Tentativas de descriçao: Perec, Coleman, Akerman

May 29, 2017 | Autor: Nadège Mézié | Categoria: Ethnography, Ethnography (Research Methodology), Georges Perec, Etnografía, Paris, Chantal Akerman
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~ Tentativas de descrição: Perec, Coleman, Akerman Nadège Mézié1

RESUMO: No livro Tentativa de esgotamento de um lugar parisiense, Georges Perec propõe um exercício que ele repetirá inúmeras vezes durante sua obra : observar e descrever o cotidiano em seu aspecto mais banal, explorando os detalhes, as « coisinhas de nada” » dos nossos gestos e dos objetos que fazem parte da nossa vida. Vamos neste artigo nos aventurar nessa escrita e portanto, ao mesmo tempo, no universo da Praça Saint-Sulpice descrita por Perec, para desvendar o como da escrita descritiva perecquiana e discutir as poucas evocações teóricas que ele faz aqui e lá. Examinaremos também os limites da sua observaçãodescrição - alguns assumidos por ele mesmo. Embora curto e, à primeira vista, em tudo econômico, o texto de Perec pode ser inspirador de reflexão para a prática etnográfica. Publicado pela primeira vez em 1975, na França, o livro despertou grande interesse, inclusive em artistas que compartilhavam com o autor a busca de questionamento da modernidade pelo uso da descrição fragmentária ou múltipla do cotidiano. A obra de dois artistas, James Coleman e Chantal Akerman, parece-nos nesse sentido interessante e exploraremos algumas de suas produções. Palavras-chave: Observação. Descrição. Escrita. Obras visuais. Perec. Akerman. Coleman. No dia 18 de Outubro de 19742, uma sexta feira, às 10h30 da manha, Georges Perec3 instala-se numa mesa da Tabacaria Saint-Sulpice e dá-se por missão observar e transcrever o que se passa ao alcance de seus olhos : a Praça

Doutora em antropologia. Afiliada ao laboratório CANTHEL – Universidade Paris Descartes. [email protected] 2 Je remercie vivement Chantal Medaets, Kleber Fernando Rodrigues et Heleno Lima pour leur relecture et leur travail de traduction. 3 Georges Perec (1936-1982) é um escritor francês. Ele foi membro de um grupo de pesquisa em literatura experimental, o Oulipo (Ouvroir de Littérature Potentielle, literalmente, « Abridor de literatura potencial »). Os membros desse grupo se lançavam constantemente desafios à suas escritas, estabelecendo regras restritivas. O livro O sumiço por exemplo, foi escrito por Perec sem o uso da vogal “e”. Perec é também um observador perspicaz das transformações da vida social francesa. Em “As coisas” ele relata o consumismo que se impõe como modo de vida neste país a partir da metade do século XX. 1

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Saint-Sulpice4, seus transeuntes, os pombos, os automóveis que passam, aqueles que estacionam, os agentes de polícia que apitam e fazem a ronda, os ônibus que passam, outros ônibus que passam, uns cheios, outros vazios, meio cheios, meio vazios5. Durante as horas e dois dias que se seguem, ele vai prosseguir a sua tarefa de observação e de descrição, instalando-se em outros terraços ou num banco da praça. A reedição francesa de 2008 de Tentativa de esgotamento de um lugar parisiense (editora Christian Bourgois, colecção Titres), convida-nos a retornar à esse curto texto descritivo de Georges Perec e a confrontá-lo às descrições de cotidiano que nos oferecem James Coleman e Chantal Akerman.

« O resto », « o tecido »

Georges Perec sempre teve curiosidade pelo cotidiano, o anódino, o banal, o que ele chamava de infracomum. Uma curiosidade que ele organizou na escrita. Perec quer saber como falar sobre, como escrever, como explicar o que acontece aqui e agora, diante de nossos olhos. Ele gosta de questionar, de se questionar. O questionamento, segundo ele, é o que nos permite tirar a cortina que obstrui a percepção nítida do conjunto de ações e palavras que formam nosso cotidiano. Toda a sua obra é uma tentativa de responder à essas curiosidades primeiras, essenciais porque para ele uma boa descrição deve poder restituir cada detalhe, por exemplo, da corrida de uma criança até seu cão, « colar-se » aos gestos « que se tornam pesados sob chuva » [Perec, 1975 : 46]. Ele inicia assim sua Tentativa : « Há muitas coisas na Praça Saint Sulpice, por exemplo: uma sub-prefeitura, um prédio do ministério das finanças, um posto de polícia (...). Boa parte dessas coisas, senão a maioria, já foram descritas, inventariadas, fotografadas, contadas ou recenseadas. Meu propósito nas páginas 4

A praça Saint-Sulpice fica próxima ao centro de Paris, num bairro de classe alta (artistas, intelectuais e etc..). 5 Georges Perec tenta novamente a experiência em 1978, desta vez numa transcrição que ele faz para a rádio, com a descrição do cruzamento Mabillon, ainda em Paris. Tentativa de descrever coisas vistas no cruzamento Mabillon em 19 de maio de 1978 é transmitida pela radio France Culture, em 20 fevereiro de 1979. Ele repete o mesmo exercício nas suas descrições textuais infra-ordinários de rua em torno Beaubourg [Perec, 1989].

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que seguem foi mais de descrever todo o resto: o que geralmente não se nota, o que passa desapercebido, o que não se dá importância: o que acontece quando não acontece praticamente nada, senão o tempo, as pessoas, os carros e as nuvens » [Perec, Ibid. : 9-10]. Mais tarde, Perec retorna ao que ele busca e ao que ele evita: « Não ver apenas o extra-ordinário6, mas o tecido (mas como ver o tecido se somente o extraordinário o revela ?) » [Perec, Ibid. : 38]. O tecido é o “pano de fundo”, é a melodia da rua. Perec quer (des)cobrir, através do seu olhar, o alcance e as conexões entre cada elemento. Não as notas (separadamente), mas a relação entre elas, a música, o jogo, a interpretação musical. Ele não quer se ater à nota fora de tom, ao acidente, ao incomum, mas tentar capturar o comum do quase-nada, a trama do instante presente, o efémero : « Temos que ir mais devagar, voltar ao mais simples. Obrigando-se a escrever o que não interessa, o que é mais óbvio, o mais comum, o mais sem graça … » [Perec, 2000 : 100-101].

Observação a partir da mesa do café

Para descrever « o resto », primeiramente é necessário observá-lo, abrir seus olhos e pôr toda a sua atenção no que se vê. Prestar atenção é precisamente o que constitui a observação. Não apenas « correr os olhos » sobre a cena que presenciamos, mas apoiar o olhar (olhar e olhar de novo, atentivamente), recolher cada detalhe pensando na sua restituição, que ela se faça no presente da escrita (exercício de Perec) ou posteriormente (diário do antropólogo). Perec elaborou, portanto, um dispositivo de observação: ele se instalava em uma mesa de café ou em um banco na praça e observava o que ocorria à sua volta. Podemos imaginar que ele dispunha diante de si suas folhas de anotações e tinha à mão um lápis ou caneta, enquanto seus olhos percorriam o terraço e evadiam-se até onde a vista alcança. Para tentar o desafio do « esgotamento do lugar », Perec vai tomar vários pontos de vista a partir dos quais a observação se desenrola. Ele muda de café (Café da Prefeitura, Tabacaria Saint-Sulpice), senta-se num banco da praça 6

Em francês « déchirure » : literalmente um rasgo. Aqui evoca algo que se destaca: acidentes, acontecimentos marcantes, etc.

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ou perto da fonte Saint-Sulpice. Cada posto de observação deve oferecer-lhe um ângulo sobre a realidade que ainda não tinha sido considerado, captando o que pudesse ter passado desapercebido. No banco da praça, Perec está no meio de pombos. Sua descrição se concentra naturalmente nessas aves : « Muitas estão deitadas, as pernas dobradas. É hora da toilette e com seu bico, elas catam seus papos e asas » [Perec, 1975 : 37]. A observação supõe então uma atitude ativa em que a pessoa aguça seu olhar para ver o que normalmente não se vê, as coisas sob as quais habitualmente não paramos. No texto « Abordagens de quê? » Perec escreve « Questionar o habitual. Mas, justamente, a questão é que nós estamos habituados à ele… Nós não o questionamos, ele não nos interpela. O habitual parece não levantar nenhum problema, nós vivemos bem sem pensar nele (...) » [Perec, 1989 : 11]. Com a observação que questiona, o olhar se educa. Devemos aprender a perceber as mais ínfimas diferenças e semelhanças. Perec presta-se assim ao jogo das diferenças quando volta no dia seguinte para a Tabacaria Saint-Sulpice, na mesma hora ou quase, e escreve : « Com relação à ontem, o que mudou?

À

primeira vista, parece igual. Talvez o céu esteja mais nublado? Muitas coisas não mudaram, aparentemente nem se moveram; eu mesmo sentei-me na mesma mesa » [Perec, 1975 : 34]. Em seguida, ele marca uma ruptura no decorrer da descrição (indicada no texto pelo itálico): « À procura de uma diferença : o café da Prefeitura está fechado (…). Bebo uma água Vittel enquanto ontem bebia um café”, mas logo em seguida ele se pergunta: “(em que isso transforma a Praça?) » [Perec, Ibid. : 35]. Será então que existem diferenças insignificantes no exercício da descrição minuciosa ? A observação implica, mesmo que involuntariamente, uma « atitude discriminatória », ou seja uma atitude que opera uma seleção, uma escolha. A simultaneidade das ações, por exemplo, impede que se observe tudo: quando eu viro a cabeça para a direita, não vejo o que acontece à minha esquerda. Nesse sentido, esta atitude seletiva levanta a questão da motivação do observador. O que nos faz nos interessar por tal elemento em vez de outro ? E como justificamos tal escolha ? Assim, Perec se pergunta : « por que duas freiras são mais interessantes 21 Contemporânea – Revista de Ética e Filosofia Política, Caruaru, v. 2, n. 1, p. 18-34, jan./jul. 2016. ISSN 2447-0961

do que dois outros transeuntes ? » [Perec, Ibid. : 39] obrigando-se a reavaliar sua observação tendo em vista o que deveria ser sua preocupação inicial : o « resto », o quase-nada, o cotidiano. Mas com essa questão, Perec parece nos dizer que mesmo no banal, existe uma hierarquia e que certas coisas parecem captar muito mais a nossa atenção do que outras. O funcionamento do nosso cérebro, ainda mais quando já estamos cansados, pode pregar peças. A observação, quando realizada segundo esses princípios e com essa intensidade, é tão ativa e demanda um tipo de atenção que, ao longo do tempo, se releva cansativa : Perec se refere ao « cansaço da visão » [Perec, Ibid. : 38].

D-escrever segundo Perec

Perec questiona-se frequentemente sobre o como da escrita, sobre a forma que ela deve tomar para dizer o que nunca é dito, dizer o que é vivido sobre o modo da evidência, dizer o que some (o que perde significado na correria do dia a dia). « Como descrever /Como dizer? /Como ler os sinais? » questiona-se Perec em seu livro Histórias de Ellis Island [Perec, 1980 : 28]; « o barulho de fundo, o habitual, como dar conta, como o interrogar, como o descrever ? » ele se pergunta no seu texto « Abordagens de quê ? » [Perec, 1989 : 11]. Perec renuncia à narrativa clássica, e até mesmo da narrativa tout court no caso de Tentativa, para se investir na tomada de nota extremamente sóbria : frases curtas, minimalistas, sem nenhum excesso, o que me permite de qualifica-la de descrição econômica. A mão rabisca rapidamente na folha duas ou três palavras da cena observada para não se perder na escolha das palavras e ao mesmo tempo não perder nada da cena. A escrita acalma o sentimento terrível do medo de esquecer ou de que algo passe desapercebido. Perec « apaga-se » o máximo possível para se aproximar da descrição objetiva « Seria realmente tendencioso, por exemplo, afirmar que não há menos gente ou menos carros » [Perec, 1975 : 33]. Ele se mostra sempre muito prudente e coloca um ponto de interrogação quando lhe ocorre uma dúvida a respeito do que observou : « Um cão de caça ? » [Perec, Ibid. : 23]; « Ao fundo (Hotel Récamier?) há 22 Contemporânea – Revista de Ética e Filosofia Política, Caruaru, v. 2, n. 1, p. 18-34, jan./jul. 2016. ISSN 2447-0961

agora várias janelas iluminadas ». Perec faz uso do presente do indicativo do verbo haver « Há … », uma forma gramatical que abre a escrita à descrição, inventariando o que se encontra num lugar num dado momento : « Bem em frente ao café, há uma árvore » [Perec, Ibid. : 49]. Cada um dos episódios de observação-descrição do livro Tentativa (são nove episódios ao todo) segue uma mesma estrutura: data, hora, lugar, tempo e descrição. Perec institui sua descrição num contexto espaço-temporal preciso o que nos permite identificar a herança de uma grafia naturalista na sua escrita (sem se deixar levar por ilusões objetivistas, ver adiante,). Neste livro, o principal dispositivo literário usado por Perec, em bom escritor oulipiano7, é o inventário :

« Um [ônibus] 63 Uma camionete dos correios. Uma criança com um cachorro. Um homem com um jornal. Um homem que tem um grande ‘A’ em seu pulôver de tricô (...) » [Perec, Ibid. : 22-23].

Neste inventário, por vezes, algumas descrições são desenvolvidas mais longamente

:

« Um homem entra no café, se põe em frente à um consumidor que imediatamente se levanta e vai pagar a conta; mas ele não tem dinheiro trocado e é o outro que paga. Eles saem juntos » [Perec, Ibid. : 30].

Esse minimalismo descritivo encarna-se numa escrita desprovida, ao máximo, de adjetivos e advérbios. Perec várias vezes ignora até mesmo o verbo, notando por exemplo apenas o numero da linha de ônibus (96, 63, 70…). Já os carros são qualificados por sua marca e, às vezes, por uma cor (« um DS azul », « um 7

Integrante do grupo Oulipo, ver nota 1 para explicação do grupo.

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Volkswagen azul escuro », etc.). Para pessoas, ele nos informa somente o sexo e a idade e por vezes acrescenta um complemento circunstancial (« com um cachorro », « na calçada », « com um gorro vermelho », etc.). Objetos, pombos, cães e seres humanos são precedidos frequentemente de um artigo indefinido, ou contados. As palavras devem soar justas, precisas e em quantidade somente suficiente para que o leitor saiba à que o escritor se refere. A descrição fixa-se o objetivo de oferecer uma representação da realidade individualizável e identificável, ou seja possibilitando distinguir trajetórias individuais e objetos (coisas8) específicos do turvo fluxo cotidiano de coisas e homens. O objetivo é que a descrição possa dar conta ao mesmo tempo de situações particulares e ações de cada pessoa, sem perder de vista a relação com o conjunto da trama, com o contexto em que ela ocorre.

Projetos classificatórios

Os

inventários

que

faz

Perec

seguem

frequentemente

um

projeto

classificatório. Ele inicia, assim, sua primeira descrição por uma classificação do que ele vê, organizada em categorias (categorias de sinais ou símbolos, tipo de matéria ou ainda objetos animados e inanimados). Assim é o mundo moderno para Perec, repleto de sinais e de « coisas » :

« - Letras do alfabeto, palavras (...) - Símbolos convencionais(...) - Algarismos (...) - Slogans fugitivos (…) - Terra (...) - Pedra (...) - Árvores (...) - Seres humanos (…) » [Perec, Ibid. : 10-11].

8

Lembrando o titulo de seu livro, Coisas…

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Organizar as coisas por tipos ou categorias é pôr ordem a profusão (multiplicidade de formas e de conteúdos) da realidade. Perec evoca igualmente um « Projeto de uma classificação dos guarda-chuvas segundo suas formas, seus modos de funcionamento, suas cores, seus materiais… » [Perec, Ibid. : 46]. Num outro momento reflexivo de sua Tentativa, ele emprega uma breve análise do que ocorre na rua : « Várias dezenas, centenas de ações simultâneas, microeventos, cada um dos quais envolve posturas, atos motores, gastos de energia específicos : discussões à dois, discussões à três (…) o movimento dos lábios, os gestos, as expressões. Modos de locomoção: caminhada, veículo de duas rodas (sem motor, à motor), automóveis […]; Modos de transportar (à mão, debaixo

do braço, nas

costas); Modos de tração (malas com rodas); Graus de determinação ou de motivação : esperar, ficar ‘à toa’, se demorar, ‘enrolar’ (…) Posições do corpo: sentado (…), de pé (…) » [Perec, Ibid. : 15-16].

Entendemos, nessa passagem das páginas 15 e 16, a leitura que Perec faz de uma cena de rua e o que o interessa em primeiro plano. Ele mostra-se sensível à atividade, ao movimento, à energia. Esse gosto pelo movimento se vê na escolha das palavras que ele utiliza, na composição lexical que lhe é própria : passar, empurrar, andar, surgir, entrar, tropeçar, precipitar-se. A descrição desenrola-se “colada” ao movimento dos homens e das coisas. O « resto », o banal, o quotidiano da rua, desenrola-se na escala micro dos acontecimentos, e é preciso saber observar para tomar consciência de tudo o que está em jogo nesses momentos em que, justamente, aparentemente nada acontece. Os homens investem essa cotidianidade com seus corpos e se movem em relação direta com os objetos (apêndices de seus movimentos), essas « coisas » que constituem o mundo urbano moderno. Estas preocupações aproximam Perec da etnometodologia e de uma sociologia preocupada com o detalhe, com os microeventos interativos. Perec sempre se aventura em locais já conhecidos que ele tenta 25 Contemporânea – Revista de Ética e Filosofia Política, Caruaru, v. 2, n. 1, p. 18-34, jan./jul. 2016. ISSN 2447-0961

por sua vez percorrer em piruetas ficcionais ou tentativas de conhecimento objetivo. Perec é um globe-trotter da escrita, ele queria fazer o tour da vida em seus mínimos detalhes, seus recantos, saberes, seus locais e objetos, seguindo caminhos inusitados : as trilhas batidas não têm mais nada a nos dizer. Perec escreve : « Trata-se, talvez, de fundar enfim nossa própria antropologia : a que falará de nós, que irá procurar em nós o que temos há tanto tempo tirado dos outros. Não mais o exótico, mas o endótico » [Perec, 1989 : 11]. Ele se lança num exercício de descrição que é mais um esboço do que poderia ser um conhecimento do cotidiano que colocaria em primeiro plano a descrição metódica apoiada em princípios classificatórios epistêmicos. Sua abordagem tem diversos pontos em comum com a sociologia qualitativa, o que Howard Becker (um sociólogo de campo por excelência) notou, atribuindo à Perec o termo sociógrafo : « A estratégia de Perec coincide em boa porte com o que alguns sociólogos buscaram fazer : a descrição do que um grupo de pessoas que interage e se comunica num contexto histórico específico produz como conjunto de conhecimentos, representações e praticas partilhadas. (…) essa abordagem de Perec tende, em certa medida, à uma descrição do que é algumas vezes designado por ‘experiência vivida’ (…). É para isso que Perec chama a nossa atenção : para o que parece sem importância, que não merece comentário e não merece (certamente) que se faça a teoria » [Becker, 2003 : 69-70]. Perec provavelmente não teria desmentido Becker, ele escreve em « Notas sobre o que eu procuro » que a primeira pergunta que norteou a sua escrita « pode ser qualificada de ‘sociológica’ : como observar o cotidiano » [Perec, 2003 : 10].

Limites, a epistemologia se convida

Na Tentativa, o prevalece são uma série de fragmentos aleatórios, onde o observador oferece seu olhar à contingência, Perec só introduz poucas e fugazes evocações teóricas. No entanto, ele se mostra vigilante quanto aos limites de sua descrição. Ele não sucumbe à ilusão objetivista que gostaria de ver a escrita retranscrever com fidelidade a realidade tal qual, como durante muito tempo se 26 Contemporânea – Revista de Ética e Filosofia Política, Caruaru, v. 2, n. 1, p. 18-34, jan./jul. 2016. ISSN 2447-0961

pensou que a pintura pudesse fazer. Desde as primeiras páginas de sua descrição, ele observou, presciente:

« Restam apenas duas motocicletas [...] eu não vi a terceira partir[...] (Limites evidentes de um tal empreendimento : mesmo que meu único propósito seja observar, eu não vejo o que está acontecendo a poucos metros de mim : eu não noto, por exemplo, que alguns carros estacionam) » [Perec, Ibid. : 21, é Perec quem enfatiza com o itálico].

A simultaneidade e a abrangência espacial reduzem significativamente as pretensões da observação-descrição. A tentativa de descrição exaustiva está inexoravelmente condenada ao fracasso, apesar de todos os subterfúgios e da intensa atenção que se ponha em prática. Primeiro, porque somos fisiologicamente incapazes de completar a descrição. Nosso campo de visão é relativamente baixo em comparação com o de outros animais. A estratégia de usar diferentes pontos de vista resolve pouco a nossa incapacidade de ter olhos atrás da cabeça. Além disso, a nossa visão fica sensivelmente reduzida quando a noite cai, enquanto que o cão, com seus bastonetes, a dilatação da retina e seu tapetum lucidum, tem uma excelente

visão

noturna.

A

descrição

cede

lugar

então

às

pinceladas

impressionistas: « O crepúsculo atinge seu ponto máximo »; « No lado de fora não se distingue praticamente mais os rostos/As cores fundem-se no lusco-fusco raramente iluminado. Manchas amarelas. Vermelhidões. (…) A noite, o inverno: o aspecto irreal dos transeuntes (…). Muita gente, muitas sombras (…). Mal posso ver a igreja » [Perec, Ibid. : 31] Ao mesmo tempo que nossos olhos em repouso vêem infinitamente mais longe que os de um peixe, nossa visão permanece limitada à distância : « Ao fundo (o hotel Récamier?) Há agora várias janelas iluminadas » [Perec, Ibid. : 32]. O que não impede que Perec se gabe de sua boa visão : « ele sobe as escadas da igreja e volta a descê-las de quatro em quatro degraus, carregando sua mochila nas costas e a bandeira da sua patrulha (eu ainda tenho uma boa visão) » [Perec, Ibid. : 40].

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Outro limite fisiológico, o cansaço, como já mencionei, que aumenta com a atenção intensa. Além disso, é preciso considerar o problema epistemológico da atenção discriminatória ou seletiva, que já evoquei brevemente : o observador, mesmo sem se dar conta, se concentra em alguns aspectos em detrimento de outros. A realidade não nos chega completa, ela é previamente discriminada pela observação (ou pela nossa atenção). Para o etnólogo que observa em função de um problema de pesquisa, a questão dos critérios de seleção de fragmentos da realidade justifica-se em função desta problemática; em contrapartida, o observador que se compromete a descrever tudo de um lugar não tem nenhuma razão que justifique a seleção operada. Perec, que procura distinguir o tecido e fazer abstração do eventos que se destacam (do extra-ordiário), descobre no entanto um novo limite que lhe escapa ao controle: alguns fatos impõem-se mais à sua observação do que outros (duas freiras mais que dois transeuntes) e a seleção que se efetua revela-se definitivamente ingovernável, ainda que Perec tente dar razões à sua observação-descrição : « (Por que mencionar os ônibus? Provavelmente porque eles são facilmente reconhecíveis e regulares : eles cortam o tempo, pontuam o ruído de fundo, no limite poderíamos dizer que eles são previsíveis. O resto parece aleatório, improvável, anárquico. Os ônibus passam porque eles têm que passar, mas nada quer que um carro faça marcha ré (…) » [Perec, Ibid. : 28] e mais adiante, ainda, com ironia "Um 96 lotado/(talvez tenha só hoje descoberto minha vocação : controlador de linhas na R.A.T.P.9) » [Perec, Ibid. : 32]. Esta atitude reflexiva de Perec (porque e como ele transcreve a sua observação) é reflexo de uma abordagem epistemológica que se esforça para apreender os vieses e os limites do conhecimento objetivo. Nós já observamos anteriormente que Perec mostrava-se cuidadoso questionando-se sobre o que via : « é realmente uma maquete de arquiteto? ». Mas a descrição o obriga a avançar nas especulações, nas suposições, deduções em que a subjetividade interfere na objetividade : « isso se parece com a idéia que eu faço do que é uma maquete de

9

Empresa responsável pela gestão do transporte público em Paris.

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arquiteto; não vejo mais o que poderia ser » [Perec, Ibid. : 32]; « Eu posso deduzir pela sua expressão de desapontamento que ela queria pegar o [ónibus] 70 » [Perec, Ibid. : 23]. E quando ele não vê, ele lista uma série de possibilidades « não sabemos o que ele comprou (cigarros? uma caneta esferográfica, um selo, (…), uma caixa de lenços de papel?) » [Perec, Ibid. : 25]. Numa descrição, por mais objetiva que seja, o autor nunca está muito longe10. Quando Perec aflora

Perec tampouco está ausente da sua Tentativa. Em várias ocasiões, ele se mostra ao leitor para queixar-se de que está cansado, com frio, para dizer que mudou a localização, que comeu, que reconhece algumas pessoas na rua e com algumas ele inicia a conversa, abandonando sem dúvida a observação-descrição. Ele também aparece quando é a sua vez de ser visto, de ser pego ele mesmo por objeto de observação, numa intrusão inesperada e que foge ao seu controle : « De um ônibus de turistas uma japonesa parece me fotografar” [Perec, Ibid. : 14]; “um transeunte que lembra vagamente Michel Mohr passa uma segunda vez na frente do café e parece surpreender-se de me ver ainda sentado com uma agua Vittel e meus papeis » [Perec, Ibid. : 36]. A observação pode ser também espelho : « ele segura o cigarro da mesma forma que eu (entre o anelar e o dedo médio) : esta é a primeira vez que eu encontro este hábito em outra pessoa » [Perec, Ibid. : 25].

Observação, descrição : perguntas e respostas de Chantal Akerman e James Coleman.

Muitos artistas da década de 1970 tomarão por objeto de criação o cotidiano, o banal, os objetos comuns, a cidade dos dias que se sucedem e que se parecem. A preocupação de Perec parece, portanto, partilhada com outros e o que fica implícito 10

Remeto o leitor à Kerbrat-Orecchioni [1980 : 131-146], para um estudo linguístico detalhado dos limites da pretensão de objetividade no texto de Perec.

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– e por vezes explicito- em suas obras é uma reflexão sobre a modernidade e seus efeitos. A obra Slide Piece (1972), do artista irlandês James Coleman, investe o espaço-tempo da descrição. A obra apresenta-se sob a forma de uma projeção em um ciclo contínuo de um mesmo diapositivo com uma voz-off que descreve a cena. O diapositivo colorido representa uma paisagem qualquer de uma cidade indeterminada (embora certamente ocidental) : no primeiro plano, à esquerda, dois automóveis; no segundo-plano, um posto de gasolina; ao fundo, a rua e os edifícios de tijolo, algumas árvores aparecem na cena, nenhum humano aparece. O diapositivo é descrito por uma voz monotônica, uma descrição naturalista que se satisfaz primeiro da superfície das coisas para penetrar lentamente no cerne. Quando a voz cala-se, o diapositivo desaparece para dar lugar ao mesmo diapositivo, dessa vez acompanhado de uma nova descrição à partir de outro ponto de vista. A obra passa assim a impressão de prosseguir indefinidamente, se abrindo sempre à novas descrições (na verdade, o conjunto da projeção dura 40 minutos). Uma mesma cena ativa uma infinidade de descrições, descrições que pretendem ser polidas, de uma escrita sem graça mas informativa, teria dito Perec. Cada descrição procura novos significados, esmiúça uma série de possibilidades, de cenários. Na mudança de pontos de vista, partimos da raíz de uma árvore para, na projeção seguinte, partir de uma janela, a terceira na parte superior à esquerda, no último andar. O espectador impregna-se lentamente da imagem projetada, lembrando da descrição precedente; um diálogo se estabelece entre cada descrição e entre as descrições e a imagem. Cada projeção chama nossa atenção para um detalhe diferente que nos conduz à uma nova leitura da imagem. James Coleman nos convida a perceber que, se sua fotografia parece realista e segue aparentemente uma abordagem positivista, ela pode no entanto servir de suporte à uma infinidade de

descrições.

Ele

rompe

dessa

maneira

com

os

primeiros

tempos

« prometheanos11 » da fotografia, em que pairava no ar a certeza de que entenderíamos enfim a realidade tal qual ela era, e que a descrição adicional

11

Sentimento de poder, de usurpar a criação de Deus.

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perderia sua razão de existir. Susan Sontag fala da « afirmação whitemaneana12 » da época em que se concebia a fotografia como um ponto de vista « sábio, definitivo, transcendente » [Sontag, 2000 : 66-67]. August Sander seria o prometheano por excelência, impulsionado por um desejo « whitmaneano » incomensurável, quando ele inicia, em 1911, a fotografar o povo alemão e a fazer da sua obra « a cara do nosso tempo », um inventário ideal e completo. Nas palavras do próprio Sander, ele queria oferecer « imagens arquetípicas » de cada tipo social. Nessas fotos, ele dizia nada descrever. Chantal Akerman, no início dos anos 70, tem vinte e poucos anos e uma câmera no pendurada no ombro. No seu primeiro filme, Hotel Monterey (1972), que é geralmente classificado de experimental, ela filma um hotel barato (essencialmente frequentado por pessoas idosas e/ou pobres) em Nova Iorque. Ela planta a sua câmera no hall de entrada, no elevador, nos corredores, nos interiores dos quartos e filma longos e mudos planos fixos enquanto se desenrola a vida diária do hotel e de seus clientes : idas e vindas, abertura e fechamento de portas, silêncio, espera, corredores desertos. Numa segunda abordagem do lugar, Chantal Akerman anda nos corredores aproximando-se lentamente das janelas, filmando o exterior e recuando lentamente a sua câmera. Akerman não pretende oferecer-nos uma vista de todo o hotel, mas, com a sua câmera, ela elabora uma descrição visual fragmentária do lugar (fragmentos sobrepostos) e desestabiliza o espectador com imagens em zoom muito aproximado (sharp focus) de portas, paredes… Não há transição entre os planos fixos e os movimentos da câmera. O filme incarna a duração e a sequencia do que seria uma « pura captura », em que a câmera seria um olho fixo e invisível. No entanto, a câmera, com sua presença física obviamente perceptível13, provoca hesitação entre os clientes sobre o que eles podem ou não podem fazer14 :

12

Segundo o poeta Americano Walt Whitman (1819-1892). Whitman, ao rejeitar a distinção entre o belo e o feio, queria dar uma percepção de unidade aos Estados Unidos. 13 Lembrando que na época não existiam ainda as câmeras quase imperceptíveis de tão pequenas, de que dispomos hoje. 14 O viés não é desprezível : Akerman não pode filmar o que é o ordinário do ordinário, onde cada um age sem a presença exótica, entendida aqui como a presença do que vem de fora, que não pertence ao hotel e ao seu funcionamento.

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a câmera no elevador filma as portas que se abrem e se fecham nos andares, os clientes ficam relutantes em entrar vendo a câmera apontada para eles. Esta

abordagem

cinematográfica

anti-narrativa

(duração,

sequencia,

eliminação da diretora) inscreve o documentário de Chantal Akerman no modo « observação » dos filmes de não-ficção, segundo a caracterização de Bill Nichols, teórico de filmes-documentário. Se enquadram nessa caracterização filmes em que « a ausência da relação direta entre ‘atores sociais’ e cineasta » prevalece e o cineasta « é deixado para trás, em uma atitude de não-intervenção ». Esse modo « não permite que as pessoas filmadas dirijam-se ao espectador [...]. A observação coloca de fato os atores sociais num status comparável ao de atores de ficção, por sua permanência nas situações e acontecimentos que os constituem enquanto personagens » [Lioult, 2004 : 107]. Um outro ponto desenvolvido por Nichols é o da descrição : « Os filmes de observação tendem a retratar [...] de forma exaustiva o cotidiano » [Nichols cité por Lioult, Ibid. : 107] et Jean-Luc Lioult, acrescenta que « o material filmado está intimamente ligado ao lugar e ao presente da filmagem » [Lioult, Ibid. : 107]. O que confere um caráter experimental ao filme de Akerman é sua montagem, que põe em sequencia planos fixos e movimentos de câmera, o que impede a percepção de continuidade espacial e temporal da observação. Um outro filme de Akerman, de 1975, Jeanne Dielman, 23, Quai du Commerce, 1080 Bruxelas, oferece uma descrição minuciosa, que dá a impressão de ser a filmagem em tempo real, da vida de uma mulher em seu ambiente doméstico e seu trabalho. Entre a cozinha e o jantar com seu filho, a prostituição em seu quarto para aumentar a renda mensal, quando a trama regular e comum de sua vida sai dos trilhos. A descrição, seja ela escrita ou visual, inscreve-se na duração (tempo) e no espaço; descreve-se a passagem do tempo num determinado espaço (temporalidade do espaço) e o cenário da sequencia temporal (espacialização do tempo). Novamente, Akerman usa tomadas estáticas longas que mostram o cotidiano em sua essência repetitiva e imperturbável. Catherine Gonnard e Elizabeth Lebovici escrevem sobre o filme : « O ritmo imutável, repetitivo do cotidiano, o achatamento da temporalidade diária são produzidos pelo material cinematográfico, reduzindo seus efeitos visuais e 32 Contemporânea – Revista de Ética e Filosofia Política, Caruaru, v. 2, n. 1, p. 18-34, jan./jul. 2016. ISSN 2447-0961

palavras ao máximo (ultra-magro) para sugerir, de maneira quase corporal, a imobilidade, a regularidade e a asfixia » [Gonnard et Lebovici, 2007 : 341]. A gestualidade da personagem feminina é auferida aos objetos de sua condição de mulher : torneira, prato, tricô, botões, etc. Akerman assume essas caraterísticas e as reivindica. Ela quis fazer um filme feminista mostrando as ações diárias da mulher, seu ambiente-objeto doméstico, a temporalidade gestual (a duração que segue o gesto até que se acabe, aí está a descrição do gesto). As diferentes abordagens descritivas da cotidianeidade, e dos objetos que o compõe, nos anos 70, expressaram com maior ou menor insistência, de forma mais ou menos explicita, uma crítica da modernidade e da alienação advinda do culto das mercadorias. Perec, por sua vez, sugere que nos apropriemos do nosso ambiente para evitar cair num « sono sem sonhos », numa « anestesia » do impensado. Essa apropriação passa por uma antropologia do endótico para encontrar a nossa vida, o nosso corpo, o nosso espaço, a nossa verdade. A descrição é descoberta : « Descreva sua rua. Descreva um outro. Compare. Faça um inventário de seus bolsos, da sua bolsa. Pergunte a si mesmo sobre a origem, o uso e o destino de cada objeto que você tirar dela/e (bolsa ou bolso). Questione suas colherinhas. O que há sob seu papel de parede? Quantos gestos seriam necessários para discar um número de telefone? Por quê. Por que não encontramos cigarros nos supermercados? Por que não? » [Perec, 1989 : 12-13].

REFERÊNCIAS Becker Howard S. (2003). « Sociologie, sociographie, Perec et Passeron » dans Paroles et musique, Paris, L'Harmattan. Gonnard Catherine et Lebovici Elisabeth (2007). Femmes artistes, artistes femmes. Paris, de 1880 à nos jours, Paris, Editions Hazan. Kerbrat-Orecchioni Catherine (1980). L'énonciation. De la subjectivité dans le langage, Paris, Armand Colin. Lioult Jean-Luc (2004). A l'enseigne du réel. Penser le documentaire, Aix-enProvence, Publications de l'Université de Provence. 33 Contemporânea – Revista de Ética e Filosofia Política, Caruaru, v. 2, n. 1, p. 18-34, jan./jul. 2016. ISSN 2447-0961

Perec Georges (1975). Tentative d'épuisement d'un lieu parisien, Paris, Christian Bourgois éditeur, (nouvelle édition dans la collection Christian Bourgois éditeur Titres, parution janvier 2008). 1979, Tentative de description des choses vues au carrefour Mabillon le 19 mai 1978, émission radiophonique diffusée par France Culture le 20 février. Robert Bober (1980). Récits d'Ellis Island: histoires d'errance et d'espoir, Paris, INA/éditions du Sorbier. 1989, « Approches de quoi? » dans L'infra-ordinaire, Paris, Le Seuil. 2000, Espèces d'espaces, Paris, éditions Galilée. 2003, « Notes sur ce que je cherche » dans Penser/Classer, Paris, Le Seuil. Sontag Susan (2000). Sur la photographie, Paris, Christian Bourgois éditeur.

OBRAS AUDIO-VISUAIS

Akerman Chantal, 1972, Hotel Monterey. 1975, Jeanne Dielman. 23, quai du Commerce, 1080 Bruxelles, avec Delphine Seyrig. Coleman James, 1972, Slide piece.

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