SPOILER ALERT!:UMA PESQUISA QUANTITATIVA SOBRE O CONSUMO DE SPOILER DE FICÇÃO SERIADA TELEVISIVA 1

May 27, 2017 | Autor: Thaiane Oliveira | Categoria: Narrative, Narratology, Storytelling, Series TV, Spoiler
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SPOILER ALERT!:UMA PESQUISA QUANTITATIVA SOBRE O CONSUMO DE SPOILER DE FICÇÃO SERIADA TELEVISIVA1 Thaiane OLIVEIRA, (UFF)2 Melina MEIMARIDIS, (UFF)3 Caio MELO DA SILVA, (UFF)4 Resumo: Esse artigo é uma pesquisa quantitativa sobre os modos de consumo de spoilers, tendo como foco a ficção seriada. Para tanto, foi aplicado um questionário misto, a fim de compreender de que maneira a reconfiguração sobre os modos de consumo de produções audiovisuais seriadas tem influenciado os processos de circulação e consumo de spoilers. Assim, esta pesquisa se subdividirá nas seguintes ênfases: a relação entre produção e consumo de spoilers em múltiplas plataformas; o consumo voluntário e involuntário de spoilers e tipologias possíveis; estética do spoiler e as reações emocionais de seus consumidores. Palavras-chave: Spoilers; Consumo; Ficção Seriada; Recepção Abstract/Resumen: This article is a quantitative research concerning the consumption patterns of spoilers, focusing on television serial fiction. Thus, a mixed survey was applied in order to understand how the reconfiguration of consumption practices of serial audiovisual productions have influenced the circulation and consumption of spoilers. In this way, this research was divided according to the following emphases: the relationship between production and consumption of spoilers on multiple platforms; voluntary and involuntary consumption of spoilers and possible typologies; spoiler's aesthetics, and the emotional reactions of its consumers. Keywords/Palabras clave: Spoilers; Consumption; Television Series; Reception Studies

INTRODUÇÃO

“Nos dias atuais, os spoilers se tornaram uma valiosa moeda de troca ou um meio de retaliação” (entrevistado 1645)

Nos últimos anos o consumo de ficção seriada tem sido marcado por uma disputa dicotômica: o embate entre os fãs que consomem e produzem spoilers e os que evitam a todo custo o paratexto. Spoilers, que podem ser definidos como “o adiantamento de uma peça do roteiro fora da ordem original” (MEIMARIDIS, DOS Trabalho apresentado ao Grupo de Pesquisa SÉRIECLUBE, durante a II Jornada Internacional GEMInIS, na Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, de 17 a 19 de maio de 2016. 2 Professora adjunta do departamento de Estudos Culturais e Mídia e do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal Fluminense [email protected] 3 Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da Universidade Federal Fluminense. Coordenadora adjunta do grupo de pesquisa Série Clube. [email protected] 4 Graduando de Estudos de Mídia da Universidade Federal Fluminense, voluntário dos projetos Série Clube, Asian Club e do P³, também da UFF, e estagiário do Núcleo de Mídia da Escola de Engenhaia da UFF. [email protected] 1

SANTOS, OLIVEIRA 2015, p.18), têm sido cada vez mais difíceis de evitar, uma vez que os fãs frequentemente debatem os acontecimentos mais recentes de suas séries favoritas nas mídias sociais, tornando espaços como o Twitter e o Facebook em um verdadeiro campo minado. Apesar da aparente dicotomia, é culturalmente aceito que spoilers comprometem a experiência de consumir uma narrativa (JOHNSON & ROSENBAUM, 2014; REDMON, 2015). Nesse sentido, acredita-se que spoilers “estragam” o consumo da obra, e portanto, os indivíduos não gostariam deles (GRAY & MITTELL, 2007). Entretanto, recentemente, inúmeros pesquisadores vêm buscando outras perspectivas problematizando a questão da recepção de spoilers. Jon Lachonis e Amy Johnston indicaram dois tipos diferentes de fãs de Lost (ABC, 2004-2010), os "spoilerphobes" que evitam spoilers a todo o custo e os "spoilerholics" que sentem prazer em saber detalhes antes do episódio ir ao ar (2008, p. 30). Similarmente, Meimaridis et al (2015), ao analisarem a repercussão de um spoiler de Grey’s Anatomy (ABC, 2005-Presente) no Twitter, indicaram a presença de fãs de spoilers no fandom da série, e propuseram a existência de nuances mais complexas do que apenas uma recepção positiva e negativa. Apesar da complexidade em torno da questão, a maior parte da bibliografia ainda reflete uma visão negativa do fenômeno. Porém, estudos recentes que se utilizam de análises quantitativas e qualitativas têm indicado outras possíveis relações com o paratexto. Nesse seguimento, esse artigo se propõe a investigar os modos de consumo de spoilers por parte dos fãs brasileiros, através de uma pesquisa quantitativa, com base em um modelo de aplicação de questionário misto, composto por perguntas abertas e fechadas. Para atingir os objetivos propostos, o artigo começa com um breve levantamento bibliográfico da questão da produção e circulação de spoilers. Em seguida, apresenta-se o desenho metodológico aplicado. A discussão retoma os apontamentos feitos pela bibliografia, e corrobora dois principais achados. Primeiro, a existência de fãs de spoilers (GRAY & MITTELL, 2007; MEIMARIDIS, DOS SANTOS, OLIVEIRA, 2015) e segundo, identifica a função preparatória dos spoilers (HASSOUN, 2013), nas falas dos entrevistados. Sugerimos também, que além da função preparatória, o consumo de spoilers pode contribuir para gerar curiosidade no espectador, alimentando

sua ansiedade. Ao mesmo tempo, eles também servem como uma moeda de troca entre os fãs, podendo inclusive ser usado como forma de um fã se vingar de outro. Dessa forma, spoilers se tornam um poderoso recurso tanto para os criadores das séries, que podem usá-los como “isca”, quanto para os fãs das séries, como a fala do entrevistado demonstra na epígrafe desse texto. A INVASÃO DOS SPOILERS Por muitos anos, a ideia de que o consumo de spoilers poderia ser prazeroso era praticamente inconcebível; é culturalmente aceito que ao receber informações prévias de uma narrativa, a experiência do leitor seria prejudicada (HASSOUN, 2013, p.349; REDMON, 2015, p.1). Porém, o preconceito em torno dos spoilers pode ser ilusório, uma vez que considera que os fãs consomem textos, bem como se relacionam com eles, de uma única forma, quando, na realidade, a relação entre texto e leitor é extremamente complexa (HALL, 1980). Impulsionados por novas perspectivas nos estudos de mídia e de fãs, alguns autores têm nos últimos anos, problematizado a questão do consumo de spoilers, abordando o paratexto, através de estudos de recepção, pesquisas qualitativas e qualitativas (BAYM, 2000; GRAY & MITTELL, 2007; HASSOUN, 2013). Para começar a problematizar a questão do consumo, produção e circulação de spoilers de séries ficcionais televisivas, devemos primeiro ressaltar o panorama atual da prática. Antigamente encontrávamos que a principal razão para a produção de spoilers se encontrava em uma disparidade temporal. Nesse sentido, Jenkins (2008) afirma que "o spoiling surgiu do desencontro entre as temporalidades e geografias de velhos e novos meios de comunicação" (p.59). Notamos que esse desencontro ocorre até os dias atuais, nos Estados Unidos e no restante do mundo. Devido à extensão territorial americana, algumas séries possuem uma diferença de três horas de exibição entre a costa oeste e a leste. Já no âmbito global, as séries podem levar desde algumas semanas, até meses para serem exibidas, muitas vezes só chegando aos mercados estrangeiros após serem finalizadas na televisão americana. Apesar de ainda existir a disparidade nas temporalidades, encontramos que graças à internet e às mídias sociais, ela pode ocorrer em um intervalo muito menor de tempo. Muitas vezes enquanto um programa de televisão está sendo exibido nos Estados Unidos, fãs ao redor do mundo acompanham online a transmissão do episódio. Outros,

porém, após o término da exibição, vasculham a internet por links de streaming ou de download ilegais. No Brasil, dependendo da série, horas após a exibição, já circulam nas redes versões legendadas do episódio. No Facebook, a página de fãs de Grey’s Anatomy “You’re My Person”5, começou em 2016 a postar os episódios completos em sua timeline, minutos após sua transmissão na televisão americana. Assim, a internet não só possibilitou uma maior acessibilidade a esses conteúdos, mas também vem proporcionando espaços para esses fãs comentarem acerca desses objetos culturais (SCHIRRA, SUN, BENTLEY, 2014). Nesse processo, a prática de produzir spoilers tem se popularizado enquanto fãs comentam sobre os últimos acontecimentos das séries online. Assim, parece inevitável no cenário midiático atual, entrar em contato com spoilers de séries ficcionais televisivas. Devido a essa inevitabilidade recente, a questão da recepção de spoilers tem chamado atenção de pesquisadores, os quais têm complexificado a visão negativa em torno desse paratexto. Gray e Mittell (2007), em um dos primeiros estudos quantitativos envolvendo spoilers, identificaram que os fãs de Lost se relacionavam de formas distintas com os spoilers. Alguns fãs os evitavam, enquanto outros buscavam freneticamente por qualquer informação sobre os desfechos da série. Meimaridis et al (2015), através de uma análise de tweets envolvendo Grey’s Anatomy identificaram uma pequena,

porém

significativa

porcentagem

de

fãs,

que

também

buscavam

intencionalmente spoilers online, enxergando essa atividade como prazerosa. Além de associações prazerosas com spoilers, alguns autores têm atribuído funções distintas ao paratexto. Hassoun (2013), ao realizar um estudo envolvendo o consumo de spoilers em narrativas gráficas, argumenta que o paratexto possui inúmeras funções podendo satisfazer a curiosidade dos fãs e intensificar a antecipação pela próxima edição. Já Gray e Mittell indicam que para alguns fãs consumir spoilers permitia a eles prestarem mais atenção durante a exibição do episódio. Nesse sentido, pode-se argumentar que spoilers possuiriam uma função preparatória, condicionando o espectador para receber a narrativa. Considerando o estágio inicial do estudo de spoilers e o tremendo potencial analítico ainda não mapeado, torna-se necessário uma maior problematização da 5

https://www.facebook.com/youremyperson/?fref=ts

questão tendo em vista aspectos mais amplos sobre a recepção. Quais são as relações que os sujeitos têm com a prática de spoilers? Há, de fato, uma aversão à produção de spoilers? O que motiva as pessoas a produzir e compartilhar spoilers? Há diferenças nos modos de consumo? Tendo isso em vista, a proposta deste artigo foi de investigar os circuitos de produção e consumo de spoilers, buscando compreender as dinâmicas sociais envolvidas nesse processo, através de uma pesquisa quantitativa, da qual abordaremos a seguir. O CONSUMO DE SPOILERS: UMA ANÁLISE QUANTITATIVA Para buscar entender o processo de circulação, de consumo e produção de spoilers, tomamos como procedimento metodológico a aplicação de um questionário misto, composto por perguntas abertas e fechadas. Este survey foi distribuído no Facebook em grupos de fãs de produções audiovisuais seriadas, de diferentes formatos e gêneros, buscando atingir um público amplo e obter o mais grau de variabilidade da amostra. Ao total, foram coletadas 1804 respostas validadas. A partir disso, foi feito uma preparação para o tratamento dos dados e execução da análise a partir de uma amostragem aleatória sistematizada em 1/30, com margem de erro em 5% e 95% de confiabilidade, resultando em uma amostra composta por n=317. Em um primeiro momento, fizemos uma análise do perfil dos respondentes compostos pela amostra selecionada, encontrando os seguintes resultados: Nossa amostra foi composta por 219 respondentes do sexo feminino (69%) e 98 do sexo masculino (31%). A idade mínima foi de 11 anos e a máxima de 62, tendo a moda em 21 anos, com 37 (11,6%) ocorrências e média de 21, 96. 149 (47%) respondentes apenas estudam, enquanto 68 (21,45%) dividiam o seu tempo entre estudo e trabalho, 66 (20,8%) trabalham formalmente, sendo 25 (7,5%) pessoas com horários flexíveis. Apenas 08 (2,5%) pessoas afirmaram trabalhar informalmente e 26 (8,2%;) disseram estar desempregados atualmente.

Fig 01: Gráfico sobre a ocupação da amostra n=317

Este enfoque tinha inicialmente, interesse em tentar estabelecer uma relação entre ocupação e o tempo disponível para dedicar-se ao consumo de séries. Evidentemente, por se tratar de um estudo quantitativo, tal investigação é muito rasa, não nos fornecendo nenhuma possibilidade de uma investigação mais profunda. Em relação ao tempo dedicado ao consumo de séries, entre as respostas totais, 41,9% (133 respondentes) afirma dedicar-se entre 1 a 2 horas por dia.

Fig 02: Gráfico de Tempo de consumo de séries por dia medida em horas

Buscando conhecer um pouco mais sobre o perfil da nossa amostra, percebemos que a maioria afirma não estar em dia com suas séries preferidas. Ao total, 195 respondentes afirmaram não estar em dia, representando 61,5% da amostra n=317. Destes, apenas 25% (49 respondentes) afirmou não se sentir culpado por não estar atualizado em relação aos últimos episódios lançados da produção audiovisual seriada da qual acompanham, conforme mostra no gráfico abaixo, a partir da seleção dos respondentes que apontaram não estar em dia com a série favorita.

Fig 03: Gráfico gerado a partir da seleção dos respondentes que apontaram não estarem atualizados em relação aos últimos lançamentos de episódios das séries que acompanham

Ainda, buscando articular com os modos de consumo de spoilers com a forma com que os sujeitos consomem os produtos audiovisuais seriados, foi perguntado como os respondentes acompanham suas séries, oferecendo escolha múltiplas. 271 apontaram que acompanham séries via Streaming, por sites como Netflix, HBO Go, Popcorn Time, entre outros. Apenas 12 respondentes assinalaram que acompanham suas séries através de sites não oficiais que disponibilizam episódios online ilegalmente. 167 apontaram que preferem fazer downloads. 89 afirmaram que preferem acompanhar de acordo com a grade televisiva, sendo apenas quatro através dos canais de televisão aberta. Se segmentarmos a pesquisa, buscando conhecer o perfil de quem afirma estar atualizado com os últimos episódios das séries audiovisuais que costumam acompanhar, 100 deles afirmam assistir as produções via Streaming, 38 pela televisão (sendo apenas um pelos canais de TV aberta), 54 via download e 10 online, em sites não-oficiais. Evidentemente, é necessário verificar se, dentre esses 100 respondentes que afirmaram estar em dia com suas séries favoritas e que assistem via Streaming, se estas são produções das próprias empresas, como Netflix, questão que não é possível responder através dessa metodologia aplicada. Ainda que a aplicação de uma pesquisa quantitativa não nos fornece subsídios para aprofundar em certas questões, pode nos oferecer caminhos possíveis de investigação, abrindo oportunidades de surgimento de outros desdobrametos que poderão ser aprofundadas futuramente em metodologias mistas.

SPOILING EM NÚMEROS Após o conhecimento do perfil do público que participou desta pesquisa, buscamos dividir as questões em três blocos principais de perguntas, a fim de poder investigar todo o processo de circulação de spoilers, levando em consideração, inclusive, diferentes formas de se consumir e produzir spoilers, em situações distintas. Assim, os blocos temáticos se firmaram em três categorias principais: consumo voluntário de spoilers; consumo involuntário de spoilers; e produção de spoilers. Perguntados se consideravam-se consumidores de spoilers, 60% informou que não e 36% apontou que sim. Contudo, esta afirmação não condiz com as respostas das perguntas sobre os respondentes sobre costumarem a ler informações sobre as séries, no qual 262 (83%) afirmaram que sim, conforme mostra no gráfico abaixo:

Fig 04: Gráficos comparativos sobre consumidores de spoilers

Em que medida faz com que a leitura de certas informações sobre as séries não sejam relevantes para os sujeitos se considerarem consumidores voluntários de spoilers? Seriam informações relevantes para a narrativa ou paratextos que complementem informações sobre as produções? Essa ambiguidade interpretativa revela a dificuldade existente em uma definição clara do que é um spoiler. Em certa medida, essa definição perpassa questões subjetivas e gosto pessoal. Nesse sentido, para alguns fãs, spoilers podem ser qualquer informação relativa a produção, enquanto para outros são apenas as informações pertinentes a desfechos narrativos. A partir dessas questões, estruturamos uma pergunta de múltipla escolha que tinha como objetivo conhecer o tipo de informação sobre séries as pessoas buscavam na internet.

Fig. 05: Que informações os consumidores buscam?

De acordo com o resultado desta pesquisa, os fãs buscam na internet os mais diversos conteúdos sobre as ficções seriadas televisivas. Na grande maioria, procuram informações relativas aos personagens e sobre os atores. Assim, pudemos observar que informações complementares à narrativa ou ao universo diegético da produção audiovisual, como referentes aos personagens ou aos próximos acontecimentos de uma trama, estão entre as principais escolhas dos consumidores voluntários de spoilers. Há de ressaltar, ainda, que a opinião de outros fãs é mais representativo do que a opinião dos produtores e diretores da série, pois diz respeito a um reconhecimento e legitimação através do gosto. Nesse sentido, o ato de acompanhar uma série deixa de ser apenas um consumo do episódio exibido, e sim a junção de inúmeros textos e informações que complementam a experiência do consumo da série. Perguntados sobre os motivos que os levava a procurar mais informações sobre as séries, os respondentes apontaram que a curiosidade e a ansiedade eram umas das principais razões que os tornavam consumidores voluntários de spoilers, conforme se observa na nuvem de palavras geradas a partir das respostas abertas dos entrevistados, corroborada pelo gráfico referente ao sentimento sobre o consumo voluntário de spoilers no momento do ato.

Fig 06: Nuvem de palavras e ocorrências de sentimentos sobre o consumo voluntário de spoilers

32% ressaltaram sentimentos negativos, como frustração, raiva e tristeza e 23,3% sentimentos positivos, como alegria, felicidade, prazer ou satisfação. A curiosidade, elemento referente a competências endonarrativas, como matrizes interacionais que são competências sensório-cognitivas e afetivas da ordem do intérprete não instauradas na obra em si, mas latente na inter-relação entre o interator e a obra. Ainda que não seja possível atribuir uma valência, podemos defender que a curiosidade é provocada através de lacunas da própria narrativa que permitem que seu interator identifique e antecipe as ações do eixo narrativo (BARONI, 2006; LEAVITT & CHRISTENFELD, 2013). Se diz respeito à ordem do intérprete, podemos sugerir que esta possui uma relação direta com a própria escolha do consumidor, por se tratar de um consumo voluntário de spoiler. Porém, quando perguntados sobre os sentimentos ao consumir involuntariamente spoilers, a curiosidade também esteve entre os principais resultados de maior ocorrência, ficando atrás de sentimentos de valência negativa como raiva e frustração.

Fig 07: Gráfico de sentimentos sobre o consumo involuntário de spoilers

Ainda assim, apesar dos sentimentos negativos em relação ao consumo involuntário de spoilers, 38% afirmou não se incomodar com o paratexto quando não solicitado, o que relativiza afirmações precipitadas de que spoilers são indesejáveis (JOHNSON & ROSENBAUM, 2015), corroborando com pesquisas qualitativas anteriores de que há distintas dinâmicas sociais relacionadas ao fenômeno.

Fig 08: Você se incomoda com spoilers?

Entre tais dinâmicas, o polo emissor é um dos fatores que permitem a variação de sentimentos em relação ao consumo de spoilers.

Fig09: Quadro comparativo entre os locais que costumam consumir spoilers

Como pudemos observar, as interações sociais são as principais razões para um consumo involuntário de spoilers. Tais dinâmicas dizem respeito a uma sociabilidade estruturada através do consumo, que pode ser compreendido como uma instância privilegiada para se pensar sobre as experiências individuais e coletivas na contemporaneidade. Se entre as redes de sociabilidade em geral se localiza a circulação de spoilers, o que motiva o fornecimento do paratexto em uma conversa entre amigos?

O que motiva os sujeitos a fornecerem e compartilharem spoilers em uma conversa informal ou em seus perfis em sites de redes sociais? Buscando entender essas questões, foi perguntado se costumam fornecer spoilers. 46% respondeu que às vezes, 12% respondeu que sim e 42% disse que não possuem o hábito de compartilhar esse tipo de informação. Dentre as 190 pessoas que afirmaram fornecer spoilers, as conversas informais foram as situações de maior ocorrência, conforme mostra no gráfico abaixo.

Fig 10: Onde costumam compartilhar spoilers?

Em seguida, pedimos que os produtores pudessem elaborar o porquê de tal ato. Entre os produtores de spoiler que responderam a esta segunda pergunta (125), se encontravam: os politicamente corretos, os que fazem por vingança, os que fazem de maneira não intencional, os que fazem para convencer amigos de assistirem tal série ou episódio e os que fazem para comentar sobre o episódio assistido. Conforme mostra o gráfico abaixo, grande parte dos produtores dá spoiler involuntariamente – ou seja, “sem querer” – ou é politicamente correta – pessoas que apenas fornecem o paratexto quando são requeridas.

Fig 11: Gráfico sobre os motivos de fornecerem spoilers

Como pudemos observar também, o spoiler serve como um instrumento de sociabilidade, quando fornecido de maneira não-intencional. Como parte de dinâmicas sociais de compartilhamento e estratégia de convencimento para os amigos partilharem do mesmo gosto, o spoiler pode ser compreendido como um importante elemento de um ecossistema comunicacional contemporâneo que vem apresentando reconfigurações sobre os modos de consumo a partir das transformações da audiência. É nesse sentido que se estabelece dinâmicas pautadas em capital social e simbólico, como por exemplo, o fornecimento de spoilers por vingança ou a partir de uma noção politicamente correta de só liberar a informação quando solicitado, representando formas de sociabilidade próprias da cultura digital. Evidentemente, esses são alguns apontamentos iniciais que precisam ser aprofundados em questões posteriores que nos permita compreender melhor sob quais aspectos essas dinâmicas sociais vem sido construídas a partir do consumo de spoilers. CONSIDERAÇÕES FINAIS Considerando que vivemos atualmente na chamada “Cultura das Séries” (SILVA, 2014), a prática da produção e do consumo de spoilers tem se popularizado. Apesar da bibliografia refletir, principalmente, um relacionamento negativo por parte da audiência com o paratexto, alguns estudos recentes têm apontado nuances mais complexas do que apenas uma recepção negativa ou positiva. Tendo isso em mente, realizamos um estudo quantitativo através de um questionário misto, composto por perguntas abertas e

fechadas, na tentativa de esmiuçar as razões que levam o espectador a consumir e/ou produzir spoilers. Dessa forma, esse trabalho buscou proporcionar evidencias empíricas que demonstrassem a complexidade por trás da relação entre espectador e spoiler. Realizamos uma análise a partir de uma amostra de n=317, com margem de erro em 5% e 95% de confiabilidade. Nossos resultados refletem que a definição do que pode ser considerado um spoiler é extremamente variável, para uns sendo qualquer informação acerca da produção, enquanto para outros são apenas informações envolvendo desfechos narrativos. Essa variação faz com que um indivíduo que diz não consumir spoilers consuma paralelamente outras informações sobre a série online. Quando perguntados sobre os motivos que os levam a consumir informações sobre as séries, os respondentes identificaram os sentimentos de curiosidade e ansiedade como as principais razões que os transformavam em consumidores voluntários de spoilers. Assim, corroboramos os estudos que indicam a função preparatória dos spoilers, uma vez que eles servem para preparar o espectador para o consumo da narrativa, alimentando sua curiosidade. Apesar da nossa amostra refletir a recepção negativa de spoilers, tendo 56% afirmando se incomodar com o paratexto, encontramos também que 38% afirmou que não se incomoda, dessa forma corroborando as pesquisas qualitativas anteriores que indicam engajamento positivo com spoilers. Observamos que as interações sociais são as principais razões para o consumo involuntário de spoilers. Encontramos que muitos dos respondentes afirmaram receber spoilers de seus amigos, através de conversas informais ou até mesmo, pela postagem de spoilers nas redes sociais. Quando perguntados se fornecem spoilers, 12% respondeu que sim e 46% diz só fornecer as vezes. Buscamos por fim, esmiuçar as razões por trás do fornecimento de spoilers e encontramos que muitos afirmaram dar spoilers “sem querer” ou apenas quando solicitados. Entretanto, pudemos identificar outros que fornecem spoilers como forma de se vingar de outro indivíduo. Essa última razão tem se popularizado nos últimos anos, e pode ser evidenciada na prática comercial do site spoilerstore.net6. O site oferece um serviço de envio de spoilers através do pagamento de uma taxa de R$3 reais por email 6

https://www.spoilerstore.net/

ou R$15 reais pelo correio. Nota-se, contudo, que o indivíduo que solicita o envio não escolhe qual spoiler será enviado, apenas seleciona a série. Tendo em mente os achados desse trabalho argumentamos que os spoilers possuem funções positivas para o consumo narrativo. Ademais, identificamos que o paratexto pode ser um mecanismo narrativo poderoso incitando e gerando curiosidade no espectador. Paralelamente, o paratexto influencia dinâmicas de sociabilidade entre os espectadores. Tais resultados apontam para um fenômeno de grande potencial para ser explorado em pesquisas futuras, abrindo um leque de investigações que dizem respeito a uma nova configuração da audiência. REFERÊNCIAS

BARONI, R. La Tension narrative: suspense, curiosité et surprise. Paris, Seuil, 2006 BAYM, N. K. Tune in, log on: soaps, fandom, and online community. London: Sage, 2000. GRAY, J, & MITTELL, J. Speculation on spoilers: lost fandom, narrative consumption, and rethinking textuality. Particip@tions 4(1), p. 1-35, 2007. HALL, S. "Encoding and Decoding in TV-Discourse." In HALL, S. (Ed)., Culture, Media, Language. London, p.128-138, 1980. HASSOUN, D. Sequential outliers: The role of spoilers in comic book reading. In: Journal of Graphic Novels and Comics, 4(2), p. 346-358, 2013. JENKINS, H. Cultura da convergência. Aleph, 2008. JOHNSON, B. K.; ROSENBAUM, J. E. Spoiler Alert Consequences of Narrative Spoilers for Dimensions of Enjoyment, Appreciation, and Transportation. Communication Research, vol. 42(8) p.1068–1088, 2015. LACHONIS, J.; JOHNSTON, A. Lost ate my life: The inside story of a fandom like no other. ECW Press, 2008. LEAVITT, J, D., & CHRISTENFELD, N.J. S. Story Spoilers don’t spoil stories. In: Psychological Science, 22(9), p. 1152-1154, 2011. LEAVITT, J, D., & CHRISTENFELD, N.J. S. The Fluency of Spoilers: Why giving away endings improves stories. Scientific Study of Literature, v. 3, n. 1, p. 93-104, 2013 MEIMARIDIS, M., DOS SANTOS, M. A., OLIVEIRA, T. M. Da frustração ao Entusiasmo: Uma análise da relação entre fãs e spoilers no Twitter. Culturas Midiáticas, v.8, n.2, p. 16-31, 2015. REDMON, A. H. ‘After Everything I’ve Seen…’: Rewatching Shutter Island as a Knowing Audience. Adaptation, p. 1-14, 2015. SCHIRRA, S, SUN, H., & BENTLEY, F. Together alone: motivations for live-tweeting a television series, to appear in Proc CHI. ACM Press, p. 2441-2450, 2014. SILVA, M. V. B. Cultura das séries: forma, contexto e consumo de ficção seriada na contemporaneidade. Galaxia, n. 27, p. 241-252, jun. 2014.

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