Sou: Processos de criação artística e a possibilidade de uma imagem queer

July 5, 2017 | Autor: M. Costa de Souza | Categoria: Teoría Queer, Arte Contemporanea, Fotografia, Gênero E Sexualidade, Artes Visuais
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Grupo de Trabalho: 12

Sou: Processos de criação artística e a possibilidade de uma imagem queer

Milena Costa de Souza - UFPR Fabíola Oliveira - Unespar/Embap

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Sou: processos de criação artística e a possibilidade de uma imagem queer Milena Costa de Souza1 Fabíola Oliveira2 Este artigo analisa o processo de produção do trabalho de conclusão de curso de artes visuais de Fabíola Oliveira sob orientação de Milena C. de Souza. A criação da série “Sou” envolveu questionamentos sobre a produção do conhecimento em artes visuais e a representação dos corpos. O texto parte dessa experiência e desenvolve uma abordagem metodológica interseccional e queer com o objetivo de compreender como a interação de diferentes localizações sociais - gênero, sexualidade, geografia, classe, entre outras - estão relacionadas às produções de imagens e discursos. Em um segundo momento é analisada a possibilidade de se produzir uma imagem queer, os desafios envolvidos e as rupturas que uma imagem desafiadora da heterossexualidade pode evocar. Para finalizar foram apresentados os resultados do processo e criação de “Sou”. Palavras-chave: processo artístico, metodologia intersecccional e queer, sexualidades, gênero, queer.

Este artigo apresenta e discute a produção do trabalho artístico-visual “SOU” realizado em 2014 por Fabíola Oliveira e orientado por Milena Costa de Souza, como requisito para a conclusão do curso de artes visuais3. Durante o processo de construção do projeto foram colocados em diálogo a produção de imagens, referenciais artísticos e teóricos. Nas próximas linhas iremos apresentar o processo de construção artística de “Sou” e analisaremos a possibilidade de construção de uma imagem queer. Organizamos o texto com o objetivo de aproximar x leitor da nossa experiência por isso, em alguns momentos isolamos as falas em escritas em primeira pessoa. Em outras partes, a terceira pessoa reverbera as nossas conclusões e processos coletivos. Assim, o texto inicia com a análise dos referências teóricos, do processo de reflexão interseccional e da relação de Milena como orientadora do projeto. Em seguida apresentamos o depoimento de Fabíola sobre o seu processo artístico e suas referências

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Doutoranda em sociologia (UFPR), pesquisadora visitante na University of Southern California. Bolsista de doutorado sanduíche Capes, 2

Graduada em Artes Visuais (Pintura) pela Escola de Música e Belas Artes do Paraná. (Unespar/ EMBAP). 3

Fabíola Oliveira obteve em 2014 o título de bacharel em artes visuais pela Unespar.

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artísticas. Em um terceiro momento uma imagem queer é pensada no coletivo e as considerações finais realizadas.

A interseccionalidade como lugar de fala e a imagem queer (Milena Costa de Souza) O trabalho desenvolvido com Fabíola pertence a uma longa reflexão e processo de conhecimento de si. Quando iniciamos nossas conversas, as referências feministas e queer4 não faziam parte do seu repertório. Assim mesmo, ela se mostrou aberta para os conhecimentos e no processo de pesquisa encontrou os diálogos necessários para realizar seu projeto de conclusão de curso. O objetivo era produzir uma breve monografia além de uma obra plástica que participaria de uma exposição coletiva na galeria da Escola de Música e Belas Artes do Paraná (Unespar/Embab). Ainda que eu não lecione mais na instituição, aceitei o convite para a orientação. Durante nosso primeiro encontro, Fabíola colocou questões de pesquisa bastante abertas e com uma série de imagens de antigos auto-retratos. Ela me apresentou trabalhos bastante formais no sentido técnico, mas expos uma incrível vontade de experimentar novas técnicas e questionar a representação corporal binária à qual estava presa. Ela conhecia a minha pesquisa acadêmica atual e as questões que tenho levantado sobre produção artística e teoria queer, por isso viu na nossa relação uma possibilidade de ter contato com referenciais aos quais ainda não tinha acesso. Ao me perguntar sobre qual literatura e artistas se inteirar, expus a ela algumas possibilidades e mostrei as obras de diversxs artistas que falavam sobre a desestabilização dos corpos e a ruptura com o binarismo de gênero. Ao ver todas as imagens e conhecer autorxs da área ela disse: Mas eu posso adentrar esse território já que não sou queer? Surpresa respondi que falar sobre umx Outrx só teria sentido se ela se reconhecesse nessa fala para que não ocorresse a objetificação dos corpos que iria retratar. Propus uma série de questões sobre normalidade e o que isso poderia significar.

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Segundo Richard Miskolci a teoria queer surgiu nos Estados Unidos e teve desde seu inicio como objeto de análise: “a dinâmica da sexualidade e do desejo na organização das relações sociais” (2009, p.151). No mesmo sentido Jack Halberstam (1998) destaca que o termo queer permite a acomodação de diferentes práticas e críticas à heterossexualidade compulsória.

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Meu questionamento teve a intenção de desencadear um processo de pedagogia queer, como o proposto por Guacira Louro:

Uma pedagogia e um currículo queer estariam voltados para o processo de produção das diferenças e trabalhariam, centralmente, com a instabilidade e a precariedade de todas as identidades. Ao colocar em discussão as formas como o ‘outro’ é constituído, levariam a questionar as estreitas relações do eu com o outro. A diferença deixaria de estar lá fora, do outro lado, alheia ao sujeito, e seria compreendida como indispensável para a existência do próprio sujeito: ela estará dentro, integrando e constituindo o eu (2001, p. 550).

Por meio de uma série de questões sobre as experiências de vida de Fabíola, chegamos ao longo dos dois primeiros encontros de orientação a narrativas que desestabilizaram uma pretensa normalidade e a aproximaram das diferenças que a constituem enquanto sujeito. Ela relatou por exemplo, que em sua infância em uma cidade do interior seus pais eram conhecidos por serem os únicos a empregar mulheres que haviam sido trabalhadoras do sexo e como a opção pela não maternidade a colocou em uma posição de constante fiscalização social. Aos poucos ela foi se reconhecendo na desestabilização da heteronormatividade5 e sua identidade, bem como a percepção corporal, tornaram-se mais fluídas. Foi nesse momento que ela decidiu partir do seu próprio corpo para elaborar seus trabalhos, foi também quando decidimos escolher a fotografia da sua identidade como ponto de partida. Como orientadora e pesquisadora, acredito na importância do reconhecimento do lugar de fala dx artista e do fato de que toda representação é política e no pensamento crítico em relação à cultura. Politizar a representação é se dar conta de que, como bem aponta Patrick Grzanka:

no representation ever occurs in a social vacuum, and because all social interaction happens in a field of power relations, representation is like any other social process that may involve the exercise or exchange of power. We come to know and create meanings of race, gender, class, sexuality, and other dimensions of difference through representations, so intersectionality is both structural and a representational phenomenon (2014, p.132).

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Segundo Richard Miskolci, “[…] a heteronormatividade é um conjunto de prescrições que fundamenta processos sociais de regulação e controle, até mesmo aqueles que não se relacionam com pessoas do sexo oposto” (2009, p.156)

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No processo de elaboração das imagens trabalhamos com a questão da criação de representações e como o projeto da Fabíola, quando exposto, estaria propondo significados e interações. Ainda que no mundo a relação entre obra e expectador não possa ser controlada, na arte contemporânea, é x artista realizadorx da produção cultural quem define o ponto de partida do trabalho e articula, ao menos inicialmente, sua posição em relação à tradição artística e à cultura. Por isso, uma das nossas questões centrais era: Como articular as diferentes posições de sujeito e as diferenças presentes no próprio corpo da artista? Como relacionar as diferentes posições ocupadas por Fabíola em relação a gênero, sexualidade e poder e integra-las às imagens? Dessa maneira, quando convidei Fabíola a falar de si e politizar sua prática também tive a intenção de desmistificar o fazer artístico, já que reconhecer-se como artista perpassa tanto pelo aceite das regras quanto pela desmistificação das mesmas. A estética não precisa ser o “palácio de cristal do poder e conhecimento ocidentais” (GRAY, 2005), produzir imagens também é questionar as hierarquias artísticas, o campo da arte e a própria condição de artista. O interessante é que quando iniciamos o processo de orientação, Fabíola estava justamente nesse embate pessoal, pois não havia encontrado na instituição em que estudava professorxs que se consideravam aptxs a orienta-la. Ainda que tenha sido encorajada6 a procurar alternativas fora da instituição, é importante destacarmos como alguns espaços de ensino da arte são resistentes ou não provêm dos recursos para lidarem com propostas que se relacionam com as relações de gênero e sexualidades.

Sou: construindo a mim mesma em imagens (Fabíola Oliveira)

O processo de construção deste trabalho aconteceu de maneira despretenciosa. Em um primeiro momento me questionei sobre relações que estabelecia com frequência, mas que não possuíam uma base teórica nem longas reflexões formais.

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O professor Fábio Noronha, orientador geral da turma, mencionou à aluna a possibilidade de me procurar para ser sua orientadora. O interessante é que essa foi uma das primeiras vezes que uma relação do tipo se concretizou. Na banca de defesa do trabalho, Fábio fez a questão de mencionar o fato e de destacar a necessidade da instituição se abrir a novos temas e perspectivas.

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Percebi que diversas das imagens que produzia exploravam o corpo humano, especialmente o feminino. Até então pensava a minha pintura à maneira clássica, a experiência estética era o único questionamento em pauta e me concentrava no desenvolvimento das minhas habilidades para o desenho e a pintura. Assim, a reflexão sobre a construção do tema, da representação cultural do corpo e o pensamento artístico ficavam em segundo plano. Na minha imatura posição busquei na história da arte representações corporais que se relacionam às ideias que vagavam por minha mente, mas pouco encontrei devido a restrição de bibliografias, por não saber onde estava a informação. Entretanto, foi a experiência visual do cotidiano que me trouxe novos questionamentos. Um dia, ao sair de casa observei um sujeito cujo gênero - no sentido binário - não podia ser identificado. A imagem daquela pessoa me trouxe uma série de questionamentos e percebi a necessidade de um aprofundamento teórico. Uma grande inquietação tomou conta de mim, pois percebi que precisava discutir a representação corporal de outras maneiras. Na ocasião conversei com diversxs professorxs, dentre elxs Renato Torres, o qual ministrava a disciplina de desenho. Ele afirmou desconhecer a questão, mas mencionou a necessidade de uma discussão política sobre o corpo e a representação. A partir de então iniciei o processo de busca de uma pessoa que pudesse me orientar nessa jornada. Em busca de referências frequentei o Seminário Internacional Descolonizando Representações: arte, corpo e imagens dissidentes, realizado no Museu Oscar Niemeyer (MON). Ali percebi que o meu tema estava em franca discussão e que havia uma ampla possibilidade de diálogo com diversos autores. Na ocasião tive a oportunidade de retomar contato com minha ex-professora Milena Costa de Souza, a qual participava da organização do evento e fez uma fala sobre a invisibilidade de representações de sexualidades não hegemônicas nas artes visuais. Ao final do Seminário perguntei a ela se estava disposta a me orientar no meu processo de Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). Após algumas conversas o convite foi aceito. Para compreender o meu campo de discussões viajei por diversos textos e artigos de teóricxs como Paul (Beatriz) Preciado, Tereza de Lauretis, Judith Butler,

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Michel Foucault e Guacira Louro. Acredito que em um trabalho artístico essas referências não aparecem como uma citação direta, mas evidentemente contribuem para informar as práticas artísticas. Hoje, a partir da minha reflexão sobre meu processo de criação e as relações com as produções escritas, percebo a importância desses referenciais. O contato com a produção escrita e teórica abre um grande campo e possibilita ax artista “falar do seu tempo”, criar tensões e desestabilizações. Diante dessas descobertas pude me perceber como parte da história da arte e da cultura e construir a minha fala. No meu caso, esse diálogo possibilitou uma reflexão sobre a desconstrução dos binarismos como: homem/ mulher e masculino/feminino, bem como a diluição das identidades fixas. Mergulhar em referenciais da teoria queer foi, como no sentido destacado por Guacira Louro, representar: “[…] a diferença que não quer ser assimilada ou tolerada” (2001, p.546). Em paralelo às leituras ocorreu o processo de construção plástica das peças e pesquisa artística. O processo de criação partiu de uma foto de identidade 3x4 digitalizada e impressa em fine art 7. A escolha de uma impressão de alta qualidade ocorreu pelo fato da mesma suportar a intervenção da tinta acrílica. Usei o meu corpo, a minha imagem e a auto-representação para falar ao mesmo tempo de mim e do outro. Inicialmente propus um jogo com a questão da “reprodutibilidade técnica” de Walter Benjamin e reproduzi meu retrato de identidade 6 (seis) vezes. Após a reprodução realizei a intervenção com pintura, utilizei uma técnica tradicional e “devolvi” para a fotografia a sua “aura” num gesto de mimetizar um status de arte. Esse gesto também teve a intenção de me (re) imaginar em diferentes situações, estéticas e identidades visuais. O auto-retrato, ou o usar a sua imagem para representar o outro ou para se colocar no lugar do outro, demanda um exercício de profunda reflexão. Ao usar minha foto de identidade pretendi dialogar também com o conceito e a lógica de deslocamento

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A impressão fine art é um processo que utiliza pigmentos minerais em papéis de fibra de algodão ou em outras mídias de qualidade. O processo é acompanhado por técnico especializado para garantir a qualidade visual da imagem. Depois de impressa esse tipo de impressão possui alta durabilidade.

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do ready-made8 criado pelo artista francês Marcel Duchamp (1887-1968). Minha identificação com Duchamp também ocorre pelo fato dele ter se retratado travestido tanto como mulher, quanto como personagens criados por ele. Outro artista que dialoguei diretamente foi Andy Warhol (1928-1987), o qual realizou uma série de autorretratos com câmeras instantâneas polaroides. Entre xs artistas contemporânexs que usaram a auto-representação para tratar de questões que vão além do autorretrato, em que o corpo é tema e suporte ao mesmo tempo, estão Cindy Sherman (1954), Orlan (1947), Matthew Barney (1967) e Frida Kahlo (1907-1954). Cindy Sherman é uma artista norte-americana que possui fortes ligações com o questões feministas e identitárias. Assim como Frida Kahlo, ela também levanta questões sobre a marginalização das mulheres na história da arte oficial (WOOD et al., 1998, p.82). Para mim, é possível aproximar essas artistas aos já citados Duchamp e Warhol, os quais levantando questões sobre a reprodutibilidade técnica, executam o transbordamento da imagem por meio da sua incansável repetição. Assim, tendo essas referências iniciei o meu processo artístico-pessoal.

Sou: resultados do processo (Fabíola Oliveira)

Ao partir da imagem com a qual possuo o maior contato: o meu próprio rosto, pensei em como me relacionar com processos de exclusão, silenciamento e diferenças. Me relacionei tanto com a desestabilização da minha própria identidade, quanto com o reconhecimento da experiência de outrxs sujeitos. Através de mim mesma, da minha imagem eu sou elxs e elxs são eu. Os retratos foram construídos aos poucos, ao longo de diversas semanas. Cada imagem foi pensada como uma espécie de ato performático e de transformação. Durante a construção dos retratos procurei retirar a imagem da minha identidade de um lugar comum e provocar um estiramento entre eu mesma e minha “identidade”.

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O ready-made foi amplamente utilizado pelo artista Marcel Duchamp, o qual se apropriava de objetos industrializados, presentes no cotidiano e por meio do gesto de apropriação e deslocamento conferia aos mesmos o estatuto de arte.

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Parti de uma composição bastante tradicional, primeiramente por obedecer as regras de uma fotografia para documento, mas também no sentido artístico, da tradição de retratos. Nesse espaço circunscrito procurei criar uma nova dimensão na qual me encontro em “trânsito constante”.

Figura 1 - Retratos que constituem a instalação Sou Fonte: Acervo Fabíola Oliveira, 2014

A maneira como concebi a instalação das peças, colocando os retratos lado a lado, estabeleceu um jogo de alteridades onde me posiciono como, sou e me constituo como outrxs. As imagens possuem padrões compositivos que permitem o diálogo umas com as outras através de cores e traços da imagem original como por exemplo, bolas brancas da fotografia de identidade - as quais compõem originalmente perfurações que formam letras - e a marca d’água realizada pelo órgão expedidor. Como as cores que incorporei à imagem eram pensadas à medida que cada retrato ia acontecendo, cada imagem acabada pedia a revisão da anterior e a manutenção de um diálogo. O resultado final foi um conjunto de seis módulos que constituíram uma instalação.

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Figura 2 - Instalação Sou na galeria da Embap/Unespar. Curitiba, 2014 Fonte: Acervo Fabíola Oliveira, 2014

Possibilidades de pensar uma imagem queer (Milena Costa de Souza)

Tendo como referência o trabalho final e o processo de construção descritos por Fabíola Oliveira, algumas possibilidades são evocadas. Primeiramente destaco a orientação que construímos, durante a qual prática artística, experiência de vida e referenciais teóricos se encontraram de forma reflexiva. Juntas estabelecemos um diálogo baseado nas possibilidades das incertezas e na busca de referenciais artísticos questionadores das representações binárias de gênero. Exercitamos uma pedagogia queer (LOURO, 2001) em busca da produção de imagem e conhecimentos mais livres e para nos posicionarmos de maneira crítica em relação a história da arte ocidental e representações tradicionais. Um segundo ponto a ser analisado é a imagem no mundo e suas potencialidades. No caso da artista, a produção aqui descrita foi realizada como requisito de conclusão de curso de graduação e isso merece destaque tendo em vista a presença tímida do estudo de representação de gênero e/ou de sexualidades no ensino, crítica e

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historiografia da arte no Brasil. O desejo de compreender fez com que a então aluna, fosse em busca de referências além daquelas disponíveis no espaço institucional em que estava inserida, buscando construir novas pontes. Isso evoca algo interessante no sentido da crítica da produção do conhecimento e como nós que participamos das instituições de ensino podemos manter a posição crítica e uma reflexão em consonância com problemas contemporâneos. Ao mesmo tempo evoca também a necessidade de uma maior abertura entre departamentos e disciplinas no sentido transdisciplinar. Nesse sentido a nossa experiência revela como a ruptura entre essas fronteiras é fundamental quando pensamos na produção de uma imagem queer. Metodologia, epistemologia e prática não podem ser dissociadas e se uma das principais questões do queer é romper as estruturas binárias, então vida, arte e produção acadêmica também precisam ser percebidas como relacionais. A potencialidade de uma imagem queer está, entre outras coisas, no fato de permitir discussões que vão além das formalidades plásticas e das qualidades artísticas. Ao mesmo tempo desafia, do interior do próprio campo da arte, uma narrativa fixa, de corporalidades baseadas em identidades estáveis e naturais. A imagem queer, como Fabíola Oliveira demonstrou, abre espaço para nos repensarmos em nossas representações e nos deslocarmos para outros corpos. Em Undoing gender (2004) Judith Butler fala sobre essas possibilidades de alteridades destacando o movimento de reconhecimento e desestabilização de si pelo encontro com outrxs: “[…] we’re undone by each other. And if we are not, we’re missing something” (BUTLER, 2004, p.23).

Considerações finais

Falar sobre projetos artísticos que caminham em territórios instáveis é produzir uma nova teoria, é também transbordar premissas e geografias fixas. Acreditamos que o processo de produção de um objeto artístico está envolto em relações institucionais, experiências pessoais e ganha interpretações distintas de acordo com referências específicas sobre arte. Portanto, o encontro de pares dentro e fora da academia contribuem de maneira decisiva para o interesse de produção de pesquisas e projetos

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em novos campos da arte. Nossa trajetória nos fez perceber como uma metodologia interseccional e queer está diretamente ligada à diluição de hierarquias tanto no campo da palavra quanto da imagem.



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REFERÊNCIAS

BUTLER, Judith. Undoing Gender. Nova Iorque: Routledge, 2004.

LOURO, Guacira. Teoria Queer - Uma política pós-identitária para a educação. Estudos feministas, Florianópolis, p.541-553, 2001.

GRAY, Herman S. Cultural Moves: African Americans and the politics of representation. Berkeley: University of California Press, 2005.

GRZANKA, Patrick. Intersectionality: a foundation and frontiers reader. Boulder: Westview Press, 2014.

HALBERSTAM, Jack. Female Masculinities. Durham: Duke University Press, 1998.

MISKOLCI, Richard. A teoria queer e a sociologia: o desafio de uma analítica da normalização. Sociologias, Porto Alegre, ano 11, n.21, p.150-182, jan./jun. 2009.

WOOD, Paul; FRASCINA, Francis; HARRIS, Jonathan. Modernismo em disputa: a arte desde os anos quarenta. São Paulo: Cosac&Naify, 1998.

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