesto. Esta menção dialoga com os estudos desenvolvidos por Batista (1998), em uma investigação que contou com professores em atuação – os quais os sujeitos do presente trabalho representarão muito em breve.

Nessa mesma visão, Cravo apontou que estava ansioso para conseguir tempo e poder ler o livro que ganhou, sugerindo ser um acadêmico ocupado e com pouco tempo disponível para a leitura. Nesse aspecto, o trabalho de Quadros e Miranda (2009) aponta que os estudantes se limitam a ler os textos acadêmicos em função das diversas atividades por eles exercidas. Supõe-se que os acadêmicos trabalhadores, muito presentes nos cursos de licenciatura, não encontram tempo hábil para a leitura como lazer. Logo, é preciso desenvolver estratégias que motivem os professores em formação a se interessarem pelo prazer de ler; estratégias estas semelhantes à ação realizada pelo “Sorteio de Livros”. Entre os três estudantes que afirmaram não terem sido influenciados positivamente pelo “Sorteio de Livros”, dois deles disseram-se apreciadores da leitura. Hortênsia apontou que gostaria muito de ter sido sorteada e que o projeto não a influenciou em sua relação com a leitura porque ela já gostava de ler. Gardênia não se sentiu muito influenciada porque gosta de ler, apesar de ultimamente não ter encontrado tempo para isso. O terceiro sujeito que afirmou não ter sido influenciado, Crisântemo, disse não se sentir motivado exatamente por não ter ganhado nenhum livro. Isso demonstra que muitos participantes esperavam ser presenteados para, em seguida, praticarem a leitura, como é o caso de Gérbera, ao afirmar que estava muito ansiosa para ser sorteada e, com o livro ganhado, iniciar sua vida de leitora. Em um sentido diferente, alguns sujeitos, apesar de não terem sido sorteados, sentiram-se estimulados a ler com a execução do projeto. Begônia indicou que, apesar de perder o sorteio em que seria presenteada, o projeto a influenciou a ler mais, pois ela não tinha o hábito da leitura. Camélia afirmou não ter ganhado um livro, mas percebeu que o desejo de ler ficou mais forte. Já Genciana apontou que criou um bom hábito de ler, mesmo não sendo sorteada. Dessa forma, é possível perceber que o projeto conquistou leitores, independente de serem sorteados ou não, o que sugere efeitos muito positivos, pressupondo que estes sujeitos foram levados a ler com gosto (VELOSO, 2006). Ao aproveitar o apontamento de Genciana, quanto à criação do hábito de ler, ressaltase que muitos sujeitos assumiram, categorimente, estarem distantes do hábito da leitura. Magnólia afirmou que o projeto é um incentivo, já que ela não possui o hábito da leitura. No mesmo sentido, Lírio indicou que o projeto a influenciou a pensar e a começar a prática da leitura justamente por ela não ter o hábito de ler. Indicações como estas são extremamente preocupantes, uma vez que o entendimento do que se lê é desenvolvido, com mais fluência, entre aqueles que têm o hábito de leitura e diversificam as leituras realizadas (QUADROS e MIRANDA, 2009).

Mediante as inúmeras indicações apresentadas, supõe-se que o projeto “Sorteio de Livros” foi uma proposta bem sucedida para melhorar a relação entre os estudantes de pedagogia e a leitura prazerosa que estes podem consolidar durante o curso. Além disso, a ação motivou novos interesses da professora, ao melhorar sua aprendizagem docente (BOLZAN e ISAIA, 2006) e, assim, buscar novas alternativas para o seu trabalho. Entretanto, assume-se que ainda há muito a se fazer para que estes acadêmicos – e seus inúmeros colegas nos mais variados cursos de licenciatura – encontrem os caminhos da pedagogia da leitura, com o apoio dos professores do ensino superior conscientes da essencialidade de suas ações como formadores de leitores (CARVALHO, 2002).

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS A análise das influências, na prática da leitura, para os acadêmicos da licenciatura em pedagogia através do projeto “Sorteio de Livros” foi realizada e vários apontamentos podem ser feitos a partir do que foi apresentado. O principal deles concentra-se na proposição de que esta ação mostra perspectivas promissoras para incentivar a leitura entre os educadores em formação e, consequentemente, entre seus futuros educandos. Acredita-se que o despertar do interesse pela leitura, em estudantes no ensino superior, tem em sua essencialidade um potencial transformador. No caso do “Sorteio de Livros”, de acordo com as indicações dos próprios sujeitos de pesquisa, os acadêmicos e (algumas de) suas famílias foram motivados a se deliciarem com o hábito da leitura. Nesse contexto, é importante ressaltar a essencialidade da figura do professor, profissional de atuação basilar para a formação do leitor (RANGEL, 2012). É fundamental que o professor seja também um leitor ávido, para que possa florescer nos educandos, desde a infância, a aquisição do prazeroso e encantador hábito da leitura. Ao se vislumbrar o professor como um ótimo leitor, faz-se necessário destacar algumas das novas percepções que este projeto trouxe para suas idealizadoras. A professora acreditou que fosse uma leitora ávida, enquanto a aluna acreditou que fosse alguém avessa às propostas que exigem proatividade. Com a execução do “Sorteio de Livros” e toda a pesquisa que o norteou, elas descobriram, juntas, que suas crenças estavam equivocadas: a professora ainda tem um longo caminho a percorrer para se tornar uma leitora apaixonada, mas prosseguirá em sua aprendizagem docente, buscando meios de melhorar a leitura de seus pares. A aluna é especialmente proativa, apesar da trajetória a construir durante sua formação discente, para desobrigar-se de seus receios e sua timidez. Porém, é possível constatar com tranquilidade que, unidas, elas superaram os desafios na aquisição das obras, na organização

dos sorteios, na averiguação apressada dos materiais apresentados e na grande ansiedade em desenvolver uma proposta que exige tamanha responsabilidade. O êxito da proposta transpareceu na conquista de parceiros que doaram exemplares, apoiaram os momentos de encontro e conquistaram os sujeitos da pesquisa, levando-os a desenvolverem novos olhares para a leitura – diante das obras e diante deles mesmos. Logo, a ação não se limitou em sensibilizar os futuros professores para a importância da leitura, como promoveu novas visões sobre a seriedade do trabalho docente na conquista de educadores engajados na melhoria educacional. Diante disso, sugere-se que mais trabalhos sejam realizados com o mesmo propósito. Existem ações diversas que propõem a motivação à leitura entre os alunos do ensino fundamental; entretanto, poucos trabalhos sugerem ações direcionadas para o estímulo ao hábito de ler entre os professores. É preciso colocar em questão a formação do professor leitor; questioná-lo sobre as intenções das prescrições de suas leituras e o que esperam do que leem seus alunos – especialmente no ensino superior.

6. REFERÊNCIAS ALVES, R. Ostra feliz não faz pérola. São Paulo: Planeta, 2008, _______. Lições do velho professor. São Paulo: Papirus, 2013. BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 2008. BATISTA, A.A.G. A Leitura Incerta: a relação de professores(as) de português com a leitura. Educação em Revista, 27: 85 103, 1998. Disponível em: www.fundacaotidesetubal.org.br/midia/sugestao_leitura_274.pdf. Acesso em: 15 jan. 2015. BOLZAN, D.P.V.; ISAIA, S. M.A. Aprendizagem docente na educação superior: construções e tessituras da professoralidade. Educação. Porto Alegre – RS, n. 3 (60), p. 489 – 501, 2006. Disponível em: www.revistaseletronicas.pucrs.br/face/ojs/index.php/faced/article. Acesso em: 15 jan. 2015. CARVALHO, M. A leitura dos futuros professores: por uma pedagogia da leitura no ensino superior. Teias FAE-UERJ. Rio de Janeiro, ano 3, n. 5, p 7-20, jan/jun, 2002. Disponível em: www.periodicos.proped.pro.br/index.php/revistateias/article/view/93. Acesso em: 15 jan. 2015. CAVALCANTI, J. Caminhos da literatura Infantil e Juvenil: dinâmicas e vivências na ação pedagógica. São Paulo: Paulus, 2002. LAVILLE, C.; DIONNE, J. A construção do saber: manual de metodologia da pesquisa em ciências humanas. Porto Alegre: ARTMED, 1999. MORAES, R.C.L.; SOUSA, R.K.M.A. Literatura Infantil e Alfabetização. Publicação do Departamento de Ciências Humanas, Letras e Artes. Universidade Federal do Rio Grande do Norte, 2010. http://www.cchla.ufrn.br/visiget/pgs/pt/anais/artigos. Acesso em: 15 jan. 2015.

PIMENTA, S.G.; ANASTASIOU, L.G.C. Do ensinar a ensinagem. In: PIMENTA, S.G.; ANASTASIOU, L.G.C. Docência no ensino superior. São Paulo: Cortez Editora, 2002. p. 203-243. QUADROS, A.L.; MIRANDA, L.C. A Leitura dos Estudantes do Curso de Licenciatura em Química: Analisando o Caso do Curso a Distância. Química Nova na Escola. vol. 31, n° 4, 2009. Disponível em: http://qnesc.sbq.org.br/online/qnesc31_4/03-EA-7608.pdf. Acesso em: 15 jan. 2015. RANGEL, J.n.m. Leitura na escola: espaço para gostar de ler. Porto Alegre: Mediação, 3ª ed., 2012. VELOSO, R. A Leitura Literária. Educação e leitura – Actas do Seminário. Biblioteca Municipal Manuel de Boaventura, 2006, pp. 23-29.

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