Subsídios para uma proposta de monitoramento dos meios aquático continental e aquático marinho, atmosférico e terrestre.

June 4, 2017 | Autor: Rui Cs | Categoria: Environmental Monitoring
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Subsídios para uma Proposta de Monitoramento Ambiental dos Meios Aquático Continental e Aquático Marinho, Atmosférico e Terrestre

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Gustavo Krause Gonçalves Sobrinho Ministro do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal Eduardo Martins Presidente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis Celso Martins Pinto Diretor de Incentivo à Pesquisa e Divulgação José Silva Quintas Coordenador do Programa de Divulgação Técnico-Científica e Educação Ambiental Maria Luiza Delgado Assad Coordenadora de Divulgação Técnico-Científica

As opiniões expressas bem como a revisão do texto são de responsabilidade dos autores.

Edição IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis Diretoria de Incentivo à Pesquisa e Divulgação Departamento de Divulgação Técnico-Científica e Educação Ambiental Coordenadoria de Divulgação Técnico-Científica SAIN Avenida L/4 Norte, s/n 70800-200 - Brasília-DF Telefones:(061) 316-1191 e 316-1222 Fax: (061) 226-5588 e-mail: [email protected] http://www.ibama.gov.br Brasília 1998 Impresso no Brasil Printed in Brazil

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Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis Diretoria de Incentivo à Pesquisa e Divulgação

Subsídios para uma Proposta de Monitoramento Ambiental dos Meios Aquático Continental e Aquático Marinho, Atmosférico e Terrestre Miriam Laila Absy

José Galizia Tundisi Luis Roberto Tommasi V. W. J. Kirchoff Rui Cerqueira

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Série Meio Ambiente em Debate, 20 Documento composto de um termo de referência e de quatro diagnósticos sobre o meio ambiente aquático continental, aquático marinho, atmosférico e terrestre para subsidiar a proposta de implantação de uma rede de estações referenciais e/ou transectos de monitoramento ambiental - REMA, desenvolvida pela Divisão de Desenvolvimento de Tecnologias Ambientais - DITAM, do IBAMA. Equipe Técnica do Projeto Rede Consorciada de Estações Referenciais e/ou Transectos de Monitoramento Ambiental : Coordenadora Miriam Laila Absy Técnicos Cirineu Jorge Lorensi Vandite Suely D. Guimarães Leonam Xavier Gomes Oscar Cardoso de Paula

Preparação dos originais Vitória Rodrigues Diagramação Luiz Claudio Machado Capa Paulo Luna Criação, arte-final e impressão Divisão de Divulgação Técnico-Científica - DITEC

ISSN 1413-2583 S941s

Subsídios para uma proposta de monitoramento dos meios aquático continental, aquático marinho, atmosférico e terrestre. / Miriam Laila Absy, José Galízia Tundisi, Luis Roberto Tommasi, Volker W. J. Kirchoff. — Brasília: Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, 1998. 116p. (Série Meio Ambiente, no. 20) Inclui bibliografia. 1. Monitoramento ambiental . 2. Recursos hídricos 3. Mar. 4. Terra. 5. Atmosfera. 6. Brasil 7. Biomonitoramento. 8. Rede de Monitoramento Ambiental. I. Tundisi, José Galísia. II. Tommasi, Luis Roberto. Kirchoff, Volker W. J. IV. Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis. V. Série. CDU 556.18

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Em 1995 implantou-se uma nova série de publicações à qual chamamos de Série Meio Ambiente em Debate, com o objetivo claro de possibilitar aos pesquisadores, aos técnicos e estudiosos da área ambiental uma rápida troca de informações e experiências, visando assegurar o conhecimento oportuno dos trabalhos realizados nessa área. Para cumprir a finalidade de difundir com rapidez estudos, pesquisas e trabalhos técnicos na esfera da questão ambiental, optou-se por um processo editorial despojado que exigisse um mínimo de tempo e custos gráficos-editoriais para efetivação da Série. É pois, com satisfação e otimismo que o IBAMA, através de sua Diretoria de Incentivo à Pesquisa e Divulgação, apresenta mais um número da Série Meio Ambiente em Debate.

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Resumo

Neste projeto para implantação de uma Rede Consorciada de Estações Referenciais e/ ou Transectos de Monitoramento Ambiental foram apresentadas as bases conceituais para o monitoramento, discutidos os problemas metodológicos, técnicos e de articulação necessária para a sua implantação e operacionalização. Descritos os laboratórios-padrão mínimo e os laboratórios de referência e de grande porte necessários para o funcionamento do sistema, bem como as bases e critérios para a escolha de locais e pontos de monitoramento, sendo definidos alguns locais importantes e a estratégia de operacionalização do sistema. Deram-se as bases iniciais para estabelecimento de banco de dados e para o processamento e elaboração de informações. Discutiu-se metodologias de monitoramento. Definiram-se custos da implantação do sistema e custos operacionais para uma rede de laboratórios-padrão mínimo e centros de referência. Delinearam-se aspectos fundamentais do treinamento e suas necessidades. Sugeriram-se possíveis parceiros nacionais e internacionais.

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Sumário Geral Apresentação.................................................................................................................... 9 1. Termo de Referência Implantação e Operação da Rede Consorciada de Estações Referenciais e/ou Transectos de Monitoramento Ambiental - REMA Miriam Laila Absy.......................................................................................................... 13 2. Monitoramento do Meio Ambiente Aquático Continental José Galizia Tundisi........................................................................................................ 21 3. Monitoramento do Meio Ambiente Aquático Marinho Luis Roberto Tommasi.................................................................................................... 47 4. Monitoramento do Meio Ambiente Atmosférico Volker W. J. Kirchoff...................................................................................................... 77 5. Monitoramento do Meio Ambiente Terrestre Rui Cerqueira.................................................................................................................. 89

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Apresentação

Esta publicação é composta por um conjunto de 04 (quatro) documentos relativos respectivamente aos meios aquático continental, aquático marinho, atmosférico e terrestre, preparados com a finalidade de subsidiar o processo de discussão para elaboração de uma proposta de implantação e operação de uma rede de estações referenciais de monitoramento ambiental. Consiste num diagnóstico preliminar das atividades de monitoramento no País, apresentando sugestões a serem incorporadas no citado processo de discussão. A referida rede, provisoriamente denominada de Rede Consorciada de Estações Referenciais e/ou Transectos de Monitoramento Ambiental - REMA, tem como um dos seus principais objetivos gerar, contínua e sistematicamente, dados referenciais e integrados, de forma a viabilizar o monitoramento da dinâmica natural dos ecossistemas brasileiros, bem como as mudanças neles introduzidas pelas atividades antrópicas. Trata-se de um sistema inédito para o Brasil, que prevê a divulgação e o intercâmbio de dados e informações ambientais entre seus integrantes e entre esses com os usuários públicos e privados, nacionais e internacionais. Os documentos que integram esta publicação foram elaborados em 1994, no âmbito do Projeto Conservação da Biodiversidade, coordenado pela Divisão de Desenvolvimento de Tecnologias Ambientais __ DITAM, da Diretoria de Incentivo à Pesquisa e Divulgação __ DIRPED, do IBAMA. A DITAM forneceu as orientações básicas à sua elaboração, conforme apresentados no Termo de Referência, em anexo, o qual solicitou, entre outras informações, sugestões de temas, áreas, estações e transectos prioritários para monitoramento, infra-estrutura necessária para funcionamento da Rede e indicação de parceiros institucionais em potencial. Os textos encontram-se no seu original, conforme apresentado pelo autor, constituindo-se em um ponto de partida para ampla discussão com especialistas de diversas instituições que participam do processo de monitoramento ambiental.

Miriam Laila Absy Chefe da Divisão de Desenvolvimento de Tecnologias Ambientais IBAMA / DIRPED

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1 Termo de Referência Implantação e Operação da Rede Consorciada de Estações Referenciais e/ou Transectos de Monitoramento Ambiental - REMA Miriam Laila Absy

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TERMO DE REFERÊNCIA1 IMPLANTAÇÃO E OPERAÇÃO DA REDE CONSORCIADA DE ESTAÇÕES REFERENCIAIS E/OU TRANSECTOS DE MONITORAMENTO AMBIENTAL-REMA2

1. Objetivo Geral A Rede Consorciada de Estações Referenciais e/ou Transectos de Monitoramento Ambiental - REMA tem por objetivo fornecer subsídios à tomada de decisão no processo de gestão ambiental, através do monitoramento sistemático e integrado dos ecossistemas brasileiros. Além disso, objetiva contribuir interativamente com os esforços internacionais para a melhor compreensão das mudanças globais. 2. Objetivos Específicos . aumentar a capacidade de diagnóstico, prognóstico, modelagem e síntese da dinâmica dos ecossistemas; . estabelecer cooperação entre várias instituições com atividades de interesse da REMA, de forma a possibitar o levantamento, estudo, análise e consolidação de parâmetros ambientais diversos; . contribuir para a definição de indicadores de perturbação ambiental e seus níveis máximos de ocorrência, de forma a contribuir, inclusive, na complementação da legislação ambiental; . gerar, contínua e sistematicamente, dados referenciais e integrados de parâmetros ambientais; . estabelecer metodologias de coleta, análise, consolidação e armazenamento de dados. 3. Justificativa Diversos esforços têm sido feitos em âmbito internacional com o intuito de entender as mudanças globais, a partir da interação dos processos físicos, químicos e biológicos naturais e da influência das atividades humanas sobre os mesmos. Entre eles, destacam-se o Internacional Geosphere-Biosphere Programme-IGBP, do International Council of Scientific Unions; o World Climate Programme-WCP, da WHO; o World Conservation Monitoring Centre-WCMC. 1

Documento preparado por Miriam Laila Absy, chefe da Divisão de Desenvolvimento de Tecnologias Ambientais do IBAMA, com a colaboração de Bráulio Ferreira de Souza Dias, Coordenadador Geral de Diversidade Biológica - MMA e Vandite Sueli D. Guimarães, técnica da DITAM. - Versão original de 1992, revisada em 1995.

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Designação adotada provisoriamente para recurso de fácil referência verbal à Rede proposta.

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Em 1975, as Nações Unidas criou o Global Environment Monitoring System-GEMS para promover, mundialmente, as atividades de monitoramento e de controle ambiental, do qual participam 142 países desenvolvendo pelo menos uma atividade de monitoramento/ controle ambiental, além de centenas de organizações nacionais e internacionais, como a FAO, WHO, WMO, UNESCO e IUCN. O reconhecimento mundial da importância fundamental do monitoramento do meio ambiente para a compreensão segura das mudanças globais (atuais e futuras) e para a adoção de decisões sobre o uso e ordenação do território, encontra-se explicitado na Agenda 21, aprovada no âmbito da UNCED-1992. A partir de então, o monitoramento ambiental, já previsto na legislação brasileira, passou a ser também um compromisso internacional. Em razão disso, o MMA e o IBAMA devem dispor de um sistema capaz de fornecer dados básicos e suficientes para ajustar e melhorar, respectivamente, a sua atuação gestora e executora da Política Nacional do Meio Ambiente. Nesse sentido, a Rede Consorciada de Estações Referenciais e/ou Transectos de Monitoramento Ambiental constitui uma ferramenta necessária por permitir o levantamento, análise e sistematização de dados referenciais de forma a viabilizar o monitoramento periódico da qualidade ambiental. Desse modo, será possível conhecer e compreender, a longo prazo, a dinâmica natural dos sistemas ambientais brasileiros, bem como as mudanças neles introduzidas pelas atividades antrópicas. A REMA consiste num sistema inédito para o Brasil, que a exemplo das experiências internacionais, prevê a divulgação e o intercâmbio de dados e informações entre seus participantes e demais usuários públicos e privados, nacionais e internacionais. 4. Produtos e resultados obtidos pela DITAM no período de junho de 1992 a gosto de 1995 . preparação do Termo de Referência para implantação e operação da REMA (1992, atualizado em 1995); . reunião com cerca de 30 especialistas de diversas áreas do conhecimento, para sugestões quanto a estratégia de desenvolvimento da proposta da REMA; . negociação com o INPE e IOUSP para realizar um workshop, sob a coordenação da DITAM, com vistas a subsidiar concretamente a proposta de implantação e operação da REMA, bem como de aprofundar o diagnóstico das experiências com monitoramento de dados bióticos e abióticos no Brasil (o INPE mostrou grande interesse, oferencendo sua colaboração nas tarefas de organização do evento e elaboração da proposta) (ago/1993 a mar/1995); . produção de 04 documentos referenciais, respectivamente, sobre os meios atmosférico, terrestre, aquático e marinho, contendo diagnóstico preliminar das experiências de monitoramento no Brasil e sugestões para implantação e operação da REMA nesses sistemas (nov/1993 a abr/1994); . encaminhamento desses documentos a unidades do IBAMA e do MMA para conhecimento e contribuições (2º semestre de 1994); 16

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. acordo com a Fundação Tropical de Pesquisas e Tecnologias André Tosello, para veiculação on line dos documentos acima referidos na WWW/INTERNET (abr/94, devendo estar disponível nas próximas semanas). 5. Metas propostas para 1995 Meta I - Definição de temas prioritários A partir da legislação ambiental brasileira e dos compromissos internacionais assumidos pelo governo brasileiro, serão definidos, sob a coordenaçao do MMA, os temas ambientais prioritários a serem monitorados pela REMA. Meta II - Workshop “Programa Nacional de Monitoramento Ambiental Integrado” Atividade 1: Reunião Preparatória A ser realizada em Brasília, essa reunião contará com a participação de representantes do Ministério do Meio Ambiente, dos Recursos Hídricos e da Amazônia Legal-MMA, do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis-IBAMA e os consultores da Divisão de Desenvolvimento de Tecnologias Ambientais-DITAM, autores dos documentos relativos ao Monitoramento Ambiental dos meios terrestre, atmosférico, aquático continental e marinho, os quais foram desenvolvidos a partir de um Termo de Referência anterior, preparado pela DITAM/IBAMA como um primeiro esforço para subsidiar a elaboração da proposta da REMA. Essa reunião busca obter sugestões quanto a: 1. indicadores dos temas prioritarios estabelecidos pelo MMA/IBAMA, a serem monitorados; 2. áreas prioritárias a serem monitoradas; 3. dinâmica de realização do workshop, com vistas a garantir produtos de qualidade; 4. parceiros institucionais que farão parte da REMA, na qualidade de co-gestores; 5. local, data e infra-estrutura para a realização do workshop; 6. um questionário a ser enviado a especialistas e instituições diversas, incluíndo aquelas que participarão do evento. Atividade 2: Consulta à Comunidade Acadêmica, através de questionário A partir da Reunião Preparatória (Atividade 1), será elaborado um questionário a ser enviado a diversas instituições/pesquisadores, com o objetivo de levantar subsídios à preparação de um diagnóstico do conhecimento e das tecnologias disponíveis quanto a prática de monitoramento no Brasil. Este questionário servirá como um instrumento, onde cada instituição consolidará suas informações, devendo enviá-lo em data pré-estabelecida pela MMA/IBAMA. Visando alcançar maior número de colaboradores, esse questionário será colocado também em sistema on line. De caráter norteador e orientador das discussões do workshop (Atividade 3), esse questionário conterá: Sér. meio ambiente debate, 20

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1. uma nota explicativa informando o que é a REMA e os seus objetivos; 2. uma abordagem sobre sua importância como mecanismo de consulta para obter subsídios ao aperfeiçoamento dos objetivos pretendidos pela REMA, bem como da estratégia de elaboração de sua proposta de implantação e operação; Espera-se com esse questionário uma contribuição de cada instituição consultada quanto a suas experiências concretas na atividade de monitoramento de dados ambientais, como: temas monitorados, locais, métodos, infra-estrutura existente, linhas básicas e programas de pesquisas, projetos e atividades realizados em colaboração com organismos internacionais, resultados obtidos com esses monitoramentos, lista de pessoas envolvidas e nível/área de especialização, bibliografia, capacitação e treinamento de recursos humanos. Atividade 3: Realização do Workshop Esse workshop terá por objetivo reunir especialistas com experiências diversificadas em monitoramento ambiental, de forma a subsidiar concretamente a elaboração da REMA e, consequentemente, do Programa de Monitoramento Ambiental. O workshop deverá: 1. identificar futuros parceiros; 2. definir parâmetros dos temas prioritários a serem monitorados; 3. definir estratégia para estabelecimento da Rede; 4. identificar áreas e transectos que constituirão a Rede; 5. incorporar as Unidades de Conservação no sistema; 6. definir métodos e técnicas a serem adotados; 7. definir sistemas de coleta, armazenamento, intercâmbio e divulgação dos dados. A dinâmica do workshop será definida com base nos resultados da Reunião Preparatória (Atividade 1) e do Questionário (Atividade 2) e deverá ter, a princípio, a duração de dois dias: 1º Dia manhã: Grupos de Trabalho para discutir e propor parâmetros a serem monitorados. tarde: Grupos de Trabalho para proposta de áreas e parceiros institucionais em potencial que integrarão a Rede e sugestões quanto a infra-estrutura necessária para instalação e operação das estações/ transectos de monitoramento ambiental. 18

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2º Dia manhã: Grupo de Trabalho para discutir e sugerir sistemas de bancos de dados; Grupo de Trabalho para sugestão quanto a estratégia para operação da Rede; tarde: Relatoria dos grupos de trabalho; Plenária e encerramento do evento Durante a fase de preparação do workshop, o IBAMA deverá contactar o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais-INPE para ratificar a disponibilidade dessa Instituição em realizá-lo, conjuntamente com o MMA e IBAMA, considerando que em acertos anteriores, o mesmo havia colocado à disposição do IBAMA suas dependências para a realização do evento. Ainda nessa fase, a DITAM/IBAMA providenciará a contratação de um colaborador para apoiar a realização do workshop e elaborar a proposta da REMA e, consequentemente, do Programa de Monitoramento Ambiental, através da consolidação das sugestões obtidas pelos questionários,o próprio evento e documentos já produzidos pela DITAM. Atividade 4: Elaboração do Documento Final da Proposta do Projeto da REMA A partir das atividades acima mencionadas e com base nas sugestões obtidas, será definida a estratégia de elaboração da proposta para estabelecer a implantação e operação da Rede. Será preparado um documento final que contará com o apoio de um colaborador e eventualmente de outras instituições que já tenham se comprometido a serem parceiros da Rede. 6. Coordenação, supervisão e execução A coordenação, supervisão e execução dos trabalhos propostos neste Termo de Referência estarão sob a responsabilidade do MMA, conjuntamente com a DITAM/DIRPED/IBAMA.

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Monitoramento do Meio Aquático Continental

José Galizia Tundisi

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Sumário 1. Introdução.............................................................................................................................................. 25 1.1- Aspectos fundamentais do problema............................................................................................... 25 1.2 - Manejo integrado de recursos hídricos............................................................................................ 25 1.3 - Dificuldades no manejo integrado de recursos hídricos.................................................................... 26 1.4 - A situação atual dos recursos hídricos no Brasil............................................................................... 26 2. Análise crítica do monitoramento dos recursos hídricos continentais......................................... 28 3. Estratégias de monitoramento............................................................................................................. 31 4. Metodologias de monitoramento......................................................................................................... 32 5. Sistema operacional do monitoramento............................................................................................. 34 5.1 - Problemas e etapas operacionais..................................................................................................... 34 5.2 - Estratégias operacionais.................................................................................................................. 35 6. Laboratórios........................................................................................................................................... 36 6.1 - Laboratório-padrão mínimo................................................................................................ ............ 36 6.2 - Laboratórios centrais e de grande porte - Laboratórios de referência............................................... 37 7. Bibliografia e informações................................................................................................................... 37 8. Banco de dados................................................................................................................................... 38 9. Processamento de dados..................................................................................................................... 38 10. Biomonitoramento............................................................................................................................... 39 11. Monitoramento automático e integral.............................................................................................. 39 12. Treinamento do pessoal...................................................................................................................... 39 13. Principais transectos.......................................................................................................................... 40 14. Identificação dos possíveis parceiros na rede de monitoramento ambiental............................. 41 15. Situação e conexão internacional da REMA.................................................................................. 43 16. Acompanhamento e avaliação.......................................................................................................... 44 17. Centros e laboratórios no Brasil....................................................................................................... 44 18. Números de laboratórios................................................................................................................... 45 19. Custos................................................................................................................................................... 46 20. Bibliografia.......................................................................................................................................... 46

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1. Introdução 1.1 Aspectos fundamentais do problema O sistema aquático continental do Brasil, compreendendo os rios, lagos, áreas alagadas, represas, de vários volumes e morfometrias, ocupa uma vasta extensão latitudinal e é um recurso natural de extrema importância. Não só os usos da água são diversificados no Brasil, mas o potencial para produção sustentada de alimento também é grande e em algumas regiões é crucial para a economia regional. Além dos recursos hídricos superficiais, deve-se considerar a água subterrânea igualmente importante e muito valiosa como recurso a ser utilizado no futuro. Atualmente, o uso da água subterrânea já se intensifica em algumas regiões do Brasil. A água é um componente crítico para o desenvolvimento sustentado. Sem água de boa qualidade com alta contaminação, este desenvolvimento passa a ter limitações. A importância da água para o desenvolvimento tem sido mais reconhecida nas últimas décadas: água de boa qualidade para uso doméstico; água para irrigação e produção agrícola; água para geração de energia; água para transporte; água para manutenção de fauna e flora, produção de alimento (aquacultura, pesca intensiva); e água para recreação e turismo. Devido à sua importância para a economia nacional, e o grande impacto que a água de baixa qualidade e contaminada causa à saúde da população humana, é primordial estabelecer um programa de proteção, conservação, recuperação e gerenciamento de recursos hídricos, o qual, sem dúvida, deve ter características regionais importantes, e, ao mesmo tempo, deve ser considerado em um contexto nacional. Um dos tópicos essenciais da Agenda 21 é o de que suprimentos adequados de água de boa qualidade sejam mantidos para toda população do planeta, enquanto se conservam as funções hidrológicas, biológicas e químicas dos ecossistemas, adaptando as atividades humanas dentro dos limites da natureza e combatendo vetores e doenças de veiculação hídrica. Portanto, o desenvolvimento sustentado apoia-se, fundamentalmente, no ciclo hidrológico e no manejo adequado dos recursos hídricos continentais. 1.2 Manejo integrado de recursos hídricos Para fazer face às crescentes demandas de água (Fig. 1) e ao grau extremamente elevado da contaminação, deve-se considerar o gerenciamento integrado de recursos hídricos continentais. Este gerenciamento deve incluir uma visão inter e multidisciplinar do problema, articulando tecnologia, sócioeconomia, saúde humana e bases científicas de uma forma interativa e integrativa (Biswas,1993). Considerando-se a complexa interdependência dos processos relacionados ao ciclo hidrológico, disponibilidade e uso de água, e interações com a saúde humana, o manejo integrado deve apoiar-se nas bases biogeofísicas do sistema, representadas pelas unidades naturais que são as bacias hidrográficas. Esta abordagem tem sido cada vez mais intensificada e sem dúvida deve ser considerada como um processo fundamental no gerenciamento. A bacia hidrográfica não só possibilita uma visão clara dos limites, mas impõe condições excelentes para cálculo, determinações, medidas de carga e outros aspectos quantitativos (que inclui o ciclo hidrológico e o balanço hídrico) e qualitativos. Possibilita o gerenciamento efetivo do sistema de recursos hídricos e o controle ambiental adequado. A gestão da água, através do gerenciamento de bacias hidrográficas implica os seguintes conceitos (Biswas, 1990): I - O estabelecimento de uma visão holística e interdisciplinar do problema do gerenciamento; Sér. meio ambiente debate, 20

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II - O reconhecimento da água como fator econômico; III - O uso das bacias hidrográficas como unidade para o gerenciamento; IV - O envolvimento do público neste gerenciamento; V - A avaliação de impacto ambiental; VI - A avaliação de impactos sociais. Todos estes conceitos básicos de manejo integrado consideram a interdependência dos fatores biogeofísicos, econômicos e sociais, os múltiplos usos da água e os efeitos variados da poluição, eutrofização e contaminação, e a necessidade de integrar os vários aspectos do gerenciamento. Um outro conceito importante que emerge destes já delineados é a necessidade de continuidade do gerenciamento, a qual deve considerar espaço e tempo como fatores fundamentais. A consideração do fator econômico relacionado com as reservas de água é outro aspecto importante e que tem recebido, recentemente, atenção especial. 1.3. Dificuldades no manejo integrado de recursos hídricos Existem inúmeros fatores que limitam, regulam e impedem, em muitos casos, o estabelecimento de programas adequados de gerenciamento ou manejo integrado dos recursos hídricos continentais. Os principais problemas são: a) Análise incompleta do problema. b) Conhecimento técnico inadequado. c) Falta de metodologia apropriada. d) Problemas e limitações institucionais. e) Falta de articulação entre as várias etapas do trabalho e as instituições interessadas no gerenciamento. Um exemplo muito claro destes problemas pode ser dado, considerando-se os trabalhos com impactos produzidos por reservatórios, o gerenciamento de represas urbanas e o gerenciamento de alguns consórcios municipais. A falta de dados, devido ao conhecimento limitado ou às metodologias não adequadas, é outro problema extremamente sério. A descontinuidade do processo e a visão setorial do gerenciamento são outros aspectos que devem ser levados em conta (Biswas,1984). 1.4 A situação atual dos recursos hídricos no Brasil Em um rápido resumo, pode-se descrever a situação atual dos recursos hídricos no Brasil como se segue: Os recursos hídricos continentais no Brasil, incluindo-se aqui água subterrânea e superficial, têm uma distribuição relativamente boa em todo o país (com exceção do Nordeste, 26

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em águas superficiais), com abundância e disponibilidade de água; as duas grandes bacias hidrográficas da América do Sul, a bacia Amazônica e a bacia do Prata, têm grande volume de água e regimes hidrológicos bem estabelecidos e conhecidos. As áreas alagadas, como os pantanais, são recursos importantes tanto do ponto de vista qualitativo quanto quantitativo, não só pela abundância de água, mas pela diversidade da fauna e flora. Nestas duas bacias hidrográficas, a biodiversidade e o ciclo hidrológico estão bastante correlacionados, com uma grande interdependência de processos. Apesar da abundância de recursos hídricos na maior parte do país, existem áreas críticas no que se refere aos usos múltiplos, grau de contaminação e poluição e disponibilidade de água. Estas são as áreas metropolitanas em praticamente todas as regiões do país em que a demanda crescente de águas produz impactos em todo o sistema regional (e não só na área metropolitana), além da poluição e eutrofização que atingem níveis qualitativos e quantitativos de grandes proporções, com implicações na saúde humana nos custos de tratamento. Há uma evidente crise de água nas regiões metropolitanas. As áreas rurais, onde ocorre irrigação intensiva e onde a disponibilidade de águas é cada vez menor, constituem outro problema. E a contaminação, poluição dos mananciais em muitas regiões próximas às áreas urbanas, onde a disposição de resíduos sólidos interfere nos mananciais e na captação de água para cidades de médio e pequeno porte (10.000 a 150.000 habitantes). Portanto, são três processos importantes: a) A diversificação dos usos múltiplos. Por exemplo, em áreas metropolitanas há um conflito entre o uso de água para abastecimento, recreação e pesca comercial (no mesmo manancial). b) O aumento das necessidades de água. c) O aumento da poluição e deterioração dos mananciais. Neste último caso, devem-se destacar os seguintes aspectos da poluição, contaminação e deterioração dos mananciais e dos recursos hídricos continentais em geral: I - Descargas de material inorgânico, em suspensão; II - Descargas de substâncias tóxicas e aumento da toxidade da água ( superficial e subterrânea); III - Descargas intensas de matéria orgânica com aceleração da eutrofização; IV - Perda da biodiversidade das águas continentais. Estes processos ocorrem devido a descargas industriais e domésticas, desmatamentos, uso de fertilizantes, uso excessivo de herbicidas e pesticidas. Embora esforços tenham sido feitos para controlar esta situação, existem enormes dificuldades para uma efetiva atuação decorrente de alguns fatores já descritos, tais como, problemas metodológicos, ênfase setorial e falta de articulação entre várias agências ou instituições. Este breve resumo procura chamar a atenção para os problemas principais e, daí, destaca-se a necessidade urgente de um gerenciamento integrado, multidiciplinar, descentralizado e dinâmico dos recursos hídricos continentais do Brasil.

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2. Análise crítica do monitoramento dos recursos hídricos continentais Uma das bases fundamentais de sustentação do gerenciamento integrado de recursos hídricos continentais é o monitoramento. Este, sem dúvida, em qualquer situação ambiental, é o sensor que possibilitará o acompanhamento dos processos e facilitará a tomada de decisões. Por outro lado, institui um mecanismo de acompanhamento a longo prazo, fundamental para escolha de alternativas, e delineamento dos usos múltiplos e seus efeitos. O monitoramento ocupa, portanto, uma posição central no gerenciamento de recursos hídricos e no planejamento ambiental com base em recursos hídricos (Fig. 1). energia, capital

implementação

Fig. 1 - Esquema generalizado de gerenciamento de recursos hídricos, mostrando a posição do monitoramento. Modificado e adaptado de Bower e Hutschmidt, 1984.

Desta forma, o monitoramento sempre é um componente fundamental do planejamento e gerenciamento de recursos hídricos. Nenhum desenvolvimento auto-sustentado pode deixar de apoiar-se em um eficiente banco de dados proporcionado pelo monitoramento. Para ser efetivo o sistema de monitoramento deve ter algumas características essenciais: a) Rapidez na aquisição e no uso de informações sobre a qualidade da água. b) Efetividade em relação aos custos c) Cobertura geográfica máxima. d) Erro mínimo nas medidas e determinações. e) Erro mínimo na amostragem. f) Identificação dos usuários da informação. g) Disponibilidade imediata de dados. 28

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h) Capacidade de ações emergenciais rápidas. a) Rapidez na aquisição e no uso de informações sobre a qualidade de água Para funcionar como um “sensor” efetivo, um monitoramento deve ser não só utilizado para acessar rapidamente o sistema mas também efetivo na disponibilidade dos resultados para os gerentes e operadores do sistema. Um dos mais sérios problemas é o tempo gasto entre a tomada de decisões, o processamento de informações e a sua disponibilidade para os gerentes. É essencial que a informação seja rapidamente repassada de tal forma que as decisões possam ser tomadas rapidamente. Por exemplo, estas decisões são cruciais, quando se referem à saúde humana (epidemias), perda de recursos (mortalidade em massa de peixes). Se esta informação não atingir os usuários em tempo hábil, o monitoramento tem impacto e ação limitada e as conseqüências são (Biswas, 1991): - Erros na escolha das possíveis alternativas para ações. - Ações retardadas. - Decisões com alto custo. - Decisões que resultam em danos irreversíveis. b) Custos O monitoramento requer as seguintes etapas: - Coleta de informação. - Processamento. - Análise do resultado. - Disseminação dos dados. Deve-se ter em mente que no caso do Brasil, em razão da dimensão e da complexidade dos problemas ambientais, ações de monitoramento devem levar em conta os custos, e a qualidade da informação obtida. Em muitos projetos, o valor da informação aumenta geralmente com a extensão e acuracidade do monitoramento, aumentando conseqüentemente, os custos. v Custos da Obtenção da Informação

Custo ou Valor

Valor Máximo da Informação

Valor da Informação

Custo Efetivo

Cobertura e acuricidade da informação

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Fig. 2 - Custos e qualidade de informação obtida

Portanto, há um máximo de informação a ser obtida, acima do qual os custos aumentam, mas a qualidade da informação não melhora, atingindo um patamar. Assim, deve-se ter em mente que o rigor científico da informação necessita ser contrabalançado, considerado com acuracidade, viabilidade e rapidez do monitoramento.

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c) Cobertura geográfica máxima Deve ser profundamente analisada a relação entre a necessidade de máxima cobertura geográfica e os custos e disponibilidade de recursos para o monitoramento. Em um país de dimensões continentais como o Brasil, deve-se ter cuidado nas relações das áreas para o monitoramento. A descentralização das ações, com uma metodologia comum, com calibragens adequadas é essencial. Não há dúvida de que as ações de monitoramento devem ser consideradas em função de bacias hidrográficas e de seus pontos críticos. d) Erro mínimo nas determinações O nível de acuracidade de confiança nas determinações deve ser fonte de permanente avaliação. Para tanto é necessário estabelecer mecanismos efetivos de calibração, análise e acompanhamento do monitoramento. Intercalibração de métodos e periódica avaliação das condições do instrumental são fundamentais. e) Erro mínimo na amostragem A amostragem deve levar em conta a magnitude da área a ser monitorada, a representatividade, as condições básicas do sistema (morfometria, compartimentalização), a localização das principais entradas (indústrias, cidades, áreas agrícolas, áreas naturais), de tal forma que a informação obtida seja a de máxima eficiência. O acoplamento da amostragem com os ciclos sazonais é também um fator importante. f) Identificação dos usuários da informação A identificação dos usuários das informações resultantes do monitoramento é essencial. Em diferentes níveis de gerenciamento, há diferenças na hierarquia de informações. Em alguns casos, a apresentação de sínteses e de dados agregados é suficiente. Os usuários devem ser treinados para solicitar as informações desejadas com o máximo de eficiência e rapidez. Por outro lado, a informação disponível deve ser eficiente, confiável e rapidamente posta à disposição dos usuários. g) Disponibilidade imediata dos dados A obtenção e processamento de dados deve ser a mais rápida possível e também a sua disponibilidade a fim de que se possa ter um gerenciamento efetivo do sistema. Em alguns sistemas-piloto um processo automático de monitoramento deve ser implementado com a finalidade de testar equipamentos e verificar a viabilidade destes sistemas. Hoje há uma rápida aceleração na construção de equipamentos que possibilita a obtenção de informações rápidas, via satélite. Esta metodologia deve ser testada em programas-piloto. h) Capacidade de ações emergenciais rápidas Qualquer sistema de monitoramento deve ter condições de proporcionar uma rápida tomada de decisões e resolver problemas em situações emergenciais. Tal é o caso quando ocorrem pulsos de contaminação que coloquem em risco a saúde humana ou produzem mortalidade em massa de organismos aquáticos. O sistema deve estar preparado para uma rápida avaliação da situação e possibilidades de intervenção. 30

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O monitoramento de águas é complexo uma vez que se trata de trabalhar em sistemas de múltiplas variáveis não lineares. Se adotar a bacia hidrográfica como unidade básica de monitoramento, as ações na bacia hidrográfica são sempre um conjunto de atividades, impactos cuja repercussão no sistema aquático é grande. Por isso deve haver um treinamento efetivo, integrador e interdisciplinar de gerentes e responsáveis pelo monitoramento a fim de que compreendam esta complexidade e possam analisar os resultados adequadamente. Finalmente, deve-se levar em conta que a efetividade, o custo, o nível de qualidade das informações e a sua disponibilidade dependem de uma integração de vários aspectos acima descritos. O monitoramento pode sem dúvida apoiar e ser decisivo na solução e prevenção de muitos problemas nos sistemas aquáticos, mas também ser uma fonte de problemas se não for adequadamente implementado. 3. Estratégias do monitoramento A complexidade do monitoramento provém de fato de que há uma gama de problemas envolvidos, tais como: abordagem, metodologia, amostragem, técnicas, pessoal envolvido, calibração e intercalibração. Um dos problemas importantes é a área abrangida pelo monitoramento. Sem dúvida a bacia hidrográfica é uma unidade importante, mas deve-se especificar e detalhar as principais bacias a serem monitoradas no Brasil. Esta abordagem geral deve ser seguida de uma estratégia regional e local que permita ao monitoramento ter a flexibilidade necessária dentro de um padrão conceitual e metodológico que possibilite comparações. Números de variáveis, freqüência de amostragem, localização podem, dentro de certos limites, ser escolhidos localmente ou regionalmente. Neste contexto, deve-se considerar os seguintes níveis de monitoramento: I - Qualidade da água; II - Quantidade da água; III - Monitoramento biológico; IV - Monitoramento de quantidade e qualidade da água acoplado ao monitoramento ambiental completo Estes níveis de monitoramento devem ser tanto quanto possíveis simultâneos. Por exemplo, é impossível considerar-se só quantidades de água. Há um grande número de dados de estações hidroelétricas em todo o Brasil que medem a vazão de rios, represas, riachos, etc. Este é um banco de dados bem estabelecido, mas há pouquíssimos dados que monitoram simultaneamente qualidade e quantidade de água para se obter o dado de carga (mg/m3/s, por exemplo), ou seja, é preciso que os dados de qualidade da água venham acompanhados das vazões em m3/s. Técnicas quantitativas de monitoramento da água (ou seja análises de quantidades) são relativamente simples e bem estabelecidas no Brasil. Muito mais complexo é o problema da qualidade das águas. O número de potencial de variáveis é muito maior e a escolha deve ser bastante cuidadosa. Geralmente, deve-se ter um grupo “core” de variáveis que são amostradas continuamente e um grupo mais amplo que pode ser coletado simultaneamente se for possível, ou que será adicionado paulatinamente à medida que o sistema se consolida. Sér. meio ambiente debate, 20

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Monitoramento Biológico É essencial utilizar organismos para melhor compreensão científica do estado de uma massa de água no que se refere às situações de contaminação, poluição ou estado natural de baixa contaminação. O monitoramento biológico, entretanto, é difícil pois demanda três ações essenciais: I - O conhecimento de organismos indicadores; II - O conhecimento detalhado da biota regional; III - Laboratórios e sistemas de controle muito bem caracterizados. Monitoramento Ambiental Completo e de Qualidade e Quantidade da Água Em algumas regiões e, principalmente, em áreas metropolitanas deve ser considerada a possibilidade de realizar um monitoramento integrado que envolva ar, água e solo de tal forma que uma visão global e articulada dos processos de interação entre esses compartimentos seja obtida. Portanto, dentro das estratégias do monitoramento deve-se considerar: - Abordagem - Metodologia - Monitoramento da qualidade de água - Monitoramento de qualidade e quantidade de água - Monitoramento biológico (biomonitoramento) - Monitoramento ambiental integrado 4. Metodologias de monitoramento Dois pontos importantes devem ser considerados no monitoramento dos recursos hídricos continentais: a) Coletas e análises para orientação; b) Coletas e análises sistemáticas. As coletas para orientação são realizadas com freqüência reduzida, com um grupo pequeno de variáveis, e têm a finalidade de possibilitar uma série de observações mais amplas sobre os sistemas aquáticos. As coletas sistemáticas são caracterizadas por ter freqüência mais alta, com um número maior de variáveis e em número menor de pontos de amostragem. Estes dois tipos de amostragem devem ser utilizados em sistemas diversos, mas podem ser feitos simultaneamente no mesmo sistema onde as coletas e amostragens de orientação dão informações que propiciam a escolha de pontos da coleta sistemática e periódica. Por outro lado, as coletas de orientação podem apoiar as informações obtidas com coletas sistemáticas na nova região. A escolha de pontos de coleta e dos períodos de amostragem é outro problema crítico do monitoramento. O sistema aquático é extremamente variável e complexo, e as variações de qualidade e quantidade de água estão intrinsecamente relacionadas com os ciclos climatológicos e hidrológicos, com as descargas de poluentes e com a 32

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hidrogeoquímica regional. Assim, com relação a pontos de coletas e épocas de amostragem os seguintes problemas devem ser considerados: I - Máxima cobertura geográfica possível; II- Obtenção de informações com freqüência que se acople aos ciclos sazonais e as peculiaridades ecológicas e hidrológicas de cada região. A máxima cobertura geográfica em um país com a dimensão do Brasil é muito difícil. Deste modo, é necessário estabelecer prioridades com a finalidade de melhorar a efetividade do monitoramento. Essas prioridades devem considerar os seguintes aspectos: - Áreas críticas com alto grau de contaminação e potencialmente problemáticas com relação à disponibilidade da água e intersecções com a saúde humana. - Áreas pouco contaminadas ou não contaminadas com perspectivas de manancial permanente e que sirvam como base para comprovação (unidades de conservação). - Abordagem por bacia hidrográfica. As principais variáveis que geralmente são coletadas em monitoramentos de água constitui um sistema de amostragem que permitirá uma análise do ecossistema aquático nos seus componentes físico, químico e biológico ( Tabela 1 ). Uma sofisticação destas análises, que poderá ser feita em laboratórios centrais, inclui: Na, Ca, F, Mg, Cl, Mn, CI, Zn, Co, Cu, Hg, Cr, NO2, NO3, NH4, PO4, pesticidas, herbicidas, fenóis (na água e no sedimento).

Tabela 1 Principais variáveis que são geralmente coletads em monitoramento de águas Variável

Monitoramento para Orientação

Monitoramento Sistemático

1. Temperatura X X 2. Oxigênio dissolvido X X 3. Condutividade X X 4. pH e alcalinidade X X 5. Material em suspensão X X 6. Transparência X X 7. Nitrogênio total X 8. Fósforo total X 9. Fitoplâncton X 10. Zooplâncton X 11. Bentos X 12. Ferro total X 13. Manganês X 14. Metais pesados X 15. Bactérias coliformes X X 16. Clorofila X 17. Insetos aquáticos X X 18. D.B.O. Para estas análises as amostras X deverão ser coletadas, preservadas e encaminhadas X

nos laboratórios centrais. Deve-se considerar sempre que a melhor amostragem possível é aquela que

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possibilita um perfil completo do sistema aquático, com medidas da superfície até o fundo. A esta série de medidas pode-se adicionar outras mais complexas como já foi mencionado. Este outro grupo de dados, de custos mais elevados, pode ser obtido em alguns regiões, utilizando para isso instituições-chave que catalisam esforços para um monitoramento completo. Deve-se ainda levar em conta, outro ponto importante que é a decisão de onde realizar o monitoramento. As prioridades, além das já descritas, devem basear-se em um sistema hierárquico que envolve: - Bacias hidrográficas e sub-bacias - Áreas metropolitanas - áreas críticas (com contaminação e poluição) - Unidades de conservação - áreas preservadas - Mananciais ou potenciais - Mananciais 5. Sistema operacional do monitoramento 5.1 Problemas e etapas operacionais A implantação de uma rede de monitoramento ambiental implicará em uma estratégia que compreende várias etapas: I- Discussão e aprofundamento da abordagem para a localização do sistema de monitoramento. Escolha das principais bacias e sub-bacias e definição das prioridades para o monitoramento. Discussão sobre os pontos críticos a monitorar; II- Discussão da metodologia e sua implantação. Definição das principais variáveis e das coletas sistemáticas e de orientação. É fundamental definir-se estas duas formas de atuação; III- Discussão sobre a periodicidade das coletas e amostragens e o seu acoplamento aos ciclos hidrológicos/climatológicos; IV- Discussão sobre os problemas de centralização de dados/descentralização. A operacionalização do monitoramento deve também definir a metodologia e equipamentos a serem utilizados, o sistema da calibração e intercalibração de método, o estabelecimento e o credenciamento de alguns centros de monitoramento e o treinamento de pessoal. A operacionalização de um REMA para todo o Brasil não é fácil. Portanto, a sistemática deve ser feita com aproximações sucessivas e por meio do estabelecimento de um sistema experimental inicial que se desenvolverá, por etapas. Deve-se assinalar neste trabalho os seguintes problemas a serem discutidos no processo de operacionalização: I - Localização dos sistemas e principais estratégias para esta localização.

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Seleção das áreas. Algumas bacias, por serem representativas devem ser colocadas como unidades-padrão de monitoramento. Nessas instituições-chave, tais unidades terão papel fundamental na implantação do sistema. As principais prioridades já discutidas mas que sem dúvida devem ser consideradas são: áreas metropolitanas, água para abastecimento e mananciais, áreas agrícolas (em que não há absolutamente nenhum monitoramento de água), unidades de conservação (para obtenção dos dados básicos com baixa contaminação). É preciso contar com todo o sistema de capacidades emergenciais, o que possibilitará a rápida obtenção de informações, principalmente, no que diz respeito à saúde humana. A implantação de um banco de dados é crucial. É necessário o estabelecimento de um banco de dados nacional sobre a qualidade das águas que possibilite o acompanhamento da evolução dos processos dos vários sistemas aquáticos do país e possa dar informações adequadas sobre contaminação e poluição, problemas potenciais, águas naturais em bom estado. Banco de dados regionais e sobre as bacias ou sub-bacias em monitoramento devem ser também utilizados. As unidades de conservação têm papel essencial neste sistema. 5.2 Estratégias operacionais A operacionalização do sistema pode seguir a seguinte estratégia: Após a melhor definição da metodologia, sugerida no item 4, e com a abordagem decidida (cujas prioridades também já foram apresentadas), o sistema pode ser implantado experimentalmente em uma ou várias regiões, mas em pequeno número, com a finalidade de testar os métodos, iniciar as primeiras calibrações e intercalibrações, e treinar pessoal. Nestas regiões, laboratórios-padrão já existentes podem servir como ponto de apoio importante. Podendo ser utilizados alguns sistemas em andamento em instituições de pesquisas que deverão acelerar o processo. Nesta operacionalização, é fundamental que a calibração e a intercalibração dos métodos constituam um processo básico. Muitas tentativas de monitoramento são perdidas simplesmente por falta de calibração de aparelhos, resultados não confiáveis e intercalibração pouco eficiente entre os laboratórios. Estas etapas iniciais devem ser acompanhadas muito freqüentemente e exaustivamente checadas por uma equipe científica de alto nível que deverá fornecer as diretrizes principais. Este acompanhamento é essencial, devendo proceder com: I - Checagem do equipamento; II - Uso do equipamento em condições de campo; III - Calibração dos equipamentos. Intercalibração dos métodos entre os laboratórios iniciais em atuação; IV - Checagem das informações e implantação da metodologia no uso as informações; análises estatísticas dos resultados. Discussão e implantação do sistema de tratamento dos dados; V - Elaboração dos primeiros bancos de dados por bacia ou região. Esta etapa deve ser precedida de um seminário inicial de preparação das equipes, um outro nos locais onde se desenvolve o trabalho e, posteriormente, de um terceiro para uma avaliação dos resultados e subsídios à tomada de decisões futuras. Após a implantação desta etapa, o sistema poderá ser expandido para outras regiões da mesma forma: um Sér. meio ambiente debate, 20

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laboratório central ou básico atuando, vários laboratórios associados trabalhando em conjunto. O sistema deve, assim, prosseguir por etapas, até atingir a cobertura geográfica máxima desejada. A cada uma destas etapas é adicionado, também, um componente de treinamento. Dentro das estratégias operacionais devem-se, ainda, definir os seguintes pontos: I - É essencial que o monitoramento seja descentralizado ao máximo para permitir melhor cobertura geográfica e facilidade na operação. A experiência mostra (Lee, comunicação pessoal, 1993) que as grandes companhias de tratamento e o monitoramento de água em muitos países não tiveram êxito em manter um sistema eficiente de monitoramento; II - É necessário que as bases para o monitoramento sejam derivadas da pesquisa científica. Neste ponto é fundamental o conhecimento limnológico (incluindo física, química e biologia das águas); III - Monitoramento rápido eficiente e confiável é melhor executado por equipes pequenas, bem treinadas e próximas ao sistema e à área de trabalho; IV - Um sistema central de acompanhamento, banco de dados e análise é essencial para a implantação e funcionamento da Rede Nacional de Monitoramento Ambiental. Portanto, flexibilidade, confiabilidade e, ao mesmo tempo, acompanhamento são pontos chaves no monitoramento ambiental. 6. Laboratórios 6.1 Laboratório-padrão mínimo Um laboratório com as condições operacionais mínimas deve conter os seguintes equipamentos: - Termistor - Medidor de pH - Medidor de condutividade - Medidor de transparência - Espectrofotômetro simples - Destilador de água - Bombas de vácuo e sistemas de filtração - Vidraria - Reagentes químicos - Microscópio e lupa - Equipamentos de campo: amostradores automáticos (há vários, tipos confiáveis que medem 6 variáveis de resposta rápida ao custo se U$ 5.000) - Redes de plâncton e amostradores de fundo - Barco e carro para transporte (que podem não ser necessários, dependendo da proximidade do local de coleta, facilidades, etc.) Um laboratório deste porte, atualmente, custa em torno de U$ 50.000 ( cinqüenta mil dólares) sem carro e barco. Estes laboratórios, com condições operacionais mínimas, já existem em muitas regiões do Brasil; trata-se de dar apoio logístico e possibilidades de operação aos já existentes, os quais necessitam, na maioria dos casos, de: verba para manutenção e custeio, reparo de equipamentos, aquisição de equipamentos complementares, reagentes químicos e vidraria. Um laboratório deste porte pode ser operado por no mínimo quatro 36

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pessoas: um pesquisador, dois técnicos de campo e um de laboratório. O treinamento destes técnicos é uma parte importante do processo. Este laboratório deve ter uma bibliografia mínima básica à disposição. 6.2 Laboratórios centrais e de grande porte - Laboratórios de referência Em um sistema de monitoramento como o que se pretende montar, deve-se considerar o uso de laboratórios já existentes com grande porte e equipamentos mais sofisticados. Estes laboratórios podem servir de ponto de apoio aos laboratórios-padrão mínimo, auxiliar na intercalibração e calibração de equipamentos, na definição de métodos com treinamento de pessoal. Eles necessitam de verba para manutenção e reparos de equipamentos, para material de consumo, e para aquisição de bibliografia avançada. Um laboratório deste porte necessita por volta de U$ 50.000, por ano, para a sua manutenção e custeio de operação. O sistema operacional funciona, portanto, com a seguinte estrutura:

Laboratórios Centrais de Grande Porte e de Referência

<

Análises mais sofisticadas Treinamento de pessoal Calibração de instrumentos e intercalibração Banco de dados regional Monitoramento em algumas áreas próximas

>

Laboratório Operacional Padrão Mínimo

Análises mais simples Banco de dados local Monitoramento em áreas próximas Coleta e processamento inicial de amostras que deverão ser encaminhadas aos laboratórios centrais

É preciso levar em conta o sistema de conexão das redes locais, regionais e nacionais. A cada laboratório central deve-se considerar a agregação de um certo número de laboratórios mínimos que realizem os trabalhos locais ou regionais. O ideal é utilizar-se de sistemas em rede para conexão que possibilitem rápida troca de informações, metodologia, idéias, etc. 7. Bibliografia e informações O sistema só poderá funcionar adequadamente se uma bibliografia básica com manuais apropriados for posta à disposição de todos os laboratórios. Para isto é necessário estabelecer ou criar: - Manuais técnicos de fácil manuseio e com informações básicas - Bibliografia básica de bom nível - Fluxo de informações: seminários periódicos e newsletter entre os laboratórios É importante que, periodicamente, sejam disseminadas as informações fundamentais entre os laboratórios, tais como técnicas novas, novos tipos de tratamento de dados (softwares) e novo tipo de instrumentação. Cursos de treinamento e reciclagem são também importantes no estabelecimento deste fluxo de informações.

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8. Banco de dados O banco de dados deverá conter as informações fundamentais sobre a qualidade e quantidade da água e, também, ter como pontos principais: a) Localização da bacia hidrográfica e da região: latitude / longitude / altitude b) Área abrangida pelo monitoramento c) Sistemas aquáticos abrangidos pelo monitoramento e tipo de drenagem d) Área urbana ou rural e) Tipo de solo f) Tipo de cobertura vegetal existente (ou ausente) g) Vazão dos rios (se existente). Um esforço deve ser feito para implantar o sistema de monitoramento em pontos próximos onde existem medidas de vazão já em andamento. A alternativa correta é instalar monitoramento da vazão h) Dados limnológicos (precipitação, radiação solar, temperatura do ar) i) Dados morfométricos do sistema aquático, volume, profundidade, área; informações básicas: rio, represa, área alagada, lago j) Dados da ocupação das bacias industriais, agricultura, etc. e atividades principais. k) Uso da massa de água em análise: - manancial para uso doméstico - manancial para uso industrial - usos múltiplos (recreação, turismo, irrigação, hidroeletricidade e pesca) Esta sugestão para banco de dados deve ser discutida e aprofundada. Entretanto, é essencial que ele tenha duas características básicas: I - Informações de contorno do sistema aquático e dos usos do sistema; II - Dados de qualidade e quantidade de água 9. Processamento dos dados Os dados devem ser processados com a utilização de técnicas estatísticas comuns que possibilitem estimar a confiabilidade dos resultados. Análises comparativas, multivariadas e dos componentes principais devem ser utilizadas rotineiramente no processamento.

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10. Biomonitoramento Em alguns laboratórios centrais deve-se implantar um sistema de biomonitoramento com a finalidade de desenvolver metodologias, calibrar métodos e iniciar a sua implantação com espécies nativas. Inicialmente, é necessário implantar um sistema com espécies exóticas, mas que já foram testadas em vários laboratórios internacionais. Por etapas, deve-se implantar o biomonitoramento com espécies endêmicas em certas regiões, que apresentam vantagens do ponto de vista ecológico e permitam um levantamento de dados mais adequado às realidades regionais. Este biomonitoramento pode dar as bases para futuros laboratórios de referência. É preciso iniciar uma rede especial de laboratórios de biomonitoramento. 11. Monitoramento automático e integral O estabelecimento de sistemas automáticos de medida com a recuperação das informações em tempo real tem sido introduzido em alguns países. Em algumas regiões e em caráter experimental, pode-se estabelecer um sistema de monitoramento automático e integral (ar/água/solo) que envolva os seguintes dados: - Radiação Solar - Precipitação - Vento - Umidade Relativa - Temperatura do Ar - Temperatura da Água - Temperatura do Solo - pH da Água - Condutividade da Água - pH da Água da Chuva - Condutividades da Água de Chuva - pH do Solo - Oxigênio dissolvido na Água Este sistema pode ser instalado em (uma ou duas) unidades de conservação e, em (uma ou duas) áreas metropolitanas. Custo: U$ 50.000 (para os dois sistemas) 12. Treinamento do pessoal A implantação de uma rede de monitoramento deve incluir como componente importante o treinamento de pessoal qualificado. Este treinamento pode ser realizado nos laboratórios centrais de referência e deve incluir: I - Ténicas de coleta e amostragem; II - Escolha de pontos de amostragem e uso de equipamento no campo; III - Processamento de amostras no laboratório e análises dos dados; IV - Preparação dos dados; Sér. meio ambiente debate, 20

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V - Processamento das informações e dos dados; VI - Uso da bibliografia básica; VII - Análise comparativa dos dados e discussão da significância das informações. No caso do treinamento de pesquisadores, deve-se discutir a base teórica do monitoramento e a interação pesquisa-monitoramento. 13. PRINCIPAIS TRANSECTOS Já foram discutidos alguns pontos fundamentais referentes às prioridades para a instalação da rede de monitoramento: abordagem por bacias hidrográficas, áreas metropolitanas, áreas agrícolas. Alguns eixos e áreas importantes devem ser considerados no Brasil: I - O eixo oeste-leste no rio Amazonas e as áreas metropolitanas de Manaus e Belém. Áreas críticas: garimpo, Carajás; II - O eixo norte-sul na bacia do Paraná com as sub-bacias do Tietê, Paranapanema e Grande (leste-oeste) no estado de São Paulo. Áreas críticas: represas; III - O eixo norte-sul na bacia do Rio Uruguai. Áreas críticas: represas; IV - O eixo Nordeste na bacia de São Francisco e as cadeias de reservatórios neste rio. Áreas críticas: irrigação; V - O eixo norte-sul no Pantanal Mato-grossense e as áreas metropolitanas de Cuiabá; VI - A área metropolitana do Rio de Janeiro; VII - A área metropolitana de Porto Alegre e a área da exploração carbonífera; VIII - A área de exploração carbonífera em Santa Catarina; IX - A área do pólo petroquímico na Bahia e a área metropolitana de Salvador; X - A área metropolitana de Fortaleza e os reservatórios do Nordeste (com pequena acumulação de água para abastecimento); XI - A área metropolitana de Recife; XII - Áreas de proteção ambiental no estado de São Paulo (áreas importantes como referências). A inclusão das áreas metropolitanas deve-se à necessidade de estimar permanentemente o estado destes mananciais e prevenir danos à saúde humana e epidemias. Em muitas áreas metropolitanas já se faz o monitoramento da qualidade das águas. Entretanto, o estabelecimento de uma rede implica calibração e intercalibração de métodos; possibilidade de realizar análises comparativas e de tendências nas várias regiões; necessidade de ser cruzar as informações sobre poluição e contaminação. 40

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As unidades de conservação podem ser utilizadas como ponto de referência importante, com poluição reduzida e condições naturais. Na implantação do programa-piloto nas etapas iniciais do sistema operacional, a escolha de algumas dessas áreas é fundamental. O ideal é escolher duas áreas, incluindo-se aí uma unidade de conservação como referencial. As prioridades para a seleção das áreas e áreas/transectos estão centradas nos seguintes pontos: I - Áreas críticas com alto grau de contaminação e poluição; II- Áreas de mananciais importantes ou potencialmente importantes não-poluídas ou contaminadas; III- Áreas de referência para controle (em unidades de conservação, áreas de proteção ambiental). 14. Identificação dos possíveis parceiros na rede de monitoramento ambiental Universidades : em muitas universidades há laboratórios razoáveis, que com pequeno investimento podem ser adaptados ao laboratório-padrão mínimo. Há pessoal treinado e habilitado para o desempenho e manutenção de um sistema de monitoramento. Dificuldades e limitações: manutenção geral e de equipamentos, verba para locomoção, custeio de material de consumo. Institutos de Pesquisas : vários institutos de pesquisa no país podem participar ativamente como laboratórios-padrão mínimo ou em alguns casos como laboratório central de referência. Dificuldades e limitações: manutenção geral e de equipamentos, em alguns casos falta de pessoal e infra-estrutura inadequada. Companhias de Saneamento : em alguns Estados há companhias de saneamento básico (CETESB, FEEMA) muito bem montadas, com uma excelente infra-estrutura, equipamentos e pessoal qualificado. Em alguns casos, estas companhias poderiam servir como laboratórios centrais. Dificuldades e limitações: excesso de burocracia, gigantismo com perda de controle de qualidade, dificuldades de comunicação com outros parceiros (por excesso de burocracia). Companhias Estatais de Hidroeletricidade : no Brasil, estas companhias podem ter um papel relevante no monitoramento. A maioria das grandes companhias tem laboratórios equipados e estações de piscicultura que podem servir como ponto de apoio importante e funcionar como laboratório-padrão mínimo. Com um certo esforço podem ser utilizadas em alguns casos como laboratório central. Dificuldades e limitações: excesso de burocracia, demasiada auto-suficiência, necessidade de melhor treinamento das equipes existentes, falta de bibliografia e informação necessárias a um desempenho bom. Organizações Não-Governamentais : algumas dessas organizações não podem ser incluídas no sistema de monitoramento com laboratório de padrão mínimo. As pequenas organizações de caráter local ou regional são mais eficientes do que as de grande porte. Estas organizações não-governamentais podem apoiar-se nos laboratórios das universidades para referência e treinamento. Uma experiência deve ser realizada nesse sentido. O envolvimento das organizações não-governamentais é problemático, mas pode render bons frutos com a orientação devida. Dificuldades e limitações: pessoal não qualificado adequadamente, falta de Sér. meio ambiente debate, 20

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laboratórios, em alguns casos excessivo direcionamento para determinados problemas e ausência de crítica geral. Órgãos da Administração Central: IBAMA - banco de dados nacional, coordenação-geral, estabelecimento de políticas, prioridades e recursos. CNPq - bolsas para pesquisadores, para monitores e técnicos. PROGRAMA RHAE - bolsas para técnicos e pesquisadores visitantes. INPE - análise e acompanhamento do monitoramento. É essencial aclopar-se, ao monitoramento das águas, dados de imagem de satélite que permitem correlacioná-los e calibrálos com aqueles sobre a qualidade das águas. Há experiências neste sentido, de bastante sucesso em São Carlos (USP) juntamente com o INPE. Dificuldades na implantação do sistema do monitoramento, utilizando esta gama de parceiros. A principal dificuldade é a da articulação entre os vários parceiros e a necessidade de estabelecer a adequada conexão entre os eles, devido às diferenças de abordagem, finalidades, metodologia. Deve-se, portanto, como já foi discutido, começar com um programapiloto em uma ou várias áreas, que possibilite uma articulação inicial entre dois ou mais parceiros. Esta metodologia para realização do trabalho conjunto deve ser depois repassada ao sistema por etapas. Este é um ponto crucial. Não há possibilidade de exemplar um sistema de monitoramento totalmente centralizado. A descentralização deve ser o ponto importante do sistema; entretanto, a cadeia de conexões entre as várias etapas do processo (coleta, análise, processamento, banco de dados) deve ser cuidadosamente analisada e desenvolvida por etapas. A participação destas diferentes instituições e dos laboratórios-padrão mínimo e laboratórios centrais de referência em uma rede (network) possibilitará, com os dados do monitoramento, acompanhar: I - Efeitos das interações entre o uso do solo, poluição e contaminação do ar e a qualidade da água; II- Desenvolvimento de um sistema permanente de informações que produzam dados continuamente sobre as características da qualidade da água e as condições biológicas (baseline studies and information); III- Possibilidade de desenvolver modelos ecológicos sobre determinados fenômenos e com capacidade de predição de impactos; IV- Comparação de processos e impactos que afetam a qualidade e a biologia das águas em vários locais com diferenças biogeofísicas, econômicas, e sociais; V- Padronizar metodologia e intercalibrar dados de laboratórios (inexistentes até o presente no Brasil); VI- Preparar o país para responder a questões internacionais presentes como o “global change”; VII- Análise do funcionamento dos sistemas em relação à perturbação (antes, durante e depois). Deve-se mais uma vez destacar que é necessária uma interação efetiva e permanente entre o sistema de monitoramento e a pesquisa básica (limnológica e ecológica). (Straskraba, Tundisi e Duncan, 1993), com a finalidade de produzir informações relevantes e análises 42

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adequadas e, ainda, sedimentar o sistema de monitoramento. É fundamental em toda essa inovação a participação da universidade no processo. Mesmo com os muitos defeitos atuais da universidade brasileira, esta rede pode estimular trabalhos em andamento, aperfeiçoar pesquisas, consolidar laboratórios, aumentar a articulação da universidade com outros órgãos, e desenvolver a continuidade de um processo, o qual é urgente no Brasil. Coleta de dados básicos pelos laboratórios Processamento das amostras e das informações v

Envio de amostras para os laboratórios centrais

>

Análise e processamento dos dados pelo laboratório central

Treinamento de pessoal CNPq

usuários da informação <

RHAE

v Armazenamento no banco de dados regional v Armazenamento no banco de dados nacional v usuários da informação

Possível mecanismo de coleta, análise e processamento dos dados pelos laboratórios e laboratório central e funcionamento da rede e treinamento de pessoal

15. Situação e conexão internacional da REMA É fundamental que a rede de monitoramento possa estar conectada com o sistema internacional de pesquisa e monitoramento, apoiando-se em universidades, institutos de pesquisas, centros de monitoramento ambiental, em programas internacionais e em instituições internacionais de financiamento. Os principais parceiros no exterior são: International Geosphere - Biosphere Programme. (Conexão no Brasil-Academia Brasileira de Ciências). International Lake Environment Committee (Conexão no Brasil - Centro de Recursos Hídricos e Ecologia Aplicada - USP - São Carlos - EESC. Engenharia). Comunidade Econômica Européia -laboratórios de pesquisa e ensino de países europeus (Conexão no Brasil - Agência Brasileira Cooperação).

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International Society for Theoretical and Applied Limnology (Conexão no Brasil - Centro de Recursos Hídricos e Ecologia Aplicada - EESC. Engenharia São Carlos). Programas internacionais do Banco Mundial e do Banco Interamericano de Desenvolvimento. Programas Internacionais da UNEP (UNITED NATIONS ENVIRONMENTAL PROGRAMME - Water unity em Nairobi). Japanese International Cooperation Agency Organização Mundial da Saúde - Programa GEMS -WATER. UNITED NATIONS UNIVERSITY - INWEH. International Network on Water Ecology and Human Health - Toronto-Canadá. Society on the Health of Aquatic Systems and Human Health. Center for Inland Water Research - Canadá. Organização dos Estados Americanos. Biomathematical Laboratory Czech Academy of Sciences - (Análises estatísticas, monitoramento e modelos matemáticos de sistemas aquáticos). University of Copenhagem. Departament of Chemistry - Modelagem ecológica. Toxicologia em sistemas aquáticos. 16. Acompanhamento e avaliação O estabelecimento da rede deve ser acompanhado e avaliado permanentemente por dois sistemas: I - Um grupo científico de alto nível que analisa as estratégias globais e os avanços realizados nesta estratégia, a cada etapa do programa; II - Um grupo que analisa os aspectos operacionais do programa, visita os centros, analisa resultados, sugere alterações durante o seu curso e cobra resultados em cada etapa. 17. Centros e laboratórios no Brasil Em quase todos os Estados, nas universidades e institutos de pesquisa do Brasil, há pequenos grupos que desenvolvem pesquisas em sistemas aquáticos regionais. Um número reduzido das Universidades tem Centros de Pesquisas Avançados com pesquisa e monitoramento de alto nível que podem ser pontos de apoio importantes. Os principais centros e laboratórios no Brasil que podem ser utilizados como laboratórios centrais, centros de referência (inclusive bibliografia), centros de treinamentos, em monitoramento de sistemas aquáticos continentais são: I - INPA - Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (grupo de Biologia Aquática); II - Centro de Energia Nuclear na Agricultura – CENA - Piracicaba-ESALQ - USP; 44

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III - Centro de Recursos Hídricos e Ecologia Aplicada - CRHEA, Escola de Engenharia de São Carlos, USP; IV - Departamento de Química, Laboratório de Toxicologia, Instituto de Física e Química de São Carlos da USP; V - Universidade Federal do Rio de Janeiro, Departamento de Ecologia; VI - Universidade Federal de Minas Gerais - Instituto Biociências; VII - Universidade Estadual de Maringá; VIII - Centro de Ecologia, Universidade Federal do Rio Grande do Sul; IX - Departamento de Oceanografia Biológica, FURG, Rio Grande do Sul; X - INPE, São José dos Campos. Deve-se, ainda, acrescentar algumas Companhias Estaduais como CETESB, FEEMA e Instituto do Meio Ambiente do Paraná (antiga SUREHMA). Como laboratórios-padrão mínimo pode-se considerar potencionalmente: I - Universidade Federal de Santa Catarina; II - Universidade Federal do Espírito Santo; III - Universidade Federal do Mato Grosso do Sul; IV - Universidade Federal da Paraíba; V - Laboratórios das Companhias Hidroelétricas (importante ponto de apoio): Eletronorte, CESP, Eletrosul, Eletropaulo, Clest, Codevasf e CEMIG; VI - Universidade de Brasília; VII - Caesb - Brasília; VIII -Universidade Federal do Ceará; IX - Secretaria do Meio Ambiente, Estado de Rondônia; X - Universidade Federal do Maranhão; XI - Universidade Federal de Viçosa. 18. Número de laboratórios Já se estabeleceu a necessidade de ampla cobertura geográfica no programa e rede de monitoramento. Foram dadas, também, algumas diretrizes para a seleção de áreas e apontados os pontos importantes para o estabelecimento de transectos. Sér. meio ambiente debate, 20

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Inicialmente, devem-se estabelecer dois, ou no máximo quatro, laboratórios-padrão mínimo, apoiados por no máximo dois centros de referência. Estes laboratórios, como já foi mencionado, podem localizar-se em duas áreas de conservação (unidades de conservação) e em áreas metropolitanas críticas. Este sistema deve funcionar sob observação e acompanhamento por seis meses, após o qual deverá ocorrer uma expansão para dez laboratórios e quatro centros de referência. É possível que com trinta laboratórios-padrão mínimo e sete ou oito laboratórios de referência, o sistema possa funcionar a contento. As unidades de conservação em que podem ser instalados estes laboratórios-padrão mínimo são (em uma primeira análise): Itatiaia, Emas, Tijuca, São Joaquim, Brasília, Pantanal Matogrossense, Serra do Cipó, Chapada dos Guimarães, Augusto Ruschi, Sooretana, Uajumã, Anavilhanas, Jari, Taim, Guaraqueçaba, Manirava, Juréia, bacias do rio São Bartolomeu e Descoberto, Caxiuanã, Jamari. Deve-se atentar para as áreas metropolitanas críticas, e áreas críticas como garimpo, grandes mananciais e pólos petroquímicos e carboníferos. Duas áreas com monitoramento integral são necessárias. 19.Custos Considerando que a instalação de cada laboratório-padrão mínimo fica em torno de U$50.000 (cinqüenta mil dólares) e o laboratório central de referência fica em torno de: U$50.000 por ano, para a sua manutenção, pode-se estimar o custo da implantação desta rede em aproximadamente U$2.000.000 (dois milhões de dólares). Mais U$300.000 (trezentos mil dólares) são necessários para treinamento de pessoal ao longo dos próximos 3 anos (U$100.000 por ano). Bibliografia, publicações, disseminação requerem por volta de U$250.000 (duzentos e cinqüenta mil dólares). O custo operacional deste sistema é de U$600.000 (seiscentos mil dólares por ano). 20. Bibliografia THANH. N. C. and BISWAS A. K. (ed),1990. Objectives and concepts of lake management. p. 30-58. Environmentally sound water management. Oxford University Press, 276p. BISWAS, A. 1991. Effective monitoring of lake waters. In: Hashimoto M. and Barret B. F. D. ed.Guidelines for Lake Management, p. 83-96. v. 2, ILEC, UNEP, 229p. HUTCHMIDT M. M. and Mc. Canley D. S. 1991. water resource management: planning and implementation p. 53-82. In: M. Hashimoto and Barret B. F.D. ed.Guidelines for lake management. Vol. 2 Socio Economic Aspects of Lake Management. ILEC, UNEP, 229p. Jorgensen S. E. and Vollenveider R. A. 1989. Guidelines for lake management. Vol. 1. ILEC, UNEP, 199p. JORGENSEN, S. E. and LOFTER, H. (ed.) 1990. Lake shore management. v. 3., ILEC, UNEP, 174p. STRASKRABA, M. 1986. Recommendations for water quality investigation of water supply reservoirs in Czethoslovaquia. Limnologica (Bel.) (2) p. 201-212. STRASKRABA, M., Tundisi, J. G., DUNCAN, A. (ed.) 1993. Comparative limnology and water quality mangement of reservois. Kluver Scientific Publishers, Dordrecht, 297p.

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Monitoramento do Meio Aquático Marinho

Luis Roberto Tommasi

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Sumário 1. Introdução.............................................................................................................................................. 51 1.1 - Termos de referência do projeto...................................................................................................... 52 1.2 - Biodiversidade................................................................................................................................ 52 2. Biodiversidade marinha....................................................................................................................... 55 2.1 - Biogeografia marinha do Brasil....................................................................................................... 55 2.2 - Monitoramento marinho em curso no Brasil.................................................................................... 61 2.3 - Estratégias para o estabelecimento e operação da rede de monitoramento da biodiversidade marinha no Brasil....................................................................... 62 2.4 - Locais para amostragem.................................................................................................................. 64 3. Unidades de conservação marítimas do Brasil................................................................................. 65 4. Monitoramento sobre poluição marinha............................................................................................ 66 5. Integração do programa de monitoramento da biologia marinha com o plano nacional de gerenciamento costeiro e com o REVIZEE.....................................................67 6. Parceiros internacionais....................................................................................................................... 69 7. Banco de dados..................................................................................................................................... 70 8. Programa nacional de treinamento em biodiversidade marinha.................................................... 70 9. Principais instituições brasileiras com potencial de se incorporar à REMA - meio aquático marinho........................................................................................................... 71 10. Bibliografia........................................................................................................................................... 74

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1. Introdução Segundo o Boletim Internacional de Ciências del Mar UNESCO, 63 (1992), um grupo de especialistas da UICB/AIOB - UNESCO (AIOB: Associação Internacional de Oceanografia Biológica) desenvolveu um programa para enfatizar a importância do meio marinho nos estudos globais da biodiversidade. Reconheceram que a investigação da biodiversidade marinha representa um importante desafio científico e de conservação pelo tamanho e relativa dificuldade de acesso aos ecossistemas marinhos. Após uma série de reuniões organizadas pela UICB/AIDB, conjuntamente com o programa de ciências do mar da UNESCO, foi publicada pela UICB (1991, Grassle, et al. ) uma proposta de investigação vinculando a biodiversidade marinha e a função ecossistêmica. Essa proposta foi discutida por um grupo de especialistas (UNESCO, Paris, 30/31 de janeiro e 13 a 16 de abril de 1992) como parte do Programa Diversitas da UICB - SCOPE - UNESCO (SCOPE - Comitê Científico sobre Problemas Ambientais). Foi, também, preparado, naquela reunião um informe que apresenta um plano para a realização de um programa integrado sobre biodiversidade marinha, incluindo investigações teóricas e experimentais a curto e longo prazo, bem como, aspectos de educação e formação. São identificados ecossistemas apropriados aos estudos e foi proposta uma rede de locais de estudos nas diferentes regiões do planeta. Foi proposto um programa para o desenvolvimento dos inventários. Durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada na cidade do Rio de Janeiro (5 a 14/06/92), foi assinada a Convenção sobre Diversidade Biológica ( aprovada pela Câmara dos Deputados em 18.01.94, devendo ainda ser ratificada pelo Senado) que respondeu a necessidade de suplementar o quadro jurídico internacional de proteção dos recursos naturais. O Brasil foi o primeiro a assinar a Convenção. Até o encerramento da UNCED, 154 países a tinham assinado. A Convenção reconhece que o objetivo da conservação da diversidade biológica e sua utilização sustentável baseiam-se no seu valor intrínseco e no potencial de seu aproveitamento, do ponto de vista ecológico e socioeconômico. Das obrigações assumidas, deveriam: 1- tarefas de identificação e monitoramento dos componentes da diversidade biológica; 2 - identificação das atividades que a afetem; 3 - estabelecimento de áreas de proteção para a conservação in situ; 4 regulamentação e controle da liberação de organismos geneticamente modificados; 5 - proteção do conhecimento tradicional das populações indígenas e de comunidades locais, úteis aos objetivos de conservação e utilização sustentável; 6 - criação de bancos genéticos para a conservação e recuperação in situ dos recursos da diversidade biológica; 7 - apoio à recuperação de ecossistemas degradados; 8 - incentivo à pesquisa para a identificação da diversidade biológica e para o desenvolvimento da biotecnologia; 9 - avaliação e controle do impacto ambiental sobre a diversidade biológica de atividades danosas e 10 - cooperação financeira e tecnológica para a implantação da Convenção. A Convenção define como diversidade biológica a variabilidade de organismos vivos de todas as origens, compreendendo, entre outros, os ecossistemas terrestres, marinhos e outros sistemas aquáticos e os complexos ecológicos de que fazem parte, bem como a diversidade dentro de espécies, entre espécies e o ecossistema. A Convenção estabelece que os países que a ela aderiram devam, na medida do possível: 1 - Identificar os componentes da diversidade biológica importantes para a sua utilização sustentável em ecossistemas com grande diversidade, grande número de espécies endêmicas ou ameaçadas; em ecossistemas necessários às espécies migratórias; naqueles de importância social, econômica, cultural ou científica, ou que sejam representativos únicos ou associados a processos evolutivos ou outros processos biológicos essenciais; Sér. meio ambiente debate, 20

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2 - Identificar espécies e comunidades que estejam ameaçadas, tenham valor medicinal, agrícola ou qualquer outro valor econômico; que sejam de importância social, científica ou cultural, ou para a pesquisa sobre conservação e utilização sustentável da diversidade biológica, como as espécies de referência; 3 - Genomas e genes descritos como tendo importância social, científica ou econômica; 4 - Monitorar, por meio de levantamento de amostras e outras técnicas, os componentes da diversidade biológica; 5 - Identificar processos e categorias de atividades que tenham ou possam ter sensíveis efeitos negativos na conservação e na utilização sustentável da diversidade biológica e monitorar seus efeitos por meio de levantamento de amostras e outras técnicas e; 6 - Manter e organizar dados derivados de atividades de identificação e monitoramento. O presente projeto visa, nesta fase, basicamente atender aos itens 1, 4 e 6, anteriormente citados. Do item 5, inclui o monitoramento em mariscos (mussel watch), dos níveis de contaminantes. Propomos que os itens 2 e 3, sejam abordados, pelo menos em parte, em conjunto com o programa REVIZEE que visa atender à Convenção Internacional sobre o Direito do Mar das Nações Unidas. 1.1. - Termos de referência do projeto O objetivo geral, segundo o Termo de Referência, em anexo, é elaborar um projeto para a implantação e operação de uma rede de estações referenciais com o propósito de monitorar, sistematicamente e a longo prazo, fatores impactantes sobre a mesma. É uma ação ambiental contínua e informativa, que através do conhecimento de dados referenciais, da formação da coleção de dados e do monitoramento periódico da qualidade ambiental, poderá revelar a dinâmica natural dos sistemas ambientais a longo prazo, bem como, as mudanças introduzidas pelas atividades antrópicas. Representa uma ação imprescindível para apoiar o manejo ambiental, contribuindo significativamente para o entendimento da realidade ambiental do país. Espera-se que a REMA venha a contribuir para o conhecimento da biodiversidade no âmbito mundial, sob o ponto de vista interdisciplinar e integrado. 1. 2 - Biodiversidade Segundo Kiester et al. (1992), biodiversidade, conceituada de modo mais simples, é a variedade da vida e seus processos. É uma manifestação da diversidade genética. É assim, a matéria-prima básica filtrada pela seleção natural, resultando em adaptações evolucionárias da biota às condições ambientais, tanto estáticas quanto variáveis. Num estudo realizado pela USEPA (1990), as modificações de habitat e a perda de diversidade específica foram incluídas entre os maiores níveis de risco ecológico existentes nos EUA. Habitat e diversidade específica são intimamente ligados. No âmbito regional, a diversidade específica só pode ser mantida se a qualidade dos habitats for mantida. Os principais objetivos do programa da IUBS - Internacional Union of Biological Sciences - Diversidade Específica e seu significado nos ecossistemas tropicais são: 1 - As funções ecossistêmicas da biodiversidade; 52

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2 - As origens, manutenção e perda da biodiversidade; 3 - Inventário e monitoramento da biodiversidade; 4 - Biodiversidade dos relativos selvagens das espécies cultivadas. Há, hoje, plena consciência de que os recursos são limitados e o tempo é curto. Assim, um inventário completo da biodiversidade é considerado como impossível de ser realizado. Por isso, se aceita que, para a realização de inventários e monitoramentos da biodiversidade, devemos usar taxas selecionadas. Na esfera mundial, devemos selecionar, num primeiro nível, os grandes tipos ecossistêmicos gerais, como florestas úmidas tropicais, florestas decíduas tropicais, savanas, manguezais, etc. Num segundo momento, podemos incluir ecossistemas dentro de um dado continente, como por exemplo, as savanas da Austrália, da Índia, da África e da América do Sul. O número de locais de observação deve ser o menor possível, devido à escassez de recursos. Devem ser de acessibilidade fácil, que garantam observações de longo termo e um mínimo de facilidades e acomodações de laboratórios. Para o mar brasileiro, devem ser monitorados, basicamente: 1 - Manguezais. 2 - Recifes de coral. 3 - Fundos algais calcários. 4 - Fundos arenosos e lodo/arenosos Os grupos marinhos que serão escolhidos devem permitir: 1) uma visão geral da diversidade de uma área; 2) comparar áreas diferentes em diversas partes do mundo tendo o mesmo tipo de ecossistemas, para se determinar a influência de fatores biogeográficos (históricos e evolucionários) na biodiversidade; 3) comparar locais de estudo intensivo em diferentes tipos de ecossistemas, a fim de avaliar a influência de fatores ecológicos na biodiversidade; 4) estabelecer um sistema de monitoramento que possa identificar os efeitos da fragmentação, redução e invasão de espécies, mudanças climáticas e, finalmente; 5) avaliar a biodiversidade de um dado nível trófico. Os grupos a serem escolhidos devem estar presentes nos diversos ecossistemas a serem estudados, serem ecologicamente importantes, bem estudados taxonômica e ecologicamente e contar com a participação de especialistas nacionais. Devem responder bem às mudanças induzidas pelo homem, além de possuir uma boa história de seu uso como indicadores. Devem também ter sido estudados em diferentes locais dos oceanos, sendo necessários ainda manuais e chaves de classificação, de fácil acesso, sobre estes grupos. Para o monitoramento, há necessidade de se preparar manuais de metodologia de coleta a serem usados nos locais de sua realização. Para o mar, essa é uma questão complexa, pois a metodologia tem de ser estabelecida nos níveis: Sér. meio ambiente debate, 20

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a - fitoplanctônico b - zooplanctônico c - nectônico pelágico d - nectônico demersal e - fitobentônico f - zoobentônico g - recifes de coral h - fundos algais calcáreos i - manguezais Há necessidade de se reunir um grupo de especialistas que deverá organizar os referidos manuais e estabelecer as necessidades mínimas de embarcações, equipamentos diversos, metodologias, etc. Deverá ser estabelecida uma coleção nacional de referências para cada grupo estudado, bem como, organizados ou atualizados manuais de identificação ( chaves ilustradas) dos mesmos. Deverá ser estimulada a formação e manutenção de especialistas regionais nos grupos estudados, que possam treinar novos especialistas. Considerando que no mar não há barreiras geográficas tão marcantes como em terra, há sempre uma possibilidade de recuperação de habitats destruídos, por ovos, larvas, jovens, esporos vindos de áreas vizinhas. Espécies raras podem, porém, ser eliminadas e não mais ocorrerem mesmo com boa recuperação do habitat. O estudo dos grandes padrões da distribuição da biodiversidade teve sua origem na biogeografia. São bem conhecidos os trabalhos pioneiros de Darlington (1957) e de Ekman (1953), este último sobre a biogeografia marinha é, ainda, bastante útil. Há padrões de distribuição da diversidade que são óbvios apenas numa escala nacional ou mesmo, continental. O mais importante deles, no mar, é o gradiente latitudinal de diversidade específica que ocorre na maioria dos grupos taxonômicos. Em terra são bem conhecidos os domínios morfoclimáticos e fitogeográficos introduzidos pelo Prof. Assiz N. Ab’Saber. Para o mar, há também nítido gradiente vertical, com o aumento da profundidade o qual, na realidade, se inicia com a zonação vertical nos costões rochosos. Enquanto que em terra os padrões latitudinais de biodiversidade são bem evidentes (decresce do Equador para os pólos), para os mares isso nem sempre é evidente, pois os cetáceos atingem sua maior diversidade nas altas latitudes, as algas nas regiões temperadas e os corais e o manguezal na região tropical. Em realidade, há nos mares gradientes trópicopólo e, também, pólo-trópico, por vezes, superpostos. Além disso, uma similaridade com a situação terrestre não pode ser esperada, pois o espectro de variação ambiental do mar tem um comprimento de onda, tanto numa escala de tempo ecológica como evolucionária, maior do que em terra, ainda que mudanças climáticas globais possam aumentar a freqüência de perturbações mais relevantes. Como apontam Castri et al 1992), ainda estamos longe de compreender a biodiversidade como uma função do ecossistema e de seus processos. E isso é de enorme importância para o gerenciamento do ecossistema marinho e para o modo como seus recursos serão explorados. As escalas dos processos oceânicos que determinam a distribuição das espécies marinhas são consideravelmente maiores do que aquelas em terra firme. Em decorrência disso, a conservação do ecossistema marinho e de seus processos é um problema diferente da conservação de espécies marinhas individuais. Recentemente, foi descoberto que o fitoplâncton tem um papel relevante na produção primária e no turn over nos oceanos. Além disso, esses pico-eucariotas unicelulares, cianobactérias e proclorofitas parecem desempenhar significante papel na remoção do CO2 atmosférico. Apesar disso, sua sistemática está ainda na infância. O mesmo ocorre 54

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com fungos, bactérias e vírus marinhos (Castri et al. 1992). Há cerca de sete vezes mais espécies conhecidas em terra do que no mar, mas neste há mais ordens e filo do que em terra. Cerca de 88% de todos os filos são exclusivamente marinhos. Como os filos representam maior amplitude de formas de vida e incluem maior variação genética do que as suas espécies constituintes, os sistemas marinhos são, conseqüentemente, os mais diversos de nosso planeta (Castri et al. 1992). Exceto para cetáceos e para certas áreas marinhas, onde uma intensa alteração de habitats (áreas úmidas costeiras, manguezais, lagunas, etc.), a extinção de espécies não parece ser um grave problema como em terra, devido a maior distribuição geográfica, facilidade de repovoamento e melhor fecundidade da maioria das espécies marinhas. Além disso, a diversidade marinha ocorre nas três dimensões oceânicas e em toda a sua extensão. Há “pontos quentes” de diversidade biológica marinha na plataforma continental tropical e temperada e, também, nas latitudes polares das províncias biogeográficas marinhas pelágicas correspondentes aos padrões de circulação geral das correntes oceânicas (Castri et al. 1992). Segundo, ainda, estes autores: 1. a investigação da biodiversidade marinha apresenta considerável desafio científico e conservacionista devido ao seu tamanho e à relativa inacessibilidade do ecossistema marinho. A escala do sistema marinho, a misturação, dispersão e o transporte que ocorrem no meio oceânico requerem diferentes enfoques e processos investigativos. 2. a poluição marinha, a eutrofização, a sedimentação e o assoreamento devido ao deflúvio costeiro podem encobrir os impactos diretos sobre as espécies, ou mesmo os efeitos indiretos das mudanças climáticas. Todas bacias hidrográficas que deságuam no litoral estão obviamente envolvidas. 3. a proteção dos habitats é a mais séria necessidade para a biodiversidade costeira e marinha, bem como, para o sistema terrestre. Essa proteção é, porém, em muito, dificultada pela impossibilidade de se observá-los diretamente, devido à coluna de água. 2. Biodiversidade marinha 2.1 - Biogeografia marinha do Brasil A costa brasileira é amplamente influenciada por dois ramos da corrente SulEquatorial, que se bifurca ao longo do cabo São Roque, tornando, para o norte, a corrente das Guianas e, para o sul, a corrente do Brasil. Esta, na região do Rio Grande do Sul - Província de Buenos Aires, se encontra com a corrente das Malvinas, formando a convergência Subtropical. As primeiras observações zoogeográficas sobre a fauna marinha brasileira foram feitas por Quoy & Gaimard (1829) a respeito dos crustáceos que viviam em rios que desaguavam na Baía de Guanabara. D’ Orbigny (1835-43) reconheceu a existência de uma fauna de moluscos própria da costa brasileira. Registrou 98 espécies, das quais 79 eram tropicais, 41 ocorriam até o trópico de Câncer, 2 da região do rio da Prata, 9 eram Patagônicas e 8, Patagônicas e Antilhanes. Considerou as faunas das regiões das ilhas Malvinas, Magelânica, Patagônica e sul-brasileiras como temperadas. A região ao norte do Rio de Janeiro considerou como Tropical. Dana (1853) usou linhas isoclimais (à temperatura média dos 30 dias, consecutivos, mais frios do ano) para estabelecer os limites das regiões biogeográficas marinhas, pois acreditava que as temperaturas mais baixas no inverno eram o fator limitante da distribuição geográfica das espécies marinhas. Segundo esse autor, tínhamos: Sér. meio ambiente debate, 20

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Região Atlântica Tórrida (isoclima de 74ºF), da Flórida, Yucatan até a Bahia. Região Atlântica Subtórrida (isoclima de 68ºF), da Bahia até Porto Alegre. Região Atlântica Quente-temperada (isoclima de 62ºF), de Porto Alegre até Maldonado (Uruguai). Considerou, também, as seguintes províncias zoológicas: São Paulo (Quente-temperada) de 24º a 30ºS. Uruguaia (Temperada) de 30ºS à Província de Buenos Aires. Para Dana, a mudança faunística mais acentuada ocorria na isoclima de 68ºF, cerca de 30ºS, sul do Rio Grande do sul. Para Forbes (1856), a extensão de uma província biogeográfica depende em grande parte da natureza da costa, do tipo de fundo marinho, da direção e amplitude das correntes e da profundidade do mar. Às correntes marinhas deve-se associar a variação latitudinal da temperatura do mar. Estudando os moluscos, Woodward (1856) considerou que uma província biogeográfica deve conter, pelo menos, 50% de espécies endêmicas. Para o Atlântico Ocidental, reconhece as províncias: Caribe (do golfo do México ao Rio de Janeiro) e Patagônica ( de Santa Catarina até o golfo de São Jorge, Argentina). Em relação aos cefalópodes, Hoyle (1886) reconheceu duas províncias: Índias Ocidentais ( do Cabo Hatteras, EUA, até o Rio da Prata) e Patagônica ( do Rio da Prata até o extremo sul da América do Sul). Cooke (1895), discutindo trabalhos anteriores, estendeu a província caraíbica até Santa Catarina, e a da Patagônia até Santa Catarina. Chamou atenção para a influência da corrente do Brasil na distribuição da fauna caraíbica no Atlântico Sul Ocidental. Para Dall (1901), o limite, para o sul, da fauna de moluscos caraíbica é na região de Montevidéu. Ihering (1927) assinalou, na região do Rio de Janeiro, a influência de águas frias, vindas do sul, entre 80 e 100 braços de profundidade, sobre as quais ocorriam águas quentes. Ekman (1953, pg. 47) cita o trabalho de Ihering e mostra que 40% dos moluscos eram de origem antilhana. Balech (1954) reconheceu 4 regiões zoogeográficas no Atlântico Sul Ocidental: Antilhana (dos EUA até o Cabo de São Tomé, RJ). Sul-brasileira (do Cabo de São Tomé até 30-32ºS). Argentina (de 32ºS até 41-44ºS). Magelânica (de 44ºS até a convergência Antártica). Knox (1960) sugeriu uma província sul-brasileira entre 23-24ºS e 30-32ºS. Vannucci (1964), erroneamente, comparou o Cabo Frio (23ºS) ao Cabo Hatteras (EUA). O equivalente correto é a região Uruguai - Província de Buenos Aires (Argentina). Para Forest (1966), na altura de Vitória (20ºS), há uma mudança sensível da fauna 56

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marinha, sendo essa latitude o limite sul de espécies caraíbicas. Do cabo de São Tomé até a Argentina ocorreu uma fauna heterogeneamente subtropical, sendo que, de 35ºS para o sul, a fauna era predominantemente patagônica. Segundo Leão (1982), a fauna de corais brasileiros possui três características distintas, que são inter-relacionadas: 1. Os principais construtores de recifes na região de Abrolhos são formas endêmicas, remanescentes de antigas faunas coralinas, datando do Terciário, que foram preservadas num refúgio. 2. A fauna de corais brasileiros possui baixa diversidade (19 espécies) quando comparada com a do Caribe (42 espécies). 3. Não apresenta os acroporídeos ramificados, que são os principais corais de águas rasas das cristas recifais do Caribe. Assim, a fauna de corais brasileiros se caracteriza por apresentar alto endemismo, baixa diversidade e falta de formas ramificadas. Essas características da fauna coralina brasileira, segundo Leão (1982) se devem à dois fatos: 1. O isolamento da fauna recifal brasileira daquela do Caribe. O fluxo NW do ramo norte da corrente Equatorial seria uma barreira para a propagação de plânulas das espécies recentes caraíbicas de corais. Isso ocorre desde o fim do Mioceno ou início do Plioceno, pois: a) todas as espécies caraíbicas de corais que ocorrem nos recifes brasileiros são do Mioceno (Frost, 1977), b) as espécies caraíbicas que evoluíram após o Mioceno superior são ausentes do Brasil, como ocorre com os acroporídeos, os diplorianose outros, c) os elementos arcaicos da moderna fauna coralina brasileira só ocorreram nos recifes pliocênicos do Caribe, mas não no Pleistoceno. 2. Apesar de as condições de temperatura, salinidade e profundidade serem ótimas para o desenvolvimento de uma fauna coralina diversificada, isso não ocorre devido à elevada turbidez da água, à ausência de furacões catastróficos e à limitada variedade de habitats em comparação com o Caribe. A combinação de alta turbidez ( um distúrbio de alto nível) com a falta de furacões catastróficos (distúrbio de baixo nível) concordam, segundo Leão (1982), com a hipótese do distúrbio intermediário de Connell (1978) para explicar as características da fauna coralina brasileira. Segundo esse autor, quando os distúrbios são intermediários em freqüência e intensidade, a diversidade é alta e, é baixa, quando os distúrbios são altos ou baixos. Assim, se o distúrbio for freqüente (distúrbio de alto nível) , a diversidade diminui, pois as espécies mais resistentes ao dano, ou competidores mais eficientes, podem eliminar outros e preencher grande parte do espaço, bloqueando futuras invasões. A presença de fatores de alto nível e de baixo nível de distúrbio poderiam explicar a baixa diversidade nos recifes dos Abrolhos. Silveira (1964) propôs dividir o litoral norte-nordeste brasileiro em: Sér. meio ambiente debate, 20

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1. Litoral amazônico ou equatorial: clima tropical úmido, com elevadas temperaturas e altos índices pluviométricos. Apresenta grandes rios perenes, com importante transporte de material, terras litorâneas baixas e plataforma continental muito extensa. Pode ser subdividido em: a) litoral guianense até cabo Norte; b) golfão amazônico, do cabo Norte até a ponta do Tifoca e c) litoral amazônico oriental, da ponta do Tifoca até a desembocadura do rio Parnaíba. 2. Litoral nordestino ou das barreiras: clima tropical semi-árido a úmido, com índices pluviométricos mais baixos, especialmente em sua parte norte. Muitos rios são periódicos no seu curso superior. Na parte norte ocorrem grandes linhas de dunas. A plataforma é mais estreita, especialmente, na costa leste. Próximo das praias ocorrem tantos recifes de arenito como de corais (Laborel, 1967). Pode ser subdividido em: a) litoral semi-árido, com dunas, da desembocadura do rio Parnaíba até o cabo São Roque e b) nordeste oriental, ou das barreiras, do cabo São Roque até o recôncavo Baiano. Kempf, Coutinho e Morais (1967/9) estudaram a plataforma da região NorteNordeste brasileira e mapearam os tipos de fundo nela existentes. As regiões do litoral guianense e do golfão Amazônico apresentam fundos de lodo e, de lodo e areia. No bordo da plataforma, ocorrem bolsões de fundos organogênicos. Nas regiões do litoral amazônico e do litoral semiárido nordestino, a plataforma apresenta areia e, no seu bordo, uma faixa contínua de fundos algais calcáreos e organogênicos. Do cabo Calcanhar para o sul, a plataforma apresenta, tipicamente, uma área recifal, seguida de fundos arenosos e lodosos. Em seguida, ocorre uma larga área algal-calcárea e apenas no seu bordo, uma estreita faixa organogênica. Os fundos algais cálcareos são interrompidos por grandes bolsões de lodo provenientes das águas lançadas ao mar pelos rios São Francisco (Coutinho, 1967/9 e Laborel, 1969) e Doce (Laborel, 1969) que se constituem em filtros ecológicos à dispersão de espécies de corais (Laborel, 1969), mas ao mesmo tempo, propiciam a existência de pesca comercial de camarões e peixes nesses locais. Schaeffer-Novelli (1989) propôs com base na ocorrência de manguezais, oito unidades para o litoral brasileiro, que concordam amplamente com os trabalhos pioneiros dos pesquisadores da Universidade Federal de Pernambuco, ou seja: Unidade I - (04º30’N - 01º42’N), do Oiapoque ao Cabo Norte (Amapá). Os manguezais são dominados pela siriúba (Avicennia sp), com indivíduos medindo aproximadamente 15 a 20m de altura. Unidade II - (01º42’N - 00º36’S), do cabo Norte à ponta Coruçá, no litoral do Pará (golfão Amazônico). Devido à influência das águas do Amazonas há uma redução da extensão das áreas de manguezal. Unidade III - (00º36’S - 02º15’S), da ponta Coruçá à ponta Mangues Secos (Maranhão). As Rhizophora atingem 20m de altura e dominam o bosque de mangue. Avicennia e Laguncularia ocupam porções mais elevadas dos terrenos. Unidade IV - (02º15’S - 05º08’S), da ponta Mangues Secos ao cabo Calcanhar (RN). Os manguezais são pouco desenvolvidos e estão associados aos estuários dos rios perenes. Unidade V - (05º08’S - 13º00’S), do cabo Calcanhar ao recôncavo Baiano. 58

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Rhizophora e Laguncularia aparecem como pioneiros. Nas partes mais internas, Avicennia e Laguncularia formam bosques mistos com mais de 10m de altura Unidade VI - (13º00’S - 23º00’S), do recôncavo Baiano até Cabo Frio (RJ). Por trás de restingas ocorrem, comumente, manguezais extensos. Unidade VII - (23º00’S - 29º20’S), do Cabo Frio a Torres (RS). Os indivíduos mais altos margeiam estuários, canais e ocorrem a jusante de alguns rios. Rhizophora, Laguncularia e Avicennia formam bosques mistos ou monoespecíficos. O limite das espécies que formam o mangue ocorre em Santa Catarina, aos 27º53’S para Rhizophora mangle e aos 28º30’S para Avicennia schaueriana e Laguncularia racemosa. Assim, no limite sul desta Unidade, não mais ocorre mangue. Unidade VIII - (29º20’S - 33º45’S), de Torres ao Chuí. Extensos depósitos praiais, associados a cordões de dunas e pontais arenosos. Ocorrem várias formações lagunares, isoladas do mar por barreiras múltiplas, resultantes de sucessivos eventos transgressivos e regressivos (Villwock,1983). Na região do Estado do Espírito Santo até Cabo Frio ocorrem bancos de algas Laminaria (duas espécies) e blocos de Lithothamnion. Muitas espécies tropicais não ultrapassam Cabo Frio, devido à ressurgência que aí ocorre e que se constitui num filtro ecológico para essas espécies (Ottmann e Ottmann, 1967/69). A área ao sul de Cabo Frio (23ºF) apresenta uma plataforma extensa coberta de fundos arenosos e areno-lodosos. Não mais ocorrem os fundos algais calcáreos, tão típicos do nordeste brasileiro (Coutinho, 1967/69). Segundo Coelho e Ramos (1972), para os crustáceos decápodes, podemos dividir o litoral brasileiro em quatro províncias: Guianense, Brasileira, Paulista e Argentina. A província Brasileira se estende das Guianas até onde ocorre a influência dos grandes rios equatoriais e, conseqüentemente, fundos de lama e areia, ou seja o golfão Maranhense. A província Brasileira se estende do golfão Maranhense até o Espírito Santo (desembocadura do rio Doce). A Província Paulista vai da desembocadura do rio Doce até o cabo Santa Marta Grande, em Santa Catarina. Do cabo de Santa Marta Grande para o sul, temos a província Argentina. Para aqueles autores a província Brasileira é equivalente à Antilhana ou Caraíbica. Reconheceu a existência de sete conjuntos faunísticos: do total).

1. Espécies guianenses - ocorrem nas Guianas, Amapá, Pará até o Maranhão (4%

2. Espécies tropicais contínuas - do Caribe até o Espírito Santo (19% do total). Várias espécies ocorrem até Santa Catarina. 3. Espécies tropicais de ocorrência disjunta ou descontínua, com um hiato nas Guianas e norte do Brasil (31% do total). 4. Espécies brasileiras - são espécies do Nordeste brasileiro, mas chegam até o Pará ou o Amapá e ao sul, até o rio da Prata (17% do total). 5. Espécies subtropicais - ocorrem principalmente no Sudeste brasileiro, chegando ao rio da Prata (9% do total). 6. Espécies temperadas - todas as espécies não tropicais ausentes do setor subantártico ou patagônico da América do Sul. 7. Espécies subantárticas - ocorrem da região patagônica até o norte do Rio de Janeiro.

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Os conjuntos 2, 3 e 4 representam cerca de 2/3 da fauna brasileira. A temperatura da água não é o único fator importante da distribuição das espécies de decápodes brasileiros. As espécies tropicais contínuas (conjunto 2) geralmente são ou habitantes preferenciais de fundos móveis (areia, lodo), ou são eurihalinas, ou ainda comensais de outras espécies com estas exigências ecológicas (Coelho e Ramos, 1972). Palácio (1982) propôs dividir a região litorânea atlântica sul-americana em cinco províncias zoogeográficas, das quais três interessam ao Brasil: 1. Tropical: até altura do cabo de São Tomé, (isoterma de 23ºc). 2. Paulista: da altura do cabo de São Tomé até o Rio Grande do Sul. 3. Norte Patagônico: do Rio Grande do Sul até o golfo de São Matias (Argentina). Considerou a região entre o Espírito Santo e o Rio Grande do Sul como uma região de transição faunística, caracterizada por conjuntos de organismos adaptados às condições flutuantes do meio. Existe aí, também, uma proporção considerável de espécies autóctones, e ocorrem espécies migratórias de regiões adjacentes. Christoffersen (1982) estudou a distribuição dos alfeóides (Crustacea, Caridea) na plataforma continental da região entre 23º e 35ºS. Verificou a existência de dois conjuntos de espécies ao norte e ao sul do cabo de Santa Marta (28ºS). As espécies, do norte daquele Cabo são tropicais e foram coletadas em águas com temperatura acima de 20,26ºC. As espécies ao sul são subtropicais e foram coletadas especialmente em água com temperatura abaixo de 21,22ºC. Vazzoler (1971) mostrou claramente a existência de duas regiões biogeográficas distintas na região entre o Cabo Frio (23ºS e 29ºS) e até altura da Província de Buenos Aires, caracterizadas pela variação das temperaturas médias anuais da água do mar a 10m de profundidade naquelas duas áreas. Na primeira (subtropical), as temperaturas mínimas são cerca de 5ºC mais elevadas do que na segunda (temperada quente), e nesta, as temperaturas são inferiores às da primeira área. Tommasi (1970), estudando a ocorrência de Ophiuroidea (Echinodermata) na região entre o Cabo Frio e a Província de Buenos Aires, mostrou que há regiões nas costas atlânticas sul-americanas que apresentam fatores de redução da fauna marinha litoral, ou sejam: A - região entre o foz do rio Orinoco até 2ºS (baixa salinidade). B - região de Cabo Frio (RJ) devido à ressurgência aí ocorrente (baixa temperatura). C - região do Rio Grande do Sul até a Província Buenos Aires (diminuição da temperatura com o aumento da latitude; massa de água costeira de baixa salinidade e temperatura, ocorrente na costa do Rio Grande do Sul-Uruguai-Rio da Prata, e, deslocamento norte-sul de convergência subtropical. A região entre 21ºS (ES) e 42º43’S pode ser considerada para os ofiuróides como uma larga e complexa área de transição da fauna tropical para a subantártica. Considera a região até 21ºS como tropical, daí até 42-45ºS como subtropical e, para o sul, subantártica. Tommasi (1988a) verificou, a 28-30ºS, o empobrecimento da fauna de equinodermes. Ao sul, ocorre uma fauna de espécies euritérmicas tropicais e subtropicais, a qual se sobrepõem, cada vez mais, espécies subantárticas. Tommasi (1988b) estudou a barreira hidrológica representada pela desembocadura do rio da Prata (35ºS) comparando-o com o cabo Hatteras (EUA). 60

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Na região de Cabo Frio a província de Buenos Aires, Noryioshi (1979) verificou que o Sciaenidae Micropogon ancylodon constitui 4 populações diferenciadas quanto a caracteres merísticos, morfométricos e otólitos. Essa espécie teria chegado à região Sul do Brasil por sucessivas radiações adaptativas durante os períodos pós-glaciais, vencendo vales adaptativos, aproveitando o surgimento de novos ambientes desocupados. As 4 populações ocorriam nas áreas: I - litoral do Espírito Santo; II - litoral entre Cabo Frio e Atafona; III - litoral dos estados de São Paulo, Paraná e norte de Santa Catarina; IV - litoral do Rio Grande do Sul. Durante os trabalhos do programa Rio Grande do Sul (GEDIPE), Tommasi (1970) assinalou, na região entre Torres (29ºS) e Maldonado (35ºS), um conjunto de espécies de equinodermes tipicamente tropicais, com grande descontinuidade em sua distribuição geográfica, como por exemplo, Astrocyclus caecilia (Ophiuroidea, Gorgonocephalidae), o que sugere ter, também, havido naquela região um refúgio pleistocênico à penetração para o norte ( até o sul da Bahia) durante os avanços glaciais da corrente fria das Malvinas. Esse fato de enorme importância biogeográfica, seria também responsável pela existência de Laminaria na região Cabo Frio (RJ) - Espírito Santo. Esses avanços da corrente das Malvinas até o sul da Bahia foram bem comprovados por Damith e Fairbrige (1970) e por Ab’Saber (1971). 2.2 - Monitoramento marinho em curso no Brasil O único monitoramento marinho permanente que tem sido realizado no Brasil é o de balneabilidade de praias em atenção à Resolução n.º 20 do CONAMA de 18/06/86 ( artigos 26 a 34). Apesar disso, são poucos os Estados que têm apresentado, anualmente, os resultados desse monitoramento de forma sistematizada e adequada. Destaca-se nesse sentido a CETESB em São Paulo. Bons relatórios têm sido, também, elaborados pela FEEMA (RJ). Em decorrência de derrame de petróleo, devido à ruptura de um oleoduto da Petrobras, foi iniciado um programa de monitoramento de longo termo dos impactos ecológicos sobre o ecossistema do manguezal de Bertioga (SP) e da sua dinâmica, em parcelas fixas. No rio Perequê, ilha do Cardoso, vem sendo realizado um programa de estudo de longo termo da dinâmica de um bosque de mangue, em janelas fixas. Ambos estudos são coordenados pela Dr.ª Yara Schaeffer-Novelli do IOUSP. Em Sepetiba, Coroa Grande (RJ), foi realizado um longo e amplo trabalho de geoquímica pela Universidade Federal Fluminense. Mais recentemente, o Departamento de Oceanografia da FURG iniciou, sob a coordenação da Dr.ª Clarisse Odebrecht, um programa de monitoramento da eutrofização da Lagoa dos Patos (RS) e o IOUSP participou, do Mussel watch, com amostragem em doze pontos do litoral brasileiro, sob a coordenação do Prof. Rolf Roland Weber (IOUSP). Os resultados não foram, ainda, publicados. Deve-se salientar que, apesar da importância da informação sobre a variabilidade do fitoplâncton a longo prazo, devido às implicações no processo de eutrofização, são escassos os estudos desta natureza para o ambiente marinho mundial (UNESCO, 1991). Sér. meio ambiente debate, 20

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2.3 - Estratégias para o estabelecimento e operação da rede de monitoramento da biodiversidade marinha no Brasil O gerenciamento de um programa brasileiro de monitoramento da biodiversidade marinha, num país com uma região tão longa e tão complexa, exige, obrigatoriamente, uma abordagem multiinstitucional. É absolutamente impossível que uma única instituição se encarregue desse programa. Além dessa abordagem, há premente necessidade de se garantir recursos para que as instituições participantes possam se equipar adequadamente para o monitoramento, cobrir despesas com embarcações de pesquisas no mar, estimular pesquisadores a participarem do projeto e garantir, financeiramente, que possam organizar centros de referências (coleções identificadas e bibliografia especializada) para os grupos biológicos estudados ou, se já existirem, para seu reforço, ampliação, etc. Devemos fazer distinção entre as questões gerais, o inventário e o monitoramento. Entre as questões gerais trataremos de: 1. Estabelecer bancos de dados, centros de referências (coleções e bibliografias). 2. Entrosamento com programas e redes internacionais de biosistemática. 3. Desenvolvimento de programas de avaliação da importância da biodiversidade marinha. No inventário trataremos de: 1. Como, o que e quando amostrar 2. Como analisar os resultados, a fim de avaliar os padrões de riqueza específica No monitoramento trataremos de: 1. Estudo dos padrões espaço-temporais da biodiversidade marinha 2. Estudo dos efeitos das ações antrópicas sobre os padrões espaço-temporais da biodiversidade marinha 3. Uso de técnicas de sensoreamento remoto no monitoramento 4. Desenvolvimento, atualização, compilação de manuais para classificação das espécies dos diversos grupos estudados. As questões básicas para um programa de monitoramento de biodiversidade são as seguintes: - Onde amostrar? (identificar locais representativos de diferentes condições biogeográficas) - O que amostrar? (identificar os grupos biológicos que devem ser amostrados) - Como amostrar? (métodos de coleta, de análise, meios flutuantes adequadamente equipados para a realização de amostragens, laboratórios para a análise das amostras) Duas opções logo surgem para nortear o programa, realizar trabalhos extensivos, num grande número de estações, ou realizar estudos mais intensivos em apenas alguns pontos. Se o ideal for a primeira opção, esbarraremos numa dificuldade inicial que é o alto custo desse programa e as complexas dificuldades para mantê-lo a longo prazo. Por outro lado, esse tipo de abordagem produzirá dados mais complexos, permitindo uma maior avaliação ecossistêmica. 62

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Já a segunda opção tem o mérito de ser mais simples e permitir descobrir padrões gerais de diversidade, padrões biogeográficos, para futuras pesquisas intensivas. A segunda questão é a complexidade de ambientes a serem monitorados. Como mostra Diegues (1989), a zona litôranea se compõe de várias subunidades: a litorânea, a costeira e a oceânica. Na região litorânea encontramos: restingas, dunas, manguezais, pântanos salgados, praias, costões rochosos, estuários, lagunas, baías, baixios. Já a zona costeira compreende os ecossistemas de fundos moles, parcéis, recifes de coral, fundos algais calcáreos, fundos detríticos de origem biogênica, o ambiente nerítico ( a coluna de água sobre a plataforma continental). Ora, monitorar a biodiversidade de representativos de todos esses ecossistemas é tarefa hercúlea, de longa duração e de enorme complexidade. Assim, preferimos sugerir ao IBAMA que a rede de monitoramento da biodiversidade marinha seja intensiva, mas que se restrinja a manguezais, recifes de coral, fundos lodosos sob a influência de grandes rios, em especial, o Amazonas e a sistemas neríticos. Nas áreas de plataforma continental, serão realizadas radiais contendo cada uma 4 pontos de coleta. Em todas as radiais esses pontos deverão ser posicionados de modo idêntico, de forma a permitir avaliações intra e inter-radiais. Os índices estatísticos a serem utilizados devem ser relativamente simples, como: Riqueza Relativa: RR = n/N onde n = número de taxa na estação N = número total de taxa na radial Ocorrência Relativa: OR = st/ST onde st = n.º de estações em que a espécie ocorre ST = n.º total de estações na radial Diversidade de Shannon & Weaver Similaridade entre radiais, coeficiente de Jaccard: J 1-2 = a/a+b+c onde a = nº de espécies comuns às radiais 1e 2 b = n.º de espécies presentes em a e ausentes em b c = n.º de espécies presentes em b e ausentes em a Análise de agrupamentos do tipo UPGMA ( média não ponderada), realizados com índices de similaridade obtidos dos cálculos do coeficiente de Jaccard. Todas questões apontadas anteriormente deveriam ser discutidas num seminário de 2 dias, coordenado pelo IBAMA. Sugerimos para participar desse seminário: 1. Petrônio Alves Coelho - LACIMAR 2. Audísio Luna - LACIMAR 3. Eurico Cabral de Oliveira - IBUSP 4. Aida Maria Esquinazi - UFPe 5. Zelinda M.A.N. Leão - UFBa 6. Naércio A. Menezes - MZUSP 7. Ana Maria S. P. Vanin - IOUSP 8. Gustavo de Mello Schimidt - MZUSP 9. Paulo Cunha Lana - UFPr (Pontal do Sul, Paranaguá) 10. Patrícia Cunninghan - IOUSP 11. Aírton S. Tararan - IOUSP 12. Norton Giannuca - FURG 13. Yoko Wakabara - IOUSP 14. Yara Schaeffer-Novelli - IOUSP 15. Aída Maria - UFPe 16. Enide Eskinaji - UFPe 17. Clóvis Teixeira - IOUSP Sér. meio ambiente debate, 20

18. Luz Amélia V. Pérez - IOUSP 19.Yassunobu Matsuura - IOUSP 20. Ana Cristina Bonecker - UFRJ 21. Y. Ugadim - IEMAPM 22. Sérgio l. Bonecker - UFRJ 23. Edmundo F. Nonato - IOUSP 24. José Luiz Leme - MZUSP 25. José Dias - IBAMA 26. Marise Paranaguá - UFPe 27. Isabel Maria Gurgel - UERJ 28. Jean L. Valentin - IEMAPM 29. Clarice Odebecht - UERG 30. J.P. Castello - UERG 31. Representante do IBAMA 32. Representante da DHN 33. Representante da SECIRM 34. Representante do MCT 35. Representante do MRE

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Ainda a título de sugestão, considero que o monitoramento não deve incluir todos os grupos marinhos animais e vegetais, mas aqueles que não apenas sejam bem conhecidos sistematicamente, mas que possuam especialistas seniores nacionais. Assim, sugiro os 10 seguintes grupos: 1. Scleractinia 2. Molllusca 3. Crustacea decapoda 4. Echinodermata 5. Peixes

6. Foraminifera 7. Algas bentônicas 8. Manguezal 9. Diatomáceas 10. Copepodes

Outros grupos são igualmente importantes, mas há necessidade de se identificar o efetivo interesse de especialistas nacionais em participar do monitoramento. São eles: 1. Antipoda

2. Isopoda

3. Sipunculida

4. Chaethognatha

5. Dinoflagelados

2.4 - Locais para amostragem A escolha dos locais para amostragem é uma questão crítica e deve haver pleno consenso sobre este assunto. Entre os requisitos para um local de amostragem temos: . Áreas que representem a diversas províncias biogeográficas marinha nacionais . Área rica em espécies . Área com uma boa variedade de habitats . Área não ou muito pouco infectada por atividades antrópicas . Área previamente estudada . Áreas onde a biodiversidade esteja efetivamente ameaçada Para se chegar aos locais de amostragem deve-se ouvir todos os indicados na relação do item anterior, através do método Deli (ver Linstone, H.A e Turoff, M. 1975 - The Delphi method: technique and applications. Addison-Wesley, M.A.). Sugerimos os seguintes locais: 1. Ilha de Maricá - Jipioca (Amapá). Estação Ecológica de Maricá - Jipóia. Decreto 86061 de 02/06/1961. Fundos lodosos sob influência do Amazonas, siriubal. 2. Arquipélago Fernando de Noronha. Parque Nacional Marinho. Decreto 96693 de 14/09/ 1988. Ecossistema insular e manguezal de Laguncularia racemosa na baía do Sudeste. 3.Cabo de Santo Agostinho (PE). Fundos algais calcáreos tropicais. Manguezais. 4. Abrolhos (Bahia). Parque Nacional dos Abrolhos. Decreto 88218 de 06/04/1983. Recifes de Coral. 5. Bacia de Campos (RJ). Região de ressurgência; filtro ecológico/biogeográfico. 6. Estação Ecológica de Tupinambás. Ilha de São Sebastião (SP). Fundos arenosos e arenolodosos subtropicais. 7. APA de Cananéia/Iguape (SP). Manguezais.

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8. Ao largo da reserva ecológica da ilha do Lobos (RJ). Fundos arenosos e areno-lodosos temperado-quentes. Com exceção do local 7, em todos demais serão monitorados os grupos planctônicos, bentônicos e os nectônicos, anteiormente sugeridos. Nos locais 1 e 7 serão monitorados o siriubal (local 1) e o manguezal (local 7), para as espécies de mangue, algas e bentos. 3. Unidades de conservação marítimas no Brasil Unidades de conservação são áreas que passaram a ser protegidas por instrumentos legais, estabelecidos com a finalidade de : 1. Preservar bancos genéticos da fauna e flora para que possam ser estudados de modo que venham a ser adequadamente utilizados no futuro. 2. Acompanhar, nas áreas protegidas e em seu entorno, as alterações que venham a ocorrer, quer de origem natural, quer de natureza antrópica, de modo que possam ser analisadas e medidas corretivas, quando couberem, serem tomadas. 3. Proteger recursos hídricos. 4. Proteger paisagens de relevante beleza cênica, bem como aquelas de valor cultural, histórico e arqueológico. 5. Desenvolver e conduzir a educação ambiental. 6. Proporcionar condições para o desenvolvimento da pesquisa que contribuam para a utilização sustentada dos recursos naturais. 7. Proteger áreas de particulares que tenham relevante interesse faunístico e/ou florístico. 8. Proteger áreas que venham a ter, no futuro, uma utilização racional do uso do solo. As áreas federais de proteção litorânea (ou próximo do litoral) e marinhos no Brasil são as seguintes: 1. Parques Nacionais (PARNA) - Parque Nacional dos Lençóis Maranhenses (MA) - Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha (PE) - Parque Nacional Marinho dos Abrolhos (BA) - Parque Nacional de Monte Pascoal (BA) - Parque Nacional Superagui (PR) - Parque Nacional da Lagoa do Peixe (RS) 2. Reservas Biológicas - Reserva Biológica do Atol das Rocas (RN) - Reserva Biológica de Santa Isabel (SE) - Reserva Biológica de Comboios (ES) - Reserva Biológica Marinha do Arvoredo (SC) 3. Estações Ecológicas - Estação Ecológica de Maricá Jipioca (AP) Sér. meio ambiente debate, 20

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- Estação Ecológica Foz do São Francisco (AL) - Estação Ecológica de Tamoios (RJ) - Estação Ecológica de Tupinambás (SP) - Estação Ecológica de Tupiniquins (SP) - Estação Ecológica de Carijós (SC) - Estação Ecológica do Tairu (RS) 4. Reserva Ecológica (RESEC) - Reserva Ecológica Ilha dos Lobos (RS) 5. Reservas Extrativistas (RESEX) - Reserva Extrativista Marinha do Pirafubaé (SC) Da relação acima, verifica-se que as áreas sugeridas nos itens anteriores para o monitoramento da biodiversidade marinha incluem 5 áreas de proteção litorâneas/ marinhas, ou seja: - Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha (PE) - Parque Nacional Marinho dos Abrolhos (BA) - Estação Ecológica de Maracá-Jipioca (AP) - Estação Ecológica de Tupinambás (SP) - Reserva Ecológica Ilha dos Lobos (RS) Os ecossistemas marinhos dessas áreas de proteção deverão ser estudados, envolvendo - além dos aspectos incluídos no monitoramento marinho, citados no item anterior - costões rochosos, praias, sistemas estuarinos/lagunares e manguezais neles contidos. Os projetos de pesquisa para cada uma das cinco áreas deverão ser organizados por grupos de pesquisadores de cada estado. Para a coordenação e indicação dos demais membros dos mesmos, sugerimos: AP e PE - Dr.ª Marres Paranaguá BA - Dr.ª Zelinda Leão SP - Prof. Eurico Cabral de Oliveira (IBUSP) RS - Dr. Norton Giannuca (FURG) 4. Monitoramento sobre poluição marinha A poluição marinha é uma das ameaças à biodiversidade. Assim, é importante dar continuidade dentro da REMA do Mussel watch realizada em 1993, em 7 das 12 localidades costeiras nacionais (resultados ainda não publicados), ou seja: - São Luís (MA) - Recife (PE) - Salvador (BA) - Vitória (ES) - Baía de Guanabara (RJ) - Santos (SP) - Lagoa dos Patos (RS) Em cada uma dessas localidades seriam analisadas, em mariscos (bivalves, 66

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moluscos), as concentrações de : 1. Metais Pesados: Cu - Zn – Pb – Hg - Cd 2. Organoclorados: Clorobifenis (CB 28, 52, 101, 118, 138 + 163, 153, 105, 156 e 180) Hexaclorobenzeno Heptaclor Oxiclordano Dieldrin Endrin DDE, DDD e DDT Clordane Toxafeno Triazina 3. Coliformes fecais, Salmonelas, Vibrio cholera. O programa seria coordenado por um grupo de pesquisadores ou seja: Rolf Roland Weber (IOUSP) Angela de Luca Rebelo Wagner (PUC, RJ) Representante CRA (BA) Representante FEEMA (RJ) Representante CETESB (SP) Representante IBAMA Representante Ministério da Saúde Representante Ministério da Agricultura Representante da FEPAM (ex. DMA) Representante da CPRH (PE) Seria importante o entrosamento deste programa com o Marine Environment Monitoring Programmes (MEMPs) do Joint Monitoring Group of the Oslo and Paris Commissions (OSPARCOM), com Marine Chemisty Working Group (MCWG) do International Council for Exploration of the Sea (ICES) e especialmente, com International Mussel Watch e com o Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre Investigação Mundial da Contaminação do Meio Marinho (GIPME). As atividades do projeto seriam estabelecidas pela comissão, bem como laboratórios que realizariam as análises, periodicidade das coletas, estabelecimento de um programa de garantia da qualidade e seu controle das análises químicas, riscos à saúde pública e ao ecossistemas marinho. 5. Intergração do programa de monitoramento da biodiversidade marinha com o plano nacional de gerenciamento costeiro e com o REVIZEE Muitos trechos da costa do Brasil sofrem problemas decorrentes da especulação imobiliária; deterioração da qualidade ambiental; perda de habitats críticos, redução das populações de peixes, moluscos e crustáceos; redução da biodiversidade e aumento do risco de acidentes naturais. Segundo Ehler e Basta (1993), várias características são comuns ao gerenciamento de áreas costeiras: Sér. meio ambiente debate, 20

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1. Aumento do conflito entre 3 objetivos: desenvolvimento econômico, da proteção ambiental e do uso de recursos marinhos (inclusive santuários marinhos). 2. Crescente número de usuários dos recursos costeiros e aumento dos conflitos entre eles. 3. Dispersão das responsabilidades por várias instituições e, pequena, ou nenhuma, coordenação entre elas. 4. Falta de recursos financeiros e humanos qualificados para as atividades de gerenciamento. 5. Ausência de dados, de informações para a compreensão dos problemas costeiros. 6. Crença pública e política de que os problemas costeiros têm solução imediata. A essas questões, adicionaremos para o Brasil: 7. Desinteresse do governo federal, na problemática costeira/marinha nacional; falta de vontade política para resolvê-la. 8. Falta de interesse do público pela problemática costeira/marinha. Os conflitos entre os usuários da região costeira e as áreas protegidas marinhas nacionais exigem uma integração entre o gerenciamento costeiro, programas de implantação e manutenção de parques marinhos, reservas ecológicas marinhas etc., bem como com o presente plano de monitoramento de biodiversidade marinha. O plano nacional de gerenciamento costeiro ( Lei Federal 7.661/88 ) visa orientar a utilização racional dos recursos na zona costeira, de forma a contribuir para elevar a qualidade de vida de sua população e a proteção do seu patrimônio natural histórico, étnico e cultural. Assim, está ligado ao presente plano de monitoramento de biodiversidade marinha, pois, o macrozoneamento é peça importantíssima na proteção de habitats e, portanto, da própria biodiversidade. Essa integração contribui para uma das mais importantes características do gerenciamento costeiro que é a integração de todos interessados nesta questão. Além disso, essa integração é fundamental para que se possa vir a compreender efeitos das ações antrópicas sobre a biodiversidade marinha. Como apontam Ehler e Basta (1993), o envolvimento do público em geral, das instituições de controle ambiental, de saneamento, de planejamento, etc. não é apenas desejável, mas sim absolutamente crítico para um efetivo sucesso a longo termo de programas como os presentes. Um bom exemplo dessa integração é o Florida Keys National Marine Sanituary Management Plan (EUA), da NOAA- National Oceanic and Atmospheric Administration, dos EUA. Outro grande programa é o Monterey Bay National Marine Sanituary na Califórnia, EUA. Assim, propomos que quando o presente programa estiver pronto, seja o mesmo discutido com os responsáveis pelo Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro para um adequado entrosamento entre ambos. Há hoje no Caribe mais de 100 áreas marinhas protegidas, entre elas: Belize - a Hol Chan Reserv (1987) - o segundo maior recife de barreira do mundo. República Dominicana - santuário de baleia humpback, em Silves Bank. Porto Rico - 3 áreas Costa Rica - 4 áreas Colômbia - 6 áreas Cuba - 17 áreas 68

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Soulê (1985) compara a biologia da conservação com a pesquisa sobre câncer. Qualquer pessoa que sofra dessa doença sabe duas coisas: 1º) as soluções são raramente simples, e mesmo a mais simples requer o envolvimento de especialistas e equipes multidisciplinares 2º) o tempo é um prêmio - não se pode esperar o ano que vem, os resultados do tratamento ( da pesquisa sobre conservação) devem ser atingidos o mais rápido possível. O mesmo acontece com a integração de gerenciamento costeiro x monitoramento da biodiversidade marinha, e mais ainda, com o programa Recursos Vivos da Zona Econômica (REVIZEE). Tanto a Agenda 21, aprovada na UNCED - Conferência das Nações Unidas Sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (RJ, 3 a 14/06/92), em seu capítulo 17, como a Convenção Internacional sobre o Direito do Mar, que deveria entrar em vigor no fim de 1994, estabeleceram obrigações à países que a elas aderiram, como é o caso do Brasil, de criar estoques, planejar e administrar os recursos costeiros, incluindo ações nas áreas de infra-estrutura, habitats, desenvolvimento humano, educação, biodiversidade e atividades econômicas. Assim, sugerimos um intenso entrosamento entre os programas de biodiversidade marinha, gerenciamento costeiro, REVIZEE e Agenda 21 (capítulo 17). Esse entrosamento poderia ser feito pela SECIRM através de um setor dedicado exclusivamente ao mar e que concretaria aqueles programas. 6. Parceiros internacionais Para o monitoramento de poluição marinha, recomendamos uma parceria formal com o International Mussel Watch, Coastal Chemical Contaminant Monitoring Using Bivalves, que é apoiado pela UNESCO - Intergovernamental Oceanographic Commission (COI). O Diretor Científico do IMW é o Dr. John W. Farrington do Coastal Research Center, Woods Hole Oceanographic Institution. É importante a associação com o programa BIOLAT - MAB da Smithsonian Institution, que combina intensa pesquisa em importantes locais neotropicais com uma larga variedade de programas de treinamento e de suporte institucional. Da mesma forma, com o Instituto Nacional de Biodiversidade ( INBIO ) da Costa Rica, com o US National Association of Marine Laboratories ( NAML) e com o European Marine Research Stations Network (MARS) e com o UNESCO’S Coastal Marine Project (CEMAR). Seria também interessante o entrosamento com a primeira rede internacional destinada á vigilância dos recifes de coral, parte do Sistema Mundial de Vigilância a Longo Prazo de Fenômenos Costeiros e Próximos da Costa, relacionados com Mudanças Climáticas (PNUMA/COI/OMN, UICN). Outro consórcio importante seria com o World Conservation Monitoring Center (Cambridge, Inglaterra). O NERC - Natural Environment Research Council, através do Phymouth Marine Laboratory (PML) (Inglaterra) está realizando um projeto que visa a compreensão dos mecanismos que determinam a biodiversidade e as conseqüências ambientais de sua perda. Como a natureza do habitat afeta sensivelmente a biodiversidade, em alto grau, para realizar um estudo de biodiversidade efetivamente comparativo entre diferentes regiões geográficas, numa escala global e, considerando que, o mesmo tipo de habitat não é encontrado em todos locais, estão usando substratos artificiais (nylon mesh pan scourers). Após alguns meses de imersão no mar, eles desenvolvem uma biota, em condições idênticas do habitat, que pode ser comparada em escala global. Seria essencial um convênio com o PML para organizar em cada local de amostragem na costa brasileira, a instalação de paineiras similares aos usados pelos pesquisadores ingleses e integrar esses estudos na rede mundial de estudos comparativos da biodiversidade de animais de habitats consolidados (rochosos). Sér. meio ambiente debate, 20

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7. Bancos de dados A DHN - Diretoria de Hidrografia e Navegação, Marinha do Brasil, Ilha Fiscal, RJ, possui um excelente banco de dados oceanográficos. Sugiro que seja tentado um acordo com esta instituição de modo que possa abrigar, também, os resultados dos monitoramentos de biodiversidade marinha. Seu endereço é: DIRETORIA DE HIDROGRAFIA E NAVEGAÇÃO DEPARTAMENTO DO BANCO NACIONAL DE DADOS OCEANOGRÁFICOS RUA BARÃO DE JACEGUAY S/N - PONTA DA ARMAÇÃO NITERÓI - CEP: 24048-900 RIO DE JANEIRO - BRASIL TEL: (021) 719-2626 ramais 173 ou 134 ( Divisão de Dados Oceanográficos ) TELEX: Nacional - 222134043 / 2133858 Internacional - 2153259, 2153260 e 2153261 FAX: (021) 718-7941

8. Programa nacional de treinamento em biodiversidade marinha Sugerimos que seja realizado um Programa Nacional de Treinamento em Biodiversidade Marinha, o qual poderia ser localizado no IOUSP, apoiado pelo IBAMA/MCT/ CNPq e que poderia ter como conteúdo básico: 1. A Agenda 21 da UNCED - Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar e a Convenção sobre Diversidade Biológica. 2. Oceanografia, biogeografia e biodiversidade. 3. Identificação e monitoramento dos componentes da diversidade biológica 4. Áreas de proteção para a conservação in situ da biodiversidade. 5. Gerenciamento costeiro, destruição de habitats e desenvolvimento sustentado. 6. Poluição marinha. Ecotoxicologia. 7. Legislação ambiental EIA/RIMA. 8. Produção e liberação de organismos geneticamente modificados. 9. O conhecimento tradicional das populações indígenas e de comunidade locais. 10. Bancos genéticos para a conservação e recuperação dos recursos da diversidade biológica. 11. Recuperação de ecossistemas degradados. 12. Pesquisa sobre identificação da diversidade biológica e biotecnologia. 13. Programas internacionais e nacionais sobre biodiversidade. 14. Organização de centros de referência e bancos de dados sobre diversidade. O curso poderia ser extensivo, com a duração de quatro semanas ou, numa opção intensiva, de apenas uma semana (7 dias), sendo ministrados dois itens por dia. Parece-nos que, inicialmente, a segunda opção é adequada. Cada professor deveria preparar uma apostila sobre o assunto a ser tratado, acompanhado de farta bibliografia. O curso intensivo seria teórico, mas o extensivo comportaria a realização de exercícios e seminários. O número máximo de alunos seria de 30. Acreditamos que um curso deste tipo consiga, com facilidade, suporte de programas internacionais como por exemplo: UICB/AIOB-UNESCO, UICB/SCOPE-UNESCO, COMARUNESCO, GOOS (COI, OMM e PNUMA), GIPME, etc. Os professores seriam especialistas de todo Brasil, indicados por uma comissão coordenadora, a qual, tentativamente, sugerimos ser constituída por:

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Representante do IBAMA (Coordenador) Prof. Rolf Roland Weber (IOUSP) Dr.ª Carmen Lúcia D. B. R. Wongtschowski (IOUSP) Prof. Clóvis Teixeira (IOUSP) Prof. Luiz Roberto Tommasi (IOUSP) Prof. José Galizia Tundisi (EEUSP S. Carlos) Prof. Eurico Cabral de O. Filho (IBUSP) Dr. L. H. Melges (UERJ) Caberia, também, a essa comissão organizar o currículo final do curso, o conteúdo de cada item e indicar os especialistas que os ministraria. 9. Principais instituições brasileiras com potencial de se incorporar à REMA meio aquático marinho A relação seguinte apresenta as principais instituições nacionais com capacidade de apoiar a REMA - Meio Aquático Marinho. Devem ser contactadas individualmente para se verificar sua disponibilidade, potencial e interesse. Fundação de Estudos do Mar Rua Marquês de Olinda, 18 Botafogo - Rio de Janeiro - RJ 22251 Dep. Oceanografia Universidade Federal de Pernambuco Av. Bernardo Vieira de Mello, 986 Campus Universitário - Piedade Recife - PE - 50739 Museu de Zoologia da USP Av. Nazaré, 481 São Paulo - SP - 04263-000 Fundação Zoobotânica do Rio Grande do Sul Rua Dr. Salvador Franca, 1427 Porto Alegre - RS - 90610 Cx. Postal 1188 Núcleo de Estudos e Pesquisas de Recursos do Mar Universidade Federal da Paraíba Campus Universitário João Pessoa - PB - 58059 Departamento de Oceanologia Fundação Universidade do Rio Grande Rio Grande - RS - 96201-900 Cx. Postal 474 Departamento de Oceanografia Universidade Federal Fluminense Niterói - RJ - 24251-970 Cx Postal 107.001 Sér. meio ambiente debate, 20

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Departamento de Oceanografia e Limnologia Universidade do Rio Grande do Norte Natal - RN - 59001-970 Cx. Postal 143 Instituto de Pesquisas Marítimas, Fluviais e Lacustres Universidade Federal de Pelotas Pelotas - RS - 96010-000 Cx. Postal 402 Laboratório de Hidrobiologia Universidade Federal do Maranhão São Luiz - MA - 65000-970 Cx. Postal 571 Universidade Federal de Santa Catarina Florianópolis - SC - 88040-900 Cx. Postal 476 Universidade Federal de Sergipe Campus Universitário Aracaju - SE - 49001-970 Cx. Postal 353 Instituto de Pesca Av. Francisco Matarazzo, 455 São Paulo - SP - 050010-300 Centro de Pesquisas e Manejo de Abrolhos Praia Kitogongo, s/n Ponta da Praia - Caravelas - BA - 45900-000 Universidade Federal da Paraíba Campus Universitário João Pessoa - PB - 58000 Núcleo de Estudos do Mar Universidade Federal de Santa Catarina Cidade Universitária Trindade - Florianópolis - SC - 88040-900 Instituto de Biociências USP Rua do Matão, Travessa 14 São Paulo - SP - 05422-970 Cx. Postal 11461 Centro de Biologia Marinha USP São Sebastião - SP - 11600-000 Cx. Postal 83 72

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Departamento de Zoologia Fundação de Biologia Universidade Federal do Rio de Janeiro Ilha Universitária - Bloco A Rio de Janeiro - RJ - 21941-000 Instituto de Estudo do Mar “Alves Paulo Moreno” IEAPM Rua Kioto, 253 Praia dos Anjos Arraial do Cabo - RJ - 28930-000 Universidade Federal do Espírito Santo Campus Alaor de Queiroz Araújo Goiabeiras - Vitória - ES - 29069 Departamento de Zoologia Universidade Federal do Paraná Curitiba - PR - 80001-970 Cx. Postal 441 Departamento de Zoologia Instituto de Biologia UNICAMP - Campinas - SP - 13081 Cx. Postal 6109 Centro de Estudos do Mar UFPR Av. Beira mar, s/n Pontal do Sul Paranaguá - PR - 83212-010 Centro de Ciências Biológicas Universidade Santa Úrsula Rua Fernando Ferrari, 75 Botafogo Rio de Janeiro - RJ - 2223 - 040 Fundação Instituto de Pesca do Estado do Rio de Janeiro SID-CPEM Praça 15 de Novembro, 2 3º andar Rio de Janeiro - RJ - 20010-010 Instituto Oceanográfico da USP Praça do Oceanográfico, 191 Cidade Universitária - Butantã São Paulo - SP - 05508

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10. Bibliografia AB’SABER, A. N. A organização natural das paisagens inter e subtropicais brasileiras. III. Simpósio sobre cerrado. Ferri, M.G. (Coord.). Ed. Edegard Blucher Ltda e EDUSP, p. 1-14. BALECH, E. 1954. Divison zoogeográfica del litoral sudamericano. Revista Biol. Mar. 4: 184-195. CASTRI, F. Di; VERNHES, J.R. e YOUNES, T. 1992. A proposal for an International network on inventory and monitoring of biodiversity Special Issue - 27. Biology International. The International Union of Biological Sciences. Necus Magazine. CHRISTOFFERSEN, M. L. 1982. Distribution of warm water alpheoid Shrinp (Crustacea, Caridea) on the continental shelf of Eastern South America between 23 and 35º Lat. S. Bolm Inst. Oceanogr., S. Paulo, 31 (1): 93-112. COELHO, P.A. e RAMOS, M.A. 1972. A constituição e distribuição da fauna de decápodes do litoral leste da América do Sul entre as Latitudes de 5ºN e 39ºS. Trab. Oceanogr. Univ. Federal de Pernambuco, Recife, 13: 7-28. CONNEL, Y.H. 1978. Diversity in tropical rain forest and coral reefs. Science. 199:1302-1310. COOKE, A.H. 1895. Mollusca. In: HARMER, S.F. e SHIPLEY, A.E., ed., Cambridge Natural History, London, MacMillan, v. 3. COUTINHO, P. N. 1967/69. Preliminary Investigations of the sediments between Cabo Frio and São Sebastião Island (Brazil). Trabs. Oceanogr. Univ. Fed. Pe., Recife.9/11:51-66. COUTINHO, P. N. 1967/69. Sedimentation at the mouth of the São Francisco River. Trabs. Oceanogr. Univ. Fed. Pe. v(9/11): 51-66. D’ ORBIGNY, A.D. 1835-43. Voyage dans l’Amérique Meridionale exécuté pendant les années 1827 - 1833. Tome V. Partie 3. Mollusques. Paris et Strasbourg. DALL, W.H. 1901. Results of the Branner-Agassiz Expedition to Brazil. V. Mollusca from the vicinity of Pernambuco. Proc. Wash. Aca. Sci., 3: 139-147. DAMUTH, J.E. e FAIRBRIDGE, R.W. 1970. Equatorial Atlantic deep-sea arkosia sands and ice-age aridity in tropical South America. Bull. Geol. Soc. of America, 81: 189-206. DANA, J.D. 1853. On an isothermal oceanic chart, illustrating the geographical distribution of marine animal. Am. J. Sci. Arts, ser. 2, 16: 153-167. DARLINGTON, P. J. 1957. Zoogeography. New York. John Wiley & Sons. EKMAN, S. 1953. Zoogeography of the Sea. Londres. Sedgwick & Jackson, Ltd. 417p. FORBES, E. 1856. May of the distribution of marine life. In: Johnston, A.K., ed.,The physical atlas of natural phenomena. Edinburgh, Blackwood & Sons. FOREST, F. 1966. Campague de la Calypso au large des côtes atlantiques de l’Amérique du sud (1961-1962). 1. Compterendu et liste des stations. Annls Inst.Océanogr., Monaco, 44: 329-350. 74

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TOMMASI,L. R. 1988b. Equinodermes coletados pelo N/Oc. Almirante Saldanha entre 26º59’S e 38º39’S. Relat. Ints. Oceanogr. Univ. S. Paulo, no 22, 11pgs. UNESCO. 1991. Programme on harmgul algal blooms. IOC Programme development for harmgul algal blooms. Wokshop Report no 80. USEPA 1950. Reducing risk: setting priorities and strategies for environmental protection. Science Advisory Board, Relative Risk Reduction Strategies Committee. VANNUCCI, M. 1964. Zoogeografia marinha do Brasil. Bolm. Inst. Biol. Mar 7: 113 - 121. VAZZOLER, A.E.A. de M. 1971. Diversificação fisiológica e morfológica de Micropogon furneii (Desmarest, 1822) ao sul do Cabo Frio, Brasil. Bolm Inst. Oceanogr. Univ. S. Paulo, 20 (20): 1-70. VILLCH, J.A. 1983. Geology, geomorphology and paleogeographic evolution of the Rio Grande do Sul coastal province. In: Encontro sobre lagunas costeiras da América Latina: metodologia, resultados e programas de cooperação, Porto Alegre, 1983, resumo, 5p. WOODWRD, S.P. 1856. A manual of the Mollusca. London, John Weale, 486p. YAMAGUTI, N. 1979. Diferenciação geográfica de Macrodon ancylodon (Bloch & Schneider, 1801) na costa brasileira entre as latitudes 18º36’S e 32º10’S, Etapa 1. Bolm. Inst. Oceanogr., Univ. S. Paulo, 28 (1): 53-118.

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Monitoramento do Meio Ambiente Atmosférico

Volker W. J. H. Kirchoff

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Sumário 1. Introdução............................................................................................................................................... 81 2. O que é monitorar a atmosfera............................................................................................................ 82 3. Os grandes temas de mudanças globais............................................................................................ 83 4. Porque a necessidade de uma rede de monitoramento.................................................................... 83 5. Sugestões de uma rede-piloto............................................................................................................. 85 6. Necessidades iniciais de uma rede-piloto.......................................................................................... 85 7. Necessidades de integração para atender outras áreas de conhecimento.................................... 86 8. Equipamentos necessários................................................................................................................... 86 9. Recursos humanos.................................................................................................................................. 86 10. Outras redes de monitoramento....................................................................................................... 87 11. Objetivos e cobrança de resultados.................................................................................................. 87 12. Política de implementação da rede................................................................................................. 87 13. Conclusões............................................................................................................................................ 88 14. Bibliografia recomendada................................................................................................................. 88

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1. Introdução O meio ambiente em que vivemos seria bem diferente do que é hoje se não tivesse surgido a vida na superfície terrestre. É que a interação entre meio ambiente e vida é muito forte e sempre existiu. Durante toda a evolução da vida na superfície terrestre, que se estima em 600 milhões de anos, a interação vida-meio ambiente causou a reciclagem de vários elementos químicos entre diferentes reservatórios, e imprimiu sua característica à formação dos sedimentos. Sem a fotossíntese realizada pelas plantas verdes, não haveria, por exemplo, oxigênio na atmosfera terrestre, e portanto, também não haveria uma camada de ozônio para nos proteger de radiação danosa. A presença do oxigênio introduzido na atmosfera pelos seres vivos (algas) modificou profundamente a composição e a química da atmosfera. A interação entre a vida e o meio ambiente sofreu várias modificações em diferentes períodos do passado, sempre que outros organismos passaram a dominar e impor suas características ao meio externo. Em termos de tempos geológicos, a contribuição do homem na mudança do meio ambiente é relativamente recente. É interessante observar que nem sempre estas mudanças foram lentas e graduais. Houve alguns episódios em que eventos repentinos causaram, aparentemente, mudanças ambientais que resultaram na extinção em grande escala de certas espécies vivas. A ação do homem sobre o meio ambiente difere das ações anteriores pela capacidade que tem de influir simultaneamente também no habitat de outros organismo. Algumas indicações sugerem que as mudanças presentemente em curso são suficientes para não só ameaçar espécies consideradas inferiores, mas também a própria humanidade. O impacto do homem no meio ambiente passou de regional para assumir hoje um caráter global. Os exemplos mais conhecidos no momento, em termos de efeitos globais, são a diminuição da camada de ozônio, e o efeito estufa. Torna-se cada vez mais importante monitorar certos parâmetros para que esta informação possa servir para avaliação de impactos. O homem moderno deve ser capaz de prever como diferentes organismos responderão às mudanças ambientais tanto em seu metabolismo como também geneticamente, e como estas reações tenderão a influenciar o ambiente. Para isto é necessário medir, registrar e avaliar, em escala global e local. Um dos processos mais importantes causados pela ação do homem é o efeito estufa. O conceito de efeito estufa surgiu com a constatação de que o gás carbônico (CO2) presente na atmosfera tem sua concentração aumentada continuamente. Com isto devem ocorrer mudanças no equilíbrio radiativo do sistema planeta/atmosfera, mas também as reações dos seres vivos a estas mudanças. Entretanto, apesar de algumas certezas, é impossível hoje fazer previsões precisas e corretas sobre como exatamente deve mudar o ambiente, e como certas espécies deverão responder a estas mudanças. Os problemas relacionados ao efeito estufa e o ciclo do carbono são interdisciplinares fato que requer uma interação muito próxima de cientistas de diferentes áreas, e manipulação de dados muito diversos como, por exemplo, a produção mundial de lixo, os desmatamentos, transporte de sedimentos em rios e lagos, etc. Tudo isto mostra que o assunto efeito estufa é bastante complexo e que não existe uma solução simples e rápida. O planeta Terra, assim como os outros mais conhecidos do nosso sistema solar, se desloca no espaço sujeito às leis gravitacionais. Neste aspecto, a presença ou não de uma atmosfera, uma massa gasosa externa à parte sólida, não é muito importante. No entanto, o equilíbrio radiativo que resulta da hipótese de que a Terra não possui atmosfera implica uma temperatura média da superfície bem menor, da ordem de 45ºK, do que a temperatura média real observada. A presença dos gases em volta dos planetas, modifica, portanto, em alguns casos até profundamente, o equilíbrio radiativo dos corpos celestes. Sér. meio ambiente debate, 20

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A temperatura do equilíbrio radiativo corresponde a 253º K. Deve-se notar que 253º K equivalem a -20º C (20 graus negativos na escala Celsius). Sabemos que a temperatura média em nossas latitudes é da ordem de 25º C (25 graus positivos). Portanto, algum fenômeno adicional, que ainda não foi levado em conta, deve ser responsável pelo aumento de temperatura de 45 graus. O fenômeno responsável por esta elevação de temperatura, e que, portanto, salva a Terra de ser totalmente congelada, é o efeito estufa, causado pela presença dos gases naturais (atmosfera). A atmosfera que envolve a Terra é um gás, ou melhor, uma mistura de gases. Acreditase que os gases que hoje formam a atmosfera terrestre foram lentamente, expelidos pela parte sólida. Os gases mais abundantes são o nitrogênio (N ) e o oxigênio (O ) (este é o gás mais importante para o processo biológico da respiração). N O são chamados de gases majoritários porque existem em maioria. Os restantes são os gases minoritários, isto é, os que existem em minoria. Em geral, uma massa gasosa apresenta características ópticas distintas para radiação eletromagnética de comprimentos de onda diferentes. Na Terra, por exemplo, a atmosfera é praticamente transparente para a radiação solar visível (isto é, a que vem diretamente do Sol). Em outras palavras, a radiação solar é absorvida não na atmosfera, mas na superfície sólida. após a absorção pela superfície, esta deve reemitir a energia absorvida, o que ocorre em comprimentos de ondas de radiação maiores, segundo a lei de Wien. Para a Terra, a emissão ocorre no infravermelho, isto é, após 0,7mm até 35mm. Nesta faixa, a atmosfera (isto é, alguns de seus gases) não é mais transparente. Determinados comprimentos de onda são agora absorvidos por gases na atmosfera e uma parte será reorientada para a Terra (e não para o espaço como seria com gases transparentes). A atmosfera terrestre costuma ser dividida em camadas, cada uma delas com nome próprio. O parâmetro que determina uma das maneiras de se dividir a atmosfera em camadas é a temperatura. A camada mais próxima da superfície é a troposfera. Esta é a camada mais importante para o efeito estufa. É a região mais afetada pela ação antropogênica através da emissão direta de vários gases da superfície. Na região tropical, esta camada vai até 16 km de altura, até a tropopausa. Da superfície onde a temperatura é Ts, até a tropopausa, a temperatura decresce com a altura. Da tropopausa até a estratopausa, a 50km, a temperatura cresce com a altura, pois na estratosfera, que é a camada logo acima da troposfera, existe uma fonte de calor representada pelo ozônio da atmosfera, que transfere calor para as moléculas dos gases majoritários após absorver radiação ultravioleta do sol. É esta a função associada a efeitos biológicos mais importante do ozônio, da qual resulta como conseqüência o aquecimento da estrafosfera. Acima da estratosfera, até a mesopausa, em 90km, a temperatura volta a decrescer com a altura na mesosfera e acima desta na termosfera, a temperatura mais uma vez aumenta com a altura, até atingir o máximo, a temperatura exosférica TE. Pode-se notar que as pausas, isto é, os limites entre as diferentes camadas, estão localizadas nos pontos onde o gradiente de temperatura é nulo. As camadas mais importantes no contexto desta análise das questões ambientais são sem dúvida as duas mais próximas da superfície, a troposfera e a estratosfera. Pode-se mostrar que a concentração dos gases majoritários e a pressão atmosférica diminuem com a altura, obedecendo uma lei exponencial, ou quase exponencial. Isto significa que à medida que se sobe na atmosfera, esta se torna mais rarefeita. 2. O que é monitorar a atmosfera Monitorar a atmosfera é estar constantemente obtendo respostas da atmosfera em forma de valores numéricos de alguns de seus parâmetros que foram previamente escolhidos. Monitorar é, essencialmente, obter informações quantitativas que vão auxiliar o pesquisador a 82

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melhor entender os diferentes fenômenos atmosféricos. Quando se estuda a atmosfera sob o ponto de vista ecológico, isto é, quando se quer conhecer o meio atmosférico e a influência que o homem moderno exerce sobre a mesma, consideram-se em geral duas grandes subdivisões do conhecimento que são: a meteorologia no seu sentido mais amplo, incluindo-se aí a climatologia, e a química da atmosfera, que inclui o conhecimento detalhado dos gases da atmosfera, sua composição, sua concentração, o seu transporte, além de outras características. Estes itens são em geral incluídos na linha genérica de ciências da atmosfera. Quando se considera o estabelecimento de uma rede de monitoramento da atmosfera devem ser incluídos sensores para monitorar ambas as áreas mencionadas acima. Voltamos assim à pergunta básica: o que é monitorar a atmosfera? Monitorar a atmosfera é auscultar a própria nos seus parâmetros mais importantes e básicos para o seu melhor entendimento. Monitorar é obter dados numéricos nas duas subdivisões mais importantes acima, para o diagnóstico básico da meteorologia e da química da atmosfera. É com base nestes dados que o físico, o químico, o meteorologista, o pesquisador vai construir a sua teoria para explicar e entender o meio gasoso que nos envolve. Os dados monitorados podem ser considerados como os parâmetros básicos que o médico utiliza quando faz o diagnóstico do paciente. Mas para isto precisa do exame de urina, do exame de sangue, e de outros, dependendo da necessidade. Assim, também é necessário examinar a atmosfera, constantemente, para não só conhecer alguns de seus aspectos de momento, mas também para observar e registrar a sua evolução, a sua mudança com o tempo. Isto é monitorar. A importância do monitoramento fica muito claro quando começamos a fazer perguntas como: a atmosfera está mudando? O homem moderno já conseguiu modificar artificialmente o que atmosfera levou milhões de anos para produzir? A camada de ozônio realmente está diminuindo? A radiação ultravioleta está realmente aumentando na superfície da Terra? O clima está mudando? A temperatura média da Terra está aumentando, como prevê o efeito estufa? - Nenhuma destas perguntas pode ser respondida se não houver a observação sistemática de alguns dos parâmetros que são característicos aos processos sobre os quais estamos fazendo as perguntas. Para poder responder com confiança é preciso haver um banco de dados com a evolução dos parâmetros em estudo. O monitoramento é, portanto, fundamental. Não se pode responder a nenhuma das perguntas acima sem a disponibilidade dos dados. 3. Os grandes temas de mudanças globais Entre os grandes temas de mudanças globais devem ser prioritariamente considerados o efeito estufa e mudanças climáticas, e a diminuição ou destruição da camada de ozônio. No Brasil, temos ainda um assunto regional de enorme importância, até com implicações globais, que são as queimadas. (Ver Bibliografia). 4. Porque a necessidade de uma rede de monitoramento A atmosfera sofre a influência direta dos ecossistemas de superfície. Isto porque a parte sólida do planeta influi diretamente sobre a massa gasosa. Aliás, é a parte sólida que é a responsável pela formação básica da massa gasosa há muitos bilhões de anos. Certos ecossistemas de superfície são muito influentes para modificar, ou pelo menos influenciar, a atmosfera. Na região costeira, por exemplo, grande influência na composição do ar é exercida pela presença do mar, e o deslocamento das massas de ar sobre o oceano, o que pode ocorrer durante vários dias. Outro exemplo importante para o Brasil é a região Sér. meio ambiente debate, 20

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Amazônica. A floresta exerce também uma influência poderosa sobre vários aspectos da atmosfera, o que ocorre também com a região do Cerrado brasileiro, onde domina a prática da queimada sazonal. É evidente, portanto, que, se quisermos conhecer a atmosfera inferior destes ecossistemas, precisamos fazer o monitoramento exatamente nestas regiões. E não podemos esquecer também que a atmosfera não tem limites geográficos confinantes. Ela é móvel, isto é, ela se desloca constantemente. O movimento das massas de ar faz com que a influência direta num certo local possa ser observada em outro local bem distante da origem. Para acompanhar este movimento das massas de ar é possível que seja necessário definir certos pontos preferenciais de observação para os estudos de certos fenômenos ligados ao transporte das massas de ar. Com o exposto acima fica claro porque é necessário estabelecer uma rede de monitoramento. O Brasil é um país de grandes dimensões geográficas e rico em ecossistemas que são muito distintos entre si. Citamos alguns acima, mas estas subdivisões, evidentemente, podem ser facilmente aumentadas. As diferentes escalas de observações. As observações locais referem-se em geral a uma extensão de dimensões menores, em geral com um único observatório, ou sítio de monitoramento, por exemplo numa instituição, numa universidade, etc. As observações regionais já englobam uma série de pontos de observação para monitorar uma certa região com características próprias, como por exemplo, a região do Cerrado brasileiro (caso em que a região fica dentro dos domínios de uma só Nação; pode-se aí chama-las de Observações Nacionais), ou como outro pode-se citar a região amazônica, que em seu conjunto extrapola limites nacionais. As observações globais são o conjunto de dados que refletem a realidade do globo terrestre como um todo. Seria um conjunto de observatórios regionais (ou nacionais). É este conjunto que em geral interessa para se estudar fenômenos de grandes dimensões que afetam o planeta como um todo. É evidente que os conjuntos de dados maiores são o somatório de esforços individuais. Assim, existe uma máxima que diz: Pense globalmente, atue localmente. O observatório local é o núcleo cujo somatório vai representar a região, o domínio nacional de um país, e finalmente, o global. Regras de seleção: critérios A existência de uma estação candidata a se tornar parte da rede de monitoramento fica registrada através de seu cadastro que deve conter as seguintes informações: 1- Nome da estação 2- Localização; cidade, estado; longitude e latitude 3- Organização responsável; pessoa de contato, endereço, telefone 4- Tipo de ecossistema do meio geográfico 5- Tipo de pesquisa ou monitoramento que é feito 6- Acesso ao local, distância da cidade mais próxima, facilidades, número de pessoas, observadores, etc. Um dos critérios de seleção deve considerar a necessidade essencial de monitoramento da maioria dos parâmetros por um período de tempo longo. As mudanças que se desejam registrar acontecem em escalas de tempo de dezenas de anos, e, por isto, uma 84

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boa estação de monitoramento deve prestar serviços por pelo menos vinte anos. Muitas estações não são capazes de resistir a este critério por já estarem muito próximas das cidades. 5. Sugestão de uma rede-piloto Regiões Básicas de Amostragem no Brasil Pode-se dividir o Brasil em diversas regiões, dependendo do critério adotado. No caso de estudos atmosféricos, e tendo como critério o regime de chuvas, pode-se dividir o Brasil em três grandes regiões: a Amazônia, onde o regime de chuvas é abundante, não tendo praticamente época de seca; a região do Cerrado central, onde existe uma clara definição de estação seca; e a região do litoral brasileiro, a costa marítima do Atlântico, onde, por exemplo na região do Nordeste brasileiro, as massas de ar sempre se originam do oceano Atlântico, o que permite a amostragem de ar quase que sem contaminação humana. É evidente que a divisão acima permite várias subdivisões. Alguns dos locais que se pode considerar prioritários são descritos a seguir. Locais prioritários nas regiões básicas: - Região da Amazônia: Belém, Manaus e Porto Velho. - Região do Cerrado: Goiânia, Cuiabá e Porto Nacional. - Região Litorânea. A orla costeira do Brasil é muito extensa. Sugere-se que inicialmente haja um posto de observação no Nordeste (Natal), no Sul (Porto Alegre), e na orla paulista (Ubatuba). Outros pontos de interesse são: Palmas, Araguaína, Conceição do Araguaia, Alta Floresta, Campo Grande, região do Pantanal (Passo do Lontra, Porto Jofre), Vilhena, Ji-Paraná, Rio Branco. 6. Necessidades iniciais de uma rede-piloto As necessidades iniciais de uma rede piloto são: a) Definição física dos locais exatos escolhidos para o monitoramento. b) Levantamento de necessidades de reparos e melhoramentos iniciais nos sítios escolhidos (estamos supondo que estes já existem e estão disponíveis através de uma instituição colaboradora). Pode haver casos em que se tenha que construir o sítio de monitoramento. c) Identificação do pessoal técnico responsável pelas observações em cada sítio de monitoramento. Treinamento para as observações. d) Instalação dos primeiros equipamentos de monitoramento, fase inicial de observações preliminares. e) Visita de inspeção técnica por supervisor de alta qualificação para avaliar as condições iniciais do sítio de monitoramento e seus responsáveis técnicos. No caso de aprovação, definese o início oficial do monitoramento daquele sítio.

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7. Necessidades de integração para atender outras áreas do conhecimento Cada área do conhecimento científico deverá definir as suas necessidades para localizar seus sítios de monitoramento, porém deverá existir uma flexibilidade suficiente para que em um determinado sítio (ou em vários, ou em todos) ocorra o monitoramento de parâmetros das quatro áreas definidas pelo IBAMA: o meio atmosférico, o meio terrestre, o meio aquático continental, e o aquático marinho. Para que ocorra este casamento de interesses e a coordenação dos mesmos, estão sendo planejadas reuniões com os vários representantes para a definição conjunta. Poderão ocorrer casos em que um determinado sítio de amostragem seja de interesse de apenas um dos meios mencionados acima. Estes interesses também não são permanentes. Haverá sempre uma certa inovação esporádica, e mudanças naturais nos diversos monitoramentos dos sítios de amostragem, especialmente os mais sofisticados, refletindo o interesse de momento dos pesquisadores envolvidos. Não deverá haver mudança, no entanto, no monitoramento de parâmetros básicos. 8. Relação de equipamentos prioritários a) Sensores de radiação UV tipo biometer. Justificativa: São necessários para complementar as observações da diminuição da camada de ozônio. Como esta diminuição é esperada, a radiação UV deverá aumentar. Este aumento precisa também ser documentado. Este tipo de sensor documenta o aumento sob o ponto de vista biológico, isto é, levando em conta a sensibilidade da pele humana. Valor US $ 8000,00 b) Sensores de radiação UV tipo unidades de engenharia. Justificativa: Como acima, esperando um aumento nesta radiação, é importante que isto seja também medido, agora em unidades de engenharia, quer dizer Watts/m2. Valor US $ 18000,00 c) Sensor de ozônio de superfície para a medida in situ de ozônio. Valor US $ 15000,00 d) Sensor de ozônio estratosférico para monitoramento da camada de ozônio. Valor US $ 130000,00 e) Sensor de monóxido de carbono para medidas sistemáticas de CO. Valor US $ 40000,00 f) Sensores meteorológicos básicos (pressão, temperatura, umidade relativa, direção de vento, velocidade de vento) e sistemas de gravação automática de dados. Valor US $ 30000,00 g) Estação para Sensores de altitude, para lançamento em balão, com as seguintes medidas: temperatura, umidade, pressão, direção e velocidade de ventos, ozônio. Valor US $ 120000,00 h) Sondas para a estação acima: Radiossondas e ozôniossondas. Valor US $ 30000,00 i) Sensor de CH4 por cromatografia gasosa para estudos do efeito Estufa. Valor US $ 30000,00 j) Sensor de CO2 para estudos do efeito de queimadas e do efeito Estufa. Valor US $ 20000,00 9. Recursos humanos O item de recursos humanos é o mais importante, porque uma rede de monitoramento que seja respeitada, no contexto nacional e mundial, deve necessariamente ter um plantel diretor, técnico, e observacional do mais alto nível. O Quadro diretor e técnico de alto nível já está 86

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disponível. Na parte observacional, isto não se conseguirá de imediato. Haverá necessidade de treinamentos, alguns mais curtos, outros mais longos. estágios dentro do Brasil e fora. Como o monitoramento de longo prazo torna a operação do sistema muito monótona, é necessário que haja um plano de reciclagem de pessoal, de visitas a outros centros, laboratórios, sítios, de tal modo que se mantenha sempre o moral elevado dos observadores. 10. Outras redes de monitoramento Outras redes de monitoramento que podem ser úteis no contexto deste trabalho são: A rede de monitores de ozônio estratosférico do INPE; a rede de observações meteorológicas do programa ABRACOS; a rede de monitoramento do DNAEE; a rede de monitoramento via SCD-1 do INPE. 11. Objetivos e cobrança de resultados Os objetivos de curto prazo devem ser a implantação imediata de alguns pontos menos complexos da rede. Um dos pecados que se cometem quando se planeja uma rede complexa como esta do IBAMA é que se tenta ser perfeccionista em demasia o que faz com que a rede jamais se torne realidade. Devemos fazer um esforço para, ainda que com poucos recursos, começar a implantação da rede sem demora, e aprimorá-la à medida que os primeiros resultados aparecerem. Uma vez inaugurada uma estação, ainda que em caráter experimental, é importante estabelecer uma meta de resultados para cobrança posterior. O monitoramento de longo prazo que se propõe neste estudo-projeto é um empreendimento que, muitas vezes, se perde por não conhecer quais são seus objetivos. Uma vez definida a composição (em termos de instrumentos, por exemplo) de uma estação pode-se imediatamente, determinar seus objetivos de monitoramento. Estabelece-se então um programa não só do monitoramento em si, mas também dos períodos de calibração e verificação dos instrumentos. As visitas do responsável técnico devem ser previstas igualmente, e devem ser cobradas com rigor. A intercalibração de resultados de diferentes estações é uma tarefa importante e que motiva os observadores, tirandoos da rotina do dia a dia. Por outro lado, este seu conhecimento, de comparação com outras estações é de interesse da estação e do programa de monitoramento. 12. Política de implementação da rede Vários itens são necessários para a implementação de uma rede de monitoramento ambiental, de importância nacional, mas importantes são: a) Ter recursos financeiros já disponíveis; b) Ter um coordenador científico para manter os contatos entre os especialistas da comunidade científica, e definir as prioridades dentro do orçamento; c) Ter um coordenador administrativo para operar o sistema burocrático necessário. Os coordenadores acima devem atuar como os presidentes de uma diretoria, com Conselho e outras atribuições a serem definidas.

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13. Conclusões Os principais itens de discussão, em resumo, foram: - mapeamento e descrição da filosofia de monitoramento; os anexos listam casos específicos, pessoas participantes e descrição dos experimentos; - definimos alguns temas prioritários na área da atmosfera que são: o efeito estufa, a camada de ozônio, as queimadas do Brasil central na época seca; - sugerimos algumas das áreas físicas mais importantes para serem incluídas num plano de monitoramento; definimos critérios de seleção; - somos de opinião de que não é hora ainda de se definir parceiros internacionais. Devemos primeiro formar a rede nacional, ter uma infra-estrutura mínima, para a partir daí procurar parceiros internacionais. Os parceiros nacionais devem ser além do IBAMA, as Universidades, o INPA, o INMET, a EMBRAPA, e outros. - a identificação a priori de um banco de dados não é factível. Seria colocar os bois na frente da carroça. Devemos em primeiro lugar identificar os locais, as prioridades, os instrumentos, e então os meios de processar e armazenar os dados. - foi sugerida uma estratégia inicial de definição e implementação; - o coordenador científico seria o encarregado de realizar os contatos na comunidade científica para promover a rede e incorporar as necessidades da comunidade. 14. Bibliografia recomendada - Livro - “Queimadas na Amazônia e Efeito Estufa”, de V. W. J. H. Kirchoff, 118 p. , editora Contexto, S. Paulo, 1992.

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Monitoramento do Meio Ambiente Terrestre

Rui Cerqueira

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Sumário 1. Introdução............................................................................................................................................. 93 1.1 - A manutenção da biodiversidade e o papel dos monitoramentos................................................... 93 1.2 - Abordagem e objetivos................................................................................................................... 94 1.3 - Programas existentes para monitoramento de biodiversidade......................................................... 94 1.4 - Experiência prévia com inventários e monitoramentos populacionais no Brasil com especial referência a mamíferos............................................................................... 95 2. Inventários e monitoramentos............................................................................................................ 96 2.1 - O que é monitorar?........................................................................................................................ 96 2.2 - Inventários..................................................................................................................................... 98 2.3 - Monitoramentos............................................................................................................................. 98 2.3.1 - Rede de monitoramento................................................................................................. 99 2.3.2 - Mamíferos...................................................................................................................... 99 2.3.3 - Plantas......................................................................................................................... 100 2.3.4 - Insetos.......................................................................................................................... 101 2.3.5 - Aves............................................................................................................................. 101 2.3.6 - Anfíbios e répteis.......................................................................................................... 101 2.3.7 - Diversidade genética..................................................................................................... 101 2.4 - Outras aquisições e dados............................................................................................................ 103 2.4.l - Informações sobre ocorrências....................................................................................... 103 2.4.2 - Movimentos.................................................................................................................. 103 3. Dados.................................................................................................................................................... 104 3.1 - Protocolos e manuais.................................................................................................................... 104 3.2 - Banco de dados.............................................................................................................................. 104 3.3 - Sistemas........................................................................................................................................ 104 3.4 - Análise dos dados......................................................................................................................... 104 3.5 - Implantação.................................................................................................................................. 104 4. Estudo-piloto....................................................................................................................................... 105 4.1 - Área de escolha............................................................................................................................ 105

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4.2 - Esboço de cronograma................................................................................................................... 106 4.3 - O que será estudado..................................................................................................................... 106 5. Formação de recursos humanos....................................................................................................... 106 5.1 - Técnicos necessários..................................................................................................................... 106 5.2 - Formação de técnicos.................................................................................................................... 107 5.2.1 - Formação básica................................................................................................................. 107 5.2.2 - Treinamento avançado...................................................................................................... 108 5.3 - Tipos de cursos............................................................................................................................. 108 6. Implantação da rede........................................................................................................................... 110 7. Custos.................................................................................................................................................... 110 8. Referências bibliográficas.................................................................................................................. 110

Anexo I - Possíveis colaboradores no workshop a ser realizado.................................................................. 115 Anexo II - Possíveis colaboradores na implantação do monitoramento....................................................... 115

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1. Introdução 1.1 - A Manutenção da biodiversidade e o papel dos monitoramentos Nos últimos anos vem ganhando cada vez mais força a visão de que a biodiversidade é um dos mais importantes recursos do nosso planeta. Segundo Wilson (1988), três circunstâncias conspiram para tornar a biodiversidade um assunto mundial de grande urgência. Primeiro, populações em rápido crescimento estão degradando habitats naturais em larga escala, especialmente nos trópicos. Segundo, a ciência tem descoberto cada vez mais usos para a diversidade biológica em aplicações que melhoram a qualidade de vida humana e ajudam a tornar diversas atividades econômicas sustentáveis a longo prazo. Terceiro, como muito da biodiversidade está sendo perdida rapidamente devido à degradação ambiental, a humanidade está numa corrida para catalogar a biodiversidade existente, avaliar até que ponto ela está sendo preservada, e desenvolver estratégias eficazes para o seu manejo, antes que o recurso seja irreversivelmente perdido. Portanto, é urgente avaliar a situação atual da diversidade, como passo essencial para a aquisição de conhecimentos nos quais devem se basear estratégias eficazes de conservação e manejo para o próximo século. A formulação de políticas efetivas para a preservação da biodiversidade passa necessariamente pelo entendimento do processo de extinção das espécies biológicas. Gilpin & Soule (1986) definiram quatro “vórtices de extinção”, ou seja, os quatro tipos de processo que, isoladamente ou em conjunto, tendem a levar ao desaparecimento de uma espécie. Os programas associados aos vórtices são: 1) vulnerabilidade a flutuações populacionais aleatórias em conseqüência de redução e tamanho populacional; 2) aumento da variância da distribuição espacial (fragmentação da distribuição); 3) redução a curto prazo da adaptação genética (fitness) devido ao endocruzamento: e 4) perda de flexibilidade evolutiva a longo prazo devido à perda de variabilidade genética. A avaliação destes processos para casos específicos e a base da chamada Análise de Vulnerabilidade de Populações (Gilpin & Soule, 1986), que por sua vez permite a estimativa de Populações Mínimas Viáveis para cada espécie (Soulê, 1987; Nunney & Campbell, 1993). A perspectiva para a preservação de um nível desejado de biodiversidade pode então ser avaliada a partir das probabilidades de persistência das espécies presentes na biota. Em quase todo o mundo, o estabelecimento de unidades de conservação tem sido uma resposta às ameaças à biodiversidade, com considerável sucesso. No entanto, o mero estabelecimento de uma reserva não elimina, em absoluto, todas as ameaças à biodiversidade nela contida. Mesmo deixando-se de lado a importante questão prática de que os limites da reserva sejam respeitados e perturbações sejam evitadas, ainda assim basta o próprio isolamento de uma reserva - tornada uma “ilha” de habitat natural em meio a paisagem modificada - para que a biota da reserva se torne potencialmente vulnerável a todos os quatro vórtices de extinção descritos acima (Harris, 1984; Shafer, 1990). A gravidade do isolamento de uma reserva depende basicamente de se as espécies em questão podem persistir nos habitats modificados entre as reservas, ou pelo menos se mover através deles. Tais fatores variam de taxon para taxon, ou seja, espécies diferentes vão “perceber” o habitat de maneira diferente, de modo que uma mesma reserva pode ser uma “ilha” para uma dada espécie e não para outra. Portanto, para avaliar a eficácia do nosso sistema de unidades de conservação em promover a preservação da biodiversidade, é preciso avaliar a identidade dos habitats em volta das reservas, o quão rapidamente tais habitats estão mudando, e - uma variável cuja importância tem sido freqüentemente subestimada - a capacidade de movimento de diferentes espécies entre os diversos componentes do mosaico ambiental (Cerqueira et al., no prelo a). Sér. meio ambiente debate, 20

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1.2 - Abordagem e Objetivos Pelo exposto acima, conclui-se que para um monitoramento da situação atual da biodiversidade em nosso país é preciso: a) avaliar os níveis populacionais das espécies e a intensidade da variação de tais níveis; b) caracterizar as distribuições espaciais de cada espécie e a intensidade de variação temporal em tais distribuições; c) avaliar a variabilidade genética das espécies e a rapidez de sua variação; d) avaliar o quão efetivo é o atual sistema de unidades de conservação, incluindo a avaliação do grau de isolamento entre as reservas como função das características dos habitats fora das reservas e da capacidade de movimento das espécies. A simples estimativa da variação de diversidade de toda a comunidade - medida através de um índice de diversidade - poderia fornecer uma avaliação superficial da variação da biodiversidade, mas perderia muita informação sobre as causas de tal variação e, portanto, pouco poderia contribuir para nos ajudar a revertê-la. A abordagem populacional descrita acima nos forneceria os conhecimentos necessários para isso. Cabe salientar que o programa de trabalho aqui esboçado é necessariamente um empreendimento conjunto não só de ecólogos e geneticistas, mas também de taxonomistas. Em nosso país, em muitos ou na maioria dos casos, estar-se-ia lidando com espécies não descritas, ou de situação taxonômica duvidosa (Wilson, 1988). A cada passo seria necessário avaliar se populações diferentes compartilham ou não um mesmo um patrimônio genético informação essencial para sua conservação (Soulê, 1986). Logo, é preciso que haja formação de coleções de referências obtidas através de inventários nas áreas monitoradas, e o trabalho de taxonomistas treinados é tão essencial quanto a estimação dos parâmetros ecológicos e genéticos das populações. 1.3 - Programas existentes para monitoramento de biodiversidade Devido à crescente preocupação mundial com as ameaças à biodiversidade, têm surgido, em diversos países, programas de monitoramento de biodiversidade, patrocinados por governos ou por Organizações Não-Governamentais (ONGs). Um dos mais antigos programas em andamento é o da Grã-Bretanha (Heath & Scott, 1972). Este programa se aproveita de um sistema nacional de coordenadas espaciais (o National Grid Reference System) e do considerável número de naturalistas amadores distribuídos ao longo do pequeno país. A estes naturalistas, assim como aos profissionais, são distribuídas listas padronizadas de espécies (check-lists) que são preenchidas e encaminhadas a um órgão que centraliza a informação - o Biological Records Center, em Monks Wood, Huntingdon. Este tipo de informação tem sido base de trabalhos científicos de grande importância, como o de Taylor & Taylor (1979). O sistema japonês de monitoramento (Japan Wildlife Research Center, 1989) realiza extensos inventários da natureza no país, a intervalos aproximados de cinco anos, os quais são exigidos por lei. Assim como o britânico, o sistema japonês se baseia em questionários padronizados emitidos para naturalistas amadores, em um país de pequena área e alta densidade demográfica, ainda que desigualmente distribuída o que ocasiona certos problemas para este 94

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tipo de sistema. Como no programa britânico, a informação é centralizada por um órgão público, no caso, a Agência do Ambiente japonesa, que analisa os resultados. Na Dinamarca, um sistema de monitoramento foi instalado recentemente (Agger, 1989). O programa é coordenado por um consórcio que inclui tanto organizações governamentais como não-governamentais, e baseia-se em uma pequena rede de estações fixas, algumas com pessoal permanente. Os dados oriundos da rede de informações são complementados por comunicados de amadores. Monitoram-se espécies animais e vegetais particulares bem como formações vegetais, baseando-se em espécies indicadoras. O objetivo principal da rede dinamarquesa de monitoramento é fornecer alertas precoces sobre populações ameaçadas a fim de que sejam tomadas contramedidas (manejo de fauna), e avaliar os efeitos de tais contramedidas. O problema de monitorar a biodiversidade é ainda mais complexo em países biologicamente mais diversos que a Grã-Bretanha, o Japão ou a Dinamarca, seja por serem países extensos ou por se situarem em regiões tropicais, ou ambos. Um exemplo interessante é o da Austrália, onde um ambicioso sistema de mapeamento biológico do subcontinente, usando uma grade nacional de coordenadas, foi estabelecido. Este sistema tem ajudado a coordenar esforços de ecólogos e taxonomistas na interpretação de potenciais e problemas para a conservação da biodiversidade em várias partes da Austrália, como por exemplo o Northern Territory (Whitehead et al., 1992). Nos últimos anos, outros programas de monitoramento têm sido propostos especificamente para regiões tropicais. A Smithsonian Institution lançou, em 1987, o Man and the Biosphere Biological Diversity Program (SI-MAB), em colaboração com a UNESCO, para inventariar e monitorar a diversidade biológica em florestas tropicais. A ênfase deste programa tem sido nas espécies arbóreas; e inventários estão atualmente sendo realizados em áreas na Bolívia, Peru, Porto Rico, Ilhas Virgens e nos Apalaches (EUA), usando métodos detalhadamente padronizados, descritos por Dallmeier (1992). Após terminada a fase de inventário, o SI-MAB planeja estabelecer o monitoramento da diversidade vegetal nestes mesmos locais, bem como expansão para outras áreas. A Smithsonian também está associada ao Instituto Nacional de Biodiversidade (INBio) da Costa Rica, em um programa iniciado em 1990 que objetiva completar o levantamento de toda a biodiversidade daquele país dentro de uma década. Este sistema baseia-se em uma rede de “parataxonomistas”, funcionários locais treinados em técnicas de coleta e preparação que também fazem a separação e identificação inicial das amostras coletadas. As amostras são então enviadas a especialistas dos EUA, Grã-Bretanha e da própria Costa Rica que fazem a identificação final e, quando necessária, a descrição de espécies novas. Como o propósito básico do INBio é de inventário, resta ver se este programa será futuramente estendido para um monitoramento. Dos programas atualmente em andamento, o projeto sugerido a seguir é mais similar à proposta de uma Rede Internacional para Inventário e Monitoramento da Biodiversidade, formulada dentro do programa Ecosystem Function and Biodiversity, da IUBS - SCOPE - UNESCO. Os objetivos e métodos de tal programa são descritos em certo detalhe por De Castri et al. (1992), e ficará claro que coincidem em muitos aspectos com os nossos objetivos e propostas. 1.4 - Experiência prévia com inventários e monitoramentos populacionais no Brasil, com especial referência a mamíferos São relativamente comuns, em nosso país, os inventários de fauna e de vegetação de unidades de conservação. Por exemplo, em relação aos mamíferos, um estudo é o inventário do Parque Nacional de Itatiaia realizado por Ávila-Pires & Gouvêa (1977). Mais recentemente, Sér. meio ambiente debate, 20

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Fonseca & Redford (1984) fizeram um inventário dos mamíferos da Reserva Ecológica do IBGE em Brasília. Stallings (1988) publicou um trabalho similar sobre o Parque Florestal Estadual do rio Doce, em Minas Gerais, e Cerqueira et al. (1990) caracterizaram a fauna de mamíferos de uma Área de Proteção Ambiental em Barra de Maricá, Rio de Janeiro. No entanto, a maioria de tais estudos são de curta duração e não permitem avaliar tendências populacionais. O estudo populacional pioneiro no Brasil foi o de Davis (1945), que avaliou os padrões de flutuação populacional de mamíferos, aves e mosquitos em Teresópolis, no estado do Rio de Janeiro. Vários outros estudos populacionais seguiram o caminho aberto por Davis nestes cinqüenta anos. Ainda no que se refere a mamíferos, todos os estudos populacionais datam dos últimos vinte anos e a maioria é bem mais recente que isso. Karimi et al. (1976), trabalhando no Nordeste brasileiro, fizeram várias observações interessantes sobre reprodução e demografia de várias espécies de roedores, mas não realizaram um acompanhamento detalhado de suas variações populacionais. Mais tarde. Mello (1980) e Alho & Pereira (1985) estudaram populações de várias espécies de roedores no Brasil Central. Streilein (1982) e Fernandez (1989) estudaram populações de marsupiais e roedores de caatinga e de restinga, respectivamente, em Barra de Maricá. Veiga-Borgeaud et al. (1987) estudaram a dinâmica populacional do roedor Holochilus brasiliensis, reservatório natural de esquistossomose, no Maranhão. Vinícius (1989) e Olmos (1991) analisaram a ecologia populacional de roedores de cerrado e mata Atlântica respectivamente, em ambos os casos, em áreas no estado de São Paulo. No entanto, todos estes estudos tiveram duração menor ou igual a dois anos. Tanto em mamíferos como em outros taxa, não há, que tenhamos conhecimento, monitoramentos propriamente ditos em andamento no Brasil atualmente, embora haja um paralelo com o monitoramento de algumas doenças endêmicas realizado pela SUCAM, um órgão do Ministério da Saúde. Utilizando os dados do monitoramento do antigo Serviço Nacional de Peste, Cerqueira et al. (1989) e Cerqueira & Lara (1991) estudaram as estratégias reprodutivas de roedores e sua ligação com a dinâmica populacional. Cerqueira & Bergallo (no prelo) e Bergallo & Cerqueira (no prelo) utilizaram-se dos mesmos dados para estudar um marsupial. Estes estudos correspondem a três anos de dados. Há, porém, alguns poucos estudos prévios em nosso país, nos quais populações animais foram acompanhadas por longos períodos. Entre estes destacam-se: um estudo de cinco anos de dinâmica populacional de cinco espécies de borboletas da subfamília Ithomiinae em Sumaré, São Paulo (Vasconcelos-Netto, 1980, 1991); um outro estudo de cinco anos monitorando populações de cinco espécies de pequenos mamíferos na restinga de Barra de Maricá, Rio de Janeiro (Cerqueira et al., 1993; Cerqueira et al., no prelo b); e o estudo das mudanças de densidade populacional do lagarto Liolaemus lutzae em praias do estado do Rio de Janeiro entre 1984 e 1991 (Rocha & Bergallo, 1992). Este último estudo, no entanto, constitui-se apenas de dois recenseamentos separados por sete anos. 2. Inventários e monitoramentos Detalham-se nas seções seguintes as propostas básicas para monitoramentos e inventários. Propõe-se que certos taxa e certo aspectos sejam monitorados nos níveis genético e populacional, além de sua diversidade e riqueza. 2.1 - O que monitorar? Inventários e monitoramentos são duas atividades essenciais para se enfrentar a perda da biodiversidade. O inventário é simultaneamente base para o monitoramento e parte deste trabalho. Neste projeto não se propõe o monitoramento de todo o ambiente, nem de 96

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toda a biodiversidade. Existem outros projetos tratando de diferentes aspectos do meio ambiente, como águas interiores, atmosfera e assim por diante. Para que um dado aspecto seja relevante, em termos de monitoramento, deve ter uma função importante no ecossistema. Além disso, sua observação deve ser economicamente viável. Os vertebrados terrestres, desde há algum tempo, têm sido reconhecidos como de grande importância nos processos relativos à existência das florestas tropicais (Janzen, 1980). Os insetos, dada a sua grande diversidade em todos os níveis, têm importância fundamental, e, portanto, devem ser monitorados (De Castri et al., 1992). Além dos animais, as plantas precisam também ser observadas continuamente, base que são das cadeias tróficas. Estas, além disto, são as únicas que permitem monitoramento em grandes escalas. A partir destas considerações, propomos monitorar os seguintes aspectos terrestres: a) Vegetação: distribuição de formações fitofisionômicas. Existe uma razoável experiência no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), tendo-se acesso a imagens por satélites, incluindo sensoriamento remoto (RS). Este tipo de informação é bastante limitada e, ainda, apresenta alguns problemas a serem resolvidos. No entanto, este sistema pode fornecer informações numa periodicidade e velocidade inigualáveis, só que em escalas grandes, no sentido ecológico. Como existem sistemas de informações geográficas (GIS) que podem utilizar estas informações, o sistema RS permitirá o monitoramento não apenas da vegetação, mas também de outras mudanças ambientais, em larga escala, que estejam ocorrendo nas áreas de monitoramento em menor escala. Existe a proposta de utilizar-se a legenda de vegetação do IBGE (Brasil, 1993), como legenda básica. No entanto, certos estudos podem necessitar de legendas particulares para escalas geográficas maiores (p. ex. 1: 8000). Isto será analisado no estudo preliminar. b) Populações vegetais e sua diversidade: este item inclui uma análise das tendências populacionais das espécies de plantas componentes dos diversos tipos vegetacionais identificados no item anterior. É interessante notar que numa análise recente dos padrões de distribuição de aves na Austrália, Whitehead et al. (1992) trataram vegetação e florístca como conjuntos independentes de variáveis com efeitos distintos sobre a avifauna. c) Insetos: um levantamento exaustivo da diversidade de todo este grupo é quase impraticável. Já as flutuações populacionais ocorrem numa escala de tempo pequena em relação aos intervalos usuais entre monitoramentos. Freqüentemente, os processos populacionais de insetos são independentes de densidade onde os tamanhos de população são determinados em grande parte por flutuações não-estacionais a curto prazo devido a fatores físicos. Portanto, monitoramentos populacionais detalhados e inventários da diversidade do grupo como um todo não devem ser prioritários. Propõe-se monitorar a diversidade de alguns grupos taxa selecionados dentro da classe. De Castri et al. (op cit.) sugeriram que a subfamília Scarabeiinae seria um grupo prioritário para monitoramento devido a uma diversidade de fatores. d) Anfíbios e répteis: diversidade. Alguns répteis permitem o uso de métodos de estudos de flutuações populacionais com alguma acurácia. No entanto, para a maioria dos taxa, particularmente as espécies florestais, não é possível uma determinação muito segura de tais flutuações, a não ser com esforços de coleta muito acima da capacidade de um sistema de monitoramento. Os anfíbios, exceto enquanto girinos, praticamente não permitem estudos populacionais. Estes dois taxa têm importância para o monitoramento por serem considerados sensíveis a mudanças de seus habitats e, supõe-se, a influências mais sutis no ambiente. Desta Sér. meio ambiente debate, 20

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forma, propomos que se monitore tão-somente sua diversidade. e) Aves: populações e diversidade. As aves têm papel relevante como indicadores da situação ambiental. Mudanças tanto em pequena, como em médias e grandes escalas afetam suas populações (Terborgh, 1989). Também são importantes por suas funções nos ecossistemas e por muitas serem sensíveis a mudanças sutis. Existe uma grande experiência acumulada no CEMAVE e um programa montado de anilhamento que necessita ser incorporado ao sistema geral, devido a esta experiência, inclusive no trato de dados e à importância destes animais. f) Mamíferos : populações e diversidade. Este é um grupo prioritário, uma vez que os mamíferos são um dos grupos de maior importância no fluxo energético dentro dos ecossistemas (Hayward & Phillipson, 1979), e também um dos mais drasticamente afetados por fragmentação de habitats (Wilcox, 1980). 2.2 - Inventários Um projeto de longo prazo e de execução difícil é o do completo inventário de todas as espécies que ocorrem no país. Na verdade, sistematas vêm realizando tal inventário e devem ser ativamente incentivados. Recomendar-se-ia que as agências de conservação tivessem tal tipo de profissional em seu corpo técnico para tarefas imediatas do monitoramento, mesmo que isto significasse alocá-los em outras instituições. O IBAMA, inclusive, já tem uma instituição de pesquisa em sistemática, o Jardim Botânico do Rio de Janeiro que poderia identificar o material coletado. Isto não significa ignorar-se o potencial de pesquisadores de outras instituições. O projeto de monitoramento tem uma natureza tal que um inventário (como levantamento) está ligado intrinsecamente a ele. Em cada local a ser monitorado, um levantamento intensivo de cada taxa deve ser feito, as coletas fornecerão material para os sistematas e para os estudos genéticos. O levantamento seria feito, no caso dos mamíferos, em etapas: um conjunto de transectos, cobrindo as diversas feições da unidade de conservação onde o projeto está sendo montado e coletaria amostras suficientes. As grades, parte do sistema de monitoramento em si (ver na seção correspondente), na fase inicial seriam utilizadas também para a coleta de amostras. Este estudo é que determinaria os pontos fixos para o monitoramento, assim como indicaria a riqueza da unidade de conservação. Em período mais longos, inventários-controle far-se-ão necessários. Cabe ressaltar que a riqueza geral é de importância para se avaliar o que as grades de monitoramento estarão indicando. Este procedimento deve ser seguido em diversas áreas consideradas representativas da diversidade paisagística de cada região. Procedimento similares adequados aos demais taxa, naturalmente, devem ser também realizados. O detalhamento técnico será realizado no estudo preliminar. Esta etapa de inventário, através de levantamento como amostras, será de fundamental importância, sendo essencial se quisermos fazer seriamente o monitoramento. A repetição de amostragens desta forma será necessária para o monitoramento genético. Note-o que amostras com remoção são a única forma de se perceber a intrusão de espécies crípticas. 2.3 - Monitoramentos Não é intenção aqui detalhar a metodologia a ser seguida no monitoramento, mas sim apresentar uma proposta, a título de exemplo, baseada principalmente em nossa experiência com estudos de longo prazo de mamíferos. Algumas das sugestões de aspectos da rede que devem ser monitoradas não estão detalhados. 98

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A diversidade genética será analisada com o material coletado durante o monitoramento dos diversos taxa. 2.3.l - Rede de monitoramento A rede deverá ter postos permanentes de observação. Idealmente, deveria conter amostras de todas as paisagens do país, aí incluídos não apenas os remanescentes das paisagens “naturais”, mas também as áreas modificadas. Os lugares a serem amostrados, em ambos os tipos de área, deverão ser locados utilizando-se o sistema de posicionamento geral por satélite (GPS). Desta forma, dois tipos de postos deverão existir: 1 - Postos localizados nas unidades de conservação. Estes monitoram a situação da unidade, fornecendo informações sobre os níveis de base de diversidade e populações. Podem indicar mudanças de maior escala que estejam alterando tais níveis de base, assim como servem de controle para os postos fora de unidades de conservação. Esta parte da rede teria seus postos localizados nas diversas unidades de conservação federais. Dependendo do desenrolar do projeto, unidades de conservação estaduais, municipais ou privadas poderão ter postos instalados antes de algumas unidades federais, pois muitas destas não têm instalações ou são muito remotas para que um monitoramento efetivo possa ser feito. 2 - Postos fora das unidades. Estes postos serão os mais difíceis de instalar e devem ter uma metodologia simplificada. Podem ser montados em estabelecimentos rurais com amostragens instantâneas em que, em muitos casos, apenas um tipo de organismo (p. ex. plantas) será amostrado. Um estudo preliminar será necessário para definir com maior precisão este tipo de posto. Uma hipótese é que, ao invés de postos fixos, façam-se levantamentos periódicos dos dados necessários em determinadas regiões. Isto permite que maiores áreas sejam cobertas, mesmo com dados mais espaçados no tempo. Está claro que, antes do estudo preliminar que irá estabelecer a relação custo/ efetividade, não se pode definir com precisão, o tamanho da rede, sua abrangência ou a periodicidade das observações. O monitoramento fora das unidades de conservação também deverá usar a metodologia descrita abaixo, com a diferença de que as áreas de amostragem para o monitoramento não serão, necessariamente, fixas, uma vez que em áreas não protegidas não é possível garantir que uma grade possa ser instalada exatamente no mesmo local em tempos sucessivos. Com base no inventário preliminar, terão sido definidas as áreas em que cada conjunto faunístico foi encontrado: em cada monitoramento, serão amostradas áreas que correspondam a cada um dos conjuntos faunísticos identificados. 2.3.2 - Mamíferos Nas unidades de conservação, o inventário preliminar terá a finalidade de determinar as estações fixas de coleta. O mesmo método terá que ser usado no monitoramento em áreas fora das unidades. Seria usado como método geral o de Leslie (Leslie & Davis, 1939; Caughley, 1977, Seber, 1992) como remoção em grades padronizadas de 16 pontos de captura (4 x 4), com 20 metros de espaçamento entre cada ponto, com duas armadilhas no chão e duas em árvores por ponto. Grades deverão ser marcadas em vários tipos diferentes de vegetação, que Sér. meio ambiente debate, 20

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representarem a variedade de tipos vegetacionais existentes dentro de cada unidade de conservação. Nos inventários, cevas deverão ser colocadas em cada ponto de captura por duas noites, seguindo-se cinco noites de captura propriamente dita. O inventário preliminar deverá cobrir os diversos compartimentos vegetacionais da área em estudo. Com base nos resultados do inventário preliminar, serão definidos vários conjuntos faunísticos. Estes conjuntos deverão ser analisados em relação a sua homogeneidade e, a partir deles, definir-se-ão as áreas de amostragem fixa para monitoramento. O monitoramento será feito usando-se armadilhas mantidas em cada unidade de conservação, por pessoal treinado alocado a cada unidade. Note-se que, para o monitoramento, usar-se-á a técnica de remoção temporária, sem sacrifício (Caughley, 1977). Este método só é válido para pequenos mamíferos. Para os médios e grandes nãocapturáveis, como primatas, por exemplo, transectos fixos, de tamanho padrão, deverão ser montados nos diversos conjuntos para monitoramento de população. No caso particular dos felinos, a captura será feita utilizando-se armadilhas para animais de grande porte, e o monitoramento será através de marcação recaptura. Uma alternativa mais efetiva para o acompanhamento dos movimentos bastante extensos de animais deste grupo seria a utilização de radiotelemetria. Este parte, obviamente, precisará também ser submetida ao estudo-piloto. Como o monitoramento deverá usar o mesmo método do inventário preliminar, na verdade cada inventário é comparável com todos os inventários e com as amostragens periódicas nas grades fixas. O monitoramento deverá ter uma determinada periodicidade, sendo feito com o mesmo método todo o tempo. A questão da periodicidade terá que ser definida no estudo- piloto. Fora das unidades, ver acima no item 2.3.1 2.3.3 - Plantas Os processos de alteração na composição de comunidades de plantas e, conseqüentemente, em populações de espécies, podem ser avaliados em três aspectos (e correspondentes escalas): a) fisionômico vegetal. b) dinâmica de populações e comunidades e c) variabilidade genética. Aspectos referentes à fisionomia podem ser diretamente obtidos a partir de imagens de satélite e aspectos de menor escala relacionados à variação gênica podem ser conseguidos com o material coletado ao nível de populações. Detalha-se aqui o procedimento para este último nível. Chama-se a atenção para a necessidade do estudo preliminar para que os detalhes (periodicidade, tamanho de parcela, etc.) possam ser determinados de maneira econômica. Procedimentos: Nas unidades de conservação, um levantamento florístico preliminar em parcelas será feito em áreas que devem corresponder aos compartimentos da paisagem a ser levantada a partir do estudo vegetacional. Com método similar ao utilizado em mamíferos, montar-se-ão parcelas fixas para conhecer a dinâmica de estabelecimento e sucessão vegetal. Determinam-se microparcelas fixas, a partir deste estudo, para coleta mensal de sementes e microparcelas móveis para coleta mensal de plântulas. Este material será triado e identificado em laboratório e o confronto de sementes e plântulas (diversidade e dominância) com os estratos adultos dar-nos-á uma idéia da mudança nas parcelas. Voltar-se-á, anualmente, às parcelas onde foram conduzidos os levantamentos para arbóreas, arbustivas e herbáceas de forma a se observar o crescimento (altura e diâmetro) e mortalidade. 100

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Estes procedimentos fornecem dados tanto para o monitoramento vegetacional em grande escala (a partir da descrição dos estratos, composição, etc.), como para o genético (a partir da coleta de material como sementes, plântulas e tecidos). O desenvolvimento dessa metodologia permitirá, a longo prazo, detectar possíveis alterações estruturais e fisionômicas nesses ambientes e ver as correlações com variáveis abióticas e outras ligadas a mudanças ambientais, assim como com o que for monitorado da fauna. Comparando-se com imagens de satélite, poder-se-á avaliar a eficiência deste tipo de monitoramento, em larga escala, em captar nuances relacionadas e processos sucessionais e de mudança. Com a dificuldade suposta de manter parcelas fixas fora das unidades de conservação, propõe-se, neste caso, apenas o procedimento de levantamento de estrutura e composição. Tal procedimento poderia ser repetido em lugares fixos para avaliação contínua. 2.3.4 - Insetos Identificados os compartimentos como acima referido, proceder-se-ia ao levantamento da diversidade de forma periódica. 2.3.5 - Aves Além do monitoramento realizado em larga escala por anilhas, pode-se usar anilhamento nos compartimentos de forma contínua, em estações fixas. Como nem todas as aves são capturáveis desta forma, metodologia de transecção deverá ser também utilizada. Este método pode ser repetido fora das unidades de conservação, só que se registram tão-somente a população instantânea e a composição em locais fixos, assim como nos não fixos. O anilhamento será aumentado em muito, facilitando assim o estudo em maior escala das populações de aves, bem como a situação da sua conservação. 2.3.6 - Anfíbios e répteis Também, neste caso, apenas a diversidade será monitorada. 2.3.7 - Diversidade genética A genética da conservação recai em dois problemas básicos, a preservação do pool gênico e a contínua propagação dos taxa, seja no cativeiro ou na natureza (Robinson & Elder, 1993). Qualquer estratégia para a conservação de uma espécie em particular deve ser determinada, em parte, pelo conhecimento da estrutura genética daquela espécie. Espécies ameaçadas podem ser mantidas, com populações limitadas, em parques e reservas. Esta restrição do tamanho populacional e a subdivisão de populações (pela fragmentação de habitats) antes ligadas através do fluxo gênico, implica uma série de conseqüências genéticas, dentre estas a depressão por endocruzamento e a perda gradual de variabilidade genética (Franklin, 1980). Estes problemas colocam um limite de tamanho mínimo viável de população que é compatível com a sobrevivência e manutenção ao longo do tempo de uma dada população (Nummey & Campbell, 1993). O problema da manutenção da variabilidade genética na conservação de populações naturais pode ser estudado por técnicas de genética molecular aliadas ao arcabouço teórico da genética de populações (Amos & Hoelzel, 1992; Hartl, 1981). Podemos remeter o estudo a certas questões práticas: a área da unidade de conservação mantém ou não a diversidade genética das espécies? Deveria a área das reservas Sér. meio ambiente debate, 20

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ser aumentada ou por outro lado pequenas áreas em torno devem ser mantidas? Existe ou não fluxo gênico entre populações fragmentadas em manchas de habitats dentro e fora das áreas de conservação? Como salientado acima, o tamanho efetivo das populações (que é uma medida de quantos indivíduos estão contribuindo com seus gens para a geração seguinte) tem um papel fundamental na manutenção e conservação das espécies (Campbell & Nummey, 1993; Amos e Hoetzl, 1992; Hartl, 1980). Três problemas relacionados ao tamanho efetivo de população são o endocruzamento, perda de variabilidade (diversidade) e a própria estrutura da população (se existem ou não subdivisões de uma população em uma dada área). Um axioma fundamental da teoria evolutiva é que a seleção natural atua sobre o estoque de variação genética representada na diversidade fenotípica dos indivíduos. Dada uma mudança no ambiente, por qualquer causa, é crítico que a espécie possua variação genética suficiente para responder a tais mudanças. Na ausência de pressões de seleção fortes, o fator mais importante influenciando o nível de variação genética é o tamanho efetivo da população. Isto porque em populações pequenas, os gens tendem a se fixar em homozigose devido às perdas e ganhos ao acaso de gametas ou indivíduos de uma geração para outra. Este efeito de amostragem (casualizado), ocorre independentemente de mudanças na freqüência gênica devidas à seleção, mutação e migração , sendo conhecido como deriva genética (Franklin, 1981; Hartl, 1980). Assim, em populações pequenas e isoladas, haveria uma perda gradual da variabilidade genética pela fixação de alelos em estado de homozigose. Se uma dada população é reduzida em tamanho, é importante estimar a perda esperada da variância genética ao longo do tempo e a possibilidade de recuperação desta via mutação. O tamanho efetivo de população e o monitoramento da variabilidade genética ao longo das gerações pode ser feito através de três técnicas distintas e complementares. A eletroforese de isoenzimas é uma técnica estabelecida aproximadamente há trinta anos, contando com um corpo de dados sólido contra o qual podem-se comparar os resultados obtidos (Amos & Hoelzel, 1992; Lewontin, 1974). Além disso, o custo relativamente baixo e a facilidade de aplicação da técnica são pontos a seu favor. Os resultados obtidos na eletroforese de isoenzimas sobre o maior número de loci possível servirão para avaliar as questões referidas acima, como a existência ou não de fluxo gênico entre populações e isolados, a manutenção ou perdas da variabilidade genética, estruturação da população e endocruzamento. Para se determinar o tamanho efetivo das populações em estudo, utilizaremos as técnicas de DNA fingerprinting e de sequenciamento de DNA mitocondrial (Amos & Hoelzel, 1992). Os resultados destas duas técnicas servirão também para determinar a estrutura da população e a existência ou não de fluxo gênico entre as subpopulações. Como existem problemas teóricos e práticos na determinação destes padrões (Amos & Hoelzel, 1992), os resultados das três técnicas deverão ser cruzados e verificados quanto a sua concordância. Cabe ressaltar que a remoção dos animais do campo é fundamental para a realização deste trabalho, reduzindo não só os custos operacionais como também tornando a coleta do material (tecidos) segura. Para alguns grupos taxonômicos com extrema variação cariotípica (como os roedores cricetídeos), sugere-se que sejam feitos os cariótipos com padrões de bandeamento, para assegurar a identificação das espécies e para avaliar a variabilidade genética neste nível de organização. Como alguns estudos têm mostrado que a citogenética pode ter um papel importante na conservação de mamíferos silvestres (Robinson & Elder, 1993), este seria um procedimento aconselhável.

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2.4 - Outras aquisições de dados 2.4.1 - Informações sobre ocorrências Diversos estudos estão em curso para determinação da distribuição de certos taxa. Em geral, estes estudos usam métodos diferentes nestas determinações. Uma maneira de formular hipóteses de distribuição mais precisa tem sido sugerida (Cerqueira, 1985; Cerqueira & Marroig, submetido), partindo do pressuposto de que existiria uma área de distribuição potencial (Taylor & Taylor, 1979) dentro da qual populações de um dado taxon existiriam sem, no entanto, terem centros fixos de ocorrência dado o constante movimento das populações (Cerqueira et. al., no prelo). Esta hipótese de distribuição é testável e a aquisição contínua de novos dados pode indicar mudanças na área de distribuição de um certo organismo. Portanto, este tipo de estudo é importante para o monitoramento. Zoólogos, botânicos e outro profissionais e amadores fazem observações assistemáticas, coletando continuamente dados de ocorrência de espécies. Em outros países, como o Japão e a Grã Bretanha (Heath & Scott, 1972; Japan, 1989) observadores voluntariamente preenchem protocolos padronizados, que são enviados, então, a um centro de dados que podem controlar a ocorrência de certos organismos continuamente. Um sistema semelhante pode ser projetado, com voluntários reportando a ocorrência de espécies sem maiores problemas taxonômicos. Um projeto específico seria escolher os taxa que tem sua distribuição potencial conhecida para este tipo de monitoramento. Além disto, para muitas espécies é possível fazer rapidamente esta hipótese de distribuição, de forma que eles possam entrar nesta parte do monitoramento. Note-se que os demais monitoramentos estarão fornecendo também dados para esta parte do sistema. 2.4.2 - Movimentos Movimentos parecem ser de importância nos problemas relativos à conservação (Cerqueira et al. no prelo a; Coimbra, 1991) tendo importância na manutenção do pool gênico, além de evitar o esgotamento de recursos locais (Taylor & Taylor, 1979; Wynne Edwards. 1993). A obstrução do movimento poderia levar a extinções locais. Dada esta importância, seria interessante para um determinado taxon que fosse estabelecida sua necessidade de espaço para movimento, assim como dos caminhos exigidos para que tal movimento ocorra. Isto permitiria avaliar uma certa reserva em relação a tal taxon e o efeito do entorno da reserva na manutenção da espécie. No estado atual dos conhecimentos tal avaliação é ainda um pouco difícil. Assim, propomos que os estudos de marcação e recaptura sejam usados também com esta finalidade. Para os mamíferos, os animais coletados nas estações fixas deveriam ser marcados antes de serem soltos. Desta maneira, estimativas grosseiras de longevidade e de movimentos podem ser obtidos. Os monitoramentos fora das unidades de conservação, quando aliados às análises genéticas, fornecerão dados, ao longo do tempo, sobre o problema do movimento dos gens. Recomenda-se que estudos específicos sobre estes aspectos sejam realizados a partir do estudo-piloto e simultaneamente a ele. No caso dos mamíferos, o procedimento seria a colocação de transectos ao longo do tempo em vários lugares da unidade de conservação e no seu encontro. No caso das aves, o anilhamento é suficiente para esta análise. Insetos e plantas somente podem ser estudados pela análise genética. Sér. meio ambiente debate, 20

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3. Dados Os dados serão adquiridos pela rede de monitoramento de forma contínua. Sua disponibilidade têm que ser imediata. Assim sendo eles tem que ser armazenados e processados também de forma contínua. Os protocolos deverão ser digitados e armazenados imediatamente após preenchidos. Indicamos aqui alguns dos problemas a serem enfrentados. No estudo-piloto os protocolos serão testados, assim como todo o sistema de dados. 3.1 - Protocolos e manuais Para cada tipo de dado a ser coletado, terão que ser feitos protocolos de preenchimento simples no campo. Manuais terão que ser preparados, escritos de forma simples, direta e com exemplos. Manuais de identificação também serão necessários. Um exemplo seria um guia de identificação visual dos anfíbios existentes na unidade de conservação. Treinamento para preenchimento dos protocolos terá também que ser providenciado. 3.2 - Banco de dados Os protocolos, após o seu preenchimento, devem ser digitados imediatamente e armazenados provisoriamente ou na unidade de conservação ou em repartição do IBAMA. Idealmente, os protocolos deveriam ser centralizados em arquivo central. Os dados digitados próximos ao local de estudo devem ser armazenados de duas formas: como cópias dos protocolos e já processados como resultados utilizáveis. O arquivo magnético fica no nó da rede de dados e transfere-se cópia para um banco de dados central. Estes cuidados são importantes para que, havendo perda em um dos pontos de armazenamento, cópias tanto dos dados originais quanto dos já processados estejam a salvo em algum lugar. Propomos que os arquivos sejam públicos em algum momento. No entanto, dado o custo do sistema, apenas os serviços públicos devem ter acesso grátis. Consulentes privados devem pagar pelos dados. 3.3 - Sistemas O sistema deverá incluir aplicativos de banco de dados com transformações primárias e, em seguida, sistema(s) de informação geográfica e rede de computadores. 3.4 - Análise dos dados Existe a necessidade de os dados terem análise contínua. O processamento inicial fornece a partir dos dados brutos informações básicas, por exemplo, tamanho da população por local de amostra. Outros tratamentos são necessários, como por exemplo, o tamanho da população estimada ou a diversidade do taxon para toda a unidade de conservação. Estas informações agregadas podem ser publicadas periodicamente. O cruzamento do conjunto de dados obtidos nas várias escalas é a etapa seguinte. 3.5 - Implantação A implantação do sistema tem três etapas, sendo necessário um estudo a parte para seu delineamento: 1 - Esboço do sistema a partir do projeto inicial; 2 - Teste durante o projetopiloto e 3 - Implantação progressiva juntamente com a rede de monitoramento. 104

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Resumidamente, indicamos alguns pontos para discussão e detalhamento futuro para a implantação: 1 - Coleta de dados. Protocolos-padrão devem ser produzidos para teste no estudo-piloto. A partir deste serão corrigidos para utilização. 2 - As análises necessárias para redução de dados devem estar disponíveis como programas para o estudo-piloto. Desta maneira, a partir dos protocolos, podem-se produzir novos dados a serem integrados e analisados. 3 - Um sistema de informação geográfica, ou mais de um, deve ser padronizado e estudados meios de locar os dados neste GIS. Como exemplo poderíamos imaginar que os pontos de coleta ou observação de uma dada espécie em um certo período sejam locados para uma região. Dados de populações seriam locados e far-se-iam comparações entres estes dados e os de outras fontes, por exemplo, os dados vegetacionais. Uma forma simples é tão-somente locar os dados no mapa a cada período, formando mapas de ocorrência simples, como o realizado pelo Biological Records Centre Britânico (Heath & Scott, 1972). Neste caso, dados de observação de muitos colaboradores poderiam ser utilizados a partir de protocolos-padrão. 4. Estudo-piloto Antes da implantação da rede será necessário um estudo-piloto, que terá a finalidade de testar as técnicas e protocolos propostos, ajustá-los. O cálculo do custo da operação da rede só será possível depois deste estudo. Durante tal projeto, os cursos previstos para formação de recursos humanos terão sua implementação inicial. 4.l - Área de escolha Será de fundamental importância que a área a ser escolhida tenha mais de uma unidade de conservação, assim como grupos de pesquisa na região que possam participar do projeto. A área deve ser próxima a alguma cidade onde os grupos de pesquisa estejam localizados, para facilitar o acesso do pessoal do projeto. Em geral, estes grupos são de alunos de iniciação científica e pós-graduação, e, se a área de estudo for de difícil acesso, o orçamento do projeto-piloto torna-se-á muito elevado, pois apenas pessoal contratado especialmente poderá trabalhar nele. Além disto, os pesquisadores seniores envolvidos, terão dificuldade em acompanhar o desenvolvimento do trabalho. Um outro fator de relevo é que os cursos previstos devem ser dados, em parte, numa universidade onde haja grupo (s) envolvidos no projeto, além de haver facilidade de acesso ao campo. Estas considerações levam a sugerir que a unidade de conservação a ser estudada localize-se no estado do Rio de Janeiro. Uma unidade particularmente conveniente é o Parque Nacional da Serra dos Órgãos, pelos seguintes motivos: o parque comporta uma boa variedade de paisagens em diferentes altitudes. Seu entorno engloba também uma grande gama de usos da terra, agricultura, pecuária, turismo, indústrias, matas preservadas, enfim, todo o tipo de situação que pode ser encontrada no país. Está próximo a um grande centro científico, a cidade do Rio de Janeiro, não sendo distante dos demais grupos que possivelmente estejam interessados em participar do projeto.

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4.2 - Esboço de cronograma 1 - Implantação - duração aproximada: 6 meses. Nesta fase inicial serão adquiridos e instalados os equipamentos e demais materiais necessários ao projeto, levantados os dados referentes as áreas de estudo, preparados os protocolos, organizados os cursos, enfim, montado o projeto. 2 - Inventário - Duração: 12 meses. A partir da definição das unidades de paisagem, começará o levantamento de amostras dentro da unidade de conservação. Os dados são analisados simultaneamente para testar os procedimentos e propor possíveis correções. Os cursos de treinamento começam nesta fase, já que os que vierem a ser treinados participarão do trabalho de campo. O estudo das áreas fora das unidades começará nesta fase também. 3 - Monitoramento - Duração: 18 meses A partir dos dados obtidos na segunda fase, montam-se as estações fixas de monitoramento para ajuste final dos procedimentos a partir da análise crítica tanto da fase dois como da três. Como resultado deste estudo-piloto, haverá um grupo treinado no monitoramento, com procedimentos-padrão fixados. 4.3 - O que será estudado O projeto destina-se a testar a metodologia do monitoramento (e inventários) numa unidade de conservação com a montagem de locais fixos, assim como as áreas fora delas. 5. Formação de recursos humanos Existe hoje no país um certo número de grupos de pesquisa e pós-graduação capazes de formar especialistas em Ecologia. No entanto, estes cursos não têm sido capazes de produzir a quantidade necessária de pessoal para abastecer o mercado de trabalho mesmo das universidades. O acúmulo lento de doutores está agora chegando ao ponto em que qualquer universidade, que queira, possa ter um grupo de Ecologia de razoável nível. Será esta situação futura suficiente para fornecer o pessoal necessário no monitoramento? E que pessoal seria este? 5. 1 - Técnicos necessários Pelo que foi proposto no projeto, temos três níveis de atividade: 1 - A coleta de dados 2 - A análise dos dados localmente e centralmente 3 - O estudo das séries temporais, controle e revisão do monitoramento, previsões, enfim, a parte avançada do estudo dos dados. Cada nível necessita de certos tipos de pessoas. As atividades destas correspondem ao trabalho descrito anteriormente. 106

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Nível 1 - Em cada UC precisaremos de um certo número de zoólogos e botânicos, dependendo da extensão do parque e do número de aspectos a serem monitorados. Estes técnicos têm a função de organizar e proceder a coleta de dados, ajudados pelo pessoal de nível médio, além de garantir que os dados tenham a qualidade necessária para o sistema funcionar. Dada a quantidade e periodicidade do trabalho de campo, um certo número de auxiliares deve existir. Acreditamos que este tipo de técnico deve ser da carreira de ciência e tecnologia, mas integrados ao sistema de unidades de conservação. Eventualmente, o monitoramento fora das UC pode ser realizado por este mesmo pessoal, devendo estas unidade funcionarem como centros de monitoramento, responsáveis por uma área do país. Com isto, o monitoramento, a reserva e a situação ambiental geral estariam integrados. É de fundamental importância que a atividade repressiva não tenha nenhuma relação com o monitoramento. Nível 2 - Pessoas, em âmbito local, devem controlar a digitação e o preparo dos dados nesta fase. São, portanto, necessários digitadores e pessoal de apoio em análise de sistemas. No centro deverá existir uma equipe para agregar dados das diversas regiões e fazer as sínteses regionais, nacionais e, eventualmente, supranacionais. Nível 3 - No IBAMA, deverão existir, com o tempo, pessoas encarregadas dos estudos avançados. No entanto, seria muito importante que houvesse sempre uma ligação orgânica com o sistema universitário. Na verdade, esta ligação deve existir para os três níveis de atividade do sistema de monitoramento. Um ponto importante a considerar é que, no projeto-piloto, podem trabalhar pessoas fora da carreira, contratadas para este projeto. No entanto, o sistema não poderá funcionar sem que o IBAMA comece a absorver pessoal, por concurso, para uma carreira. 5. 2 - Formação dos técnicos 5.2.1 - Formação básica Os técnicos devem ter formação em Biologia, Geografia, Cartografia, Engenharia Florestal, Matemática, Estatística, Informática, enfim, nas áreas que dão formação básica ao trabalho a ser feito. O trabalho de coleta de dados ecológicos, em geral, necessita de biólogos. No entanto não se deve obstar pessoas de qualquer formação que queiram trabalhar, pois isto enriquece o sistema e evita o corporativismo. Como, porém preparar o sujeito para o trabalho específico? Nossa proposta é que tenhamos um curso de especialização para formar estas pessoas. O curso pode ser dado na universidade e destinado ao treinamento de pessoas tanto das agências ambientais, quanto do público interessados neste trabalho. O curso terá uma parte geral sobre o sistema e outra técnica para os diversos aspectos a serem monitorados. Deve ser feito utilizando-se uma prática intensa e extensa dentro do sistema. Para isto, deve ser localizado em universidades próximas a unidades de conservação. Estes cursos de especialização devem ser complementados por outros de formação de técnicos de nível médio e primário que atuarão como guardas. A longa experiência dos serviços de controle de doenças endêmicas mostra que a base de um sistema de monitoramento são as pessoas deste nível. Cursos de treinamento curto para os voluntários serão também necessários. Como exemplo podemos citar os cursos de anilhamento de aves. É necessário que, com o sistema funcionando, existam congressos periódicos, envolvendo não apenas o pessoal técnico do sistema de carreira, mas também os pesquisadores das universidades e outras instituições de pesquisa e dos voluntários colaboradores, a exemplo, Sér. meio ambiente debate, 20

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novamente, de anilhadores de aves. Certo número de cursos práticos de curta duração pode ser fornecido. 5.2.2 - Treinamento avançado Existe um certo fascínio pela ciência aplicada, procedimentos técnicos capazes de produzir resultados mediatos ou imediatos. É freqüente, no entanto, que os resultados sejam de baixa qualidade ou mesmo errados e prejudiciais quando os técnicos não têm uma formação científica adequada, faltando-lhes o rigor metodológico e a disciplina de trabalho necessária para trabalhar com uma área de complexidade como a Ecologia. Para operar o sistema em níveis de qualidade que justifiquem o seu custo, serão necessárias pessoas com conhecimentos avançados e com as qualidades de trabalho acima referidas. Como parte do sistema as pessoas envolvidas neles com técnicos de nível superior devem ser incentivadas a estudar em cursos de nível avançado, mestrado e doutoramento, formais onde possam não apenas aperfeiçoar seus conhecimentos, mas também refletir sobre os procedimentos e resultados alcançados. Pessoal com treinamento científico adequado deve ser também absorvido pelo sistema. Estas considerações indicam que o IBAMA deve sinalizar aos cursos de graduação e pós-graduação quais são as suas necessidades de pessoal, assim como interagir ativamente com alguns destes grupos. Nossa proposta é que, paulatinamente, tenhamos alguns grupos, na área que vier sendo coberta pelo monitoramento, capazes de interagir continuamente, oferecendo os diversos tipos de cursos, assim como tendo linhas de pesquisa básica ligadas aos problemas do sistema, além, naturalmente, de contribuir com a análise das informações em todos os níveis. 5.3 - Tipos de cursos Propomos para discussão os seguintes cursos de treinamento para o sistema, com breve descrição de seus conteúdos. a. Nível Elementar a.1 - Informação básica sobre o sistema. a.2 - Treinamento de pessoal de campo - coleta de dados de campo: captura e marcação, preparo de material, coleta de tecidos. a.3 - Técnicos de nível médio - coleta de dados de campo (q.v.) e técnicas de laboratório e de computação. O treinamento a.1 deve ser parte integrante de a.2 e a.3 b. Nível Superior - Cursos de graduação Profissionais com boa base em Ecologia ou em análises (GIS, métodos de amostragem e redução de dados, modelarem, etc.). - Cursos de aperfeiçoamento b.1 - Planejamento e administração de áreas ambientalmente sensíveis - Que parte 108

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da Ecologia e da Biogeografia tem relação com o tema, em particular com o monitoramento. Como é o sistema e seu funcionamento. Relações do sistema com o conjunto dos problemas ambientais e com a sociedade. b.2 - Técnicas de coleta de dados, incluindo as informações de a.2 e a.3 Análise primária dos dados. Controle de qualidade. Planejamento de atividades. Esta parte do treinamento divide-se nos diversos aspectos a serem monitorados. b.3 - Análise de dados ecológicos e biogeográficos - Populações, comunidades, GIS, modelagem, sistemas de bancos de dados. b.4 - Mestrado em Ecologia, Matemática ou Geografia (incluindo cursos que tratem destes temas, mesmo que seus nomes formais não sejam estes). b.5 - Doutorado nas áreas acima ou em Biodiversidade. a seguir:

Um esquema de formação de pessoal nos dois níveis e sua absorção é apresentado

Nível elementar Curso de informações básicas < - - - - - - - \ : \ : \ : - - - - -> funcionário do sistema : / \ : - - > Cursos de técnicas /

\ \ - - - - > Cursos de atualização

Nível superior Curso de graduação - - - - - - - - - - - - - - - - \ :

:

:

:

:

\ \

: - - > Especialização < - - - - - - - - - \ - - > funcionário do sistema

: / : - - - > Cursos de pós-graduação < - - - - - -

: :

Cursos de < - - - - - - - - - - - - - - atualização Congressos < - - - - - - - - - - - - - - Sér. meio ambiente debate, 20

: :

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6. Implantação da rede A sua implantação deve ser feita por etapas num prazo longo. Não existe a experiência anterior necessária ao seu funcionamento. Desta forma a rede começa a ser efetivamente implantada com o estudo-piloto que testará os procedimentos e protocolos, assim como poderá servir para o início da formação de pessoal. Poderíamos sugerir as seguintes etapas: 1 - Estudo-piloto. Duração 36 meses. 2 - Implantação paulatina de estações fixas. Dependendo dos recursos, pode-se implantar, inicialmente, dois conjuntos de estações, por ano, a partir do quarto ano. Com a possível incorporação de outros grupos de pesquisa do restante do país, poder-se-á formar pessoal em ritmo crescente de forma a que a rede completa possa estar funcionando em vinte anos. 7. Custos É difícil estimar o custo do projeto. Mesmo o estudo-piloto não pode ser calculado com precisão antes de se definir a escolha do que irá ser monitorado. Este estudo é que poderá estimar a quantidade de horas de trabalho e os custos financeiros para implantar e fazer funcionar a rede. No entanto, cremos que podemos dar valores em ordem de grandeza. Assim, o projeto-piloto deverá custar em torno de US$ 1 milhão. Já a implantação da rede por unidade de conservação deve ficar por volta de US$ 300 mil. Assim sendo, a rede completa implicaria um custo de aproximadamente US$ 40 milhões em vinte anos. A operação da rede sendo paulatina como propomos, fará com que seus custos sejam absorvidos aos poucos ao orçamento, sem um impacto grande. 8. Referências bibliográficas AGGER, P. (1989). Principles for the danish biomonitoring programme. Helgolander Meeresunters 43, 309-317. ALHO, C.J.R. and PEREIRA, L.A. (1985). Population ecology of a cerrado rodent community in central Brazil. Rev. Brasil. Biol. 45, 597-607. AMOS, B. and HOELZEL, A. R. (1992). Applications of molecular genetic techniques to the conservation of small populations. Biol. Conserv. 61, 133-144. AVILA-PIRES, F.D. and GOUVEA, E. (1977). Mamíferos do Parque Nacional do Itatiaia. Bol. Mus. Nac. N.S. 291, 1-29. BERGALLO, H. G., and CERQUEIRA, R. (in press). Reproduction and growth of Monodelphis domestica in Northeastern Brazil. J. Zool. BRASIL. (1993). Mapa da vegetação do Brasil. IBGE, Rio de Janeiro. CAUGHLEY, G. (1977). Analysis of vertebrate populations. Wiley Chichester.

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Anexo I - Possíveis colaboradores no workshop a ser realizado Depois de analisarmos os diversos trabalhos relacionados à proposta de monitoramento apresentada, gostaríamos de indicar as seguintes pessoas para participação na discussão do documento no orkshop a ser realizado para este fim. Genética de Plantas: Dr. Paulo Kageyama

(Escola Superior de Agricultura Luis de Queiroz. Piracicaba / SP)

Vegetação: Prof. Dorothy S. D. de Araújo (Fundação Estadual de Estudos do Meio Ambiente. Rio de Janeiro / RJ)

Ecologia de Populações Vegetais: Dr. Fábio R. Scarano (Departamento de Ecologia UFRJ. Rio de Janeiro / RJ)

Genética Animal: Dr. Hector Seuanez (Instituto do Câncer. Rio de Janeiro / RJ)

Insetos: Dr. Bráulio Dias e Dr. João Vasconcellos Neto (Universidade de Brasília / DF) - (Universidade Estadual de Cmpinas - SP), respectivamente.

Anexo II - Possíveis colaboradores na implantação do monitoramento. Alexandre Araújo - Universidade Nacional de Brasília Woodruff Benson - Universidade de Campinas Keith S. Brown - Universidade de Campinas Geraldo W. Fernandes - Universidade Federal de Minas de Gerais Alfredo Langguth - Universidade Federal da Paraíba Orillo Leoncini - Universidade Federal do Rio de Janeiro William Magnusson - INPA Jader Marinno - Universidade de Brasília Sérgio Mendes - Museu Mello Leitão Sérgio Potsch - Universidade Federal do Rio de Janeiro Anthony Rylands - Universidade Federal do Rio de Janeiro Antônio M. Solé-Cava - Universidade Federal do Rio de Janeiro

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Série Meio Ambiente em Debate 1 .

Seminário sobre a Formação do Educador para Atuar no Processo de Gestão Ambiental - Anais

2 .

Modernidade, Desenvolvimento e Meio Ambiente - Cristovam Buarque

3 .

Desenvolvimento Sustentável - Haroldo Mattos de Lemos

4 .

A Descentralização e o Meio Ambiente - Aspásia Camargo

5 .

A Reforma do Estado - Cláudia Costim

6 .

Meio Ambiente e Cidadania - Marina Silva

7 .

Desenvolvimento Sustentável - Ignacy Sachs

8 .

A Política Nacional Integrada Para a Amazônia Legal - Seixas Lourenço

9 .

Diretrizes Para Operacionalização do Programa Nacional de Educação Ambiental

10 .

Análise de Um Programa de Formação de Recursos Humanos em Educação Ambiental - Nilza Sguarezzi

11 .

A Inserção do Enfoque Ambiental no Ensino Formal de Goiás - Magali Izuwa

12 .

Educação Ambiental para o Século XXI & A Construção do Conhecimento: suas imlicações na educação ambiental - Naná Mininni Medina

13 .

Conservação, Ecologia Humana e Sustentabilidade na Caatinga: Estudo da Região do Parque Nacional da Serra da Capivara - Moacir Arruda

14 .

Planejamento Biorregional - Kenton Miller

15 .

Planejamento e Gestão de APAs: Enfoque Institucional - Dione Angélica de Araújo Côrte

16 .

Educação Ambiental Não-Formal em Unidades de Conservação Federais na Zona Costeira Brasileira: Uma análise crítica - Marta Saint Pastous Madureira e Paulo Roberto A. Tagliani

17 .

Efeitos Ambientais da Urbanização de Corumbá-MS - Maria José Monteiro

18 .

Elementos de Ecologia e sua Estrutura Ecossistêmica - Genebaldo Freire Dias

19 .

Educação Infantil e Subjetividade Ética - Jara Fontoura da Silveira

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