Sufrágio universal: movimento sufragista britânico (1903 - 1918)

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO PARANÁ ESCOLA DE EDUCAÇÃO E HUMANIDADES CURSO DE LICENCIATURA EM HISTÓRIA

MARINA KOOL ARTIOLI BENECIUTI

SUFRÁGIO UNIVERSAL: MOVIMENTO SUFRAGISTA BRITÂNICO (1903 – 1918)

CURITIBA 2016

MARINA KOOL ARTIOLI BENECIUTI

SUFRÁGIO UNIVERSAL: MOVIMENTO SUFRAGISTA BRITÂNICO (1903 – 1918) Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Licenciatura em História da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, como requisito parcial à obtenção do título de Licenciada em História.

Orientadora: Profa. Dra. Adriana Mocelim de Souza Lima

CURITIBA 2016

Dados da Catalogação na Publicação Pontifícia Universidade Católica do Paraná Sistema Integrado de Bibliotecas – SIBI/PUCPR Biblioteca Central

B461s 2016

Beneciuti, Marina Kool Artioli Sufrágio universal : movimento sufragista britânico (1903-1918) / Marina Kool Artioli Beneciuti ; orientadora: Adriana Mocelim de Souza Lima. – 2016. [75] f. : il. ; 30 cm

TCC (História) – Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, 2016 Bibliografia: f. [73-75]

1. Sufragistas - Grã-Bretanha - História. 2. Pankhurst, Emmeline, 1858-1928. 3. Mulheres - Grã-Bretanha - História. I. Lima, Adriana Mocelim de Souza. II. Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Escola de Educação e Humanidades. III. Título. CDD 20. Ed. – 324.6230941

MARINA KOOL ARTIOLI BENECIUTI

SUFRÁGIO UNIVERSAL: MOVIMENTO SUFRAGISTA BRITÂNICO (1903 – 1918)

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Licenciatura em História da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, como requisito parcial à obtenção do título de Licenciada em História.

COMISSÃO EXAMINADORA

_____________________________________ Profa. Dra. Adriana Mocelim de Souza Lima Pontifícia Universidade Católica do Paraná

_____________________________________ Prof. Dr. Wilson Maske Pontifícia Universidade Católica do Paraná

Curitiba, 14 de junho de 2016.

Dedico este trabalho à pessoa que eu gostaria que estivesse hoje presente para comemorar esse momento tão especial comigo, que mais me motivou, diretamente e indiretamente, durante esses três anos e meio, minha amada avó que faz uma falta imensurável, Guilhermina Kool Artioli. & LK.

AGRADECIMENTOS Existem algumas pessoas que merecem meus agradecimentos por terem um espaço tão especial na minha vida e por terem feito parte da minha trajetória acadêmica: Meu Deus, um ser de uma força e iluminação inigualável; Minha mãe e meu pai, Maria Thereza e Ivanildo, que sempre me ensinaram, me apoiaram e me deram as melhores oportunidades; Minha irmã, Daniela, que sempre me inspirou; Minha orientadora, professora Adriana, por toda ajuda; Minha prima, Julia, que nos últimos anos se tornou uma grande amiga; Minha família, que apesar de tudo são muito importantes; Meus amigos, Eloise, Thuany, Gabrielle, Jessica, Nicolas, Leonardo e Lucas, pelo companheirismo, por todos os anos de amizade e todas as boas memórias; Minhas amigas, Nathália e Jessica, por me mostrarem que a distância não significa nada; Meus companheiros de curso, Lucas, Marcelo, Larissa e Giovanna, com quem compartilhei os últimos três anos e meio; E todos aqueles que por algum motivo não foram citados mas que já fizeram parte da minha vida e influenciaram na formação da pessoa que sou hoje.

RESUMO O presente trabalho de conclusão de curso aborda o movimento sufragista britânico entre 1903 e 1918 a partir das manifestações das suffragettes. Teve-se como problemática em questão a maneira que a luta das mulheres é apresentada na autobiografia de Emmeline Pankhurst, importante militante e fundadora da Women’s Social and Political Union, e como objetivo entender de que forma o movimento influenciou nas mudanças política e civil das mulheres da época. A fonte primária estudada ao longo da pesquisa é a autobiografia de Emmeline Pankhurst, publicada em 1914. A metodologia empregada ao longo da monografia é pesquisa bibliográfica e análise do discurso, fundamentada nos trabalhos de Brandão e Fiorin. Buscou-se também contextualizar a Inglaterra no período do século XX e realizar uma breve pesquisa a respeito da História da Mulher. Como resultado, é possível constatar que o movimento sufragista, depois de anos de luta, conseguiu o seus maiores objetivos que era o direito ao voto e sua emancipação. Palavras-chave: sufrágio feminino; Emmeline Pankhurst; Inglaterra; século XX; História da Mulher

ABSTRACT The present work handles the British suffragist movement between the years of 1903 and 1918, as from the suffragettes’ demonstrations. The issue in question is the way the women’s fight is presented in Emmeline Pankhurst’s autobiography, important militant and founder of Women’s Social and Political Union, and aims to understand the ways the movement influenced the political and civil changes for women at the time. The primary source that was studied during this research is Emmeline Pankhurst’s, published in 1914. The methodology employed along the thesis is bibliographical research and discourse analysis, justified by the works of Brandão and Fiorin. The author sought to contextualize 20th Century England and perform a brief research on Women’s History. As a result, it is possible to determine that the suffragist movement, after years of fight, achieved its biggest goals, which were the right to vote, and enfranchisement. Keywords: women’s suffrage; Emmeline Pankhurst; England; 20th Century, Women’s History

LISTA DE ILUSTRAÇÕES FIGURA 1 – Imagem publicada no Ilustrated London News em 9 de março de 1912 intitulada Glass-Smashing for Votes! Suffragettes as window-breakers ................................ 24 FIGURA 2 – capa do jornal semanal The Suffragette, em junho de 1913, prestando homenagem a Emily Wilding Davison ................................................................................... 26 FIGURA 3 – propagandas antissufragista ............................................................................. 27 FIGURA 4 – Annie Kenney e Christabel Pankhurst segurando uma faixa com o slogan votes for women, 1906 ...................................................................................................................... 42 FIGURA 5 – propagandas desenvolvidas pela Women’s Social and Political Union ........... 53 FIGURA 6 – cartaz produzido pela WSPU que ilustra a alimentação forçada que acontecia dentro das prisões femininas devido a greve de fome ............................................................ 59 FIGURA 7 – brutalidade na Black Friday, 18 de novembro de 1910 ................................... 61 FIGURA 8 – acidente fatal de Emily Wilding Davison, 4 de junho de 1913 ........................ 67

SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ....................................................................................................................... 9 2. CAPÍTULO I: HISTÓRIA DAS MULHERES E CONTEXTUALIZAÇÃO DO MOVIMENTO SUFRAGISTA BRITÂNICO ................................................................... 11 2.1 HISTÓRIA DAS MULHERES .............................................................................................. 11 2.2 CONTEXTO HISTÓRICO DA INGLATERRA NO SÉCULO XIX E SÉCULO XX .................................................................................................................................................. 14 2.3 A LUTA PELO DIREITO AO VOTO ................................................................................... 19 3. CAPÍTULO II: O MOVIMENTO SUFRAGISTA BRITÂNICO (1903 – 1918) ATRAVÉS DOS OLHOS DE EMMELINE PANKHURST ............................................. 30 3.1 EMMELINE PANKHURST: A FORMAÇÃO DE UMA MILITANTE E SUAS CONTROVÉRSIAS ............................................................................................................... 31 3.2 A WOMEN’S SOCIAL AND POLITICAL UNION E OS ANOS DE FORTE MILITÂNCIA .................................................................................................................................................. 46 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................... 71 5. FONTE PRIMÁRIA ............................................................................................................. 73 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................ 73



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1. INTRODUÇÃO O presente trabalho de conclusão de curso tem como objetivo estudar os anos finais do movimento sufragista britânico, mais especificamente os anos de luta das suffragettes, filiadas da Women’s Social and Political Union, liderada pela militante Emmeline Pankhurst. No entanto, o movimento sufragista não se limita apenas à Inglaterra. O episódio marcante da História das Mulheres teve início na metade do século XIX e se estendeu até o século XX. Como vai ser possível perceber ao longo do trabalho, o movimento sufragista britânico mantinha um relacionamento próximo com o estadunidense. O primeiro país a garantir o direito de voto às mulheres foi a Nova Zelândia em 18931. Já na América do Sul, o Brasil, que instituiu o voto feminino em 24 de fevereiro de 19322, apesar de não ser citado durante a pesquisa, recebeu forte influência dos movimentos da Inglaterra e dos Estados Unidos da América. Durante a pesquisa aconteceram mudanças na condução do trabalho pois, foi constatado o difícil acesso ao acervo digital de jornais britânicos da época estudada. Outro ponto importante que deve ser levado em consideração é a pouca disponibilidade de material na língua portuguesa, sendo possível destacar os trabalhos de Abreu e Karawejcyk. Os recortes temporal e espacial compreendem a Inglaterra nos anos de 1903 a 1918. Apesar do foco do trabalho se passar durante os anos finais do movimento, o movimento sufragista britânico tem acontecimentos que ultrapassam o recorte temporal mas que possuem grande importância, como a promulgação do Equal Franchise Act em 2 de julho de 1928 que garantiu o direito de voto igual para mulheres e homens. Foi utilizado como fonte primária a autobiografia de Emmeline Pankhurst, publicada em 1914. Fundadora da Women’s Social and Political Union, Emmeline Pankhurst é um dos grandes nomes do movimento. A autobiografia foi digitalizada pelo The Project Gutenberg e está gratuitamente disponível. Para estudar metodologicamente a fonte foram usados os estudos sobre análise do discurso de Brandão e Fiorin. O trabalho de conclusão de curso foi dividido em dois capítulos intitulados “História das Mulheres e contextualização do movimento sufragista britânico” e “O movimento sufragista britânico através dos olhos de Emmeline Pankhurst”. 1

KARAWEJCZYK, Mônica. As filhas de Eva querem votar: dos primórdios da questão à conquista do sufrágio feminino no Brasil (c. 1850-1932). 2013. p. 12. Disponível em: . Acesso em: 20 maio 2016. 2 Ibid. p. 119.





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O primeiro capítulo foi separado em três seções. Na primeira, foi desenvolvido uma breve introdução à História das Mulheres, fundamentada nos trabalhos de Perrot, Gomes, Soihet e Pedro. Na segunda, o contexto histórico da Inglaterra nos séculos XIX e XX. Para isso, foram usados Vizentini e Perry. Já na terceira e última seção, foi elaborada uma breve contextualização do movimento sufragista britânico com base nos trabalhos desenvolvidos por Abreu e Karawejcyk. O segundo capítulo, apesar de destinar-se por inteiro à fonte primária, também foi dividido em seções. A primeira constitui-se da análise do livro I da autobiografia de Emmeline Pankhurst bem como as controvérsias visões que existem a respeito da militante, apresentadas por Purvis. A segunda e última seção abrange os livros II e III, onde Emmeline Pankhurst relata os oito anos pré-Primeira Guerra Mundial (1914 – 1918) e os avanços na radicalização do movimento.





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2. HISTÓRIA DA MULHER E CONTEXTUALIZAÇÃO DO MOVIMENTO SUFRAGISTA BRITÂNICO O objetivo deste primeiro capítulo é estudar a relação entre a mulher e a História, bem como o movimento sufragista do início do século XX e o contexto histórico em que ele se encontra. 2.1 HISTÓRIA DA MULHER A historiadora Michelle Perrot, uma das mais importantes do assunto, destina uma seção em seu livro Os excluídos da História apenas para analisar a História da Mulher. Perrot inicia seu trabalho com a seguinte afirmação, as relações das mulheres com o poder inscrevem-se primeiramente no jogo de palavras. ‘Poder’ [...] é um termo polissêmico. [...] No plural, ele se estilhaça em fragmentos múltiplos, equivalente a ‘influências’ difusas e periféricas, onde as mulheres têm sua grande parcela. [...] as mulheres têm, diz-se, poderes. No Ocidente contemporâneo, elas investem no privado, no familiar e mesmo no social, na sociedade civil. (PERROT, 1988, p. 167)

Ao se debruçar sobre as representações do poder da mulher, Perrot (1988, p. 168) aponta que esse é um tema que requer investigação histórica e antropológica. A historiadora ainda acrescenta que temas antigos, como a ideia que as mulheres são forças do mal, passaram a ser reatualizadas no século XIX. Perrot comenta que a pesquisa feminina que estava acontecendo recentemente, considerando que o livro fora publicado no final dos anos 80, passava por um processo de reavaliação do poder feminino, completou o pensamento dizendo que foi um período que pode ser denominado era do matriarcado. De acordo com a historiadora francesa, “o século XIX nada inventa nesse domínio; ele apenas reformula uma questão muito antiga, na verdade eterna, reapropriando-se dela” (PERROT, 1988, p. 169-170). De certa forma atrelado ao tema que se desenvolverá ao longo do presente trabalho de conclusão de curso, quando comentado sobre a ligação entre as mulheres e a política, Perrot afirma: Há o caso em que a exclusão das mulheres do poder político ocorre pura e simplesmente; há outros casos em que essa exclusão vem acompanhada por justificativas ou compensações, e outros ainda onde ela se dá em graus variados. [...] As mulheres e a política: é ainda um vasto campo de reflexão para nossos esforços conjuntos. (PERROT, 1988, p. 173)





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A historiadora Gisele Gomes afirma que o avanço da História das Mulheres deveu-se também aos novos rumos seguidos pelas tendências historiográficas, no exterior e no Brasil, que ganhavam força nesse período. Lembremos que até a década de 1970 predominavam as análises estruturalistas que se apoiavam nos recortes macrossociais, nas explicações globalizantes, nas conjunturas econômicas e nas categorias sociais em sua busca pela compreensão do passado histórico. (GOMES, 2010, p. 4)

Gomes (2010, p. 4) ainda acrescenta que as mulheres se tornaram protagonistas lado a lado com os homens. Em seu outro trabalho, onde relata sua experiência como estudiosa da área, Perrot (1994, p. 9) afirma que “escrever uma história das mulheres é um empreendimento relativamente novo e revelador de uma profunda transformação: está vinculado [...] à concepção de que as mulheres têm uma história” e completa o pensamento alegando que existe uma teoria e uma historiografia da História das Mulheres que permitem desenvolver críticas e questionamentos a respeito dessas pesquisas e suas dificuldades. A História da Mulher passou por um longo período deixada de lado, já que, como revela Perrot (1994, p. 13), “até o século XIX, faz-se pouca questão das mulheres no relato histórico”. Acrescenta, também, que quando as mulheres eram relatadas em crônicas, havia dois extremos: na maioria das vezes eram excepcionais por sua beleza, virtude e heroísmo, ou eram descritas como tenebrosas, com vidas escandalosas. Perrot (1994, p. 15) aponta como fatores dessa transformação na História das Mulheres, outras disciplinas e não a História, no caso Sociologia e Antropologia por serem, como ela mesma diz, “mais sensíveis à diferença entre os sexos em virtude dos seus próprios procedimentos”. De acordo com a historiadora, a Sociologia foi a precursora e possui “pesquisas inovadoras acerca da imprensa feminina” (PERROT, 1994, p. 15-16), carregando nomes importantes como Evelyne Sullerot, Madeleine Guilbert e Andrée Michel. Já a Antropologia voltou-se mais para as desigualdades das mulheres no trabalho e no movimento operário. Ao voltar-se para História, Perrot (1994, p. 19) comenta que “campos de estudo se multiplicaram e [...] a quantidade de dissertações aumentou”. Já Soihet e Pedro (2007, 285), ao desenvolverem um pensamento a respeito da história das mentalidades e história cultural relacionadas com a abordagem do feminino, afirmam que as transformações na historiografia, articuladas à explosão do feminismo, a partir de fins da década de 1960, tiveram papel decisivo no processo em que as mulheres são alçadas à condição de objeto e sujeito da História, marcando a emergência da História das Mulheres. (SOIHET, PEDRO, 2007, p. 285)





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Soihet e Pedro ainda afirmam que, de acordo com Joan Scott, após ser constituída a História das Mulheres, uma das maiores contribuições foi o “descrédito de correntes historiográficas polarizadas por um sujeito humano universal. A História das Mulheres [...] implicava a negação de que o sujeito da história constituía-se numa figura universal”. (2007, p. 286). Mais uma vez podendo realizar conexões com o tema central deste trabalho, o movimento sufragista, Soihet e Pedro (2007, p. 286) afirmam que o movimento feminista contribuiu com a inclusão das mulheres no ser humano universal. E acrescentam a ideia de que A fragmentação de uma ideia universal de “mulheres” por classe, raça, etnia, geração e sexualidade associava-se a diferenças políticas sérias no seio do movimento feminista. Assim, de uma postura inicial em que se acreditava na possível identidade única entre as mulheres, passou-se a outra, em que se firmou a certeza na existência de múltiplas identidades. (SOIHET, PEDRO, 2007, p. 287)

Dessa maneira, a história das mulheres não se prendeu apenas a uma tentativa de corrigir ou preencher um registro incompleto do passado, passou a ser um meio de compreender de que forma a história trabalha na produção do saber de gênero (SOIHET, PEDRO, 2007, p. 291). Perrot (1994, p. 20-21) comenta sobre três datas significativas: 1973, quando foi ministrado o primeiro curso em Jussieu intitulado Les femmes ont-elles une histoire?, onde mostrou a “falta de direcionamento e nossa carência de materiais”; 1983, quando aconteceu o colóquio Une Histoire des femmes est-elle possible? em Saint-Maximin e foi levantada a questão de não havia mais dúvidas de que as mulheres possuíam uma história, mas sim como escrevê-la; e 1990-92, quando o livro Histoire des femmes en Occident foi publicado. A historiadora ainda acrescenta que em vinte anos foi firmado um campo de pesquisa a respeito de História das Mulheres que conduz a uma reflexão em volta da história como um produto da dominação masculina, que trabalhava com dois níveis, o dos próprios acontecimentos e o da elaboração deles empreendida pelo relato. As representações femininas que interessavam logo de início eram as mais oprimidas pela sociedade, como por exemplo as prostitutas, domésticas e operárias. Posteriormente, a questão do corpo feminino, sua representação e suas funções surge como foco central. Claudia de Lima Costa, citada por Soihet e Pedro, durante seu trabalho, “insiste na recriação da categoria ‘mulher’ abandonando a utilização do gênero. Esse retorno à noção de mulher é justificado a partir de sua consideração explícita como categoria política” (COSTA, 1998, p. 138 apud SOIHET, PEDRO, 2007, p. 295).



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Sendo assim, é possível perceber que com o passar do tempo e o aprofundamento dos estudos a respeito de História das Mulheres e História de Gênero, os dois campos apresentamse hoje mais definidos; porém, isso não exclui o fato de que ainda são campos que, academicamente, precisam de atenção e dedicação. 2.2 CONTEXTO HISTÓRICO DA INGLATERRA NO SÉCULO XIX E SÉCULO XX O período que antecede o recorte temporal do presente trabalho de conclusão de curso foi marcado por uma série de mudanças na esfera política e econômica mundial. Entre 1770 e 1890, como citado pelo historiador Paulo Fagundes Vizentini, havia uma “predominância inglesa sobre o sistema mundial, consagrada como Pax Britânica3” (VIZENTINI, 1996, p. 12). A Inglaterra garantiu sua supremacia durante o Congresso de Viena ao se apoiar no “sistema baseado no equilíbrio de poderes na Europa e no ‘imperialismo livre-cambista’ no plano mundial” (VIZENTINI, 1996, p. 12-13), com o objetivo de impedir a predominância de apenas uma potência na Europa. Conforme aponta Marvin Perry, a Segunda Revolução Industrial, que aconteceu na metade do século XIX, foi responsável por uma transformação significativa nos campos social e econômico. A respeito das mudanças ocorridas, Perry comenta: Essa mudança no mundo foi definida pelos avanços tecnológicos e por novas formas de negócios e organização de trabalho. Caracterizou-se também a ascensão da classe média ao poder político e social equivalente a seu poder econômico; pelo declínio dos grupos ou classes tradicionais; e por mudanças significativas no papel das mulheres e crianças no seio da família. (PERRY, 1999, p. 444)

A partir da década de 1870, a Grã-Bretanha começou a declinar, não conseguindo mais se manter como centro da economia mundial e perdendo controle da balança de poder. Vizentini aponta que desde 1880, devido a esse acontecimento, a Grã-Bretanha passou a adotar “uma política de expansão na África, Ásia e Oceania, que ficou conhecida como imperialismo4”. (VIZENTINI, 1996, p. 20) 3

“Pax Britânica é um termo em latim que em tradução livre significa paz britânica. O período de anos que determinam a Pax Britânica parte da derrota definitiva de Napoleão e com o Tratado de Paris em 1815 até o início da Primeira Guerra Mundial, quando os termos do equilíbrio europeu firmados no Congresso de Viena se tornam insustentáveis e a Grã-Bretanha não mais se encontra em condições de manter a paz no continente.” (BASTOS, 2012, p. 3) 4 “Não há um imperialismo, mas imperialismos. Cada um com suas práticas e estratégias de controle específicas, possuindo também diferentes definições. [...] a palavra ‘imperialismo’ apareceu apenas em 1879, sendo bastante utilizada entre 1890 a 1914, e servindo ainda hoje para designar práticas militares e culturais desenvolvidas por





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Os países europeus “passaram a buscar a expansão colonial através do imperialismo, e a política de alianças passou a resultar principalmente de eventos extra-europeus”. (VIZENTINI, 1996, p. 22) O isolamento que a Grã-Bretanha havia conseguido firmar teve que ser deixado de lado devido a rivalidade que sua expansão causou, obrigando-a a procurar estabelecer novas alianças na Europa, como afirma Paulo Fagundes Vizentini (1996, p. 25): No Pacífico, Londres se inquietava com a crescente presença norte-americana através da diplomacia do dólar e de sua política de portas abertas na China; na África, a França conquistara a Tunísia, e procurava controlar o Alto Nilo, o que produziu o incidente de Fachoda, sendo que Londres teve também que travar uma dura guerra contra os Boers sul-africanos de 1899 a 1902; no continente asiático, a rivalidade com a Rússia foi sempre um motivo de preocupação. [...] a Inglaterra procurou aproximar-se da Alemanha (com a qual ainda não possuía litígios) visando compensar a aliança franco-russa. Mas a crescente rivalidade comercial e a decisão alemã de ampliar seu poderio naval inviabilizaram este acercamento. (VIZENTINI, 1996, p. 25)

Uma das consequências da Segunda Revolução Industrial foi o “forte incremento demográfico e o crescimento de uma concentração urbana acelerada” (VIZENTINI, 1996, p. 29). Em 1904, com o imperialismo em declínio, iniciou-se um período de grande crise, denominado Paz Armada, que durará até 1914 e conduzirá à Primeira Guerra Mundial (1914 – 1918) (VIZENTINI, 1996, p. 37). No âmbito político, a Inglaterra passava por um processo de reforma que iniciou-se com as leis de 1832. Em 1867, como apontado pelo historiador Marvin Perry (1999, p. 448), foi encaminhada ao Parlamento por Benjamin Disraeli, conservador Primeiro-Ministro do Reino Unido, a Lei de Reforma que dava direito de voto aos trabalhadores urbanos, fazendo com o que o eleitorado britânico duplicasse. Outras duas leis citadas pelo historiador possuem grande importância na reforma eleitoral, sendo elas a lei que estabelecia o voto secreto, promulgada em 1872, e a Lei de Reforma de 1884 que ampliou os direitos políticos aos trabalhadores rurais, fazendo com que a maioria dos ingleses do sexo masculino pudessem votar. As mudanças políticas que estavam acontecendo na Inglaterra não agradavam outra parcela da população, a feminina – já que, como Marvin Perry aponta, “com respeito à questão do sufrágio feminino, a democracia britânica foi lenta”. (PERRY, 1999, p. 448) potências para exercer domínio sobre outros Estados, politicamente independentes. [...] o imperialismo se define como um período histórico específico, que abrange de 1875 a 1914, quando a Europa Ocidental passou a exercer intensa influência sobre o restante do mundo. [...] O período entre 1870 e 1914 esteve, dessa forma, associado à expansão do Capitalismo monopolista, à conquista política e militar de territórios e ao auge do imperialismo sobre o mundo, com a partilha da África. [...] o imperialismo inglês, durante o final dos séculos XIX e XX, tornou-se intervencionista na África e na Ásia, dividindo essas regiões com outras Nações europeias, como França e Alemanha. Nesse caso, a dominação foi também política, com a transformação dos territórios e povos dominados em colônias.” (SILVA, 2009, p. 218)





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Dois assuntos trabalhados por Eric Hobsbawm (1988) possuem grande relevância para esta pesquisa, já que ilustram dois pontos importantes do contexto analisado. O primeiro deles é a transformação da democracia. O historiador coloca que o processo de democratização teve início após a rápida existência da Comuna de Paris, em 1871, onde houve “um surto internacional de histeria entre os governantes europeus e suas aterrorizadas classes médias”. (HOBSBAWM, 1988, p. 125-126) Ao conceituar o termo democracia, Hobsbawm faz uso do pensamento de Aristóteles e afirma que “a democracia [...] é o governo das massas populares, que em geral são pobres. Evidentemente, os interesses dos pobres e dos ricos, dos privilegiados e dos desprivilegiados não são os mesmos.” (HOBSBAWM, 1988, p. 126) Este processo de democratização da política passou a ser mais evidente após 1980, quando as massas passaram a marchar em direção ao palco da política, conforme aponta o historiador britânico. Hobsbawm ainda afirma que “a era da democratização [...] veio a ser a era da hipocrisia pública, ou antes, da duplicidade e consequentemente, da sátira política”. (HOBSBAWM, 1988, 130-131) Mais adiante, o historiador faz uma reflexão a respeito das mobilizações de massa e suas consequências na política. De acordo com o britânico (1988, p. 131), os novos movimentos de massa possuíam caráter ideológico e a classe operária era uma das principais. Hobsbawm desenvolve uma breve comparação entre a transformação das políticas. Em contraste com a política eleitoral da antiga sociedade burguesa, a nova política de massas mostrava-se progressivamente incompatível com a velha política localizada, baseada nos homens com poder e influencia local, conhecidos (no vocabulário político francês) como notables (notáveis). [...] Na política democrática, o “patrão” não chegava a desaparecer, mas neste caso era crescentemente o partido que fazia o notável ou que, pelo menos, o salvava do isolamento e da impotência política. [...] A democracia que assim substituía a política dos notáveis [...] não substituía o clientelismo e a influencia pelo “povo”. (HOBSBAWM, 1988, p. 139)

Outro tema discutido na pesquisa foi a corrupção. Hobsbawm afirma que ela passou a ser mais visível, mesmo onde não havia tanta corrupção – e se tornava ainda mais visível quando colocada ao lado da “incorruptibilidade dos juízes e administradores públicos permanentes mais graduados”. (HOBSBAWM, 1988, p. 142) O historiador ainda cita um escândalo de corrupção que aconteceu na Inglaterra, o escândalo Marconi (1912). O segundo assunto diz respeito do processo de emancipação feminina, ou como o historiador aponta, o surgimento de uma “nova mulher”. No início de sua discussão, Hobsbawm coloca que historiadores focam seus estudos nas transformações da condição feminina. A nova espécie “nova mulher”, como citada por ele, surge a partir de 1880 quando



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“[...] os observadores do sexo masculino teorizaram e discutiram e que foi a protagonista dos escritores ‘progressistas’, como Nora, de Henrik Ibsen e Rebecca West, heroína de Bernard Shaw, ou melhor, anti-heroína”. (HOBSBAWM, 1988, p. 272) Ao analisar a realidade da mulher na época, o historiador afirma que a partir de 1875, as mulheres, do considerado mundo “desenvolvido”, passaram a ter menos filhos. Esse fato apresentou uma mudança significativa na demografia destes países “desenvolvidos” causando o que o historiador coloca como “transição demográfica”. Ao contrário desses países, o índice de natalidade em grande parte do Terceiro Mundo continuou alto. O historiador acrescenta que existem duas hipóteses para o índice de natalidade ter diminuído sendo elas “tanto se as mulheres se casarem mais tarde, como se mais mulheres permanecerem solteiras [...] ou por meio de alguma forma de controle de natalidade, o que, no século XIX, predominantemente significava abstenção de fazer sexo ou coitus interruptus”. (HOBSBAWM, 1988, p. 273) Em seguida, afirma que, devido ao padrão de casamento na Europa Ocidental, as duas primeiras hipóteses tem mais força, afinal “as mulheres do Ocidente pré-industrial inclinavam-se a casar tarde, muitas vezes no final de seus vinte anos, e a proporção de solteiros e solteiras era alta”. (HOBSBAWM, 1988, p. 273) Dessa forma, Hobsbawm afirma que o crescimento no controle da natalidade significava uma mudança nas estruturas, valores e expectativas das mulheres trabalhadoras ocidentais, uma vez que “o controle da natalidade indicava significativas mudanças culturais, seja em relação às crianças quanto ao que homens e mulheres esperavam da vida; [...] famílias menores torvavam possível dedicar mais tempo, mais cuidados e mais recursos a cada um dos filhos”. (HOBSBAWM, 1988, p. 275) A respeito do perfil das mulheres trabalhadoras, o historiador coloca que houve “um número grande e crescente de mulheres trabalhadoras cujos padrões de vida haviam sido ou estavam sendo transformados – não necessariamente para melhor – pela revolução econômica.” (HOBSBAWM, 1988, p. 277) E aponta que o primeiro fator desta revolução foi o aumento no número de indústrias domésticas e a domicílio, chamado de “protoindustrialização”. Estas indústrias domésticas, no entanto, passaram a ser uma forma de trabalho mal remunerado que as mulheres poderiam fazer em casa. Apesar disso, com as indústrias domésticas, as mulheres poderiam conciliar um trabalho pago com a supervisão da casa e dos filhos. Hobsbawm afirma que, o efeito mais drástico da industrialização para a mulher foi a separação do local de trabalho com a casa. O historiador inicia em seguida uma discussão a respeito do provedor da família, ou o



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“ganha-pão” como coloca no texto. Hobsbawm afirma que esse cargo, por assim dizer, era tipicamente do homem, no entanto não era uma regra. O “ganha-pão” principal era o que possuía rendimento suficiente para manter seus dependentes. Como houve a separação do local de trabalho com a casa, passou a ser mais difícil para a mulher casada levar dinheiro para casa pois, “essa separação [...] trazia consigo, logicamente, um padrão de divisão sexualeconômica. Para a mulher, isso significava que seu papel de gerencia doméstica tornava-se sua função primordial, especialmente em casos em que os ganhos familiares eram irregulares ou escassos”. (HOBSBAWM, 1988, p. 279) Outro ponto importante levantado pelo historiador é a criação da crença de que o trabalho da mulher era inferior e assim, mal pago, já que o rendimento do “ganha-pão” era a principal renda e o dos demais membros da família serviriam apenas como complementares. A dependência da mulher casada surgia com o fato de que o casamento dificultava o trabalho fora de casa, já que ela precisaria fazer os trabalhos domésticos e cuidar dos filhos. Ou seja, quando a mulher se casava um ciclo de sua vida acabava, já que “as mulheres, quase sempre, trabalhavam antes de casar. Com frequência eram obrigadas a casar quando enviuvavam ou seus maridos as abandonavam. Mas não costumavam trabalhar quando casadas”. (HOBSBAWM, 1988, p. 280) O historiador ainda faz uma discussão sobre a masculinização do trabalho, dos negócios, da economia e da política, o que causava nas mulheres um sentimento de exclusão. As mulheres das classes operária e média no século XIX “viram sua posição começar a mudar, substancialmente nessas décadas, por motivos econômicos”. (HOBSBAWM, 1988, p. 283) As mudanças e a tecnologia passaram a aumentar a perspectiva feminina de um trabalho assalariado. Sendo assim, houve um aumento no número de empregos em lojas e escritórios. Houve também alterações na posição das mulheres, em especial nas classes médias, influenciadas pela expansão da educação secundária para meninas. O historiador afirma que “na Inglaterra, onde não havia sistema secundário nacional antes de 1902, o número das escolas de rapazes subiu de 292, em 1904-1905, a 397, em 1913-1914; mas o número de escolas para meninas elevou-se de 99 para uma comparável cifra de 349”. (HOBSBAWM, 1988, p. 287) A reflexão do historiador mais relevante para este trabalho de conclusão de curso é a respeito da documentação da história das mulheres. “É mais fácil documentar o movimento consciente das campanhas pela emancipação feminina e as mulheres que realmente conseguiram penetrar nas esferas de vida até então reservadamente masculinas”. (HOBSBAWM, 1988, p. 292) É possível, dessa forma, fazer uma conexão desta citação com



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a fala de Michelle Perrot previamente apresentada, “até o século XIX, faz-se pouca questão das mulheres no relato histórico”. (PERROT, 1994, p. 13) Hobsbawm coloca que houve também mudanças na moda feminina, por exemplo quando mulheres da “’geração do jazz’ do após-guerra adotou decisivamente o uso de cosméticos em público, o que antes havia sido característico de mulheres cuja função exclusiva era a de agradar aos homens: prostitutas e outras profissionais do entretenimento”. (HOBSBAWM, 1988, p. 306) O historiador (1988, p. 300) finaliza afirmando que houveram outros importantes debates, políticos e não-políticos, sobre as mulheres, como a luta pela liberação sexual e a luta pelo direito do voto, assunto principal deste trabalho de conclusão de curso. 2.3 A LUTA PELO DIREITO AO VOTO A busca por direitos sociais, políticos e civis das mulheres não é um assunto pertencente somente à atualidade. A escritora inglesa do século XVIII, Mary Wollstonecraft (1759 – 1797), como apontado por Zina Abreu, foi “uma das primeira mentoras intelectuais dos ulteriores movimentos pela emancipação das mulheres”. (ABREU, 2002, p. 444) Em seu trabalho intitulado Uma Reinvindicação pelos Direitos das Mulheres 5 , publicado em 1792, Wollstonecraft, seguidora da filosofia empírica de Francis Bacon e John Locke, “argumentava que a desigualdade social e política entre os sexos devia-se sobretudo à educação diferenciada que as mulheres recebiam, e ao cerceamento de sua liberdade, por convenções sociais longamente estabelecidas”. (ABREU, 2002, p. 444) A obra teve uma repercussão significativa não só na época em questão, século XVIII, mas também nos Estados Unidos, onde foi publicada pouco tempo depois e serviu também como inspiração para as mulheres responsáveis pelos movimentos do final do século XIX e início do século XX. (ABREU, 2002, p. 444) Quando a escritora inglesa produziu sua obra, estava sendo tomada pelo idealismo liberal que estava aflorado na época, e a sua obra surgiu como “o primeiro manifesto feminista na História da Inglaterra”. (ABREU, 2002, p. 450). Wollstonecraft estava certa de que [...] os males da sociedade tinham a sua origem nas desigualdades sociais e na subordinação de uns ao poder arbitrário de outros. [...] Mary Wollstonecraft acreditava que eram as desigualdades sociais e as distinções estabelecidas na

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Título original, Vindication of the Rights of Woman.



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sociedade que constituíam a fonte dos males e dos vícios que, a seu ver, transformavam o mundo num cenário dantesco. (ABREU, 2002, p. 449)

Já no século XIX, o trabalho de Wollstonecraft teve grande influência no pensamento de integrantes dos movimentos a favor do voto feminino britânico e estadunidense. Nos Estados Unidos, as mulheres estadunidenses “começaram a sua militância política no movimento abolicionista” (ABREU, 2002, 453), já que se identificavam com a condição social de submissão que os escravos possuíam. Porém, após a abolição da escravidão e o reconhecimento do direito dos negros ao sufrágio, em 1866, os dois movimentos seguiram em sentidos opostos. (ABREU, 2002, p. 454) O ponto crucial para o início do movimento a favor do voto feminino americano foi o “aparecimento, pela primeira vez, da palavra ‘male’ associada a ‘cidadão’ no texto constitucional”. (ABREU, 2002, p. 454) A reação inicial foi a fundação, em Nova York, da National Woman Suffrage Association (NWSA), em 1869. Qualquer mulher que acreditasse no seu direito de voto poderia tornar-se membro da associação. No mês de novembro do mesmo ano, em Cleveland, foi criada a segunda associação sufragista americana, a American Woman Suffrage (AWS). (ABREU, 2002, p. 454) A partir desse momento, outras associações a favor do direito de voto feminino começaram a surgir. Em 1902, a International Women’s Suffrage Alliance (IWSA) foi iniciada em Londres, que tinha como presidente a estadunidense Susan B. Anthony e como membro executivo sênior Millicent Garret Fawcett6. Essa aliança foi o ponto mais importante do movimento a favor do direito de voto feminino na época, que se tornou internacional. (ABREU, 2002, p. 454) Assim como nos Estados Unidos, o movimento sufragista britânico é separado em duas fases: “uma constitucionalista, outra militante. As sufragistas constitucionalistas conduziam as suas campanhas com moderação e sempre em observância da lei e da boa ordem [...] Esta estratégia não se mostrou todavia eficaz em nenhuma das duas nações”. (ABREU, 2002, p. 454-455) Os Estado Unidos, até o retorno das estudantes estadunidenses Alice Paul e Lucy Burns, não havia tornado seu movimento militante. Paul e Burns, enquanto moravam e estudavam na Inglaterra, tiveram contato direto com as militantes da Women’s Social and Political Union (WSPU). Ao regressar aos Estados Unidos, tornaram-se membros da National Woman Suffrage Association (NWSA) e passaram para as sufragistas estadunidenses “as 6

Millicent Garret Fawcett era também presidente da associação sufragista britânica National Union of Women’s Suffrage Societies. (ABREU, 2002, p. 454).





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tácticas e estratégias de militância agressiva que aprenderam durante a sua estada em Inglaterra”. (ABREU, 2002, p. 455) Na Inglaterra, o liberalismo político foi um ponto determinante para o movimento que defendia os direitos das mulheres. Abreu afirma: Liberais e feministas partilhavam muitas posições e princípios comuns. Tanto as teorias políticas liberais como as das feministas centravam-se no ‘individualismo’ e na ‘razão’, em oposição à estrutura, crenças, convenções e autoridade estabelecidas. Acreditavam no poder da educação e das reformas políticas e sociais como forma de erradicar barreiras e hierarquias. (ABREU, 2002, 456)

A respeito do início do movimento sufragista britânico, a pesquisadora brasileira Mônica Karawejczyk aponta que: Para Käpelli, o surgimento de associações femininas na Inglaterra foi diretamente influenciado pela negativa do governo em relação às medidas políticas em prol do voto feminino ocorridas nesse país. A autora cita como ato fundador do movimento a petição apresentada por Stuart Mill no ano de 1866 que, apesar de ser aprovada pelo Parlamento inglês, recebeu veto do primeiro-ministro Gladstone. (KARAWEJCZYK, 2013, p. 5)

O pensador liberal e filósofo inglês John Stuart Mill7, eleito deputado em 1865, teve um papel de grande importância para o movimento sufragista britânico. A petição citada acima fora preparada pela primeira Women’s Suffrage Committee britânica (ABREU, 2002, p. 459). As campanhas britânicas a favor do direito de voto feminino tiveram início entre 1830 e 1840, quando “as mulheres inglesas começaram a juntar-se a outros movimentos libertários, como o da abolição da escravatura e o movimento cartista, que visava tornar os direitos políticos extensíveis aos trabalhadores” (ABREU, 2002, p. 458). As reformas da lei eleitoral, que aconteceram entre 1832 e 1884, indignaram as sufragistas que usavam o argumento de que “as vidas das mulheres não melhorariam até que os políticos tivessem de prestar contas a um eleitorado feminino” (ABREU, 2002, p. 460). A reação da imprensa e daqueles que se opunham ao movimento e a ideia do voto feminino foi negativa e carregada de estereótipos. Na época, foram feitas e publicadas charges onde a mulher sufragista era ilustrada como inimiga dos homens, estando sempre feias e velhas, como aponta Karawejczyk (2013, p. 2). As duas fases do movimento já citadas anteriormente, sendo a primeira constitucional e a segunda militante, receberam termos distintos para denominar as mulheres. As sufragistas, 7

O pensamento feminista de Stuart Mill foi influenciado pela esposa Harriet Taylor Mill, autora do ensaio Enfranchisement of Women (1851), que defendia a luta pelo direito ao voto feminino (ABREU, 2002, p. 456)





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integrantes da primeira fase, recebiam este nome pois utilizavam táticas pacíficas, buscando não violar a lei ou ordem pública. Como apresentado por Abreu (2002, p. 462), a associação mais importante desta fase é a National Union of Women’s Suffrage Societies (1897), considerada a maior e mais antiga organização sufragista britância, que tinha como presidente Millicent Garret Fawcett. As sufragistas possuíam um jornal que recebeu o nome de The Common Cause e tinham como objetivo “não só a obtenção do direito de voto para as mulheres, como a reforma da sociedade, que consideravam tão importante como conseguir o direito ao voto”. (ABREU, 2002, p. 462) As suffragettes, foco da presente pesquisa, eram as afiliadas ao Women’s Social and Political Union, que foi fundada em 1903 na cidade de Manchester por Emmeline Pankhurst e suas três filhas Christabel, Sylvia e Adela. Levavam como lema a frase deeds not words (ações e não palavras), que, ao longo da campanha, estava sempre estampada. Três anos após a fundação, a sede foi transferida para Londres para que ficassem mais próximas dos políticos e do Parlamento, instalando-se na Clement’s Inn, nº 4. A WSPU, diferentemente da NUWSS, tomara uma postura mais agressiva (ABREU, 2002, p. 462-463). Em sua autobiografia, a presidente e fundadora Pankhurst apresenta uma caracterização da WSPU: Em primeiro lugar, os nossos membros possuem absolutamente um único pensamento; eles concentram todas as suas forças em um objeto, a igualdade política com os homens. Nenhum membro da União Social e Política das Mulheres divide sua atenção entre o sufrágio e outras reformas sociais. Sustentamos que a razão e a justiça ditam que as mulheres devem ter uma participação na reforma dos males que afligem a sociedade, especialmente os males que relacionam-se diretamente com as próprias mulheres. Portanto, exigimos, antes de qualquer outra legislação que seja, a justiça elementar de votos para as mulheres. 8 (PANKHURST, 1914, p. 57) (Tradução livre da autora)

As suffragettes possuíram dois jornais semanais, “o primeiro deles fundado em 1907, o Votes for Women, seguido pelo The Suffragette, de 1912” (KARAWEJCZYK, 2013, p. 7). Em 1908, a WSPU instituiu as cores violeta, branco e verde como as oficiais da campanha. As cores usadas em faixas e broches, que também levavam a frase vote for women (voto para as mulheres), possuíam um significado: [...] a WSPU passou também a apostar no uso de cores para diferenciar as suas seguidoras e identificar a sua campanha pelo voto. Escolheram para isso as cores

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"In the first place, our members are absolutely single-minded; they concentrate all their forces on one object, political equality with men. No member of the W. S. P. U. divides her attention between suffrage and other social reforms. We hold that both reason and justice dictate that women shall have a share in reforming the evils that afflict society, especially those evils bearing directly on women themselves. Therefore, we demand, before any other legislation whatever, the elementary justice of votes for women.” (PANKHURST, 1914, p. 57)





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violeta – para representar a dignidade, o branco – a pureza –, e o verde – a esperança. Segundo Maria de Abreu (2002, p.463), “as suffragettes foram instruídas para usarem sempre essas cores, por forma a serem instantaneamente identificadas em público, bem como a causa por que lutavam”. (KARAWEJCZYK, 2013, p. 12)

As táticas, bem mais agressivas, utilizadas por elas as diferem ainda mais das sufragistas; elas colocavam fogo em caixas de correio, quebravam vidraças de lojas e casas, prendiam-se a portões de prédios públicos com correntes para interromper os discursos dos políticos. (KARAWEJCZYK, 2013, p. 8) A historiadora Mônica Karawejczyk comenta que: [...] as táticas que tiveram mais sucesso, em termos de resultados práticos, foram as empregadas entre 1906 e 1908, caracterizadas pelas interrupções nos discursos dos parlamentares e os atos de se acorrentarem em prédio públicos, que serviam para elevar a questão do sufrágio feminino como uma das prioridades do novo século. Pugh também salienta que o incremento no uso da violência, ao invés de trazer simpatias para a causa do grupo, mais desgastou o movimento junto à opinião pública do que ajudou. (KARAWEJCZYK, 2013, p. 15)

De acordo com Karawejczyk, o ato de quebrar vidraças foi uma das primeiras manifestações agressivas das suffragettes, repercutindo negativamente na imprensa. O Ilustrated London News publicou um artigo em 9 de março de 1912 fazendo “menções a um incidente ocorrido no primeiro dia de março de 1912 no qual cerca de 150 suffragettes, armadas com martelos e pedras, provocavam um quebra-quebra nas janelas das lojas e escritórios pelas ruas de Londres”. (KARAWEJCZYK, 2013, p. 8)





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FIGURA 1: Imagem publicada no Ilustrated London News em 9 de março de 1912 intitulada Glass-Smashing for Votes! Suffragettes as window-breakers.

MUSEUM OF LONDON. 1912. Disponível http://collections.museumoflondon.org.uk/online/object/547960.html Acesso em: 21 out. 2015.

em:

Abreu (2002, p. 464) afirma que “a radicalização da militância pró-sufrágio feminino teve como consequência o encarceramento de centenas de sufragetes, muitas das quais fizeram greve de fome, como forma de protesto”. Karawejczyk (2013, p. 18) informa que mais de 200 mulheres foram presas após os ataques que aconteceram contra o governo e prédios comercias entre 1911 e 1912, passando até dois meses na prisão feminina Holloway Gaol. A reação dos policiais a respeito da greve de fome foi a alimentação forçada através de “um tubo enfiado pela boca abaixo”. Entretanto, Abreu salienta que a luta pelo direito de voto feminino somente passou a ser levada a sério na Grã-Bretanha pelos políticos e pela imprensa



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depois que as suffragettes passaram a tomar atitudes mais radicais e agressivas (KARAWEJCZYK, 2013, p. 18) – contrapondo com a afirmação de Martin Pugh. Na época em que aconteceram as táticas mais agressivas por parte das britânicas, houve uma grande repercussão internacional. A Revista da Semana, publicou, na edição de 25 de abril de 1914, uma matéria intitulada “As suffragistas julgadas pelos caricaturistas americanos” onde apresentou as diferenças entre o movimento sufragista estadunidense e britânico: ao mesmo tempo que a suffragista ingleza, enganada nas suas esperanças, enveredava imprudentemente para a propaganda pelo facto, a suffragista americana, já victoriosa em alguns dos Estados da União, continua reivindicando o direito politico do suffragio sem apellar para os argumentos da violência. [...] Em Inglaterra, contra as apedrejadoras de vitrinas, contra as incendiárias dos marcos postais, contra as destruidoras de obras de arte, contra as vociferadoras dos ‘meetings’, contra as desordeiras das ruas, a polícia procede com resoluta energia. A luta tomou o aspecto de uma accesa batalha. A mulher, no seu desvairio, tendo perdido a serenidade e tendo desistido de combater a coberto do escudo da sua fragilidade, expoz-se voluntariamente a ser considerada como uma adversária perigosa, irritante e incômoda, com quem se não usa de contemplações. (Revista da Semana, 25/04/1914, p. 20 apud KARAWEJCZYK, 2013, p. 18)

Algumas suffragettes “tomavam atitudes extremadas por conta própria”, comenta Karawejczyk. Um dos casos que ganhou maior destaque na imprensa foi o de Emily Wilding Davison, que se atirou “sob as patas do cavalo do Rei inglês numa corrida de cavalos, na qual veio a se ferir gravemente, vindo a falecer alguns dias depois". (KARAWEJCZYK, 2013, p. 16) Ela se tornaria a primeira mártir do movimento sufragista britânico e recebeu uma homenagem das companheiras suffragettes, que estampou a capa do jornal semanal The Suffragette em junho de 1913, como pode ser visto na figura 1 abaixo. Atitudes como esta de Davison davam argumentos a àqueles que não concordavam com o movimento sufragista, denominados de antissufragistas. Estes faziam o uso de imagens, ilustradas na figura 2, que ilustravam negativamente as suffragettes com o intuito de denegrir o movimento. (KARAWEJCZYK, 2013, p.16)





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FIGURA 2: capa do jornal semanal The Suffragette, em junho de 1913, prestando homenagem a Emily Wilding Davison.

Legenda: Em honra e em reverente memória de Emily Wilding Davison. Ela morreu por mulheres. (Tradução livre da autora) THE SUFFRAGETTE. 1913. Disponível em: http://thewildingfestival.co.uk/?attachment_id=110 Acesso em: 22 out. 2015.





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FIGURA 3: propagandas antissufragista.

Legenda: (esquerda) Minha mulher se juntou ao movimento sufragista. (Eu estou sofrendo desde então). (Tradução livre da autora). (direita) Mamãe é uma suffragette. (Tradução livre da autora). PALCZEWSKI, Catherine H. Postcard Archive. University of Northern Iowa. Cedar Falls, IA. Disponível em: http://www.uni.edu/palczews/NEW%20postcard%20webpage/Bamforth.html Acesso em: 22 out. 2015.

No ano de 1913, o Parlamento Britânico promulgou a lei Prisoners (Temporary Discharge for Ill-Health) Act, popularmente conhecida como The Cat and Mouse Act. Essa lei “permitia a rápida libertação das prisioneiras que estavam tão enfraquecidas pela fome que apresentavam risco de morte. Elas deveriam retornar para a prisão uma vez que sua saúde fosse recuperada, onde o processo começaria novamente” (UNITED KINGDOM. Parliament, 1913) (Tradução livre da autora)9. Em 1914, um importante acontecimento fez com que todas as antigas alianças sufragistas fossem deixadas de lado, o início da Primeira Guerra Mundial. Karawejczyk (2013, p. 20) afirma que, “os atos de desobediência civil foram suspensos de comum acordo entre os grupos, deixando a militante campanha em prol do sufrágio feminino em segundo 9

“allowed for the early release of prisoners who were so weakened by hunger striking that they were at risk of death. They were to be recalled to prison once their health was recovered, where the process would begin again.” (UNITED KINGDOM. Parliament, 1913)





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plano”. As mulheres, como aponta Marvin Perry (1999, p. 450), desempenharam um importante papel no fronte civil durante o período da guerra. Em sua autobiografia, a líder do movimento Emmeline Pankhurst comenta sobre a participação das mulheres na guerra: [...] os homens estão se voltando para as suas mulheres e chamando-as para assumir o trabalho de manter a civilização viva. Através de todos os campos de colheita, em pomares e vinhas, as mulheres estão ganhando comida para os homens que lutam, bem como para as crianças órfãs deixadas pela guerra. Nas cidades as mulheres estão mantendo abertas as lojas, estão dirigindo caminhões e bondes, e estão atendendo a diversos negócios. Quando os remanescentes dos exércitos retornam, quando o comércio da Europa é retomado por homens, eles vão esquecer a parte que as mulheres tão nobremente ocupou? Será que eles vão esquecer na Inglaterra como as mulheres de todos os níveis da vida colocaram de lado seus próprios interesses e organizaram, não apenas para cuidar dos feridos, o cuidado com os necessitados, consolar o doente e solitário, mas, na verdade, manter a existência da nação? No primeiro sinal de guerra as militantes proclamaram uma trégua, que foi respondida sem entusiasmo com anúncio de que o Governo iria libertar todos os prisioneiros de sufrágio que se comprometeriam a ‘não cometer mais crimes ou ofensas.’ [...] Assim termina, até o momento, a guerra das mulheres contra os homens. (PANKHURST, 1914, p. 1) (Tradução livre da autora)10

A consequência mais significativa da participação das mulheres na Primeira Guerra Mundial foi a mudança de opinião de muitos integrantes da elite britânica. Dessa forma Karawejczyk (2013, p. 22) afirma que, em março de 1907, foi apresentado “um novo projeto de lei na Câmara dos Comuns, concedendo o voto para as mulheres maiores de 30 anos”. Em janeiro de 1918, foi promulgada a Representation of the People Act que “concedeu o voto para as mulheres com idade superior a 30 anos que possuíssem uma qualificação proprietária. A mesma lei deu o voto a todos os homens com mais de 21 anos de idade” (UNITED KINGDOM. Parliament, 1918) (Tradução livre da autora)11. Dez anos após a primeira grande conquista, foi promulgada em 2 de julho de 1928 o Equal Franchise Act, que garantiu o “direito de voto igual para mulheres e homens. Como resultado, ambos, homens e

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“[...] the men are turning to their women and calling on them to take up the work of keeping civilisation alive. Through all the harvest fields, in orchards and vineyards, women are garnering food for the men who fight, as well as for the children left fatherless by war. In the cities the women are keeping open the shops, they are driving trucks and trams, and are altogether attending to a multitude of business. When the remnants of the armies return, when the commerce of Europe is resumed by men, will they forget the part the women so nobly played? Will they forget in England how women in all ranks of life put aside their own interests and organised, not only to nurse the wounded, care for the destitute, comfort the sick and lonely, but actually to maintain the existence of the nation? At the first alarm of war the militants proclaimed a truce, which was answered halfheartedly by the announcement that the Government would release all suffrage prisoners who would give an undertaking ‘not to commit further crimes or outrages.’ [...] So ends, for the present, the war of women against men.” (PANKHURST, 1914, p. 1) 11 “granted the vote to women over the age of 30 who met a property qualification. The same Act gave the vote to all men over the age of 21.” (UNITED KINGDOM. Parliament, 1918)





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mulheres, podiam votar com a idade de 21 anos” (UNITED KINGDOM. Parliament, 1928) (Tradução livre da autora)12. Marcou-se, assim, o fim de um período de mais de três séculos da luta pelo sufrágio feminino na Inglaterra.

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“equal voting rights to women and men. As a result, both men and women could vote at the age of 21.” (UNITED KINGDOM. Parliament, 1928)





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3. O MOVIMENTO SUFRAGISTA BRITÂNICO (1903 – 1918) ATRAVÉS DOS OLHOS DE SUA LÍDER No segundo capítulo vai ser desenvolvida a análise da fonte primária, que no caso estudado é a autobiografia de Emmeline Pankhurst, presidente e fundadora da Women’s Social and Political Union (WSPU). Ao longo do capítulo será levado em consideração não só o pensamento de Pankhurst, mas também a forma em que ela dirige sua fala e seu público alvo – já que o livro foi publicado em 1914, importante ano para o movimento sufragista. A autobiografia intitulada My Own Story13 é dividida em três livros: The Making of a Militant, Four Years of Peaceful Militancy e The Women’s Revolution 14 . Calcular a disponibilidade e o alcance do livro na época em que foi publicado, 1914, não é tão simples. Sabe-se, através de sua fala, que Emmeline Pankhurst enviou cópias do My Own Story para algumas sufragistas estadunidenses porém, não se tem contato com informações concretas que mostrem o impacto do livro no Reino Unido. Nos dias de hoje, além de estar disponível em livro impresso, o livro foi digitalizado pelo The Project Gutenberg. Para analisar metodologicamente o livro de Emmeline Pankhurst será utilizado a análise do discurso. A pesquisadora pós-doutora em linguística Helena H. N. Brandão (2004), em seu livro “Introdução à análise do discurso”, apresenta a definição de assujeitamento ideológico: consiste em fazer com que cada indivíduo (sem que ele tome consciência disso, mas, ao contrário, tenha a impressão de que é senhor de sua própria vontade) seja levado a ocupar seu lugar, a identificar-se ideologicamente com grupos ou classes de uma determinada formação social. É o mesmo que interpelação ideológica. (BRANDÃO, 2004, p. 105)

A partir dessa definição, a colocação citada anteriormente a respeito do direcionamento da fala de Emmeline Pankhurst em relação ao seu público alvo é reafirmada. Outro ponto importante que deve ser levado em consideração é o vocabulário utilizado pela militante. Emmeline era uma mulher culta e teve excelente formação acadêmica e apesar disso, o texto escrito no século XX continua fácil de ser compreendido no ano de hoje, 2016. Brandão ainda coloca que possuir uma noção histórica durante a análise é importante pois, [...] porque marcado espacial e temporalmente, o sujeito é essencialmente histórico. [...] sua fala é produzida a partir de um determinado lugar e de um determinado tempo, à concepção de um sujeito histórico articula-se outra noção fundamental: a

13 14



Minha Própria História. A fabricação de uma militante, Quatro anos de militância pacífica e A revolução das mulheres.



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de um sujeito ideológico. Sua fala é um recorte de representações de um tempo histórico e de um espaço social. (BRANDÃO, 2004, p. 59)

O linguista José Luiz Fiorin, ao se referir sobre o discurso, coloca que: O discurso tem uma estrutura. [...] Há no discurso, então, o campo de manipulação consciente e o da determinação inconsciente. O falante organiza sua estratégia discursiva em função de um jogo de imagens: a imagem que ele faz do interlocutor, a que ele pensa que o interlocutor tem dele, a que ele deseja transmitir ao interlocutor etc. (FIORIN, 2004, p. 17-18)

Sendo assim, tendo em mente as palavras de Fiorin, ao analisar o trabalho de Emmeline Pankhurst é possível perceber que a intenção da militante no momento da escrita não só era transmitir a trajetória do movimento até então mas também convencer possíveis futuras companheiras de militância a se juntarem a luta pelo direito do voto feminino. 3.1 EMMELINE PANKHURST: A FORMAÇÃO DE UMA MILITANTE E SUAS CONTROVÉRSIAS Ao longo do primeiro capítulo do primeiro livro de sua autobiografia, Emmeline Pankhurst introduz o leitor à sua vida de militante, trazendo-o para perto e mostrando toda sua trajetória. Como a mesma aponta, seus pais sempre tiveram grande influência em sua vida e modo de pensar, já que ambos apoiavam movimentos a favor da liberdade; sua mãe participou de um grande bazar beneficente na cidade onde nasceu, Manchester, onde o intuito era “arrecadar dinheiro para aliviar a pobreza dos escravos negros recém-emancipados nos Estados Unidos” (PANKHURST, 1914, p. 1) (Tradução livre da autora)15 e seu pai, Robert Goulden, grande defensor do abolicionismo, apresentou à filha desde criança a situação da escravidão: Jovem como era – eu não devia ter mais de cinco anos, eu sabia perfeitamente bem o significado das palavras escravidão e emancipação. Desde a infância eu estava acostumada a ouvir discussões prós e contra de escravidão e a Guerra Civil Americana. Embora o Governo britânico finalmente decidiu não reconhecer a Confederação, a opinião pública na Inglaterra estava fortemente dividida sobre as questões tanto de escravidão e de secessão. Em termos gerais, as classes proprietárias eram pró-escravidão, mas havia muitas exceções à regra. A maioria dos que formavam o círculo de amigos da nossa família se opunham à escravidão, e meu pai, Robert Goulden, sempre foi um abolicionista mais ardente. (PANKHURST, 1914, p. 2) (Tradução livre da autora)16

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“to raise money to relieve the poverty of the newly emancipated negro slaves in the United States.” “Young as I was—I could not have been older than five years—I knew perfectly well the meaning of the words slavery and emancipation. From infancy I had been accustomed to hear pro and con discussions of slavery and the American Civil War. Although the British government finally decided not to recognise the Confederacy, public opinion in England was sharply divided on the questions both of slavery and of secession. Broadly

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Em outro momento, Pankhurst comenta sobre as histórias que sua mãe lia para ela antes de dormir e o grande impacto que eles causaram em sua vida, afirmando que elas “deixaram uma impressão permanente em seu cérebro e em seu caráter” (PANKHURST, 1914, p.3) (Tradução livre da autora)17. Algumas das obras citadas por ela eram sobre a escravidão estadunidense, Uncle Tom’s Cabin18 e uma segunda que ela não comenta o nome mas conta a história de um jovem escravo negro que fugia da plantação onde trabalhava. Além desses, outros livros citados são, Pilgrim’s Progress, Holy War19, Odyssey20 e French Revolution21. Os Goulden eram uma família grande, Emmeline tinha nove irmãos e era a mais velha das cinco meninas. Sempre afirmando ter um bom relacionamento com seus irmãos, Pankhurst notava desde criança as dificuldades que uma mulher passava. Foram essas dificuldades que ela aponta como formadoras de sua militância, e um dos pontos discutidos por ela é a diferença entre a educação de meninos e de meninas: A educação de um menino inglês, tanto antes quanto agora, era considerada um assunto muito mais sério do que a educação da irmã deste menino inglês. Meus pais, especialmente meu pai, discutiam a questão da educação dos meus irmãos por uma questão de muita importância. A minha educação e de minha irmã raramente era sequer discutida. Além do fato de que a diretora era uma dama e todas as alunas eram meninas da minha própria sala/turma, ninguém parecia se importar. A educação de uma menina na época parecia ter como principal objetivo a arte de "deixar a casa atraente" – presumidamente para parentes homens migratórios. Eu não conseguia entender por que eu tinha a obrigação particular de tornar a casa atraente para os meus irmãos. Nós tínhamos um nível ótimo de amizade, mas nunca foi sugerido que eles deveriam deixar a casa atraente para mim. Por que não? Ninguém parecia saber. (PANKHURST, 1914, p. 6) (Tradução livre da autora)22

É necessário ter em mente que, apesar de Emmeline não deixar especificado em seu texto a exata posição social de sua família, ela fazia parte de uma família inglesa de speaking, the propertied classes were pro-slavery, but there were many exceptions to the rule. Most of those who formed the circle of our family friends were opposed to slavery, and my father, Robert Goulden, was always a most ardent abolitionist.” (PANKHURST, 1914, p. 2) 17 “made a permanent impression on my brain and my character.” (PANKHURST, 1914, p. 3) 18 A cabana do Pai Tomás, de Harriet Beecher Stowe. 19 O Peregrino e A Guerra Santa, ambos de John Bunyan. 20 Odisseia, de Homero. 21 História da Revolução Francesa, de Thomas Carlyle. 22 “The education of the English boy, then as now, was considered a much more serious matter than the education of the English boy's sister. My parents, especially my father, discussed the question of my brothers' education as a matter of real importance. My education and that of my sister were scarcely discussed at all. Of course we went to a carefully selected girls' school, but beyond the facts that the head mistress was a gentlewoman and that all the pupils were girls of my own class, nobody seemed concerned. A girl's education at that time seemed to have for its prime object the art of "making home attractive"—presumably to migratory male relatives. It used to puzzle me to understand why I was under such a particular obligation to make home attractive to my brothers. We were on excellent terms of friendship, but it was never suggested to them as a duty that they make home attractive to me. Why not? Nobody seemed to know” (PANKHURST, 1914, p. 6)





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comerciantes que possuía recurso e acesso à educação. Além de grandes apoiadores da abolição da escravidão estadunidense, os pais de Pankhurst também eram defensores da igualdade dos votos. Ao explicar os primórdios do movimento a favor do voto feminino, a fundadora da WSPU, que na época em que a lei foi promulgada tinha apenas oito anos, comenta sobre a Reform Act de 1866 e a agitação que ela causou: Este Reform Act, conhecido como Bill Franchise Household, marcou a primeira popular extensão do voto na Inglaterra desde 1832. Nos termos do acordo, chefes de família pagando um mínimo de dez libras anualmente recebiam voto no Parlamento. Enquanto ele ainda estava em discussão na Câmara dos Comuns, John Stuart Mill propõs uma alteração ao projeto de lei para incluir as mulheres chefes de família, bem como os homens. A alteração foi rejeitada, mas no ato aprovado, a palavra "homem", em vez da usual "pessoa do sexo masculino," foi usada. Agora, sob outro ato do Parlamento foi decidido que a palavra "homem" sempre incluía “mulher”, a menos que fosse indicado o contrário. [...] Então, quando a Reform Bill com a palavra "homem" se tornou lei, muitas mulheres acreditavam que o direito de sufrágio na verdade tinha sido concedido a elas. Uma grande discussão seguiu, e o assunto foi finalmente testado por um grande número de mulheres que procuram ter seus nomes colocados no registo como eleitoras. Na minha cidade de Manchester 3.924 mulheres, de um total de 4.215 possíveis eleitoras mulheres, reivindicaram seus votos, e sua alegação foi defendida nos tribunais por advogados eminentes, incluindo o meu futuro marido, Dr. Pankhurst. Claro que a reivindicação das mulheres foi resolvido negativamente nos tribunais, mas a agitação resultou em um reforço da agitação do sufrágio feminino em todo o país. (PANKHURST, 1914, p. 7) (Tradução livre da autora)23

O interesse por política era algo que sempre esteve presente na vida de Emmeline Pankhurst graças a influência dos pais – em especial o pai, Robert –, e a Reform Act ajudou a aumentar o sentimento. Quando tinha quatorze anos, em 1872, Pankhurst se recorda da primeira reunião a respeito do sufrágio feminino. No local, foi apresentada a Lydia Becker, secretária do comitê de Manchester e editora do Women’s Suffrage Journal, revista que sua mãe recebia semanalmente. O discurso de Becker impressionou a então adolescente, que saiu da reunião convicta de que era uma sufragista. (PANKHURST, 1914, p. 9) Em seguida, a respeito da formação do movimento a favor do voto feminino, Pankhurst diz que ele “era organizado por um grupo de homens e mulheres extraordinários” 23

“This Reform Act, known as the Household Franchise Bill, marked the first popular extension of the ballot in England since 1832. Under its terms, householders paying a minimum of ten pounds a year rental were given the Parliamentary vote. While it was still under discussion in the House of Commons, John Stuart Mill moved an amendment to the bill to include women householders as well as men. The amendment was defeated, but in the act as passed the word "man," instead of the usual "male person," was used. Now, under another act of Parliament it had been decided that the word "man" always included "woman" unless otherwise specifically stated. […] So when the Reform Bill with the word "man" in it became law, many women believed that the right of suffrage had actually been bestowed upon them. A tremendous amount of discussion ensued, and the matter was finally tested by a large number of women seeking to have their names placed upon the register as voters. In my city of Manchester 3,924 women, out of a total of 4,215 possible women voters, claimed their votes, and their claim was defended in the law courts by eminent lawyers, including my future husband, Dr. Pankhurst. Of course the women's claim was settled adversely in the courts, but the agitation resulted in a strengthening of the woman-suffrage agitation all over the country.” (PANKHURST, 1914, p. 7)





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(PANKHURST, 1914, p. 10) (Tradução livre da autora)24. Alguns dos nomes citados por ela são Sr. e Sra. Jacob Bright – Jacob Bright, como apontado por ela, foi membro do Parlamento de Manchester por anos e até o momento de sua morte apoiou o sufrágio feminino –, Sra. Alice Cliff Scatcherd, Sra. Wolstentholm-Elmy e um dos principais fundadores do comitê, seu futuro marido, Dr. Richard Pankhurst. Dos quinze aos dezenove anos, Pankhurst se mudou para Paris e estudou em um dos colégios pioneiros em educação superior de meninas da Europa. De acordo com ela, a diretora, Srta. Marchef-Girard, “acreditava que a educação de meninas deve ser tão aprofundada e prática como quanto a educação que meninos estavam recebendo no momento” (PANKHURST, 1914, p. 10) (Tradução livre da autora)25. No colégio em questão, cuja nome não foi citado, Srta. Marchef-Girard incluiu química e contabilidade além de bordados e suas estudantes seguiam rigidamente os valores de verdade e sinceridade. Quando retornou de Paris, Emmeline passou a trabalhar para o movimento a favor do sufrágio feminino e teve conhecimento do trabalho que seu futuro marido, Dr. Pankhurst, desenvolveu a favor do voto feminino – ele elaborou a primeira lei de emancipação conhecida como Women's Disabilities Removal Bill, que foi introduzida à Câmara dos Comuns em 1870 por Sr. Jacob Bright, Dr. Pankhurst e Sr. Coleridge foram consultores das mulheres que, em 1868, tentaram se registrar como eleitoras. Ele também elaborou a lei que dava as mulheres casadas o controle de seus bens e suas propriedades, que foi aprovada em 1882. Sua esposa, Emmeline, trabalhou na comissão executiva. (PANKHURST, 1914, p. 12) Pankhurst também discute a visão preconceituosa que os antissufragistas tinham a respeito das sufragistas, que “as sufragistas eram mulheres que falharam ao encontrar uma saída para as suas emoções, e por isso são seres amargos e decepcionados.” (PANKHURST, 1914, p. 12) (Tradução livre da autora)26. Apesar de ter filhos pequenos, os Pankhursts tiveram cinco filhos porém até o momento analisado do livro são citados apenas quatro, Emmeline mantêm o posicionamento de militante. Ainda no primeiro capítulo, Emmeline comenta sobre o Primeiro-Ministro Sr. Gladstone que “era um inimigo implacável do sufrágio feminino. Ele acreditava que o

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“it was organised by a group of extraordinary men and women.” (PANKHURST, 1914, p. 10) “believed that girls' education should be quite as thorough and even more practical than the education boys were receiving at that time.” (PANKHURST, 1914, p. 10) 26 “suffragists are women who have failed to find any normal outlet for their emotions, and are therefore soured and disappointed beings.” (PANKHURST, 1914, p. 12) 25





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trabalho e política das mulheres estavam a serviço dos partidos masculinos” (PANKHURST, 1914, p. 15) (Tradução livre da autora)27. Pankhurst finaliza o capítulo inicial de seu livro, onde faz a introdução de sua vida como militante, afirmando que o fracasso do movimento do voto feminino em 1884, quando as mulheres tentaram introduzir uma lei de sufrágio independente e foram ignoradas por Sr. Gladstone, serviu para dar início a nova fase de sua carreira e militância. (PANKHURST, 1914, p. 15-17) No segundo capítulo do primeiro livro, Emmeline Pankhurst disserta a respeito de sua vida profissional. Dois anos após a derrota sofrida com mais uma proposta de lei de sufrágio feminino ignorada, a família Pankhurst se muda para Londres, onde continuam interessados com as questões trabalhistas e movimentos sociais. A militante recorda com entusiasmo sua participação em uma greve de mulheres que trabalhavam na fábrica de fósforos Bryant and May, onde trabalhou “[...] com as meninas e com algumas mulheres de destaque, entre elas a célebre Sra. Annie Besant” (PANKHURST, 1914, p. 19) (Tradução livre da autora)28. A greve em questão obteve sucesso e as trabalhadores tiveram uma considerável melhora nas suas condições de trabalho. Foi fundada em 1891 uma nova associação a favor do sufrágio feminino, a Women’s Franchise League (WFL), e Emmeline Pankhurst se filia. Velhas conhecidas importantes de Pankhurst também faziam parte da nova associação, como Sra. Jacob Bright, Sra. Wolstentholm-Elmy e Sra. Stanton Blatch. No mesmo ano em que surgiram, as integrantes da WFL preparavam uma nova proposta de lei sufragista feminina. Entretanto, a lei não chegou a ser apresentada ao Parlamento. Dois anos depois, em 1893, a família Pankhurst retorna a Manchester, onde Emmeline volta a trabalhar na Suffrage Society (SS), e iniciou uma campanha para levar a SS até trabalhadoras. É no ano seguinte do retorno dos Pankhurst à Manchester que Emmeline Pankhurst dá um passo a frente na sua vida profissional se candidatando para o Board of Poor Law Guardians (BPLG). De acordo com Pankhurst (1914, p. 23) o BPLG era responsável por desembolsar “[...] para os pobres o dinheiro proveniente das Poor Rates (impostos), e

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“was an implacable foe of woman suffrage. He believed that women's work and politics lay in service to men's parties.” (PANKHURST, 1914, p. 15) 28 “[…] with the girls and with some women of prominence, among these the celebrated Mrs. Annie Besant.” (PANKHURST, 1914, p. 19)





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algumas verbas adicionais autorizadas pelo conselho do governo local, o presidente que é um Ministro. Sr. John Burns é o atual titular do cargo”. (Tradução livre da autora)29. A realidade que Emmeline Pankhurst encontrou no seu escritório quando começou a trabalhar era outra. A militante afirma que a lei do distrito que fazia parte, Chorlton, estava durante sendo administrada e que pessoas denominadas rate savers (protetores das taxas) constituíam o Conselho. “Eles eram guardiões, não dos pobres mas das taxas, e, como logo descobri, não eram guardiões astutos nem mesmo de dinheiro” (PANKHURST, 1914, p. 24) (Tradução livre da autora).30 A respeito das mães solteiras e crianças que trabalhavam nos workhouses e sua militância, Emmeline (1914, p. 28) coloca “Eu pensei que era uma sufragista antes de me tornar uma Poor Law Guardian, mas agora eu comecei a pensar sobre o voto nas mãos das mulheres não apenas como um direito, mas como uma desesperadora necessidade” (Tradução livre da autora)31 A explicação para essa colocação de Pankhurst é situação encontrada nos workhouses, lugar onde pobres iam viver e trabalhar. O primeiro contato de Emmeline (1914, p. 25) com o workhouse de Manchester causou grande impacto. Ela relata que ficou horrorizada ao ver meninas de sete e oito anos, que recebiam uma fraca educação, limpando os corredores vestindo finas roupas de algodão, em uma época onde a bronquite era muito epidêmica. A militante ainda coloca, com orgulho, a mudança que seu trabalho fez na vida das crianças: Em cinco anos já havíamos mudado a realidade deles. Nós tinha comprado terras no campo e tinha construído um sistema de chalés para as crianças, e tínhamos estabelecido para eles uma escola moderna, com professores treinados. Tínhamos até garantido para eles um ginásio e uma piscina. Posso dizer que eu estava na comissão de construção do conselho, o único membro mulher. (PANKHURST, 1914, p. 25) (Tradução livre da autora) 32

Comentando a respeito do estigma criado a respeito dos indigentes, as crianças dos workhouses e o propósito da Poor Law, Emmeline coloca que

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“[…] for the poor the money coming from the Poor Rates (taxes), and some additional moneys allowed by the local government board, the president of which is a cabinet minister. Mr. John Burns is the present incumbent of the office.” (PANKHURST, 1914, p. 23) 30 “They were guardians, not of the poor but of the rates, and, as I soon discovered, not very astute guardians even of money.” (PANKHURST, 1914, p. 24) 31 “I thought I had been a suffragist before I became a Poor Law Guardian, but now I began to think about the vote in women's hands not only as a right but as a desperate necessity.” (PANKHURST, 1914, p. 28) 32 “In five years' time we had changed the face of the earth for them. We had bought land in the country and had built a cottage system home for the children, and we had established for them a modern school with trained teachers. We had even secured for them a gymnasium and a swimming-bath. I may say that I was on the building committee of the board, the only woman member.” (PANKHURST, 1914, p. 25)





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Se eles são tratados como indigentes, claro que eles serão indigentes, e eles vão crescer indigentes, permanentes encargos na sociedade; mas se eles são considerados apenas como as crianças sob a tutela do Estado, eles assumem completamente outro papel. [...] A Poor Law inglesa, adequadamente administrada, deve dar de volta para os filhos de indigente o que as classes mais altas tenham lhes tomado, uma boa educação com base no auto-respeito. (PANKHURST, 1914, p. 26) (Tradução livre da autora)33

Ainda sobre as mulheres que viviam e trabalhavam nos workhouses, Pankhurst (1914, p. 27) coloca que, quando grávidas, muitas trabalham até muito perto do nascimento de seus bebês e que muitas vezes as gestantes são mulheres solteiras e muito jovens. Quando dão a luz, podem ficam com seus filhos por duas semanas e então devem voltar a trabalhar. Nesse caso, as novas mães tem duas opções: voltar a trabalhar e se separar de seu bebê ou deixar os workhouses com o recém-nascido e viver sem casa e sem dinheiro. Emmeline então levanta uma questão a respeito da tentativa em vão das mulheres conseguirem uma reforma da Poor Law onde poderiam proteger as crianças ilegítimas e impossibilitar “qualquer canalha rico de escapar de suas futuras responsabilidades para com seu filho por causa do montante fixo que ele pagou” (PANKHURST, 1914, p. 28) (Tradução livre da autora)34. Ainda acrescenta que, apesar de diversas tentativas, sempre acabaram falhando pois ninguém se importa com as mulheres. Outro ponto importante é a forma que mulheres de idade vão parar nos workhouses. Emmeline (1914, p. 29 – 30) conta que haviam as mulheres pertencentes da classe de empregadas-domésticas, que nunca haviam casado e perderam o emprego. Muitas vezes os workhouses eram sua única opção pois, não conseguiram juntar dinheiro o suficiente para se manter – deve-se levar em consideração que o salário mínimo de uma mulher na época em questão era dois dólares por semana. Também haviam as viúvas que, após a morte do marido, acabavam tendo que depender dos workhouses pois, ficavam sem dinheiro. Pankhurst ainda acrescenta que nesse caso, muitas eram viúvas de homens que serviram o exército, ou seja, seus maridos recebiam uma pensão do governo, mas após a morte sua pensão não era mais válida. A trajetória da militante como membra do Board of Poor Law Guardians, quatro anos depois quando seu marido morre, em 1898, e ela renuncia seu cargo para que pudesse assumir 33

“If they are treated like paupers of course they will be paupers, and they will grow up paupers, permanent burdens on society; but if they are regarded merely as children under the guardianship of the state, they assume quite another character. […] The English Poor Law, properly administered, ought to give back to the children of the destitute what the upper classes have taken from them, a good education on a self-respecting basis.” (PANKHURST, 1914, p. 26) 34 “any rich scoundrel to escape future liability for his child because of the lump sum he has paid down.” (PANKHURST, 1914, p. 28)





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a responsabilidade de cuidar da casa e de seus filhos. Uma nova fase inicia-se na vida profissional de Pankhurst, que agora assume um cargo assalariado no Registrar of Births and Deaths de Manchester. A função do departamento é registrar nascimentos, mortes e casamentos. Entretanto, como Emmeline (1914, p. 32) indica, o registro de casamentos não era permitido ser feito por mulheres. Os registros eram arquivados em Londres, no escritório do secretário-geral, o chefe do departamento do governo. Mais uma vez, a vida profissional de Emmeline Pankhurst causa grande impacto na sua vida de militante. A militante comenta sobre a alegria das mulheres ao saberem que teriam um registrador mulher para ir, e por causa disso ficou sabendo a história por trás da vida das registradas. A realidade das mulheres são descritas por ela em dois relatos. No primeiro, meninas de treze anos que iam registrar o nascimento de seus filhos ilegítimos, cujos pais provavelmente eram os próprios pais das meninas ou algum outro parente homem. Emmeline ainda acrescenta que apesar da idade de consentimento na Inglaterra na época era dezesseis anos, o homem poderia afirmar que acreditava que a menina tinha mais que dezesseis anos e se livrar de qualquer acusação. O segundo relato era uma menina tinha um filho ilegítimo que veio a falecer. A jovem então foi acusada de assassinato e condenada à morte. Posteriormente, a condenação foi alterada, mas Emmeline conta com certa indignação que mesmo assim a menina teve que passar por um julgamento cuja sentença era enforcamento. (PANKHURST, 1914, p. 33) O último trabalho profissional de Emmeline exposto no capítulo foi a candidatura dela para integrar o Conselho Escolar de Manchester, em 1900. Eu precisava de apenas mais uma experiência após esta, apenas mais um contato com a vida do meu tempo e da posição das mulheres, para me convencer de que, se a civilização quer avançar de qualquer maneira no futuro, deve ser com a ajuda de mulheres, mulheres livres de seus grilhões políticos, as mulheres com plenos poderes para trabalhar a sua vontade na sociedade. (PANKHURST, 1914, p. 34) (Tradução livre da autora)35

Mais uma vez é apresentado no texto de Emmeline a falta de representatividade que as mulheres tinham na Inglaterra no final do século XIX e início do século XX e do grande papel que uma professora tinha.

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“I needed only one more experience after this one, only one more contact with the life of my time and the position of women, to convince me that if civilisation is to advance at all in the future, it must be through the help of women, women freed of their political shackles, women with full power to work their will in society.” (PANKHURST, 1914, p. 34)





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Os professores tinham um representante nos Conselhos do Conselho Escolar. É claro que o representante era um professor homem, e igualmente claro, ele deu preferência aos interesses dos professores homens. Professores homens recebiam salários muito mais altos do que as mulheres, embora muitas das mulheres, para além do seu trabalho regular em sala, tinha que ensinar costura e economia doméstica no acordo. Elas não recebiam nenhum pagamento a mais para o seu trabalho extra. Apesar desta carga adicional, e apesar de os salários mais baixos recebidos, descobri que as mulheres se importavam muito mais com seus trabalhos, e muito mais sobre as crianças que os homens. Foi um inverno, quando houve uma grande quantidade de pobreza e desemprego em Manchester. Descobri que as professoras estavam gastando seus salários delgados para fornecer jantares regulares para crianças carentes, e foram dando seu tempo para esperar por eles e ver que estavam alimentados. (PANKHURST, 1914, p. 34) (Tradução livre da autora) (grifo próprio)36

Ainda a respeito deste assunto, Pankhurst (1914, p. 35) coloca que em 1900, o Parlamento aprovou uma lei que previa que as empresas deveriam integrar pelo menos uma mulher em seus Conselhos Escolares. No caso de sua cidade, Manchester, quatro mulheres foram cooptadas, e por recomendação do Partido Trabalhista, ela foi uma das escolhidas. Foi então nomeada para fazer parte da Comissão de Instrução Técnica, onde mais uma vez era a única mulher. Emmeline traz para nosso conhecimento a realidade no ensino superior inglês ao comentar que a Manchester Technical College, então considerada segunda melhor da Europa, não investia seu dinheiro em formação técnica para meninas – “mesmo nas aulas onde elas poderiam facilmente terem sido aprovadas, [...] as meninas eram mantidas fora, porque a união sindical dos homens contestavam que elas recebessem educação para obras tão qualificadas.” (PANKHURST, 1914, p. 35) (Tradução livre da autora)37 A militante finaliza o segundo capítulo do primeiro livro comentando sobre a introdução de suas filhas no movimento sufragista, que muito faz recordar da época em que a mesma acompanhava a sua mãe em reuniões, como citado no início deste parágrafo. O terceiro capítulo é iniciado com o relato da visita, feita no verão de 1902, de uma das mulheres mais importantes do movimento sufragista estadunidense, Susan B. Anthony38. Emmeline (1914, p. 37- 38) comenta que a visita teve influência na fundação da Women’s 36

“Teachers had a representative in the school board councils. Of course that representative was a man teacher, and equally of course, he gave preference to the interests of the men teachers. Men teachers received much higher salaries than the women, although many of the women, in addition to their regular class work, had to teach sewing and domestic science into the bargain. They received no extra pay for their extra work. In spite of this added burden, and in spite of the lower salaries received, I found that the women cared a great deal more about their work, and a great deal more about the children than the men. It was a winter when there was a great deal of poverty and unemployment in Manchester. I found that the women teachers were spending their slender salaries to provide regular dinners for destitute children, and were giving up their time to waiting on them and seeing that they were nourished” (PANKHURST, 1914, p. 34) 37 “Even in classes where they might easily have been admitted, […] the girls were kept out because the men's trades unions objected to their being educated for such skilled work.” (PANKHURST, 1914, p. 35) 38 É sempre importante ter em mente que as sufragistas estadunidenses e britânicas tinham uma certa proximidade e ligação, como já foi mostrado anteriormente.





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Social and Political Union (WSPU), em 1903. Outro fato influenciador foi o retorno ao Parlamento do socialista escocês Mr. Keir Hardie pelo Partido Trabalhista, do qual ainda era membro. Com este retorno, Pankhurst desenvolveu uma resolução onde suplicava a instrução do membro do Parlamento de apresentar uma lei para a emancipação das mulheres. Quando a resolução foi aceita, teve-se a decisão de criar uma sociedade de mulheres. Em outubro de 1903, a WSPU foi fundada em Manchester. A justificativa do nome era “[...] em parte para enfatizar a sua democracia, e em parte para definir o seu objeto como político em vez de propagandista” (PANKHURST, 1914, p. 39) (Tradução livre da autora)39. A WSPU era exclusiva para mulheres e não possuía nenhuma filiação partidária, e levou como lema a frase deeds not words (ações e não palavras). Novas discussões a respeito da elaboração de uma lei de sufrágio começaram e Emmeline (1914, p. 41) coloca que no ano seguinte, 1904, após muito debate com o Conselho Administrativo Nacional, do qual fazia parte, “[...] decidiu adotar a original Lei de Emancipação das Mulheres, elaborado pelo Dr. Pankhurst. [...] A decisão do Conselho foi aprovado por uma esmagadora maioria da conferência.” (PANKHURST, 1914, p. 42) (Tradução livre da autora)40 A primeira manifestação da WSPU, apresentada no texto de Emmeline Pankhurst (1914, p. 42), aconteceu durante uma sessão do Parlamento em fevereiro de 1905. A militante acompanhada de sua filha do meio Sylvia, passaram dias no saguão da Câmara dos Comuns conversando com todos os membros haviam se comprometido a apoiar uma lei de sufrágio quando introduzida. No entanto, a tentativa foi em vão, já que nenhum dos membros concordou em utilizar sua chance na votação introduzindo a lei. Porém, mãe e filha não desistiram. Sr. Bamford Slack seria o responsável em introduzir a lei, cuja leitura ficou marcada para o dia 12 de maio. O pequeno progresso causou enorme comoção pois, como Emmeline (1914, p. 43) aponta, essa era a primeira lei de sufrágio em oito anos. No dia da leitura da lei, uma multidão de mulheres de diversas classes sociais se formou no saguão porém, Emmeline não estava muito otimista. “Foi lamentável ver o olhar de esperança e alegria que brilhava nos rostos de muitas dessas mulheres. Sabíamos

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“[...] partly to emphasise its democracy, and partly to define its object as political rather than propagandist” (PANKHURST, 1914, p. 39) 40 “[…] decided to adopt the original Women's Enfranchisement Bill, drafted by Dr. Pankhurst. […] The Council's decision was approved by an overwhelming majority of the conference.” (PANKHURST, 1914, p. 42)





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que a nossa pobre medida tinha poucas chances de ser aprovada” (PANKHURST, 1914, p. 43) (Tradução livre da autora)41. Em alguns momentos de seu discurso, Emmeline Pankhurst deixa visível o preconceito que as mulheres sofriam na época. Antes da leitura da Lei de Emancipação das Mulheres, foi discutida a Roadway Lighting Bill, um projeto de lei que obrigava que os carros deviam usar luzes traseiras e frontais caso andassem por estradas públicas durante a noite. Pankhurst (1914, p. 43) ainda conta a incessante tentativa em vão das mulheres de convencer os membros do Parlamento de que seu projeto de lei era mais importante. Ao invés disso, foi permitido que os promotores da Roadway Lighting Bill pudessem “comentar”, assim colocado pela militante, a Lei de Emancipação das Mulheres. Os promotores então prolongaram o debate contando “histórias bobas e piadas tolas” enquanto os membros do Parlamento riam e aplaudiam. Este foi o estopim para a primeira manifestação da WSPU acontecer. Emmeline e suas companheiras da WSPU começaram então um protesto contra o governo no lado de fora do prédio. Pankhurst ainda pontua que esta forma de expressão nunca havia acontecido com as sufragistas mais antigas. Ao contrário de eventos que serão discutidos a diante, os policiais apenas anotaram os nomes das envolvidas. O famoso slogan sufragista Votes for Women (Votos para Mulheres), usada diversas vezes por sufragistas de todo o mundo em cartazes, broches, faixas, etc, surgiu em 1905, época em que o Partido Conservador deixava o poder do Parlamento e o Partido Liberal buscava retornar.

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“It was pitiful to see the look of hope and joy that shone on the faces of many of these women. We knew that our poor little measure had the very slightest chance of being passed.” (PANKHURST, 1914, p. 43)





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FIGURA 4: Annie Kenney e Christabel Pankhurst segurando uma faixa com o slogan votes for women, 1906.



1906. Disponível em: http://blog.nationalarchives.gov.uk/blog/keeping-tabs-suffragettes-officialwatchlist/#more-24718 Acesso em: 15 maio 2016

A reunião que aconteceria no Free Trade Hall, Manchester, cujo figura principal era Sr. Edward Grey pareceu ser para as suffragettes uma ótima oportunidade. A fundadora da WSPU comenta que foi feito um grande cartaz que carregava a frase “Will the Liberal Party give Votes for Women?” (O Partido Liberal vai dar Votos para Mulheres?), no entanto, momentos antes da reunião foi decidido cortar e deixar apenas as últimas três palavras. Votes for Women. O resultado da reunião não foi o esperado. Christabel Pankhurst, filha mais velha de Emmeline, e Annie Kenney ficaram encarregadas de questionar Sr. Edward Grey a respeito



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das intenções de apoiar a questão do voto feminino. Diversas vezes fizeram perguntas porém não receberam resposta alguma. O real resultado da reunião foi a prisão de Christabel e Annie (PANKHURST, 1914, p. 46-48). Apesar desse episódio, é apontado por Emmeline que a WSPU ganhou um grande número de novos membros e a questão do voto feminino se tornou um assunto comentado em toda a Grã-Bretanha. Ainda em relação ao slogan Votes for Women, Emmeline Pankhurst coloca: Nós determinamos que a partir desse momento os pequenos cartazes “Votos para Mulheres” devem aparecer sempre que um potencial membro do Partido Liberal se levantasse para falar, e que não deve haver mais paz até que a pergunta das mulheres fosse respondida. (PANKHURST, 1914, p. 50) (Tradução livre da autora)42

O próximo passo estipulado pelas suffragettes era levar a luta pelo voto feminino a Londres – a primeira marcha sufragista que aconteceu em Londres foi em 19 de fevereiro de 1906 onde, de acordo com dados apresentados por Emmeline (1914, p. 55) em seu livro, cerca de 400 mulheres fizeram parte. A militante finaliza o capítulo com uma reflexão que sintetiza o movimento sufragista de modo geral. Essas mulheres [...] desafiaram a polícia. Elas estavam enfim despertadas. Elas estavam preparadas para fazer algo que as mulheres nunca tinham feito antes, lutar por si mesmas. As mulheres sempre lutaram para os homens e para os seus filhos. Agora elas estavam prontas para lutar por seus próprios direitos humanos. Nosso movimento militante estava estabelecido. (PANKHURST, 1914, p. 56) (Tradução livre da autora)43

O quarto e último capítulo do primeiro livro, The Making of a Militant, é iniciado por Emmeline Pankhurst com a mudança de posicionamento das integrantes da WSPU, e o primeiro ponto apresentado é a diferença delas com as demais associações sufragistas: [...] nossas membras são absolutamente focadas; elas concentram todas as suas forças em um objeto, a igualdade política com os homens. Nenhuma membra da W. S. P. U. divide sua atenção entre o sufrágio e outras reformas sociais. [...] exigimos, antes de qualquer outra legislação que seja, a justiça elementar de votos para mulheres. (PANKHURST, 1914, p. 57) (Tradução livre da autora)44

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“We determined that from that time on the little "Votes For Women" banners should appear wherever a prospective member of the Liberal Government rose to speak, and that there should be no more peace until the women's question was answered.” (PANKHURST, 1914, p. 50) 43 “Those women […] had defied the police. They were awake at last. They were prepared to do something that women had never done before, fight for themselves. Women had always fought for men, and for their children. Now they were ready to fight for their own human rights. Our militant movement was established.” (PANKHURST, 1914, p. 56) 44 “[…] our members are absolutely single minded; they concentrate all their forces on one object, political equality with men. No member of the WSPU divides her attention between suffrage and other social reforms. [...] we demand, before any other legislation whatever, the elementary justice of votes for women.” (PANKHURST, 1914, p. 57)





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De acordo com a fundadora da WSPU, a adesão à associação era simples, porém havia uma série de normas a serem seguidas, que são apontadas juntamente de algumas características: Qualquer mulher pode se tornar um membro, pagando um xelim, mas, ao mesmo tempo, ela era obrigada a assinar uma declaração de adesão fiel a nossa política e um compromisso de não trabalhar para qualquer partido político, até que o voto feminino fosse ganho. [...] Nós não acreditamos na eficácia da organização sufrágio comum. A W. S. P. U. não é prejudicado por uma complexidade de regras. Nós não temos nenhuma constituição e estatutos; nada a ser alterado ou consertado com ou brigaram em uma reunião anual. Na verdade, não temos nenhuma reunião anual, há sessões de negócios, não há eleições de oficiais. A W. S. P. U. é simplesmente um exército de sufrágio no campo. É puramente um exército de voluntárias, e ninguém é obrigado a permanecer nela. Na verdade não queremos a permanência de ninguém que não ardentemente acreditar na política do exército. (PANKHURST, 1914, 59) (Tradução livre da autora)45

Era considerado um adversário das suffragettes não somente os antissufragistas assumidos mas também as pessoas neutras e que todo homem era considerado um inimigo do sufrágio feminino a não ser que ele estivesse disposto a se envolver ativamente. E, no caso, a oposição com o Partido Liberal, do qual marido de Emmeline já foi filiado, era justificada com a simples explicação de que ele estava no poder e não se envolviam com a questão do voto feminino. (PANKHURST, 1914, p. 60-61) Uma característica marcante da WSPU é a forte publicidade desenvolvida durante a campanha – foram confeccionados jornais, broches, faixas, bandeiras, cartões postais, jogos, bonecas, panfletos, etc, que eram vendidos na loja da WSPU que se localizava na Rua Fulham nº 905. Os dois jornais de destaque foram Votes for Women e The Suffragette. No desfecho do primeiro livro de sua autobiografia, Emmeline Pankhurst (1914, p. 74) apresenta uma sessão do Parlamento que aconteceu em outubro de 1906, onde mais uma vez as WSPU tentaram trazer a tona a discussão da questão do voto feminino e receberam como resposta que “nada poderia ser feito pelas mulheres naquela sessão”. Durante a revolta das presentes após essa resposta, onze foram presas. No entanto, a realidade vivida pelas prisioneiras é mais discutida nos livros seguintes.

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“Any woman could become a member by paying a shilling, but at the same time she was required to sign a declaration of loyal adherence to our policy and a pledge not to work for any political party until the women's vote was won. […] We do not believe in the effectiveness of the ordinary suffrage organisation. The WSPU is not hampered by a complexity of rules. We have no constitution and by-laws; nothing to be amended or tinkered with or quarrelled over at an annual meeting. In fact, we have no annual meeting, no business sessions, no elections of officers. The W. S. P. U. is simply a suffrage army in the field. It is purely a volunteer army, and no one is obliged to remain in it. Indeed we don't want anybody to remain in it who does not ardently believe in the policy of the army.” (PANKHURST, 1914, 59)





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A controvérsia citada no título do capítulo faz referencia do artigo Emmeline Pankhurst: a biographical interpretation46 desenvolvido pela historiadora June Purvis. Um ponto interessante apresentado por Purvis é a relação conturbada que Emmeline Pankhurst tinha com a filha do meio, Sylvia. A representação que a filha fez da mãe em seu livro The Suffragette Movement (1931) a coloca como uma [...] traidora das causas socialistas, que encorajava mulheres conservadoras ricas a se juntar a WSPU e não conseguiu mobilizar a classe trabalhadora [...] bem como uma mãe fracassada que estava mais preocupada com sua própria vida política que negligenciou os filhos menos favorecidos chamados Harry, Adela e Sylvia. (PURVIS, 2003, p. 74) (Tradução livre da autora)47

A historiadora ainda apresenta em seu trabalho a representação de não só Emmeline Pankhurst, mas as suffragettes no geral, através da visão masculina de alguns historiadores, relacionando de forma genérica e preconceituosa a sexualidade das suffragettes com seu posicionamento político: No meu trabalho Times Higher, questionei o uso e interpretação de evidências de Pugh, especialmente a história do jornal sensacionalista sobre lesbianismo. Ao falar sobre a ‘longa tradição’ dos historiadores masculinos afirmando que os líderes sufragistas eram lésbicas, eu perguntei, 'iria movimento político dos homens ser abordado por especulações sobre a orientação sexual de seus ativistas?’ A resposta a essa pergunta é, claro que ‘não’. Ativistas políticos do sexo masculino na história britânica, como os cartistas, que fizeram campanha para o sufrágio universal masculino, são vistos como heroico, figuras 'másculas', maridos e pais; a questão de saber se qualquer era gay nem sequer é levantada e heterossexualidade é assumido. São as mulheres, não os homens, que são considerados um jogo justo por alguns historiadores do sexo masculino para a especulação sobre sua sexualidade de modo que o lesbianismo é raramente escrito em cerca de uma maneira positiva, mas sim como um meio para estigmatizar as mulheres, para representá-las, por meio da visão tipicamente masculina heterossexistas, como patológico, antinatural e o ‘outro’ por causa de sua preferência sexual. (PURVIS, 2003, p. 76) (Tradução livre da autora)48

Como é apresentado por Purvis, Sylvia Pankhurst não mostrou apenas uma representação de sua mãe – são citados pela mesma três obras de Sylvia: The Suffragette 46

Emmeline Pankhurst: uma interpretação bibliográfica. “[…] as a traitor to the socialist cause, a leader who deliberately encouraged wealthy Conservative women to join the WSPU and who failed to mobilise the working classes […] as well as a failed mother who was so preoccupied with her own political life that she neglected her less favoured children, namely, Harry, Adela and Sylvia.” (PURVIS, 2003) 48 “In my Times Higher piece, I questioned Pugh’s use and interpretation of evidence, especially the sensational newspaper story about lesbianism. In speaking about the ‘long tradition’ of male historians asserting that the suffragette leaders were lesbians, I asked, ‘would a men’s political movement be approached by speculation about the sexual orientation of its activists?’ The answer to that question is, of course, ‘no’. Male political activists in British history, such as the Chartists, who campaigned for universal male suffrage, are seen as heroic, ‘manly’ figures, husbands and fathers; the issue of whether any were gay is not even raised and heterosexuality is assumed. It is women, not men, who are considered fair game by some male historians for speculation about their sexuality so that lesbianism is rarely written about in a positive manner but, rather, as a means to stigmatise women, to represent them, through typically male heterosexist eyes, as pathological, unnatural and the ‘other’ because of their sexual preference.” (PURVIS, 2003, p. 76) 47





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(1911), The Suffragette Movement (1931) e The Life of Emmeline Pankhurst (1935). Na segunda obra, de 1931, Sylvia faz um comentário sobre a doença de seu irmão Harry, que o deixou paralisado, e chamou a mãe de insensível por deixar o filho para seguir a planejada viagem na América do Norte. No entanto, na última obra, de 1935, o mesmo evento é apresentado de uma forma mais amenizada, mostrando Emmeline relutante de deixar o filho doente para seguir viagem. (PURVIS, 2003, p. 76) A terceira representação de Emmeline Pankhurst no trabalho de Purvis é da própria historiadora que sempre se posicionou a favor da militante, Emmeline Pankhurst foi julgada politicamente de forma incorreta. [...] Seu feminismo [...] abraçava todas as mulheres. [...] ela não negligenciava as preocupações das mulheres da classe trabalhadora, mas acreditava que seus interesses não foram servidos pela análise luta de classes integrante ao socialismo e do marxismo que colocar os interesses dos homens primeiro e dividia mulheres de formação de laços comuns entre si, do outro lado da divisão de classes. O feminismo de Emmeline [...] não se encaixava facilmente em qualquer dos partidos políticos do sexo masculino da época, nem em nenhuma das filosofias políticas mais amplas, como o liberalismo, o socialismo ou o conservadorismo. (PURVIS, 2003, p. 95-96) (Tradução livre da autora)49

A colocação de Purvis a respeito de Emmeline é a que mais se aproxima do que foi analisado ao longo do primeiro livro da autobiografia da militante. Algumas vezes podendo ser interpretada de maneira negativa, Emmeline em momento algum se coloca superior ou exclui mulheres de classe social mais baixa, como afirmou sua filha Sylvia em seu segundo livro. 3.2 A WOMEN’S SOCIAL AND POLITICAL UNION E OS ANOS DE

FORTE

MILITÂNCIA Nos livros II e III de sua autobiografia, Emmeline Pankhurst altera a forma em que escreve seu discurso. Os oito anos apresentados por ela recebem uma quantidade muito maior de detalhes e os livros passam a ser divididos em mais capítulos. No primeiro capítulo do livro II, a militante relata três reuniões parlamentares que fizeram parte do denominado Women’s Parliament (Parlamento das Mulheres). A primeira delas, aconteceu em fevereiro de 1907. O governo, como Emmeline coloca, mais uma vez 49

“Emmeline Pankhurst was judged politically incorrect. [...] Her feminism [...] embraced all women. [...] she did not neglect the concerns of working-class women but believed that their interests were not served by the class struggle analysis integral to socialism and Marxism which put men’s interests first and divided women from forming common bonds with each other, across the class divide. Emmeline’s feminism [...] did not fit easily into any of the male political parties of the day nor into any of the broader political philosophies such as liberalism, socialism or conservatism.” (PURVIS, 2003, p. 95-96)





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decidiu que “não devem seus salões sagrados do Parlamento ser profanado por mulheres pedindo a votação, e as ordens tinham sido dadas, que passaria a impedir as mulheres de alcançar até mesmo os recintos exteriores da Câmara dos Comuns” (PANKHURST, 1914, p. 82) (Tradução livre da autora)50 A ordem dada pelo governo apresentada anteriormente, de impedir a entrada das mulheres na Câmara dos Comuns, iniciou então uma série de agressões de policiais contra mulheres. É relatado o uso de cavalos contra as mulheres, que as mesmas “lutaram até que suas roupas estavam rasgadas, seus corpos machucados, e a última gota de sua força esgotada” (PANKHURST, 1914, p. 83) (Tradução livre da autora)51. O resultado do primeiro Women’s Parliament foi a prisão de cinquenta e sete mulheres e dois homens, entre os presos estavam Christabel e Sylvia Pankhurst – suas penas foram, respectivamente, quatorze dias e três semanas. É interessante a informação dada por Emmeline de que os jornais unanimemente condenaram as ações do governo, uma vez em que havia na época muitos antissufragistas. As integrantes posteriormente foram informadas de que o membro do partido liberal Sr. Dickinson introduziria o projeto de lei de voto feminino e que o primeiro Ministro Sr. Campbell-Bannerman apoiaria. No entanto, como as mesmas já esperavam, Pankhurst (1914, p. 85) afirma que os membros antissufragistas presentes na Câmara alegavam que a proposta de lei não era democrática e excluía mulheres de classes baixas. Como consequência, Sr. Campbell-Bannerman retirou seu apoio. A partir do primeiro Women’s Parliament, a quantidade de relatos de agressividade policial contra as mulheres só aumentou – o que, somado com os inúmeros fracassos, resultaram na radicalização das manifestações das suffragettes como poderá ser visto adiante. A segunda Women’s Parliament relatada por Pankhurst não teve um desfecho diferente da primeira. Novamente houve a tentativa das mulheres de introduzir uma lei de voto feminino e a repressão brutal dos policiais. A militante ainda acrescenta que nos dois primeiros meses do ano de 1907, o Governo Inglês enviou para a prisão cento e trinta mulheres cuja "militância" consistia meramente em tentar carregar uma resolução do corredor para o Primeiro-Ministro na Câmara dos Comuns. Nosso

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“not again should their sacred halls of Parliament be desecrated by women asking for the vote, and orders had been given that would henceforth prevent women from reaching even the outer precincts of the House of Commons.” (PANKHURST, 1914, p. 82) 51 “fought until their clothes were torn, their bodies bruised, and the last ounce of their strength exhausted.” (PANKHURST, 1914, p. 83)





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crime foi chamado obstrução da polícia. Será visto que foi a polícia que fez a obstrução. (PANKHURST 1914, p. 86) (Tradução livre da autora)52

O trabalho das suffragettes com discursos antes das eleições suplementares se intensificou durante a primavera de 1907. Os jornais continuaram a se posicionar a respeito delas de maneira positiva pois, como a militante coloca, apesar de não concordarem com a política das suffragettes, eles admiravam sua coragem e força (PANKHURST, 1914, p. 90). Emmeline, ainda a respeito da visão da imprensa, apresenta um fragmento de uma notícia publicada pelo jornal Liberal London Tribute: Disse o correspondente do London Tribune, um hostil jornal Liberal sobre nossas táticas: "Seu poder de permanência, julgando-as pelos padrões dos homens, é extraordinário. Ao entardecer, bem como reuniões à noite, elas têm trabalhado duas vezes mais duro que os homens. Eles estão de pé mais cedo, eles se recolhem tão tarde. Mulheres contra homens, eles são melhores oradores, mais lógico, mais bem informadas, melhor formulada, com uma visão mais segura para o argumento revelador." (PANKHURST, 1914, p. 90) (Tradução livre da autora)53

Novas agressões contra as mulheres aconteceram, desta vez no distrito de Mid-Devon – colocado pela militante como “fortaleza do liberalismo” –, após um discurso. Apesar de ter sido alertada por uma Sindicalista sobre o perigo de se posicionar contra os Liberais, a militante falou publicamente após a votação. Mais uma série de agressões aconteceram, desta vez contra Emmeline Pankhurst e Sra. Martel, que a acompanhava no momento. Foram arremessados contra elas bolas de neve sujas, vegetais e ovos estragados. Ao tentarem escapar, foram cercadas pelas agressores. Ambas sofreram fortes agressões físicas após levarem diversos golpes. Emmeline ainda acrescenta que, apesar de toda a agressividade, nenhum homem foi preso e faz uma comparação com o tratamento dado as mulheres em Londres (PANKHURST, 1914, p. 94). Em 29 de janeiro de 1908, mais uma sessão do Parlamento se iniciava e mais uma vez a questão do voto feminino foi ignorada. Um novo Women’s Parliament foi convocado pela WSPU que aconteceria nos dias 11, 12 e 13 de fevereiro. No primeiro dia, quase todas as mulheres presentes se voluntariaram para levar a resolução para o Primeiro-Ministro. Ao 52

“within the first two months of the year 1907 the English Government sent to prison one hundred and thirty women whose "militancy" consisted merely of trying to carry a resolution from a hall to the Prime Minister in the House of Commons. Our crime was called obstructing the police. It will be seen that it was the police who did the obstructing.” (PANKHURST 1914, p. 86) 53 “Said the correspondent of the London Tribune, a Liberal paper hostile to our tactics: ‘Their staying power, judging them by the standards of men, is extraordinary. By taking afternoon as well as evening meetings, they have worked twice as hard as the men. They are up earlier, they retire just as late. Women against men, they are better speakers, more logical, better informed, better phrased, with a surer insight for the telling argument.’” (PANKHURST, 1914, p. 90)





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chegarem na Câmara dos Comuns, as mulheres foram barradas pelos policiais e cinquenta delas foram mandadas para celas. O segundo dia não foi diferente. Foi avisado pelo Sr. Muskett, que processava as penas das presas no dia anterior para a Coroa, que, para benefício das suffragettes, havia a intenção de trazer de volta uma lei aprovada no reinado de Charles II chamada Tumultuous Petitions (Petição Tumultuosa) – lei esta que impedia a aproximação ao rei ou ao Parlamento com qualquer tipo de petição, reclamação, protesto, declaração acompanhado de um número de pessoas maior que doze; a multa para violação desta lei era o pagamento de cem libras ou três meses de prisão (PANKHURST, 1914, p. 95). As mulheres presas no dia anterior escolheram a sentença de prisão. E de fato a lei foi utilizada no julgamento das presas. Grande parte do segundo capítulo foi destinado ao relato da realidade vivida pelas mulheres na prisão. Determinadas a desafiar a Tumultuous Petitions, em uma nova reunião do Parlamento, treze mulheres se dirigiram à Câmara dos Comuns. E foi o que aconteceu. Emmeline conta que, ainda se recuperando do ataque que aconteceu em Mid-Devon e necessitada de ajuda para caminhar, desobedeceu a ordem dos policiais de que as mulheres deviam andar sozinhas. Dessa forma, as treze mulheres foram presas. A militante continua afirmando que durante o julgamento, tanto os depoimentos das presas quanto das testemunhas foi ignorado. Foram condenadas por seis semanas e enviadas para a prisão Holloway. Assim, deu-se início a uma série de relatos dos abusos que aconteciam dentro dessa prisão. De acordo com Emmeline, “o sistema prisional Inglês é totalmente medieval e desgastado. Em alguns de detalhes, o sistema melhorou desde que começaram a enviar os Suffragettes para Holloway.” (PANKHURST, 1914, p. 102) (Tradução livre da autora)54 A primeira reclamação feita por Pankhurst foi a respeito da troca de roupa pessoal para a do presídio: Parecia um tempo infinito antes da minha porta da cela ser aberta por uma carcereira que ordenou-me a segui-la. Entrei em uma sala onde uma outra carcereira sentou-se em uma mesa, pronta para fazer um inventário dos meus efeitos. Obedecendo a uma ordem de despir-se, tirei meu vestido, então parei. "Tire tudo," foi a próxima ordem. "Tudo?" Eu hesitei. Parecia impossível que eles esperavam me despir. Na verdade, eles me permitiram tirar as últimas peças de vestuário no abrigo de um banheiro. (PANKHURST, 1914, p. 100) (Tradução livre da autora)55

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“The English prison system is altogether mediæval and outworn. In some of its details the system has improved since they began to send the Suffragettes to Holloway.” (PANKHURST, 1914, p. 102) 55 “It seemed an endless time before my cell door was opened by a wardress, who ordered me to follow her. I entered a room where another wardress sat at a table, ready to take an inventory of my effects. Obeying an order to undress, I took off my gown, then paused. ‘Take off everything,’ was the next order. ‘Everything?’ I faltered. It seemed impossible that they expected me to strip. In fact, they did allow me to take off my last garments in the shelter of a bath-room.” (PANKHURST, 1914, p. 100)





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O interior da Holloway apresentava condições precárias. Exausta, Emmeline afirma que deitou-se na dura cama de sua cela mas não conseguiu descansar. Ainda acrescentou que, por ser um prédio antigo, a prisão não recebia luz do sol suficiente, o que, acrescentado com o mau cheiro e a má ventilação, pioraram ainda mais a experiência. Outro ponto citado foi a solitária, colocado pela militante como um “castigo muito terrível de infligir a qualquer ser humano, não importa o que seu crime. Criminosos endurecidos nas prisões dos homens, dizse, muitas vezes imploravam o chicote no lugar.” (PANKHURST, 1914, p 102) (Tradução livre da autora)56. A própria militante ficou dois dias na solitária até precisar ser encaminhada ao hospital, onde presenciou um momento que lhe causou muito mal estar. Havia uma mulher na cela ao lado dando a luz a uma criança e ela coloca Uma mulher, presa pelas leis dos homens, estava dando uma criança ao mundo. Uma criança nascida em uma cela! Nunca vou esquecer daquela noite, nem o que eu sofria com as dores de parto daquela mulher, que, descobri mais tarde, foi simplesmente esperando julgamento por uma acusação que foi descoberta ser sem fundamento. (PANKHURST, 1914, p. 102) (Tradução livre da autora)57

No início do segundo capítulo do presente trabalho, Emmeline comentou sobre algumas de suas leituras de quando era criança e voltou a citar uma no capítulo que está sendo analisado. Como passatempo enquanto estava presa no hospital, a militante costurou, tricotou e traduziu o livro Autour de mon Jardin de Jules Janin. Alguns dias após sua libertação, uma reunião foi marcada no Albert Hall para fazer o encerramento de uma semana onde foi arrecadado pelas mulheres dinheiro para a campanha anual. No dia seguinte da reunião, Pankhurst e outras ex-presidiárias se encaminharam até um eleitorado de Londres onde estava tendo uma eleição suplementar e a WSPU estava fazendo forte campanha. O resultado da eleição foi a vitória do Liberal Sr. Asquith, um forte inimigo das sufragistas. O novo Primeiro-Ministro era abertamente contra o sufrágio feminino. Pankhurst coloca que existe uma lei inglesa onde, ao assumir um cargo no Gabinete deve-se renunciar o cargo no Parlamento. Sendo assim, foram convocadas uma série de eleições suplementares e, mais uma vez, a WSPU se coloca contra os candidatos Liberais e a entrada do inimigo ao poder dá início as mudanças na militância das suffragettes. Não é comum Emmeline direcionar tão diretamente seu discurso ao leitor, porém nesse caso ela comenta “eu devo deixar ao honesto julgamento dos meus leitores para estes colocarem onde 56

“too terrible a punishment to inflict on any human being, no matter what his crime. Hardened criminals in the men's prisons, it is said, often beg for the lash instead.” (PANKHURST, 1914, p. 102) 57 “A woman, imprisoned by men's laws, was giving a child to the world. A child born in a cell! I shall never forget that night, nor what I suffered with the birth-pangs of that woman, who, I found later, was simply waiting trial on a charge which was found to be baseless.” (PANKHURST, 1914, p. 102)





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de fato pertence a responsabilidade pelas primeiras janelas quebradas” (PANKHURST, 1914, p. 106) (Tradução livre da autora)58. Como apontado por Emmeline anteriormente, o partido que estivesse no poder e não apoiasse a questão do voto feminino seria seu inimigo. No caso, os Liberais ainda estavam no poder e o candidato selecionado para ser derrotado em uma das eleições suplementares foi Churchill, que estava concorrendo para a presidência do Board of Trade. A responsável por essa manifestação foi Christabel que obteve sucesso, Churchill perdeu por 420 votos. No entanto, o mesmo assegurou-se de outro cargo, em Dundee na Escócia, e a WSPU continuou na tentativa de derrotá-lo. Temendo a força das mulheres, Emmeline apresenta um trecho de uma declaração onde Churchill se coloca como defensor do voto feminino e dirige um discurso para as mulheres dizendo que Ninguém [...] pode ser cego para o fato de que no próximo sufrágio universal o voto feminino será um problema real e prático; e o próximo Parlamento, penso eu, deveria ver a satisfação das reivindicações das mulheres. Eu não excluo a possibilidade do sufrágio ser tratado neste Parlamento. (CHURCHILL apud PANKHURST, 1914, p. 107) (Tradução livre da autora)59

Porém, Churchill perdeu a votação por 2200 votos. Emmeline então retorna a falar sobre Asquith. Quando Stanger, que no terceiro Women’s Parliament citado anteriormente havia prometido introduzir uma proposta de lei de sufrágio, de fato cumpriu sua palavra e recebeu apoio de companheiros do Partido Liberal. No entanto, a resposta que recebeu do Primeiro-Ministro não foi positiva. Asquith não deseja ver as mulheres emancipadas e que, apesar de estar ciente das falhas no sistema eleitoral, o governo pretendia apresentar um projeto de reforma antes do fim do Parlamento; projeto este que não incluiria o sufrágio feminino, mas seria formulado de uma maneira que permitiria que o sufrágio feminino fosse incluído caso algum membro tivesse interesse. (PANKHURST, 1914, p. 109) A militante afirma que o discurso de Asquith foi muito bem aceito pelas integrantes da Liberal Associations. Uma semana depois, ao ser questionado durante uma sessão da Câmara dos Comuns a respeito do sufrágio feminino, o Primeiro-Ministro deu uma resposta que desagradou a WSPU, uma resposta que de acordo com Emmeline sinalizou uma “promessa”. A reação da WSPU foi imediata,

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“I shall leave it to the honest judgment of my readers to place where it ought rightly to be placed the responsibility for those first broken windows.” (PANKHURST, 1914, p. 106) 59 "No one […] can be blind to the fact that at the next general election woman suffrage will be a real, practical issue; and the next Parliament, I think, ought to see the gratification of the women's claims. I do not exclude the possibility of the suffrage being dealt with in this Parliament." (PANKHURST, 1914, p. 107)





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[...] as mulheres liberais ainda se apegam à esperança de ação do Governo, e a imprensa Liberal fingiu se agarrar a ela. Quanto à Women’s Social and Political Union, estávamos preparadas para mais trabalho. Tivemos de atacar com uma linha nova, já que era evidente que o governo poderia, por um tempo, pelo menos, neutralizar o nosso trabalho nas eleições suplementares com mais falsas promessas. Consistentes com nossa política, de nunca ir mais longe do que o Governo obrigounos a percorrer, fizemos a nossa primeira ação uma perfeitamente pacífica. (PANKHURST, 1914, p. 111) (Tradução livre da autora)60

Pankhurst faz em seguida um interessante relato a respeito de um discurso feito por Sr. Herbert Gladstone, Ministro do Interior. Gladstone se posicionou como um sufragista interessado em votar a favor da lei e estava confiante de que a lei poderia ser aprovada já que não tinha nenhum partido unido contra ou a favor. O Ministro ainda acrescentou que Sufrágio feminino [...] deve avançar para a vitória através de todas as etapas que são necessárias para grandes reformas para amadurecer. Primeiro debate acadêmico, em seguida ação eficaz, foi a história do sufrágio dos homens; deve ser o mesmo com o sufrágio feminino. Homens [...] aprenderam esta lição e sabem a necessidade de demonstrar a grandeza do seu movimento, e de estabelecer que a força maior que atua e armar um governo de trabalho eficiente. [...] Olhando para trás, as grandes crises políticas na década de trinta, sessenta e oitenta, percebe-se que as pessoas não andavam em pequenas multidões, nem estavam satisfeitos com reuniões entusiastas em grandes salões; eles se reuniam em suas dezenas de milhares em todo o país. (GLADSTONE apud PANKHURST, 1914, p. 111) (Tradução livre da autora)61

Não é possível medir o peso das palavras de Gladstone na consciência das militantes apenas com a leitura do texto de Emmeline, mas é preciso considerar o fato de que as manifestações das suffragettes foram se tornando cada vez mais radicais. A historiadora Zina Abreu, ao se falar sobre a radicalização do movimento, aponta que A obstinação do Governo e do Parlamento em não dar ouvidos às suffragettes levouas a adoptarem tácticas cada vez mais agressivas e violentas, sobretudo a partir de 1908, como vandalizar ou destruir edifícios públicos e privados, igrejas, museus, campos de golfe, etc., vários dos quais incendiaram ou destruíram com explosivos; partir vidraças, como as janelas da própria residência do Primeiro Ministro, em 10 Downing Street, que as sufragetes Mary Leigh e Edith New estilhaçaram. Os prejuízos atingiram centenas de milhares de libras. (ABREU, 2002, p. 464)

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“[…] the Liberal women still clung to the hope of Government action, and the Liberal press pretended to cling to it. As for the Women's Social and Political Union, we prepared for more work. We had to strike out along a new line, since it was evident that the Government could, for a time at least, neutralise our by-election work by more false promises. Consistent with our policy, of never going further than the Government compelled us to go, we made our first action a perfectly peaceable one.” (PANKHURST, 1914, p. 111) 61 “Woman suffrage [...] must advance to victory through all the stages that are required for great reforms to mature. First academic discussion, then effective action, was the history of men's suffrage; it must be the same with women's suffrage. Men [...] have learned this lesson and know the necessity for demonstrating the greatness of their movement, and for establishing that force majeure which actuates and arms a Government for effective work. […] Looking back at the great political crises in the thirties, the sixties and the eighties, it will be found that the people did not go about in small crowds, nor were they content with enthusiastic meetings in large halls; they assembled in their tens of thousands all over the country." (PANKHURST, 1914, p. 111)





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Pankhurst afirma que as suffragettes tomaram o discurso de Gladstone como um desafio, que foi cumprido. A WSPU organizou uma manifestação no Hyde Park no dia 21 de junho de 1908. Para essa manifestação, as militantes investiram muito na propaganda, algumas delas ilustradas abaixo Nós cobrimos os painéis de Londres e de todas as principais cidades do interior com grandes cartazes com retratos de mulheres que estavam para presidir as vinte plataformas onde os discursos seriam feitos; um mapa de Londres mostrando as rotas pelas quais os sete procissões iriam percorrer, e um plano do local de encontro Hyde Park também foram mostrados. [...] Durante semanas, um pequeno exército de mulheres ocupava-se escrevendo a giz anúncios nas calçadas, distribuindo panfletos, angariavam de casa em casa, anunciando a manifestação com cartazes e placassanduíche espalhadas pelas ruas. (PANKHURST, 1914, p. 113) (Tradução livre da autora)62

FIGURA 5: propagandas desenvolvidas pela Women’s Social and Political Union.

FLOREY, Kenneth. Woman Suffrage Memorabilia. http://womansuffragememorabilia.com/ Acesso em: 15 maio 2016.

2012.

Disponível

em:

Quando Emmeline começa a falar sobre o dia da manifestação, é possível perceber, apesar de escrever cerca de seis anos após a data, a empolgação e confiança que as militantes tinham com relação ao evento. O evento foi grandioso e repercutiu nos jornais da época: O London Times disse no dia seguinte: "Seus organizadores contaram com um público de 250.000. Essa expectativa foi certamente cumprida, e provavelmente foi duplicada, e seria difícil contradizer qualquer um que afirmou que foi triplicada. Como as distâncias e o número das estrelas, os fatos eram para além do limiar de percepção.” O Daily Express disse: "É provável que nunca tantas pessoas ficaram reunidas em qualquer lugar na Inglaterra. Homens que viram as grandes reuniões na

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“We covered the hoardings of London and of all the principal provincial cities with great posters bearing portraits of the women who were to preside at the twenty platforms from which speeches were to be made; a map of London, showing the routes by which the seven processions were to advance, and a plan of the Hyde Park meeting-place were also shown. […] For weeks a small army of women was busy chalking announcements on sidewalks, distributing handbills, canvassing from house to house, advertising the demonstration by posters and sandwich boards carried through the streets.” (PANKHURST, 1914, p. 113)





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época de Gladstone anos atrás, disseram que, em comparação com a multidão de ontem, foi como nada." (PANKHURST, 1914, p. 115) (Tradução livre da autora)63

Apesar do sucesso da manifestação e dos positivos comentários da mídia, a resposta de Asquith não foi a esperada. O Primeiro-Ministro continuou honrando suas palavras de que o governo pretendia, em algum momento futuro, apresentar um projeto de reforma eleitoral que poderia caber a inclusão do voto feminino. É possível dizer que o terceiro capítulo tem uma importância maior que os anteriores deste segundo livro. É apontado logo no início, que as militantes atingiram um ponto em que precisavam escolher entre duas alternativas, no caso sinalizando que precisavam escolher entre manter as manifestações da maneira que estava ou agir contra o governo. O primeiro relato de janelas quebradas pelas suffragettes, que passa a ser uma manifestação comum das mesmas, acontece neste capítulo. A militante, que junto com suas companheiras organizavam um Women’s Parliament para o dia 30 de junho de 1908, envia uma carta para Asquith informando sobre as manifestantes que o aguardariam. Como era de se esperar, a resposta de Asquith não foi positiva. Na verdade, não houve resposta, apenas um mandado proibindo a entrada das militantes na Câmara dos Comuns. A reação das suffragettes foi de muita revolta, no entanto apenas duas foram as responsáveis pelas pedras jogadas nas janelas da residência de Asquith na Downing Street. Esse acontecimento deu abertura para Emmeline, mais uma vez, mostrar as contradições e o preconceito que as mulheres sofriam na época. De acordo com ela, “a destruição de janelas é um método consagrado pelo tempo para mostrar desagrado com uma situação política” (PANKHURST, 1914, p. 119) (Tradução livre da autora) 64 . A militante relata uma manifestação feita por homens alguns anos antes onde, assim como as mulheres nesse episódio, quebraram janelas e vitrines mas não receberam punição, enquanto as mulheres foram presas. E ainda acrescenta uma frase que resume a diferença no tratamento de homens e mulheres infratores: “Quebra de janela, quando feito por ingleses, é considerado como

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“The London Times said next day: ‘Its organisers had counted on an audience of 250,000. That expectation was certainly fulfilled, and probably it was doubled, and it would be difficult to contradict any one who asserted that it was trebled. Like the distances and the number of the stars, the facts were beyond the threshold of perception’. The Daily Express said: ‘It is probable that so many people never before stood in one square mass anywhere in England. Men who saw the great Gladstone meeting years ago said that compared with yesterday's multitude it was as nothing’." (PANKHURST, 1914, p. 115) 64 “The smashing of windows is a time-honoured method of showing displeasure in a political situation.” (PANKHURST, 1914, p. 119)





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expressão honesta de opinião política. Quebra de janela, quando feita por inglesas, é tratada como um crime.” (PANKHURST, 1914, p. 120) (Tradução livre da autora)65. Mais a diante, Emmeline comenta sobre uma manifestação organizada no Trafalgar Square no dia 11 de outubro onde Christabel, Sra. Drummond e ela discursaram e aponta que havia policiais presentes. A presença de Sr. Lloyd-George não passou despercebida. No dia seguinte, as três militantes receberam um documento afirmando que deveriam comparecer à Câmara dos Comuns na manhã de 13 de outubro por estarem envolvidas em uma denúncia de ato ilegal. A resposta de Emmeline automaticamente resultou no mandato de prisão das três. O julgamento aconteceu no dia 21 de outubro de 1908. Lloyd-George, anteriormente citado por estar presente na manifestação, foi a primeira testemunha. Porém, como de se esperar, seu depoimento não ajudou as manifestantes. Em seguida, Gladstone (o mesmo citado anteriormente ao conversar com as mulheres a respeito da forma com que homens conduziam suas indignações) foi convocado a depor. Christabel, depois de muito questionar Gladstone, conseguiu fazer o mesmo admitir que acredita “que as mulheres jamais conseguiriam o voto pois elas não poderiam lutar por isso como os homens lutaram” (PANKHURST, 1914, p. 125) (Tradução livre da autora)66. A filha mais velha da militante ainda coloca que Mr. Herbert Gladstone nos disse no discurso que eu li para ele que a vitória do argumento por si só não é suficiente. [...] Ele diz: "Vá em frente, lute como fizeram aqueles homens”. E então, quando mostramos nosso poder e conseguimos as pessoas para nos ajudar, ele leva um processo contra nós de uma maneira que teria sido vergonhoso mesmo nos velhos tempos de coerção. (PANKHURST, 1914, p. 127) (Tradução livre da autora)67

Emmeline finaliza o capítulo com o discurso feito aos presentes no julgamento – e, que de acordo com a militante, emocionou muitos deles – antes da sentença de prisão das três mulheres Eu vi [...] que os homens são encorajados por lei para se aproveitar do desamparo das mulheres. [...] Nós mulheres apresentamos petições maiores em apoio à nossa emancipação do que qualquer outra apresentada para qualquer outra reforma; nós conseguimos com sucesso segurar maiores reuniões públicas do que os homens já detidos para qualquer reforma, apesar da dificuldade que as mulheres possuem em jogar fora de sua timidez natural. [...] Temos enfrentado multidões hostis em

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“Window-breaking, when Englishmen do it, is regarded as honest expression of political opinion. Windowbreaking, when Englishwomen do it, is treated as a crime.” (PANKHURST, 1914, p. 120) 66 “that women could never get the vote because they could not fight for it as men had fought” (PANKHURST, 1914, p. 125) 67 "Mr. Herbert Gladstone has told us in the speech I read to him that the victory of argument alone is not enough. [...] He says, 'Go on, fight as the men did.' And then, when we show our power and get the people to help us, he takes proceedings against us in a manner that would have been disgraceful even in the old days of coercion." (PANKHURST, 1914, p. 127)





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esquinas, porque nos disseram que não poderíamos ter a representação por nossos impostos que homens ganharam a não ser que nós convertêssemos o país inteiro a nosso favor. Porque nós fizemos isso, temos sido deturpadas, temos sido ridicularizadas, tivemos desprezo derramado sobre nós, e a ignorante multidão foi incitada a nos oferecer violência, que temos enfrentado desarmadas e desprotegidas pelos seguranças que Ministros do Governo desfrutam. [...] estamos determinadas a continuar com essa agitação porque sentimos honra vinculada. Assim como era dever dos seus antepassados, é nosso dever tornar o mundo um lugar melhor para as mulheres do que é hoje. [...] Estamos aqui, não porque somos infratoras da lei; estamos aqui nos esforçando para nos tornarmos legisladoras. (PANKHURST, 1914, p. 129) (Tradução livre da autora)68

A sentença decidida foi de três meses de prisão para Emmeline e Sra. Drummond e de dez semanas para Christabel. O quarto capítulo se inicia dando sequência a esse episódio, com as três condenadas já na prisão. Emmeline diz que a primeira ação ao chegar na Holloway é convocar a presença do governador. Ela então, pede que as suffragettes presas sejam tratadas como criminosas políticas e não simples infratoras; e diz que se recusam a efetuar a troca de roupa na presença da carcereira e pede para que possam conversar com suas amigas. Os dois últimos pedidos foram atendidos. Mas, apesar de poder agora dividir celas, Emmeline acaba tendo que ser levada para o hospital devido as condições da prisão citadas anteriormente. Quando Christabel, Sra. Drummond e Emmeline foram libertadas, foi marcado um café-da-manhã onde Pankhurst avisa as companheiras de militância que elas devem insistir para ser tratadas como criminosas políticas. O ano de 1909 iniciou-se agitado. Em 25 de janeiro, a WSPU faz uma manifestação onde quatro militantes foram presas, dentre elas a irmã de Emmeline, Sra. Clarke – esta informação é interessante pois é a primeira vez que o nome dela é citado. Um mês depois, o sétimo Women’s Parliament foi convocado para protestar contra a falta de menção das mulheres no discurso do Rei. Como era de se esperar, todas as envolvidas foram presas e sentenciadas de um a dois meses de prisão. Novamente Emmeline cita a luta das mulheres para não serem tratadas como simples presas e sim como criminosas políticas. 68

"I have seen [...] that men are encouraged by law to take advantage of the helplessness of women. [...] We women have presented larger petitions in support of our enfranchisement than were ever presented for any other reform; we have succeeded in holding greater public meetings than men have ever held for any reform, in spite of the difficulty which women have in throwing off their natural diffidence. [...] We have faced hostile mobs at street corners, because we were told that we could not have that representation for our taxes that men have won unless we converted the whole of the country to our side. Because we have done this, we have been misrepresented, we have been ridiculed, we have had contempt poured upon us, and the ignorant mob have been incited to offer us violence, which we have faced unarmed and unprotected by the safeguards which Cabinet Ministers enjoy. [...] we are determined to go on with this agitation because we feel in honour bound. Just as it was the duty of your forefathers, it is our duty to make the world a better place for women than it is to-day. [...] We are here, not because we are law-breakers; we are here in our efforts to become law-makers." (PANKHURST, 1914, p. 129)





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O rumo da radicalização do movimento começa a tomar forma no final do quarto capítulo, quando Emmeline relata uma manifestação cujo desfecho foi a prisão de cento e oito mulheres. Pankhurst ainda finaliza o capítulo com a seguinte frase, “longe de nos desencorajar ou desanimador, ele simplesmente estimulou-nos a formas novas e mais agressivas de militância.” (1914, p. 148) (Tradução livre da autora)69 É possível dizer que o quinto capítulo do livro II é um dos mais importantes da autobiografia de Emmeline Pankhurst. É nele que a greve de fome e a alimentação forçada são detalhadamente relatados. A primeira greve de fome70 citada aconteceu após a prisão de Srta. Wallace Dunlop. Uma semana depois, apesar da tentativa do governador, do médico e dos carcereiros, a militante mantinha a greve. Na sexta-feira seguinte de sua prisão, foi convocado um médico que afirmou que Srta. Wallace Dunlop estava enfraquecendo muito rapidamente e poderia morrer a qualquer momento; na tarde daquele dia a militante foi liberada após cumprir apenas um quarto de sua sentença. Após o ato de Srta. Wallace Dunlop, muitas mulheres passaram a fazer greve de fome, mas Emmeline afirma que em alguns casos a greve era tratada pelos policiais com extrema crueldade, “mulheres delicadas foram condenadas, não apenas a solitária, mas a usar algemas por vinte e quatro horas. Uma mulher recusando roupas da prisão foi colocada em uma camisa de força.” (PANKHURST, 1914, p. 154) (Tradução livre da autora)71. O depoimento da primeira vítima da alimentação forçada demostra a brutalidade desse ato. Sra. Leigh desde sua prisão recusou se alimentar e três dias depois foi encaminhada até a sala do médico. Era naquela sala que a militante iria passar por uma das experiências mais dolorosas de sua vida Um número de carcereiros [...] caiu sobre a Sra Leigh, segurou-a para baixo e inclinando sua cadeira para trás. Ela estava tão tomado pela surpresa que ela não poderia resistir com sucesso dessa vez. Eles conseguiram fazê-la engolir um pouco de comida com um copo de alimentação. Mais tarde, dois médicos e os carcereiros apareceram em sua cela, forçaram Sra Leigh até a cama e seguraram-na lá. Para seu horror, os médicos produziram um tubo de borracha, duas jardas de comprimento, e este começou a encher sua narina. A dor era tão terrível que ela gritou diversas

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“Far from discouraging or disheartening us, it simply spurred us on to new and more aggressive forms of militancy.”(PANKHURST, 1914, p. 148) 70 A respeito das greves de fome, a historiadora Zina Abreu afirma que “receando a morte de algumas delas [sufragetes] e a consequente produção de mártires, o Governo adoptou a ‘alimentação forçada’, feita por meio de um tubo enfiado pela boca abaixo – processo bárbaro visto como tortura. Muitas sufragetes foram assim alimentadas durante semanas, numa média de três vezes por dia. Kitty Marion, actriz famosa, por exemplo, foi submetida à alimentação forçada mais de 230 vezes.” (ABREU, 2002, p. 464) 71 “Delicate women were sentenced, not only to solitary confinement, but to wear handcuffs for twenty-four hours at a stretch. One woman on refusing prison clothes was put into a straightwaistcoat.” (PANKHURST, 1914, p. 154)





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vezes. Três dos carcereiros começaram a chorar e o médico júnior pediu para o outro desistir. Tendo recebido suas ordens do governo, o médico persistiu e o tubo foi empurrado para dentro do estômago. Um dos médicos, de pé sobre uma cadeira e segurando o tubo para cima, derramou o alimento líquido através de um funil quase sufocando a pobre vítima. ‘Os tambores de meus ouvidos,’ ela disse depois, ‘pareciam estar explodindo. Eu podia sentir a dor ao final do osso do peito. Quando, finalmente, o tubo foi retirado era como se a parte de trás do meu nariz e garganta estavam sendo rasgado fora com ele.’ (PANKHURST, 1914, p. 159) (Tradução livre da autora)72

No entanto, a atitude tomada pelo governo não era bem vista por todos. Emmeline aponta que uma das maiores revistas médicas da época, The Lancet, condenava a forma indigna que as suffragettes estavam sendo tratadas. Um médico afirmou que, em alguns casos, a morte pode ser causada quase ao mesmo tempo que o tubo era introduzido. Outro disse que existem casos onde o alimento foi injetado dentro dos pulmões. No jornal The Times, o médico Sr. C. Mansell-Moullin, indignado com o nome escolhido pelo governo, Hospital treatment (tratamento de hospital), declarou que essa violência e brutalidade não tinha espaço nos hospitais. A militante afirma que um protesto contra a alimentação forçada foi assinado por 116 médicos e enviado para o Primeiro-Ministro. (PANKHURST, 1914, p. 158) O sexto capítulo é o mais curto da obra de Pankhurst e é onde a militante comenta sobre uma visita aos Estados Unidos da América em outubro de 1909. No entanto, a informação mais importante do capítulo é distribuição do famoso cartaz mostrando o processo agressivo da alimentação forçada criado pela WSPU.

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“A number of wardresses then fell upon Mrs. Leigh, held her down and tilted her chair backward. She was so taken by surprise that she could not resist successfully that time. They managed to make her swallow a little food from a feeding cup. Later two doctors and the wardresses appeared in her cell, forced Mrs. Leigh down to the bed and held her there. To her horror the doctors produced a rubber tube, two yards in length, and this he began to stuff up her nostril. The pain was so dreadful that she shrieked again and again. Three of the wardresses burst into tears and the junior doctor begged the other to desist. Having had his orders from the Government, the doctor persisted and the tube was pushed down into the stomach. One of the doctors, standing on a chair and holding the tube high poured liquid food through a funnel almost suffocating the poor victim. ‘The drums of my ears,’ she said afterwards, ‘seemed to be bursting. I could feel the pain to the end of the breast bone. When at last the tube was withdrawn it felt as if the back of my nose and throat were being torn out with it.’” (PANKHURST, 1914, p. 159)





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FIGURA 6: cartaz produzido pela WSPU que ilustra a alimentação forçada que acontecia dentro das prisões femininas devido a greve de fome.

Legenda: Torturando mulheres na prisão – vote contra o governo. (Tradução livre da autora) Disponível em: https://brontehoroine.files.wordpress.com/2011/08/exhssuffragettesfeeding300.jpg Acesso em: 21 out. 2015.

Já o sétimo capítulo se inicia no começo de 1910 e narra uma importante manifestação da WSPU. Depois que, mais uma vez o sufrágio feminino foi deixado de lado no discurso do Rei e de uma reunião do Parlamento, Emmeline acreditava que era necessário reunir a força de todas as sufragistas da Câmara dos Comuns, independente de seu partido. E foi isso que aconteceu. O comitê foi formado, de acordo com a militante, por 26 Liberais, 17 Conservadores, 6 Nacionalistas Irlandeses e 6 membros do Partido Trabalhista. O projeto de lei, intitulado Conciliation Bill, propunha a ampliação do voto parlamentar para mulheres donas de casa e às mulheres trabalhando em estabelecimentos comerciais pagando dez libras ou mais de aluguel. Emmeline completa dizendo que a lei emanciparia cerca de 95% das mulheres. (PANKHURST, 1914, p. 168)



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Foi com grande entusiasmo que a Conciliation Bill foi introduzida na Câmara dos Comuns no dia 14 de junho de 1910. A WSPU organizou uma manifestação e reuniu todos os grupos de sufrágio; 617 mulheres marcharam juntas. Asquith volta a ser citado, Emmeline afirma que ele pessoalmente não queria aprovar a lei. Foi então organizado uma assembleia com os membros da Câmara dos Comuns que apoiavam a lei; duas das associações citadas são The Men’s Political Union for Women’s Enfrachisement e The Men’s League for Women’s Suffrage. A grande manifestação aconteceu na sexta-feira, dia 18 de novembro de 1910, e ficou conhecida como Black Friday por conta da violência. Quando ficou claro que a Conciliation Bill não seria aprovada, a WSPU, que considerava dar uma trégua, declarou guerra novamente, como aponta Emmeline. Seguindo ordens do governo, a polícia se posicionou de forma violenta. A militante coloca que os policiais “colocaram suas mãos nas mulheres e literalmente jogaram elas de um homem para outro” (PANKHURST, 1914, p. 181) (Tradução livre da autora)73. Além disso, alguns policiais usavam seus punhos para acertar as mulheres no rosto, seios e ombros. 115 mulheres machucadas foram presas naquela sexta-feira. Na noite seguinte e na outra, janelas foram quebradas nas casas de importantes nomes do Parlamento. O número de presas aumentou para 160, mas apenas foram sentenciadas as que quebraram as janelas.

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“they laid hands on the women and literally threw them from one man to another” (PANKHURST, 1914, p. 181)





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FIGURA 7: brutalidade na Black Friday, 18 de novembro de 1910.

PANKHURST, Emmeline. For hours scenes like this were enacted on Black Friday. 1914. Disponível em: http://www.gutenberg.org/files/34856/34856-h/34856-h.htm Acesso em: 15 maio 2016

O último capítulo do livro II inicia-se com outra viagem para os Estados Unidos, que foi brevemente comentada por Emmeline pois logo em seguida a mesma cita a morte de sua irmã. Sra. Mary Clarke, apontada pela militante como uma grande sufragista, estava presente na Black Friday e foi muito machucada, e também estava presente na noite onde as janelas foram quebradas. Por conta do último acontecimento, Clarke foi sentenciada a um mês de prisão e liberada no final de dezembro de 1910 e no dia de Natal veio a falecer. Ainda mostrando sua indignação com o que aconteceu na Black Friday, Emmeline afirma ser impossível mensurar a quantidade de mulheres que morreram ou foram machucadas em manifestações a favor do sufrágio feminino na Inglaterra. Um dos exemplos citados por ela é Constance que foi presa, submetida a alimentação forçada e acabou nunca se recuperando dos maus tratos (PANKHURST, 1914, p. 187-188). Uma terceira viagem para os Estados Unidos é citada e dessa vez, Emmeline faz uma breve comparação com as prisões britânicas e estadunidenses – no país americano, a militante não viu solitárias, não tinha regra de silêncio, a comida era boa (PANKHURST, 1914, p. 200). O final do livro II indica o rumo não só do livro III, mas sim do movimento. Ainda nos Estados Unidos, Emmeline ficou sabendo que a Conciliation Bill tinha praticamente sido destruída pelo governo, e a reação da WSPU é imediata, “nosso movimento entrou em uma



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nova etapa e mais vigorosa de militância” (PANKHURST, 1914, p. 202) (Tradução livre da autora)74 Logo no início do último livro da autobiografia percebe-se que o discurso de Emmeline Pankhurst muda. Já com os dois primeiros livros era possível perceber a ideologia e a intenção da militante ao relatar os detalhes, mas, neste livro, a forma com que ela expõe os acontecimentos passa a ser tão radical quanto a forma com que as suffragettes estavam se manifestando. Dessa forma, devido a forma com que a militante apresenta as informações, não foi viável analisar o livro III por seus capítulos. O último livro comenta as manifestações e prisões que aconteceram nos anos de 1910 à 1914, ano da publicação. No começo do livro é dada a informação de que o Parlamento havia sido remontado em 1911, e que um projeto de lei, chamado Insurance Bill, estava sendo preparado. No entanto, o projeto não agradou as suffragettes. Emmeline aponta que apenas um dos dias de reunião do Parlamento foi destinado à discussão das cláusulas que envolviam as mulheres – as cláusulas, como aponta a militante, não eram justas. Algumas das diferenças apontadas por ela diz respeito à saúde e ao desemprego. Mulheres não teriam direito ao seguro desemprego, enquanto aproximadamente dois milhões e meio de homens tinham; aproximadamente quatro milhões de mulheres receberiam seguro saúde, enquanto onze milhões de homens recebiam. Porém, a pior notícia veio no dia 7 de novembro de 1911. Neste dia, foi anunciado que o governo pretendia aprovar a lei intitulada manhood suffrage bill. O anúncio foi feito para uma delegação de homens membros da People’s Suffrage Federation, que foi recebia por Asquith. O Primeiro-Ministro foi questionado pelo porta-voz sobre a formulação de uma medida que incluísse o sufrágio universal adulto (incluindo o feminino) e, como já aconteceu anteriormente, Asquith se posicionou de maneira antissufragista. Emmeline, aproveitando para fazer uma crítica ao Primeiro-Ministro, apresenta fragmentos de jornais que se colocaram contra Asquith. O mais interessante foi publicado pelo Evening Standard and Globe, “nós não somos apoiadores do sufrágio feminino, mas qualquer coisa mais desprezível do que a atitude assumida pelo Governo é difícil de imaginar” (PANKHURST, 1914, p. 207) (Tradução livre da autora)75. A resposta da WSPU para o ato de Asquith foi o cancelamento da trégua que estava sendo planejada. Além disso, foi escrita uma carta direcionada ao Primeiro-Ministro onde as militantes solicitavam a presença do mesmo na deputação onde seria discutida a substituição 74

“Our movement had entered upon a new and more vigorous stage of militancy.” (PANKHURST, 1914, 202) “We are no friends of female suffrage, but anything more contemptible than the attitude assumed by the Government it is difficult to imagine.” (PANKHURST, 1914, p. 207)

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da manhood suffrage bill por uma medida que desse direitos iguais para homens e mulheres. Pela primeira vez, Asquith decidiu receber uma deputação que envolvia o sufrágio feminino. (PANKHURST, 1914, p. 208). Apesar disso, a opinião do Primeiro-Ministro a respeito do sufrágio feminino continuava a mesma. Mais uma vez as integrantes da WSPU, não satisfeitas com o resultado da reunião, começaram outro episódio de quebra de janelas lideradas por Sra. Pethick Lawrence. Depois dessa manifestação, aproximadamente 150 mulheres foram presas e sentenciadas a até dois meses de prisão. Além disso, em dezembro, Emily Wilding Davison foi presa após incendiar uma caixa de correio. Esta é a primeira vez que a militante – que, como foi apresentado no primeiro capítulo deste trabalho, é considerada a primeira mártir do movimento – é citada na autobiografia. Depois deste ocorrido, a WSPU oficialmente se posiciona conta o Parlamento. A militante comenta que a situação estava tão ruim que as militantes não tinha mais simpatia nenhuma com os membros. Quando a questão do voto feminino não foi incluída em outro discurso do Rei, que aconteceu em fevereiro de 1912, a WSPU decidiu que “[...] o único caminho a seguir era oferecer determinada oposição a qualquer medida de sufrágio que não inclua como parte integrante sufrágio igual para homens e mulheres” (PANKHURST, 1914, p. 212) (Tradução livre da autora)76. Em 16 de fevereiro de 1912, quando algumas das prisioneiras foram libertadas, Emmeline organizou uma reunião da WSPU onde afirmou que, durante as manifestações, a arma que seria utilizada pelas militantes seria a pedra. Ainda comentou que havia pessoas que não entendiam a ligação entre o ato de quebrar janelas ou incendiar caixas de correio e o voto pelo qual estão lutando, e a militante responde mostrando mais uma diferença de tratamento entre manifestações feitas por homens e por mulheres com a afirmação: “[...] cada avanço da liberdade política dos homens tem sido marcado com violência e destruição de propriedade. Normalmente, o avanço tem sido marcado pela guerra, que é chamado glorioso.” (PANKHURST, 1914, p. 214) (Tradução livre da autora)77. Uma nova grande manifestação foi organizada pela WSPU, que aconteceu nos dias 1 e 4 de março de 1912, rendeu diversas prisões. Durante o primeiro dia, as militantes planejaram a quebra de janelas quase simultaneamente em três endereços diferentes. No segundo dia, mais pedras foram arremessadas contra janelas. A militante estima que aproximadamente 200 suffragettes foram levadas para diversas delegacias. É ainda apontado pela mesma uma 76

“[...] the only course to take was to offer determined opposition to any measure of suffrage that did not include as an integral part, equal suffrage for men and women.” (PANKHURST, 1914, p. 212) 77 “[...] every advance of men's political freedom has been marked with violence and the destruction of property. Usually the advance has been marked by war, which is called glorious.” (PANKHURST, 1914, p. 214)





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manifestação de mineiros de carvão que se mostrou mais violenta que a das suffragettes porém, não houve nenhuma prisão. E, por reclamar, Emmeline acabou recebendo uma sentença de dois meses de prisão. (PANKHURST, 1914, p. 217-220) A repressão do Governo e da polícia continuava aumentando e, alguns dias depois da manifestação citada anteriormente, a sede oficial da WSPU foi invadida e saqueada. Havia mandados de prisão para o casal Pethick Lawrence, Christabel e a própria Emmeline. No momento da invasão policial ao prédio, apenas Sr. e Sra. Pethick Lawrence estavam presentes, o que deixou os policiais determinados a encontrar Christabel. No entanto, a filha da militante, avisada por amigas, conseguiu escapar e se refugiou em Paris. A sede localizada na Clement’s Inn foi destruída pelos policiais que procuravam provas de que a WSPU estava armando uma conspiração. O jornal semanal foi publicado normalmente, porém um terço estava em branco. A manchete mais interessante citada pela militante dizia “’História Ensina’, dizia uma manchete para um espaço em branco, claramente indicando que o Governo não estava disposto a deixar o público saber algumas das coisas que a história ensina” (PANKHURST, 1914, p. 223) (Tradução livre da autora)78. Em seguida, Emmeline apresenta o julgamento dos presos. Devido ao estado de saúde de Pankhurst, o julgamento que deveria acontecer no dia 23 de abril foi transferido para o dia 15 de maio de 1912. Neste dia, Sr. e Sra. Pethick Lawrence e a própria militante compareceram ao Tribunal Central Criminal, também conhecido como Old Bailey. De acordo com a militante, havia um grande número de testemunhas, sendo que grande parte eram policiais. Tanto Emmeline quanto Sr. Pethick Lawrence falaram em sua defesa. O discurso de Pankhurst, por conta de seu tamanho, não pode ser analisado por inteiro, mas existem alguns fragmentos que são importantes. Logo no início, a militante faz um breve resumo da história da WSPU e a evolução de sua militância. Ao descrever as integrantes do movimento, Emmeline deixa a mostra novamente o preconceito que existia contra as mulheres, já que ela coloca que a WSPU não era feita por mulheres histéricas e sem importância. Outro ponto relevante é a justificativa da radicalização, onde ela diz que a WSPU nunca apoiou a violência, mas que depois do que aconteceu na Black Friday, elas precisaram mudar a forma que militavam (PANKHURST, 1914, p. 240-241). Os três julgados foram sentenciados a nove meses de prisão e novamente surge o pedido para que os presos por causa de manifestações sufragistas sejam tratados como criminosos políticos e não somente simples presidiários. Desta vez, como é apontado pela 78

“’History Teaches’ read one headline to a blank space, plainly indicating that the Government were not willing to let the public know some of the things that history teaches.” (PANKHURST, 1914, p. 223)





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militante, o pedido teve apoio internacional. Após forte pressão, o Governo concedeu a mudança. Sr. e Sra. Pethick Lawrence e Emmeline foram transferidos pra celas melhores, realmente sendo tratados como queriam. Porém, eles ficaram sabendo que apenas os três foram beneficiados com as mudanças e recusaram o tratamento. A greve de fome, cada vez mais levada a sério pelos presos, trouxe consigo mais casos de brutalidade por causa da alimentação forçada – Sr. e Sra. Pethick Lawrence foram duas das vítimas desse cruel ato mas Emmeline conseguiu evitar. Por conta de seu estado de saúde, Sra. Pethick Lawrence e Emmeline foram libertadas. Depois de se recuperar um pouco, a militante foi visitar a filha em Paris, onde Christabel morava e tomava conta da edição do jornal da WSPU, Votes for Women. Em junho de 1912, a manhood suffrage bill do Primeiro-Ministro Asquith foi aprovada, causando grande revolta. A nova lei dava o direito de voto para todos os homens maiores de 21 anos e negava o mesmo a todas as mulheres. O outono de 1912 trouxe para a WSPU uma grande mudança. Por conta da mudança de posicionamento das suffragettes, Sr. e Sra. Pethick Lawrence se desligaram da associação. Um novo jornal estava sendo elaborado e receberia o nome de The Suffragette. O comunicado da saída do casal da WSPU foi publicado no novo jornal e no Votes for Women. (PANKHURST, 1914, p. 262) A consequência da aprovação da lei de Asquith é apresentada com mais uma explicação das mudanças no rumo da militância da WSPU. Emmeline afirma que a intenção da associação não é tirar a vida de ninguém pois quem já faz isso são os inimigos, no caso os homens. A militante ainda coloca uma convocação que fez com as mulheres, chamando-as para apoiar a nova militância. É curioso a colocação de Pankhurst em seguida onde diretamente dialoga com o leitor. (PANKHURST, 1914, p. 265-268) Emmeline Pankhurst afirma que [...] as Suffragettes absolutamente repudiam esse duplo padrão de moralidade. Se é certo para os homens a lutar por sua liberdade, e só Deus sabe como a raça humana seria hoje se os homens não tivessem, desde o início dos tempos, lutado por sua liberdade, então é certo para as mulheres a lutar por sua liberdade e a liberdade de seus filhos. (PANKHURST, 1914, 269) (Tradução livre da autora)79

A guerrilha, assim colocado por Pankhurst para sinalizar as manifestações pós radicalização da militância, logo no primeiro mês causou grande destruição. Algumas das ações promovidas pelas suffragettes foram os cortes de linhas telefônicas e telegráficas de 79

“[...] the Suffragettes absolutely repudiate that double standard of morals. If it is right for men to fight for their freedom, and God knows what the human race would be like today if men had not, since time began, fought for their freedom, then it is right for women to fight for their freedom and the freedom of the children they bear.” (PANKHURST, 1914, 269)





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diversos lugares e mais janelas quebradas (PANKHURST, 1914, p. 283). E assim, mais uma vez Emmeline Pankhurst era levada até o presídio Holloway. O julgamento aconteceu no dia 2 de abril de 1913 no Old Bailey. No caso, a militante estava sendo acusada de estar incitando mulheres ao crime e, logo no início do julgamento, Sr. Bodkin, que falava em nome da Coroa, apresentou uma carta escrita por Emmeline para uma amiga onde a militante defendia sua militância. Ao argumentar sobre a carta, Bodkin afirmava que Emmeline era a líder e que tinha grande influência emocional sobre os membros da associação. Mais adiante no tribunal, Emmeline discursa sobre as mulheres e a atual falta de respeito que as mesmas tem perante as leis. Mais de mil mulheres tem ido para a prisão por causa desta agitação, sofreram a sua prisão, tem saído da prisão feridas em saúde, enfraquecidas no corpo, mas não no espírito. [...] Somos mulheres, com ou sem razão, convencidas de que esta é a única maneira em que podemos ganhar poder de alterar o que para nós são condições intoleráveis, condições absolutamente intoleráveis. [...] Nós nos oferecemos como sacrifícios, tal como seus antepassados fizeram no passado. [...] Há apenas uma maneira de por fim a essa agitação, [...] e é fazendo-nos justiça. (PANKHURST, 1914, p. 293-295) (Tradução livre da autora)80.

Apesar de todas as tentativas de argumentar a seu favor, Emmeline foi considerada culpada e sentenciada a três anos de prisão, o que causou grande revolta entre as mulheres presentes no julgamento. No caminho entre o Old Bailey e a Holloway, mulheres cantavam o Women’s Marseillaise e protestavam contra o resultado. O penúltimo ano apresentado pela militante foi marcado por diversos acontecimentos. Logo que chegou na Holloway, Emmeline iniciou mais uma greve de fome, mas não esperava que em março de 1913 iria ser introduzida na Câmara dos Comuns a lei que popularmente ficou conhecida como Cat and Mouse Act – a militante coloca que cat era como os policiais eram coloquialmente chamados (PANKHURST, 1914, p. 309).

Como apresentado no

primeiro capítulo do presente trabalho, o propósito desta lei era liberar, por tempo previamente determinado, as presas sufragistas que estivessem muito fracas devido as greves de fome. Ao serem liberadas, eram constantemente vigiadas por policiais. Emmeline ainda afirma que Sr. McKenna admitiu que a lei não iria acabar com a alimentação forçada (PANKHURST, 1914, p. 306). Outro ponto importante colocado por Emmeline é a rapidez 80

"Over one thousand women have gone to prison in the course of this agitation, have suffered their imprisonment, have come out of prison injured in health, weakened in body, but not in spirit. […] We are women, rightly or wrongly, convinced that this is the only way in which we can win power to alter what for us are intolerable conditions, absolutely intolerable conditions. […] We offer ourselves as sacrifices, just as your forefathers did in the past. […] There is only one way to put a stop to this agitation [...] it is by doing us justice.” (PANKHURST, 1914, p. 293-295)





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com que o Parlamento aprovou a lei, já que quando a mesma foi novamente enviada a Holloway, a lei já estava em vigor. Dez dias depois de sua prisão, Emmeline recebeu sua liberação provisória devido ao estado de sua saúde provocado pela greve de fome e foi comunicada que deveria retornar à prisão em quinze dias. Para se recuperar, a militante se hospedou na casa de sua amiga, Dra. Ethel Smyth em Woking. No entanto, após uma tentativa de comparecer a uma reunião que aconteceria no London Pavillion no dia 26 de maio, Emmeline novamente foi presa pelo policial que vigiava a casa onde estava. Ao chegar novamente na Holloway, uma nova greve de fome é iniciada. Como era de se esperar, já que Pankhurst nunca se recuperou por completo da primeira greve, foi mais uma vez liberada no dia 30 de maio. Dias depois, um dos episódios mais trágicos de toda a trajetória do movimento sufragista britânico, morre Emily Wilding Davison após se atirar na frente do cavalo do Rei durante a Derby de Epsom (PANKHURST, 1914, p. 314). FIGURA 8: acidente fatal de Emily Wilding Davison, 4 de junho de 1913.

1913. Disponível em: http://www.chroniclelive.co.uk/news/north-east-news/100-years-north-suffragette-emily-4039487 Acesso em: 15 maio 2016.

A morte da militante gerou não só um choque muito grande para todas as suffragettes mas também uma revolta ainda maior. O próximo passo a ser tomado por Emmeline era a



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greve de sede, muito mais agressiva que a de fome. Uma das diferenças entre as duas greves é a rapidez da mais recente, a militante foi mandada para casa apenas três dias após o início da greve de sede. Já perto do final da autobiografia, Emmeline apresenta uma informação relevante a respeito da produção de sua obra. Após sua liberação, a militante viajou para Paris, onde encontrou sua filha Christabel. Foi durante esta viagem que a autobiografia começou a ser escrita, em 1913, e a justificativa dada era que “eu tinha um dever a cumprir em dar ao mundo a minha própria declaração clara dos eventos que levaram até a revolução das mulheres na Inglaterra” (PANKHURST, 1914, p. 323) (Tradução livre da autora)81. Além disso, mãe e filha trabalharam na campanha da WSPU que seria lançada no outono. Emmeline, que anteriormente já direcionou seu discurso para leitores da época em que o movimento sufragista acontecia, neste momento direciona sua fala aos leitores do futuro quando comenta sobre historiadores que poderão no futuro, de forma mais calma, fazer justiça ao estudar a respeito de como as mulheres da Inglaterra lutaram por sua emancipação (PANKHURST, 1914, p. 323-324). Logo adiante, mais uma viagem para os Estados Unidos da América é citada no final de outubro de 1913. Ao desembarcar em Nova York, a militante foi informada de que devia comparecer à Comissão Especial de Inquérito, onde estava sendo acusada de ser uma pessoa de caráter duvidoso. Os planos foram seguidos normalmente, Emmeline afirma que sua palestra para as estadunidenses foi um sucesso ainda maior por causa do ocorrido. No final de novembro, a militante retorna à Inglaterra, onde estava sendo esperada por policiais do Scotland Yard (Quartel General da Polícia de Londres). Emmeline Pankhurst é encaminhada à Holloway outra vez, onde mais uma forma de protesto contra as prisões surgiu: a greve de sono (PANKHURST, 1914, p. 330). Enquanto isso, fora da prisão, suffragettes se manifestavam contra o Governo e a polícia. Um grande incêndio em um depósito de madeira aconteceu em Richmond Walk cuja causa nunca foi descoberta, no entanto havia uma edição do jornal The Suffragette e dois cartões protestando a prisão de Emmeline presas em uma grade. A militante coloca que, além deste incêndio, casas não ocupadas e caixas de correio foram incendiados em cidades como Liverpool, Bristol e Londres. Emmeline coloca que as suffragettes se sentiram “[...] forçadas a abandonar todas as esperanças de conseguir sucesso nas petições com Ministros” (PANKHURST, 1914, p. 335) 81

“I had a duty to perform in giving to the world my own plain statement of the events which have led up to the women's revolution in England.”(PANKHURST, 1914, p. 323)





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(Tradução livre da autora) 82e então tentaram duas vezes dialogar com o Rei; uma no final de dezembro de 1913 (apontada por Emmeline como a manifestação de maior sucesso do ano) e outra no início de janeiro de 1914. Para esta segunda, Pankhurst escreveu uma carta direcionada ao Rei onde convocava-o para uma reunião (PANKHURST, 1914, p. 335-336). Assim inicia-se o último ano apresentado por Emmeline Pankhurst em sua autobiografia. Em fevereiro, uma série de reuniões fora de Londres foram organizadas pela militante, sendo que a primeira aconteceu em Glasgow. Logo após seu discurso, o mais curto que já fez, Pankhurst é levada para uma delegacia da cidade onde, na manhã seguinte, seria encaminhada à Holloway – onde passou apenas trinta dias presa; sua libertação não tinha como causa somente a fraqueza devido as greves de fome e sede mas também das lesões que recebeu no momento de sua prisão em Glasgow. Emmeline afirma que esta era a sétima tentativa do Governo fazer com que a mesma cumprisse a sentença de três anos imposta no julgamento do ano anterior. No ano de 1914, além das manifestações do movimento sufragista, acontecia também o início da Primeira Guerra Mundial. Chegou para as suffragettes a informação de que o Governo, o mesmo que sempre se colocou contra qualquer manifestação a respeito da questão do voto feminino, permitiu que militantes de Ulster, uma província da Irlanda, se manifestassem no Hyde Park para defender sua política de guerra. Como resposta, as suffragettes organizaram sua própria manifestação no mesmo lugar. Geral Drummond foi anunciada como a principal oradora nesta reunião, e quando chegou o dia, os homens militantes de Ulster e mulheres militantes se reuniram em Hyde Park. Os homens militantes foram autorizados a falar em defesa de derramamento de sangue; mas a general Drummond foi presa antes que ela havia dito mais do que algumas palavras. (PANKHURST, 1914, p. 346) (Tradução livre da autora)83

A manifestação acabou com mais prisões de suffragettes. A presença do Rei na reunião marcada para o dia 21 de maio de 1914 foi negada pelo menos através de seus Ministros. Emmeline, apesar de estar proibida de fazer aparições públicas, dava discursos em varandas. Já que todas as reuniões eram anunciadas publicamente, a militante afirma que a polícia estava sempre se misturando com a plateia na tentativa de prendê-la. A respeito da reunião com o Rei, Emmeline aponta que foi uma estratégia do Governo de prendê-la; e foi o 82

“[…] had been forced to abandon all hope of successful petitioning to his Ministers.” (PANKHURST, 1914, p. 335) 83 “General Drummond was announced as the chief speaker at this meeting, and when the day came, militant Ulster men and militant women assembled in Hyde Park. The militant men were allowed to speak in defence of bloodshed; but General Drummond was arrested before she had uttered more than a few words.” (PANKHURST, 1914, p. 346)





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que aconteceu. No dia marcado, a deputação de mulheres marchava em direção ao Palácio de Buckingham guiada por Emmeline Pankhurst. A militante, ao se referir a conduta dos policiais, compara este episódio com a Black Friday por causa da violência e brutalidade. O resultado para Pankhurst foi mais uma prisão. (PANKHURST, 1914, p. 347-348) Nos últimos momentos da autobiografia, Emmeline apresenta uma reunião da Câmara dos Comuns onde aconteceria um Commitee of Supply. Nesta reunião, havia pessoas a favor e contra as manifestações e o voto feminino. Sr. Robert deu início à discussão a respeito da militância e citou alguns dos tratamentos violentos que as mulheres receberam como por exemplo a Black Friday e a alimentação forçada. Já Sr. McKenna, o primeiro a responder, se posicionou contra as suffragettes, chegando até a debochar das mesmas e ser aplaudido por outros membros. Já Sr. Hardie, ao se pronunciar, lamenta que a Câmara, ao invés de se pronunciar a respeito do sufrágio feminino, discute métodos para punir as militantes (PANKHURST, 1914, p. 362). Emmeline Pankhurst finaliza sua autobiografia fazendo um balanço do movimento sufragista até então e o início da Primeira Guerra Mundial: Nossas batalhas haviam praticamente acabado, nós confiantemente acreditávamos. Por ora, pelo menos, nossos braços estão imobilizados, pois com a ameaça de uma guerra estrangeira descendia diretamente sob a nossa nação nós declaramos uma completa trégua da militância. [...] Nenhum governo futuro repetirá os mesmos erros e a brutalidade do ministério de Asquith. Nenhum estará disposto a assumir a tarefa impossível de reprimir ou sequer atrasar a marcha de mulheres em direção a sua legítima herança de liberdade política e independência social e industrial. (PANKHURST, 1914, p. 364) (Tradução livre da autora)84

Como foi apresentado no primeiro capítulo, a primeira lei que deu o direito ao voto para as mulheres foi aprovada em 1918. No entanto, toda a luta e sofrimento vivido não só pelas suffragettes mas por todos aqueles que durante anos apoiaram a questão do voto feminino foi recompensada com a aprovação do Equal Franchise Act, em 2 de junho de 1928. Infelizmente, Emmeline Pankhurst que bravamente lutou por esse direito, nunca pode usufruilo. A militante, que nunca de fato se recuperou após tantas prisões e greves de fome e sede, faleceu alguns dias após a aprovação da lei, em 14 de junho de 1928.

84

“Our battles are practically over, we confidently believe. For the present at least our arms are grounded, for directly the threat of foreign war descended on our nation we declared a complete truce from militancy. […] No future Government will repeat the mistakes and the brutality of the Asquith Ministry. None will be willing to undertake the impossible task of crushing or even delaying the march of women towards their rightful heritage of political liberty and social and industrial freedom.” (PANKHURST, 1914, p. 364)





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4. CONSIDERAÇÕES FINAIS O movimento sufragista britânico é um marco da História das Mulheres. Foi durante este episódio que as mulheres lutaram por seus direitos, não só o direito ao voto mas também a sua liberdade e sua emancipação política e civil. Apesar de ser um movimento predominantemente feminino, houve uma participação significativa de homens que apoiaram a causa. Ao longo da análise da autobiografia de Emmeline Pankhurst foi possível ver a luta incessante das mulheres e perceber as mudanças de estratégia conforme os anos iam se passando e nenhum resultado positivo era atingido. No caso, os últimos anos apresentados na obra (1907 – 1914) são os mais agressivos. A forma com que a militante apresenta as informações em seu texto deixa indicada que sua intenção de não só passar informações sobre sua vida e sobre o movimento sufragista antes da fundação da Women’s Social and Political Union, mas também chamar o leitor a fazer parte da luta das mulheres. O ponto que afirma essa colocação é a o vocabulário usado pela culta mulher no século XX, seu discurso não é informal mas seu intuito também não é apenas alcançar a elite. No entanto, nem sempre Emmeline Pankhurst é vista positivamente, como apresentou Purvis. De um lado, existe a representação negativa de alguns historiadores homens que estudam o movimento anos depois e, como foi apresentado no trabalho, acabam generalizando não só Emmeline Pankhurst, mas as suffragettes de modo geral. De outro lado, a própria filha de Emmeline Pankhurst que retrata a mãe de forma negativa e ao mesmo tempo contraditória, já que nos três livros publicados a representação da mãe aparece de maneira diferente. Não é possível negar a grandiosidade do movimento sufragista de um modo geral. Foi uma luta longa, na Inglaterra durou entre 1897 e 1928, que despertou nas mulheres força e determinação para lutar por seus direitos. A relação próxima entre as britânicas e estadunidenses mostra que o movimento era mundialmente conhecido. O movimento no Brasil, cuja um dos nomes mais importantes é Bertha Lutz, recebeu forte influência dos outros dois anteriormente citados.





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Emmeline Pankhurst sabiamente coloca que “não pode haver verdadeira paz no mundo até que a mulher, mãe da metade da família humana, é dada a liberdade nos conselhos do mundo” (PANKHURST, 1914, p. 1) (Tradução livre da autora)85. O movimento sufragista de modo geral não teve como desfecho apenas o direito de voto para as mulheres estabelecido, mas também mostrou-as de que elas tem uma história a ser contada, que devem ser respeitadas e que devem lutar por todos os seus direitos.

85

“There can be no real peace in the world until woman, the mother half of the human family, is given liberty in the councils of the world.” (PANKHURST, 1914, p. 1)



FONTE PRIMÁRIA

PANKHURST,

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